Duas Faces - Continuação escrita por Palloma Oliveira


Capítulo 11
Capitulo 56




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Capitulo 56

(Em Lisboa, Victoria chega a casa, depois de um exausto dia de trabalho. Não pensava que era tão difícil ser Paula. Do salão ouve-se uma doce melodia tocada num cravo. Ela entra e sem se manifestar, aprecia Cristina a tocar Tristesse – Chopin. Uma melodia serena e calma, capaz de fazer sonhar até o mais agitado. Tocava de olhos fechados, deixando-se guiar pela pouca experiencia de menina moça, e pelas brancas mãozinhas de pequena aristocrata. Mas Victoria estranha o facto de uma jovem tocar tal clássico. Aproximou-se dela, sem fazer barulho e sorrateiramente sentou-se ao seu lado tocando com ela aquela triste música de tarde chuvosa. O salão estava escuro, iluminado por dois castiçais com velas que mantinham mórbido e triste, o lugar frio. O cravo barroco parecia repousar sobre quele carpete carmim no meio do grande salão, rodeado por quadros de moldura doirada fazendo notar ter sido feito só para ele. Cristina demonstra não se importar com as mãos que tocam com ela. Aquelas mãos, não tão brancas, não tão pequeninas como as de sua mãe. A cada nota, a cada som, parecia exorcizar-se a tristeza que Cristina levava no olhar e nas mãos. Pareciam conversar entre sinfonias, o dó-ré-mi eram palavras e prosas, mas a única coisa que se ouvia no grande salão, era a triste melodia de tarde chuvosa. Cristina encerra e sem dizer uma única palavra, levanta-se e sai deixando Victoria com a preocupação de que algo lhe estivesse a passar. Vai ter com ela)

Victoria (Paula) (agarra-a pelo braço) – Meu bem, não te vás ainda! Que tens, minha flor?

Cristina (olha-a como à uma estranha) – A mim, nada! Mas à ti… oh querida mãe!

Victoria (Paula) – Porquê tocavas uma música tão triste? Estás triste?

Cristina – Já se me passaram as tristezas, minha senhora mãe. E se toco Chopin é porque assim mo ensinaste… desde os quatro anos, obrigaste-me a aprender piano, violino, flauta, picardo e o cravo que herdaste de meu avô, que nosso senhor o tenha! O ballet, nunca deixei, não te preocupes que não tenho tais planos. Para o teu descanso, tenho a tua educação rigorosa.

Victoria (Paula) (abaixa o olhar lembrando-se de Paula) – E o que gostavas de fazer?

Cristina (sorri) – O que decidir a minha senhora mãe.

Victoria (Paula) – Não, eu não decido nada. (pega nas suas mãos) Diz-me: o que tu queres?

Cristina (desvia o olhar e franze os lábios) – Bem… quero ser atriz como meu pai.

Victoria (Paula) (sorri) – Da tua mãe não herdaste nada se não a aparência física. (acaricia-lhe os longos fios doirados) Queres ser atriz? Segue com isso. Levas no sangue este dom.

Cristina – Obrigada, querida mãe. (abraça-a) Sabes, as vezes comparo-te à acácias… pobres arvores de savana que por vezes são solitárias e verdes apenas… mas outras vezes são alegres e amarelas pelas flores que têm. As acácias podem ser tristes, mas também podem alegrar.

Victoria (Paula) (sorri olhando-a) – Não gosto de acácias… estas roubam-me o sossego se estou com elas. São tão grandes, assombradas por tristes lembranças e guardiãs da tranquilidade na savana. Dão alegria ao cansado que se quer refrescar na sombra, mas dão astucia ao guepardo que nela sobe para espreitar a presa, atacando o infeliz que nela confiou seu descanso.

(Com isto, Victoria quis dizer que assim como faz a acácia, ela também pode dar alegria aos que a rodeiam mas que a tristeza se lhes cairá por sua culpa, se lhe for descoberta a verdade. Cristina deixa-a e retira-se. Victoria sobe para o quarto onde encontra Cesar que está recostado à cama, a ler um livro. Ao perceber a sua presença, sorri)

Cesar – Boa tarde, meu amor! (pousa o livro) Anda cá! Preciso de um beijinho teu!

Victoria (Paula) (senta-se ao seu lado e concede-lhe o beijo) – Sentiste a minha falta?

Cesar – Não vês que pareço um cão quando vê o dono chegar?

Victoria (Paula) (dá-lhe outro beijo) – Quero pedir-te um favor, meu adorado amor.

Cesar (abraça-a) – Tudo o que quiseres, minha Afrodite.

Victoria (Paula) – Quero que inscrevas a Cristina na tua escola de teatro. É isso o que ela quer para a sua vida, é isso o que será. Tinhas que ver como ela tocava o velho cravo do salão.

Cesar (sorri ao perceber que Victoria é o contrário de Paula) – Eu sempre quis isso para ela. Assim que voltar a ativa, inscrevê-la-ei. Prometo-te! E já agora… bem podias-me recompensar.

Victoria (Paula) – És tão interesseiro, Cesar! Estás sempre a querer malandrices de mim.

Cesar – E tu és tão sedutora que eu não resisto em tentar ganhar mais que beijos. (Ouvir: Laura Pausini - Viveme con Alejandro Sanz. Beija-a mais uma vez e ela deixa-se beijar)

Victoria (Paula) (encerra os beijos) – bem… agora preciso tomar um banho… ai! Estou aflita.

Cesar (manhoso) – Ah… pois… sabes, é que eu também preciso tomar um banho. E nesta crise, meu bem, convém economizarmos agua, por isso é melhor irmos os dois juntos!

Victoria (Paula) (rir-se com as suas artimanhas) – Hoje o menino está muito atrevido.

Cesar – Oh… vá lá! O que custa fazeres-me este agrado?

Victoria (Paula) – Custa a tua saúde. Ainda não podes fazer movimentos bruscos.

Cesar (a fazer-se de desentendido) – Como? Ah… mas eu não disse que faríamos nada além de tomar banho. Hum… agora diz lá quem é a atrevida que já tinha segundas intenções!

Victoria (Paula) – Cesar, não te faças de desinteressado que não és! E não ponhas palavras na minha boca… eu bem sei dos teus interesses comigo nesta cama.

Cesar (seduzindo-a) – Então, se já sabes, porquê arrisca-te a vir aqui? Qualquer hora não conseguirás fugir de mim. (deita-a no seu colo) Vou-te prender assim, e ninguém te vai salvar.

Victoria (Paula) (arrepia-se e sente-se humedecer) – Cesar… solta-me!

Cesar (sussurra) – E se eu não quiser? (aperta-a no seus braços prendendo-a) Que vais fazer?

Victoria (Paula) (debate-se para sair mas ele a tem presa) – Eu grito!

Cesar (sorri sedutoramente) – Grita, que assim eu sei que estás a gostar.

Victoria (Paula) (nervosa por já quase não resistir) – Cesar, solta-me, se fazes favor.

Cesar – Desde o momento em que vi as tuas curvas, que não te esqueço.

Victoria (Paula) – Não deverias… (Cesar beija-lhe o pescoço) Cesar, eu tenho mesmo que ir!

Cesar (pondo-se sobre ela) – Só sais quando eu disser. (volta a beijá-la mas Victoria solta-se)

Victoria (Paula) – Desculpe, mas não podes ainda. Estou a cuidar-te! (vai para a casa de banho)

Cesar – Esta mulher ainda me há de matar com este desejo que me consome o espirito.

(Em Sintra, Frederico chega a casa aflito a procura de Paula. Traz consigo um ramo de gardénias. Corre para o quarto e não a encontra, desce e ouve vozes que vêm do seu escritório. Ao entrar depara-se com uma cena pouco agradável, deixa o lindo bouquet cair ao chão ao ver Paula e Rodrigo abraçados, sentados no sofá. Sem raciocinar, sente uma ira esquentar-lhe o sangue. O ciúme queima-o por dentro)

Frederico (exaltado) – Podem me dizer o que é que se passa aqui?

Paula (Victoria) (solta-se de Rodrigo) – Frederico? (levanta-se e vai ter com ele) Meu amor, chegaste cedo, hoje! (vai beijá-lo mas ele desvia) Que tens?

Frederico (ignora-a) – Rodrigo, que fazes aqui? Creio que já não são horas de visitas.

Rodrigo – Frederico, desculpe não te ter avisado é que justamente vim a tua procura e…

Frederico – É verdade? E não sabes que trabalho? E porquê estavas abraçado à minha esposa?

Paula (Victoria) – Frederico, não precisas de falar assim com ele. Está a dizer a verdade!

Frederico (para Paula) – Tu, cala-te! Não é muito decente que uma mulher casada esteja a sós assim com um homem. O assunto deveria de estar bom para abraços.

Paula (Victoria) (põe-se nervosa) – Frederico, penso que estás a confundir as coisas porque…

Frederico (aumenta a voz) – Já disse para te calares! Eu sei bem o que vi, e não estou confuso.

Rodrigo – Frederico, eu não vou permitir que a trates com tal brutalidade.

Frederico (exalta-se) – Tu não estás em condições de me exigir nada!

Paula (Victoria) – Rodrigo, vai-te embora, sim? Depois falo contigo!

Frederico (agarra-a pelo braço) – Então já estás a combinar coisas com ele?

Rodrigo (defende Paula) – Solta-a! Tu estás a magoa-la assim…

Paula (Victoria) – Vai-te embora, Rodrigo! Eu resolvo isto. Não te preocupes!

Rodrigo (para Frederico) – Se lhe fizeres algo… eu juro-te que… (olha para Paula) Adeus! Qualquer coisa, não hesites em chamar por mim. (vai embora)

Paula (Victoria) (solta-se dele) – Frederico, estás louco? Tu não me podias ter feito isto.

Frederico (segura-a, com força, nos dois braços) – Eu estou louco? Tu estavas abraçada outro homem e queres que eu fique calmo, que aja como se nada fosse?

Paula (Victoria) – Sim, porque não estávamos a fazer nada de mal. Nós só estávamos a…

Frederico – Ontem tivemos uma linda noite de amor e hoje encontro-te abraçada à outro.

Paula (Victoria) – Mas já disse que não fazíamos nada de errado. Porquê insistes neste ciúme?

Frederico (aumenta a voz) –Eu encontrei-te abraçada à outro, e diz-me porquê? Porquê…

Paula (Victoria) (grita) – Porque ele perdeu tudo! Os alemães lhe tiraram até a alma e por culpa da tua covardia. Está na miséria, não tem nada se não uns trocados e uma casa que herdou da avó. (Frederico cala-se) ­Ele sacrificou-se por nós e tu o trataste daquela maneira.

Frederico (espantado) – Que estás a dizer? (abaixa a cabeça e afunda-se no silencio)

Paula (Victoria) (Ouvir: Madredeus- Ao Longe o mar) – É o que ouviste. Lamento muito que o teu ciúme ridículo tenha causado esta cena tão desagradável. Estou profundamente irritada contigo e não te vou perdoar por esta situação constrangedora. E mais uma coisa: da próxima vez que me mandares calar, não te vão sobrar dentes na boca. (vai a sair e encontra as flores caídas ao chão. Pega nelas) Isto era para mim? (atira-as nele) Assim como estas flores, o meu coração também está desfeito e desfolhado. Não te quero voltar a ver por hoje. É melhor dormires noutro quarto, assim aproveitas para pensar nas tuas atitudes infantis.

Frederico (abraça-a por trás) – Querida… eu lamento muito! Perdão, por favor, perdão!

Paula (Victoria) – É tão fácil errar e achar que as coisas podem-se resolver com uma palavra… Frederico, já experimentaste quebrar um copo? Quebra-o e depois remonta-o colando os cacos… podes até conseguir remontá-lo, mas nunca será igual a antes. As rachaduras ficarão ali para sempre assim com as cicatrizes da minha alma. (solta-se e vai para o quarto. Entra a correr e deita-se sobre a cama em prantos. Está triste, dececionada, magoada… sente-se ofendida com as desconfianças do homem que ama. No escritório, Frederico está sentado, com a única gardénia que sobrou inteira… ele tinha dezenas para lhe demonstrar o seu amor, mas só conseguiu salvar uma, nesta uma ele enxerga a esperança de receber o seu perdão. Desconhece a brava dama que o enfrentou e lhe gritou a verdade a cara, mas sabe que, agora mais do que nunca, ama esta brava dama e sente medo de a perder. Escorre-lhe uma lágrima e ele levanta-se e vai para um quarto de hóspedes, despreparado para receber visitas. Pega num copo, enche-o com água e põe a flor dentro. Frederico deita-se naquela cama fria e recorda o quão quentes são os lençóis quando Paula está sobre eles. Sente a falta do seu cheiro e da sua mãozinha fria que tocava-lhe o peito procurando abraço e proteção durante a noite. O velho Ramalhete volta à escuridão e aos calafrios das trevas)

FIM (CAPITULO 56)


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