Os dias iam se passando e cada vez mais Anny se sentia mais cansada, dia após dia ficava mais difícil achar forças para se levantar.

As pessoas ao seu redor pareciam não notar o desaparecimento de sua personalidade, ela já não respondia grosseiramente, não aumentava o tom de voz, quando era repreendida já não respondia a altura, apenas ouvia calada. Todo o brilho que havia no olhar da garota desaparecera, já não restava muito dela.

A única coisa que ainda a mantinha lucida era suas visitas quase que diárias a bruxa Maléna, as horas silenciosas que passavam juntas, imersas em seus próprios pensamentos e em suas dores.

Cada vez mais ela estava mais mergulhada em si, mais fechada em seu casulo, mais perdida em si, mais longe da dor que as pessoas ao seu redor estavam lhe causando.

Ela estava a minutos do baile, estava pronta, trajava um vestido azul petróleo com um corpete negro de rendas, os cabelos rubros eram presos em um coque mal feito acima da cabeça com varias mechas caindo preguiçosamente sob seu ombro esquerdo, seus olhos estavam destacados com uma maquiagem escura e seus lábios possuíam uma leve tonalidade avermelhada.

–Já esta pronta, alteza?

Um suspiro escapou dos lábios da garota.

–Você sabia que quando suspiramos deixamos escapar um pouco de felicidade?

Anny olhou para a pobre empregada que a encarava assustada.

–Perdoe-me alteza, mas não sabia!

Anny deu uma ultima olhada no espelho antes de soltar uma risadinha sem humor.

–É claro que não!

Sem mais a ruiva saiu do quarto e se dirigiu sem animo para o salão de bailes.

–Alteza, sugiro que melhore seu animo, vosso pai ira perceber que não esta animada com o baile!

–O que faz aqui Maléna?

A mulher ao seu lado não lhe lembrava em nada a velha que andara visitando, mas Anny sabia que a velha bruxa possuía varias fachadas e a que estava ao seu lado sorrindo lindamente era apenas mais uma delas.

–Vim me divertir, sabe que na floresta eu não encontro muito entretenimento!

–Então veio ver minha desgraça!

–Em parte!

As duas se olharam e como em um raro momento, Anny, sorriu de verdade.

–Assim esta melhor querida!

–Quem esta ai?

–De importante e que você deveria se preocupar? Principe Endimion, que provavelmente não tem boas intenções, Grã Duque Redinton, que com toda a certeza não tem boas intenções, ele ira aprontar algo e o Duque Raise esta muito estranho, com cara de quem planejou algo!

–Muito legal, tenho que fingir apreciar o baile enquanto tomo cuidado com três idiotas, sera que me falta acontecer mais alguma coisa?

–Não diga isso querida, vai que o universo resolve agir por suas costas e realmente piorar as coisas!

–Não seria a primeira vez que ele me prega essa peça!

–Hoho, então quer dizer que o universo já pos as mãos em seu destino?

–Se piorar meu dia enquanto eu estava perdida em uma floresta escura e me mandar um monstro para acabar com a minha raça faça parte das peças deles? Então sim, ele já fez isso comigo!

Maléna se colocou na frente da garota, sorrindo.

–Sim, fora obra dele, e pelo visto mais uma vez ele vai interferir!

Maléna lhe deu um beijo na bochecha e desaparecera em meio as pessoas e Anny pode ver o que ela escondia, seu pai conversando seriamente com Endimion, seu olhar se voltou para o teto.

–Isso já esta virando conspiração do universo, será que eu já não estou na merda o suficiente?

–Já esta enlouquecendo, mas ainda não é o suficiente!

A mulher lhe sorriu e desapareceu em meio a multidão e Anny viu seu pai conversando com Endymion, um suspiro acabou por escapar de seus lábios e toda a felicidade que havia lhe retornado escapara por seus dedos. Sem pensar a respeito ela se encaminhou até onde os dois estavam conversando de forma serio, o que causou um frio na espinha da garota.

–Papai, príncipe Endymion!

–Olá querida, o que esta achando o baile?

–Maravilhosa!

Anny sorriu de forma falsa, mas passara despercebida pelo olhar desatento do pai.

–Olá princesa Anny!

Anny quase desmanchou seu sorriso, deixando seu papel escorregar.

–O que esta achando do baile alteza?

–Esta muito agradável e agora com sua presença se tornara muito melhor!

–Assim você me deixa lisonjeada, alteza!

–Pode me tratar por Endymion, querida, afinal possuímos o mesmo posto na hierarquia!

–Claro Endymion, então pode me chamar apenas de Anny!

O rei sorria ao lado da filha.

–Vejo que se deram muito bem?

Anny olhou para o pai e sua vontade era de gritar com o velho, mas se controlou e apenas fechou os olhos por um instante para respirar fundo e se concentrar.

–Claro que sim papai, a realeza deve se dar bem com todos por causa de seu povo, não podemos nos dar o luxo de criarmos inimigos!

O rei arregalou os olhos surpreso pelo conhecimento tático da filha.

–Sim, você esta certa!

O sorriso da garota se tornou falsamente brilhante e mais uma musica começou a tocar ao fundo.

–Aceita dançar comigo, Anny?

A verdadeira resposta chegou até a ponta da língua e para não dizer-lhe ela apenas acenou positivamente com a cabeça e aceitou a mão que ele lhe oferecia. Ele lhe conduziu até o centro do salão e começou a guia-la no ritmo da musica.

–Você esta muito linda Anny!

Anny deixou o sorriso por fim morrer e o encarou seria.

–Chega de ladainha Endymion, você sabe ou já deve imaginar que eu lhe detesto, então trate de me dizer o que você esta planejando antes que eu descubra e acabe com a brincadeira!

Os olhos do príncipe brilharam em pura malicia.

–Ai esta a garota que eu gosto, não aquela fachada de princesa obediente, gosto de você assim, com fogo nos olhos!

Anny respirou fundo, sua pouca paciência chegava ao fim.

–Você não vai gostar dessa garota quando ela perder a sua tao escassa paciência, então não me provoque e diga logo o que você esta aprontando!

–Minha querida, eu não preciso lhe dizer nada, logo você ira descobrir!

O sorriso malicioso e o brilho satisfeito nos olhos do homem a preocupou, mas antes de expor sua raiva alguém os interrompeu.

–Perdoe-me por interromper Endymion, mas creio que preciso da minha amiga mais do que você!

–Quem v...

Endymion arregalou os olhos ao ver quem lhe interrompia.

–Eu sei que não deveria interromper o casal feliz, mas creio que tenho um assunto muito importante para tratar com a minha amiga!

Maléna continuou a sorris enquanto puxou Anny pelo braço e a fez rodopiar até estar ao seu lado e poder guia-la até a janela mais próxima.

–Maléna...

–Ahhh ele é tão fofo quando contrariado, pena eu não poder fazer muito isso!

–Você o conhece?

Os olhos escuros da mulher brilharam com intensidade e seu sorriso já malicioso se ampliou.

–O conheço melhor do que ele mesmo e vê-lo irritado se tornou um prazer pra mim, mas já não é possível eu irrita-lo com tanta frequência!

–Por quê?

–Viagens até o reino dele demoram demais e eu não posso me ausentar da minha floresta pelo tempo necessário!

–Você é apaixonada por ele!

–Sim, adoraria poder prendê-lo na minha cama, ouvi-lo gritar por ajuda, me aproveitar daquele corpo másculo até me der por satisfeita!

–Você é louca!

Maléna deu de ombros enquanto limpava uma fina baba que escapava de seus lábios.

–Já me chamaram de coisas piores!

As duas se olharam e caíram na risada. Anny fora a primeira a recobrar a postura e Maléna apenas tentava recuperar o folego antes de cair novamente na risada.

–Tenho que voltar, logo irão notar a minha ausência!

Maléna não havia se recuperado totalmente, mas sua respiração já estava mais estável.

–Sim, você tem eu voltar, só não caia nas armadilhas do príncipe!

–Farei o que puder, mas se algo der errado você ira me resgatar?

–Se eu puder ver a cara emburrada daquele mimado farei o que você quiser meu bem!

Anny sorriu e ia saindo.

–Que bom que lhe tenho como aliada Maléna!

Anny olhava o salao totalmente cheio, vestidos das mais variadas cores, homens das mais diferentes idades, sem perceber seu olhar fora atraído para um casal que conversava alegremente, a mulher trajava um lindo vestido escarlate, com um corpete da mesma cor, mas cheio de fitas brancas, seu cabelo loiro era preso em um coque perfeito mostrando sua pele tao branca quanto a neve. Anny sentiu uma facada no coração ao ver que o casal feliz era sua irmã e Nathan, lagrimas se acumularam em seus olhos e sua vontade de gritar e sair dali pisando duro se fizeram presentes, porem ela deveria agir de forma madura e não como uma criança que fazia pirraça. Um garçom passou carregando taças de vinho branco e sem pestanejar ela pegou uma taça, sem qualquer delicadeza ela virou a taça de uma única vez, engolindo todo o conteúdo e ao deixar a taça em outra bandeja de um outro garçom ela finalmente reparou no serviçal e ele lhe parecia muito familiar, logo ela se pegou olhando para todos os empregados que estavam servindo ou fazendo qualquer outro serviço por ali, todos lhe pareciam familiar.

“Mas que inferno esta acontecendo aqui?”

Antes que ela pudesse puxar um dos homens para um canto o rei pedira silencio batendo uma pequena colher em uma taça.

–Senhora e senhores, vocês poderiam dar um minuto de silencio para esse velho rei fazer um anuncio que lhe aquece o coração?

O silencio fora predominante.

–Obrigado, enfim hoje eu tenho não somente uma boa noticia, mas sim duas, finalmente, depois de um mês desaparecida, minha filha Anny retornou ao seu lar são e salva!

Todos os olhares se voltaram para a garota, que apenas maneou a cabeça em uma pequena e educada vênia e uma salva de palmas explodiu por todo o salão, para novamente o silencio dominar enquanto o rei fazia mais um anuncio.

–E hoje na comemoração de seu retorno recebo a mais bela oferta, príncipe Endymion, do reino de Eizaide, pediu a mão da minha filha mais velha em casamente e em seu nome eu aceitei o pedido!

Anny perdera toda a cor da face e seu chão parecia ter sumido.

–Venha até aqui querida!

Anny arfou e mais do que nunca queria desaparecer ali, sem perceber ela começou a se afastar enquanto acenava negativamente com a cabeça.

–Vamos querida não seja tímida!

Suas mãos se fecharam em punhos e lutando contra todos os seus instintos ela se aproximou do pai, havia prometido que seria uma filha obediente, mas aquilo estava fugindo de todos os seus limites.