Capítulo 24: O Vértice Temporal

O Black Pearl ancorou ao largo da ilha e a tripulação desceu para os botes.

- Eu não vou sem antes ver o Will! – Alicia estava determinada a adiar a sua volta enquanto não visse Will.

- Alicia, sabes que o Will não pode pisar terra. – Lara tentou consolar a amiga.

- Mas então porque é que ele não aparece? – Alicia cruzou os braços e amuou.

- Tiveste com ele ontem e pelo que disseste foi quase como uma despedida! – Exclamou Lara.

Alicia olhou para Lara, olhou para o horizonte e olhou para a ilha. Uma lágrima escorreu para a sua face.

- E se ele aparecer e não me vir aqui? – Alicia perguntou, bastante chorosa.

- Eu digo-lhe que voltas-te. – Elizabeth aproximou-se mancando por causa do tornozelo. – Deve haver um meio para vocês se verem uma última vez. – Elizabeth sorriu timidamente.

- Não pode ser a última vez. – Alicia disse para si própria.

Barbossa chamou as moças e estas despediram-se de Elizabeth e da tripulação que ficou.

Enquanto remavam, Alicia fixava Jack que se mantinha em silêncio. Na verdade todos se encontravam calados, quer pela situação, quer pelo ambiente pesado que a ilha transmitia.

Ao olhar para Jack, Lara sentiu um aperto no coração e sentiu as lágrimas aflorarem ao seu rosto. Agora percebia a aflição de Alicia por causa de Will. Mas mesmo com Jack ali, sentia como se o Mundo fosse acabar naquele momento.

- Algum problema? – Deu com Jack olhando para si e não soube o que dizer.

- Nada de especial. Só uma angústia que não consigo explicar. – os olhos de ambos se cruzaram com tal intensidade de sentimentos que não eram precisas palavras. Era como se ambos estivessem ligados por um elo inseparável. Lara baixou os olhos quebrando o contacto e limpou as lágrimas.

A areia daquela ilha era negra como carvão e emanava um odor a enxofre. Lara tentou detectar algum vulcão que explicasse aqueles dois factores mas a montanha que se erguia não se parecia com uma cratera.

Caminharam em direcção ao interior daquele bocado de terra amaldiçoada, com olhares de receio. Ao longe, em vez das típicas árvores que abriam caminho para o seu interior, a ilha possuía grandes rochedos negros, que se erguiam como gigantes ameaçadores.

- Acho que erramos o caminho. Se isto não é o inferno, então não imagino como este último será! – Alicia caminhava ao lado de Lara.

- A Calipso avisou que isto não era brincadeira! – Lara tentou sorriu, mas berrou ao sentir algo agarrando sua perna. Olhou para baixo e viu uma mão esquelética, agarrando o seu tornozelo. Saltou instintivamente, arrancando o braço ao defunto, ficando este preso à sua perna. Tirou o braço da sua perna e levantou-o com ar repugnante. – Cuidado aonde põem os pés!

Jack aproximou-se do esqueleto. Ainda possuía as roupas e esse factor fez com o capitão vasculha-se dentro do casaco. Encontrou um papel amarelecido e já com as letras esborratadas. No entanto, um símbolo era ainda bastante visível.

- A Companhia Inglesas das Índias Orientais. – Jack pronunciou secamente.

- O que é que eles quereriam daqui? – Perguntou Barbossa.

- O melhor é nem sequer saber. – Jack guardou o papel e continuou a marcha. Mas desta vez colocou-se ao lado de Lara, fazendo esta sentir-se segura.

Caminharam mais um bocado, tentando não tropeçar nos inúmeros esqueletos que polvilhavam a ilha, até que Alicia apontou para um sítio.

- Olhem! Vi fumo sair do meio daquelas rochas!

Todos olharam em frente, mas nada viram.

- Será um géiser? Ou um daqueles buracos que estão sempre a fumegar? – Perguntou Alicia.

Mas Lara teve um pressentimento estranho. Jack e Barbossa desembainharam as espadas e seguiram em frente. Até que uma figura feminina apareceu à frente e impediu-os.

- Alto! – Calipso gritou. – A não ser que queiram morrer de maneira horrível, o melhor é sossegarem os cavalos, antes que façam asneiras.

- O que há ali? – Perguntou Jack.

- A entrada para o Vértice! – Disse com cara séria.

- Óptimo! Era mesmo disso que estávamos à procura! – Jack tentou dar um passo, mas Calipso travou-o outra vez.

- Jack Sparrow, por acaso pensas que é assim tão fácil? Não te perguntas porque é que os coitados que nos rodeiam, passarão a eternidade aqui? – Disse a deusa, apontando para os esqueletos.

Os presentes entreolharam-se e Calipso ordenou que a seguissem sem fazer barulho. Esconderam-se atrás de umas rochas.

- Como já tinha dito antes, o Vértice Temporal é um lago negro que transporta as pessoas no tempo. Para lá chegarem terão de atravessar uma gruta, já que este fica mesmo no interior da montanha. – Calipso fez uma pausa e olhou para cada um dos presentes. – Mas para lá chegarem terão de passar pelo guardião do Vértice, que aviso desde já não é nada agradável! – exclamou com voz chocha.

- A sério? Não pode ser pior que o Kraken! – Barbossa riu-se, deixando Jack profundamente irritado.

Calipso não disse nada e apenas apontou. Todos olharam cautelosamente para a entrada da gruta e julgaram ter um ataque do coração.

- Mãe de Deus! Jesus Cristo! – Raguetti entrou em pânico, assim com Pintel.

À entrada da gruta, encontrava-se uma criatura enorme, de cor negra o que fazia com que se camuflasse no ambiente. Era um misto de dragão e cão raivoso. Possuíam corpo de dragão, mas o focinho era de cão. Parecia dormir profundamente. As garras eram tão grandes que uma só patada matava sete de uma vez.

- Ok. Voltamos outra vez para o Pearl e não se fala mais nisso! – Alicia já ia virar costas quando Lara lhe agarrou o braço.

- Chegamos aqui, não é agora que vamos desistir! – Exclamou Lara.

- Lara, acho que a Alicia tem razão. – Defendeu Jack. – Embora não lhe gabe a inteligência desde que começou a namorar com o eu… - Alicia olhou para Jack com ar feroz. - … o Will, o melhor é voltarmos. Está claro que não conseguimos passar pelo Boby! – Disse apontando para a criatura.

- Não. Se quiseres ficas, Alicia. Eu vou. – Lara olhou para Calipso. – Como é que se passa por aquela coisa?

- Bem, para começar ele parece que está a dormir, mas tem uns ouvidos de tísico! Qualquer passo dado ele ouve. – Alertou Calipso.

- Espera aí! – Alicia exclamou. – Isto faz-me lembrar aquele herói grego que demos na escola! Como é que ele se chamava?

- Ulisses. – Disse Lara.

- Bons tempos! Era cá um homem… - Calipso suspirou, deixando Jack e Barbossa com cara de bobos.

- Exacto. Não há uma cena qualquer em que ele tem de ir a uma ilha e passar por um cão de três cabeças? – Perguntou Alicia.

- A Ilha dos Infernos. – Confirmou Calipso. – Consegue ser pior que o Vértice e o cofre de Davy Jones juntos. O cão de quem falas é Cérbero.

- Isso mesmo! – Alicia sorriu triunfante e botou a língua de fora na direcção de Jack.

- Cérbero tem uma maneira diferente de ser contornado. Se estiver com os olhos abertos é porque está a dormir. Se estiver com os olhos fechados é porque está acordado. No fundo é mais fácil de passar do que o Sirius.

- Sirius? – Indagou Jack.

- Sim. Ou achavas que não tinha nome? – Calipso voltou ao tema. – Para passar por ele têm de usar um truque…

- Qual? – Perguntaram todos em uníssono.

- Cantar. – Disse Calipso secamente.

- Agora é que vamos mesmo embora! – Jack levantou-se mas Calipso derrubou-o.

- Confia em mim. Vocês vão passar e vão conseguir chegar ao Vértice! – Calipso olhou Jack e Barbossa nos olhos. – Vocês são a prova viva de que o que prometo, cumpro.

- Porque é que todos os locais remotos têm um monstro a montar guarda? – Perguntou Lara.

- Não sei. Tens de perguntar a Zeus! – Calipso olhou para a criatura. - O canto faz com que ele adormeça. Qual de vocês canta melhor? – Perguntou a deusa.

Todos se entreolharam com cara de caso. Mesmo que alguém quisesse, a vergonha era maior. A última vítima tinha sido Raguetti, depois de ter falado daquela maneira a Calipso quando a libertou. Foi gozado durante semanas.

- Vai lá! – Alicia empurrou Lara.

- Eu? Mas eu não sei cantar! – Lara sentiu os olhares pousarem em si.

- Lara, sabes que cantas muito bem. Ficas sempre em primeiro no karaoke! – Alicia sorriu, mas Lara estava com vontade de se enfiar num buraco.

- Ela não pode ir. – Disse Calipso.

- Porquê? – Perguntaram Lara, Alicia e Jack ao mesmo tempo.

- É perigoso demais. Porque não vais tu Alicia? – Calipso sorriu enigmaticamente.

- Ah, para a Lara é perigoso e para mim não? – Alicia revoltou-se.

- Eu prometo que levo o Will a terra antes de voltares! – Propôs a deusa.

Alicia pensou por um bocado.

- Está bem! – a rapariga levantou-se e pé ante pé, chegou à beira da criatura.

Era algo tão gigantesco que Alicia teve vontade de dar meia volta. Mas já não havia nada a fazer. Quando olhou de novo viu dois olhos vermelhos cor de fogo pregados em si.

- "Ok, Alicia. Acalma-te. Isto não é nada de mais. É muito pior fazer um teste de matemática!" – pensou.

Sirius emitiu um rugido fazendo Alicia engolir em seco, rezar um Pai Nosso encomendando-se a Deus e cantar a primeira coisa que lhe veio à cabeça.

- Isto não vai dar certo! – Lara estava prestes a explodir mas Jack segurou-a.

Cantando mal ou bem, Alicia começou a ver os olhos de Sirius fecharem-se contra a vontade deste. Quando caiu no sono dos justos, Alicia parou de cantar, esperou um pouco certificando-se que este adormecera e voltou-se para os piratas, sorrindo, levantando os braços e mostrando os polegares em sinal de triunfo.

Um a um os piratas caminharam para dentro da gruta, passando o mais distante de Sirius. Houve um momento de pânico quando Sirius espirrou, mas como não acordou continuaram o mesmo rumo.

- Onde tens a Bíblia? – Perguntou Pintel a Raguetti.

- Porquê perguntas isso? – Perguntou o outro.

- Porque me vou dedicar a rezar para afastar o azar! – Pintel sacudiu-se, livrando-se dos restos do espirro de Sirius.

- Porque é que não queria que eu me arriscasse? – Lara perguntou a Calipso com voz soturna.

- Mais cedo ou mais tarde saberás. – Calipso respondeu sem olhar para Lara, fazendo esta ficar confusa, mas limitando-se a caminhar em frente.

Continua…