06 de Outubro, 2014
20:12

A arte envolta em tragar um cigarro não é, sobretudo, fácil nem difícil. Um cigarro, quando é aceso, se torna um objeto não-objeto. Um objeto com uma alma intocável, que só aqueles que dominam a arte de tragar a conseguem alcançar. A arte de tragar envolvem o ser com um véu invisível de uma fumaça, que começa desde a "tragagem", até contaminar o ar com a sua fina camada de poesia mesclada com a maldita fumaça da boca do amaldiçoado.

A noite estava fria, as janelas estavam abertas na grande mansão vazia. Uma pequena camada de fumaça saia da janela da sala, onde tinha um garoto, despendurado no parapeito da mesma. Ele solta um longo suspiro, enquanto observa as margaridas do jardim da frente.

— Boa noite, senhor Leonard. — a empregada diz, andando até o menino, descendo as escadas do grande salão. Os cabelos negros refletiam na luz. A barba em pequenos fiapos do garoto tinham tomado-lhe a face.

— Simples palavras não vão tornar a noite boa, Luci. Mas a noite é inevitável, não é mesmo? Sendo boa ou não. — ele bufa.

— Está preocupado? — ela perguntava astuta, afinal, Leonard era como um filho para a bela madame.

— Não é como se eu estivesse. — Leonard deu outra tragada no cigarro, dessa vez devagar, tomando o cigarro como se o amaldiçoado fosse imune a câncer. — Mas obrigado, Luci. Ao menos você nota a minha indignação. Sutil, como sempre fora, certo? — o belo garoto moreno mostrou um sorriso amarelo com o cigarro entre os dedos para Luci.

— Eu não entendo, senhor. É como se tivesse o maior presente e estivesse insatisfeito com ele. É incapaz de ficar feliz? — ela pergunta, rudemente. — Desculpe, mas alguém às vezes tem que mandar no senhor.

— Quer trocar de lugar comigo? Eu deixo. — ele se levanta, estressado, joga o cigarro no fim e suas cinzas no chão, se dirigindo ao quarto, no norte da mansão.

— Senhor, eu adoraria ser filha de um dos maiores astros do mundo, declarada como dama da rainha. Eu adoraria ser famosa, ser amada. Mas não posso, lide com isso. — ela grita e logo vai em direção ao menino, passando a mão em seu rosto. — Eu te amo, Leo, deixe-me cuidar de você.

— Pode ficar com a minha vida, eu não me importo. Mas olha... — ele põe à mostra um sorriso irônico — NÃO TEM COMO.

Leo caminha até seu quarto, subindo as escadas lustradas por Luci. A casa nunca fora desarrumada, era como uma relíquia preciosa para todos ali, embora agora só restasse Leo e alguns empregados de confiança. Bateu a porta com tanta força que o barulho ecoou por toda a mansão.

Luci continuava parada perto da janela observando o luar lá fora, como estava bonito, e o tão adorado jardim de margaridas que Leo gostava de brincar quando era criança. Sem olhar para onde Leo poderia ter se dirigido, ela volta aos seus afazeres, como uma empregada que não se abala, dia após dia.

Ela hesitava em pensar no que ele poderia fazer, ou realmente pensar no que poderia fazer, mas seguia seu caminho.

Ele, dentro de seu banheiro na suíte, olhou para o espelho. Logo mudou o cabelo de lado e jogou água no rosto, quando abriu os olhos, avistou diretamente ali a caixa de remédios. Ele a abriu e colocou todos os rémedios, no máximo uns dez dentro da boca, pegando um copo de água e tentando engoli-los todos de uma vez.

E logo após, cuspiu todos em um engasgo.

Ele se virou para o espelho, o que ele estava fazendo com a vida dele? Ele não é qualquer um, mas... Ao mesmo tempo, não parecia ser “algum”.

Ele lacrimeja, como uma criança, e um ódio toma conta de seu pobre ser. Leo de repente joga todos os objetos que estavam na pia do banheiro no chão, quebrando a saboneteira que estava perto do espelho e jogando também todos os cremes do armário no chão.

— Eu me odeio.