Os humanos não prestam!

Quem é que nunca pensou isto?

Agora, e pelo que parece, mais uma de tantas vezes, é a Lauren a pensar assim.

Para me conseguir explicar melhor terei que resumir a manhã de sexta: aulas. Não passámos nenhuma aula sentadas juntas e por isso quase não nos falámos em toda a manhã mas, depois da segunda aula, vi uma cabeleira aloirada à minha espera na base das escadas.

No momento em que me viu deixou o seu telemóvel de parte e veio cumprimentar-me como se apenas agora nos tivéssemos visto em toda a manhã. Quase isso, pelo menos. Apercebi-me de que algo não estava muito certo pela sua maneira de estar quieta e agarrada ao aparelho eletrónico que, naquela manhã, parecia algo normal nela, mesmo que não fosse.

Tentei puxar conversa:

– Que estás a fazer?

– ‘Á espera da Eva – responde, erguendo ligeiramente o olhar do ecrã na minha direção.

– Ela esta a ter aulas de quê? – insisto.

– História – diz, agora abandonando o aparelho.

– Ah, esqueci-me que a turma dela hoje tem as mesmas aulas que nós! – exclamo com um sorriso torto.

– Pois é...

Logo depois chegou a Eva que avisou que precisava de ir à secretaria da escola para fazer algo, que, sinceramente, não me diz respeito. Apenas segui as duas pensativa.

De alguma forma a mais alta parecia tentar ignorar as suas preocupações quando estava com Eva. Estaria a esconder algo?

E estava.

No intervalo seguinte recebi um convite dela para almoçar-mos juntas e com outra amiga dela (de outra escola) fora da escola. Acabei por aceitar já que sentia certa curiosidade.

Como o caminho ainda era um pouco longo e nós íamos a pé tivemos tempo para conversar, embora uma conversa acanhada no inicio. Mais ou menos a meio de percurso Lauren pede:

– Eu preciso contar uma coisa, mas não podes dizer a ninguém!

– Eu nunca conto nada. Acho que acabo por me esquecer de qualquer das formas! – respondo divertida, acabando por fazê-la sorrir.

– Não sei se reparaste mas andam a circular uns rumores sobre mim por aí...

– Rumores? – pergunto sem entender.

– É – ela chuta uma pedrinha enquanto caminha a meu lado – Sabes que na terça eu não fiz aula de Educação Física e fiquei a aula toda sentada debaixo daquele “coiso” dos jogadores com a Pippa e o Andrew.

– Huhum – concordo – Eu até tentei dedicar-te um lançamento mas tu nunca olhavas! – brinco, com uma risada em seguida.

Aí consigo ouvi-la rir de maneira fraca para logo depois se desculpar como se aquilo fosse o fim do mundo enquanto eu fingia indignação e mágoa.

A partir daí ela desabafou comigo.

Explicou que, por causa de se ter tornado amiga do Andrew (um rapaz mais ou menos da minha altura, de cabelos escuros e um pouco cheinho), agora andavam a circular rumores de que ambos gostam um do outro e que ele lhe pedira o número.

– É sempre assim! – exclamou, depois de explicar, indignada – Não posso ter um amigo rapaz e já começam todos a pensar que quero namorar! E o pior de tudo é que no fim acabam por conseguir arrastar sempre a Eva para estas confusões! – reclama, com as sobrancelhas finas franzidas – E depois começam as conversas de que somos lésbicas! – termina ainda mais irritada.

Confesso que queria saber o que se passava para poder ajudar de alguma forma, mas a situação tão complexa apanhou-me ligeiramente desprevenida. Acho que não consegui dar um conselho que prestasse mas no fim ela acabou por agradecer e por se desculpar por explodir e encher-me com os seus problemas.

Eu não me importei realmente com a situação. Achei simplesmente maravilhoso que ela já me considerasse amiga o suficiente para poder dizer como se sente sem problemas. Tal como lhe disse a ela, escrevo agora aqui: “Não foi problema nenhum. Até gostava de conseguir ser tão direta como tu. Sou do tipo que costuma aguentar as coisas, sabes?”

– Eu não sou direta – respondeu – Podem meter-se comigo; eu não me importo! Mas empurrar os outros para a minha vida já é demais!

O resto do dia correu lindamente!

Finalmente o Sr.Destino tirou um dia de folga e deixou-me aproveitar aquele almoço divertido em que três jovens com óculos quadrados, sentadas numa esplanada simples, aproveitavam para falar sobre pesadelos, sonhos e filmes de terror.

Só queria que o Destino não tivesse decidido atormentar a minha nova amiga...

– Cherry