Anjo da Cara Suja - betada escrita por Celso Innocente


Capítulo 15
Qual dor pode ser pior do que a de uma criança desaparecida?


Notas iniciais do capítulo

Este é o penúltimo capítulo deste drama que deveria ser ternura.
Obrigado pelo carinho com que acompanhou até aqui.



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Assim, o tempo ingrato foi passando devagar, fazendo com que todos percebessem, que o velho ditado que diz: só o tempo será capaz de cicatriz as feridas, causadas por drástico sofrimento, não cabia neste caso.

Já havia passado sete meses, desde a fatídica data, em que aquele menininho meigo não voltara para sua casa e as feridas continuavam abertas, como se dentro delas, houvesse alguma bactéria, que não as deixavam cicatrizar.

Às vezes, os pais de Regis, principalmente dona Odete, chegava à conclusão, em que uma criança desaparecida era pior do que uma criança morta; pois quando uma criança morre, a gente sofre muito e jamais a esquecerá também, mas com o coração partido a gente a deposita em um belo e triste caixão de madeira, depois a leva para sua derradeira morada, em um campo santo. Neste caso, realmente, só o tempo será capaz de cicatrizar tais feridas. A gente sabe que aquela criança jamais voltará, mas pelo menos sabe onde ela está. Já com a criança desaparecida, a gente, a toda hora, a imagina chegando correndo e nos abraçando, para sanar a tristeza, da grande saudade dessa perda. A todo o momento, a gente fica se perguntando, o que estará acontecendo com ela. Às vezes acredita que ela também já morreu. Depois desacredita e sente a esperança de que ela apenas foi para o colégio e daqui a pouco vai chegar. Parece um grande pesadelo que insiste em não acabar, fazendo doer fundo dentro da gente, dentro de nossos dois corações: o coração alma e também o coração carne.

Às vezes se postam até de joelhos, em orações desordenadas e desacreditadas, sendo atrapalhada ao meio, por vastas recordações, de uma criança pobre, porém feliz, trabalhando e brincando, em gritos, risos e correrias, pelo interior de casa tão humilde, onde impera o amor.

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Para Luciano e Sara, porém, procuravam deixar seu lado egoísta, lembrando-se sempre, que se a perda daquele anjinho, fazia-lhes sofrer tanto, apesar do consolo em ter consigo a sagrada presença de seu filhinho adorado, além do consolo de cativar a sagrada amizade do outro anjinho Paulinho; imaginavam o sofrimento dos pais, que só perderam.

Era sábado à tarde, Luciano estava em sua sala, com o bebê fazendo gracejos em seu colo, enquanto Sara lhe preparava uma mamadeira de leite Ninho, já que o seu leite natural, teria diminuído consideravelmente, quando alguém bateu palmas no portão e ele foi atendê-lo. Era dona Odete e outra mulher, de pele negra, estatura mediana, um pouco acima do peso, cabelos também negros, encaracolados, aparentando seus cinquenta anos de idade.

Quando se aproximou com o bebê no colo, dona Odete, disse-lhe com leve sorriso, entre a dor que ainda não passara:

— Finalmente vou conhecer o pequeno Regis Gabriel!

Realmente, apesar da promessa, ela jamais esteve naquela casa, com tal objetivo. Provavelmente não se sentia preparada para conhecer outra criança, que levava o nome, em homenagem à sua grande perda.

Fez um gesto, fazendo questão em segurar o bebê em seu colo, beijando sua fronte e acariciando seus cabelinhos, que agora faziam-se bem escuros e de certa forma, até compridos.

— Até parece meu Regis quando era nenê — disse ela, em um sorriso sofrido.

Luciano não compreendia o porquê de se parecer com Regis, se ele tinha os cabelos castanhos.

— Vamos entrar! — Convidou-o.

— Não! Obrigado! — Agradeceu dona Odete apre-sentando-lhe a outra mulher — Esta é dona Josefina. Ela é benzedeira e se ofereceu para ir comigo, ao local em que meu filho desapareceu para descobrir o que aconteceu. Você me explica direito aonde é?

Ele, descrente absoluto, não acreditava nessas baboseiras. Por outro lado, sabia ser educado o bastante, para não magoar pessoas, principalmente em casos semelhantes.

— Posso ir com vocês até lá? — ofereceu-se

Tomou o bebê do colo da mulher, ouvindo sua frase: “lindo bebê. Benza a Deus”; levou-o para dentro, entregando-o para Sara, explicando o que iria fazer e então seguiram juntos, a pé, quase em silêncio, até o derradeiro local, entrando pela entrada principal do aeroporto e encontrando a trilha, a cerca de trinta metros adentro, quase toda tomada pelo mato alto; viraram à direita sobre ela em fila indiana e seguiram caminhando, com o homem à frente e dona Odete ao meio.

Luciano, com objetivo de pôr à benzedeira à prova, planejou passar do local exato das pistas, pelo menos uns dez passos, mas se surpreendeu, quando, de repente, aquela mulher negra, pisou onde seria o último passo de Regis e gritou:

— Parem!

Luciano, apesar de descrente como era, sentiu forte calafrio no corpo inteiro, parando imediatamente.

Dona Josefina, adentrou ao mato até fechado, caminhando lentamente por vários metros, depois parou, abaixando-se e forçando para segurar nas mãos, um punhado de terra seca.

— Foi daqui que ele partiu — a alegou, olhando séria para o homem. — Por que você não disse?

— Eu? — Se embaraçou ele. — Está muito diferente, desde quando aconteceu que eu me perdi. Realmente foi aqui a última pegada que ele deixou.

— Por que não me trouxeram aqui na época?

Como ele iria adivinhar que existisse uma médium, ou que seja sensitiva, mentalista, paranormal... Por ali?

Ela se levantou, fechou os olhos e prosseguiu:

— Não consigo vê-lo.

“Bela coisa”. Pensou Luciano. “Eu também não consigo vê-lo”.

— Você precisa acreditar um pouco nas coisas — advertiu-lhe a mulher negra. — Sua descrença é fonte negativa pra mim.

— Desculpe-me — se atrapalhou de novo.

— Ele fez uma longa viagem — prosseguiu ela. — Está muito longe e eu não consigo vê-lo.

— Estaria em outro país?! — Pensou Luciano.

De repente, ela esboçou leve sorriso, dizendo:

— Ele está bem! Muito bem! Só que chora muito.

Luciano, apesar de descrente, sentiu novos calafrios e lágrimas. Dona Odete começou a rir e chorar ao mesmo tempo.

— Ele está sofrendo — continuou a mulher negra.

“Poxa! Ele está bem ou está sofrendo”? Pensou Luciano.

— Ele está bem! Mas sofre de saudade.

Luciano começou a acreditar, que aquela mulher lia seus pensamentos.

— Ele não consegue voltar! Eles não permitem que ele volte. O importante é que ele está bem.

— Ele está preso? — Questionou Luciano — Em algum lugar?

— Não! Ele está livre! Eu não consigo vê-lo. Mas posso senti-lo. Ele chora. Quer voltar, mas não pode.

As palavras serenas da mulher negra, até faziam brotar lágrimas, no canto dos olhos, daquele homem descrente. Dona Odete sim, deixava as lágrimas sentidas, banharem seu rosto sofrido.

Seria isso. Pensou Luciano, querendo realmente acreditar na mulher. O menino teria sido sequestrado e levado a um país distante, com intuito de adoção ilegal. Que monstro idiota faria isso com uma criança, com a mente formada? Será que o idiota do casal, que adotar uma criança dessa idade, não é capaz de saber que a pobre infeliz jamais lhe dará amor e compreensão?...

— Onde ele está? — Questionou Luciano, apreensivo. — Me diz que eu vou buscá-lo! Seja onde for.

— Você não consegue. Nem eu consigo! — Negou ela, tristemente.

— E então? O que faremos?

— Não sei! — Insinuou ela, com certo desânimo na voz. — O lugar que ele está é muito longe. Não sei como buscá-lo!

A descrença de Luciano, outra vez o fez acreditar que a mulher fosse uma trapaceira e estava lhes fazendo de bobos.

— Você é fonte negativa pra mim — tornou a reclamar ela.

— É que sou uma pessoa que investiga coisas reais. Coisas paranormais fogem de meu alcance.

— Tá na hora de acreditar nas coisas superiores, meu filho — advertiu-lhe a mulher, colocando o dedo em sua testa.

— Acha que se eu for embora daqui, a senhora consegue melhores detalhes, de onde ele esteja?

— Não creio — negou ela. — É tudo tão obscuro. Eu consigo senti-lo, mas não consigo vê-lo. Até vejo um vulto! Na verdade um tumulto. O menino está livre. Só que não pode voltar.

Só então, ela abriu os olhos e insinuou:

— Podemos ir embora.

— A senhora acredita que ele tenha sido abduzido? — Questionou Luciano — Quero dizer... Levado para um outro mundo?

— Só existe um mundo meu filho! Porque só existe um Deus que o criou!

De volta à sua casa, curiosa, Sara lhe perguntou:

— E então? Alguma novidade?

— Não acredito nessas baboseiras.

— Que baboseiras?

— Clarividência.

— São pessoas dotadas de um dom especial — insinuou Sara. — Dom divino.

— Dom divino?! — Admirou o homem. — Não está escrito na bíblia, que Deus não gosta de benzedores, feiticeiros, bruxos...

— É muito diferente. Deus não gosta de bruxos ou feiticeiros que usam seus poderes pro lado do mal. Satanismos ou coisas do gênero. Por acaso Jesus Cristo também não foi curandeiro?

— Ele foi milagreiro!

— E o que foi que a mulher disse?

— Não acredito nessas coisas, mas confesso que ela me surpreendeu.

— Como assim? — Se interessou animada, sua esposa.

— Com o objetivo de testá-la, eu não lhe mostraria o local exato das pistas, só que a danada descobriu na hora e sem nada de erros.

— Como assim?

— Quando ela pisou no local, onde teria sido a última pegada de Regis, ela parou e sabia que era ali.

— Com total precisão? — Questionou Sara.

— Com tanta precisão, que estou pensando em intimá-la, como suspeita principal, no desaparecimento de Regis.

— Que isso bem? Não tem nada a ver! Se assim fosse, ela não teria se oferecido pra ajudar!

— Estou brincando! — Riu o marido — Você acredita que a safada parecia adivinhar até o que eu estava pensando?

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Notas finais do capítulo

Só falta mais um capítulo para encerrarmos este drama e apenas uma pessoa sempre comentou. Será que só tenho mesmo Klariza como leitora desta trama?



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