Anjo da Cara Suja - betada escrita por Celso Innocente


Capítulo 14
Paulinho e Regis Gabriel


Notas iniciais do capítulo

Obrigado amiga Klariza (de Portugal) por ser a única a comentar a esta estória.
Nem sei se outras pessoas estão lendo. O número de acesso aumenta um pouco mas isso não garante que alguém esteja lendo.
Faço... mesmo que seja por uma leitora.



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O menino correu para dentro de sua casa. Dez segundos depois, apareceu toda a família. Como sempre, pela fisionomia de todos, dava para, notar seu estado de sofrimento, pela grande perda.

— As crianças pequenas podem ir brincar lá dentro um pouquinho? — Pediu Luciano.

Depois, percebendo que estas palavras poderiam assustar, emendou.

— Não é por nada. Quero falar a respeito deles.

Luis, sendo o primogênito, o compreendeu e praticamente forçou a todos, em seguir consigo para o interior da residência.

— O que descobriu sobre meu filho? — Questionou-lhe dona Odete.

— Desculpe desanimá-la, mas também estou perdido como a senhora.

Como sempre, ela começou a chorar. Seu esposo, também emocionado a abraçou, depois disse:

— Ouvi falar que a televisão comentou sobre Regis.

— Eu estive lá em São Paulo pra isso. Acho que foi minha última cartada, agora já não sei aonde procurá-lo — Também se emocionou Luciano. — Sei o tanto que estão sofrendo. Sei o tanto que o amam. Vocês me desculpem. É que nós: eu e minha esposa, também o amamos, como se ele fosse nosso filho também. Ele chegou à nossa vida de mansinho e rapidamente foi nos cativando...

— Ele sempre me falava sobre vocês — alegou emocionada dona Odete. — Às vezes eu até ficava com ciúmes; pois parecia que ele gostava mais de vocês do que da gente.

— Não é bem assim — negou Luciano. — Ele se preocupa demais com a senhora e o pai. Sempre dizendo que vocês trabalham muito. Não tem como não gostar daquele menino.

— E quem o pegou? — Questionou Rogério — Será que gosta dele? Ou odeia?

— Eu preciso falar outra coisa — insinuou Luciano. — É sobre as crianças. Principalmente os menores.

— O que há com eles? — Assustou-se dona Odete.

— Sofrem como vocês. Até mais.

— A gente sabe disso — concordou o homem.

— Vocês sofrem muito. Vocês choram. Eu sei que é complicado, só que precisam parar de chorar perto dos pequenos. Eles já estão sofrendo muito. Quando vocês choram, eles sofrem ainda mais. Sofrem pelo irmão desaparecido e sofrem por verem vocês chorando. Os filhos não toleram ver o sofrimento dos pais. Paulinho reclamou sobre isso.

— A gente sabe — concordou chorando dona Odete. — É que é muito difícil. Tudo o que a gente vê ou pega, nos lembra Regis.

— Sei disso. Até em minha casa, tudo o que eu vejo e faço, me lembra ele. Sei que é pedir muito, mas vocês têm que criar força.

— Vou me esforçar — se comprometeu ela. — Acontece que em todos os segundos do dia e da noite, meu pensamento está nele. Já faz tanto tempo que nem sei o que é dormir. O máximo que faço é desmaiar de cansaço e quando isso acontece, sonho com ele, durante todo o tempo. As vezes em meu sonho ele está sorrindo, mas quase sempre, eu estou o espancando com muita crueldade.

— Já falamos varias vezes sobre isso. Não se condene, pois ele não saiu de casa por sua culpa. Antes fosse! Pois assim a gente já teria o encontrado.

— Não consigo não me culpar.

— Em casa é um pouco menos triste, pois a gente ganhou um presente que nos distrai muito. Algo que ocupa todo nosso tempo...

— O senhor nos desculpe — pediu o homem. —Devido nosso sofrimento, nunca paramos pra lhe perguntar sobre seu filho.

— Não se preocupe com isso. Graças a Deus, meu filho está nos ajudando muito nessa fase.

— Como se chama o bebê? — Perguntou-lhe dona Odete.

Luciano se viu tomado de surpresa. Engasgou-se um pouco, depois tentou explicar:

— Peço que desculpe meu atrevimento. Meu filho se chamaria Gabriel. Ele nasceu praticamente no mesmo dia em que Regis desapareceu. Eu e minha esposa decidimos por...

— Regis? — Questionou-lhe ela, ainda chorando.

— Regis Gabriel! — Completou — A senhora nos perdoa?

— Não há o que perdoar! — Negou ela — Cada um é livre, pra dar ao filho, o nome que queira.

— Mas lhe dói! — Insinuou ele compreendendo.

— Claro que dói! — Chorava ela — Tudo dói! Entrar no quarto que ele dormia dói! Pegar uma peça de roupa dele dói! Lavar a louça dói! O senhor sabia que geralmente ele lavava a louça pra mim?

— Sei que ele fazia até almoço! Pelo menos foi o que ele disse.

— E fazia mesmo! Geralmente quando não tinha aulas, ou nas férias.

— Teve um dia, que ele resolveu fazer uma lasanha — comentou Rogério, em sorriso disfarçado de dor. — Disse que aprendeu com sua esposa. E ficou muito boa!

— Regis Gabriel é uma homenagem — concordou dona Odete. — Desculpe por eu sofrer com isso.

— Eu estava dando um tempo, pra lhes falar sobre meu filho. Sabia que iria trazer emoção.

— Como eu já disse tudo traz emoção — explicou ela. — Até sua presença me traz emoção. O gritinho de qualquer criança, passando na rua, me traz triste emoção.

— Nem sei como consolá-los. Nem sei me consolar. Eu pensava em lhes falar sobre o nome de meu filho, só depois que Regis aparecesse...

— Qualquer hora irei conhecer seu Regis — disse-lhe ela. — Vou conhecer também sua esposa.

©©©

Na noite seguinte, no mesmo horário, Paulinho, acabado de tomar banho, cabelos bem penteados, short preto, curto, como o irmão sempre estava, camiseta branca, sem cavas e tênis da Alpargatas preto, abriu o portão e entrou no quintal dos Cavalari, chegando até a sala de estar, onde, como sempre fazia, Luciano estava sentado no sofá de dois lugares, brincando com o bebê, enquanto Sara, no quarto, preparava seu banho, em banheira de plástico verde e branca. O menino sentou-se ao lado de Luciano e passou a mãozinha esquerda sobre a cabecinha do bebê, dizendo:

— Bonitinho!

— Como você! Lembra?

— Um príncipe! Posso pegar ele no colo?

Com muito jeito, Luciano colocou o bebê, no frágil colo daquele outro anjinho inocente, que lhe beijou a cabecinha e sorrindo, sentiu-se tão feliz, fazendo com que Luciano soubesse, que aquele humilde gesto, servia para, pelo menos amenizar um pouco, a dor que ele sentia, em seu pequeno coração de cinco anos de idade.

Em um minuto entrou Sara, que ao ver o pequeno visitante com o bebê no colo, insinuou:

— Olá! Veja se não é meu querido ajudante, pra cuidar desse menininho lindo!

— Ele gosta de mim! — Alegou o menino, rindo. — Veja, ele sorri pra mim e aperta meu dedo.

— É isso mesmo! — Concordou Luciano — Acho que ele quer que você venha sempre cuidar dele.

— Só que agora ele vai tomar um banho — insinuou Sara, apanhando-o do menino. — A água já está esfriando.

Seguiu para o quarto com o bebê no colo.

Paulinho continuou sentado ao lado do homem, parecendo que perdido naquela sala totalmente organizada, bem ao oposto de sua casa, onde o vasto número de crianças, não deixava nada no lugar. Às vezes, se intertia com o televisor ligado, outras vezes, torcia o pescoço, virando a cabecinha em sentido ao quarto, talvez na esperança de ver o bebê no banho.

— Quer ir ver o nenê no banho?

— Quero sim!

— Então vá!

Imediatamente ele saiu correndo para o quarto, seguido pelo homem. O bebê já estava dentro d’água e apesar de ainda muito novo, se debatendo na maior algazarra, como qualquer bebê gosta de fazer.

Paulinho ria, da bagunça provocada por tão jovem e despreocupada criaturinha de Deus e o pai, diante de duas bênçãos tão singelas, até se esquecia um pouco, do triste drama pelo qual passavam e ria também.

Dez minutos depois, estavam todos novamente na sala. Paulinho sentou-se bem junto a Luciano, no sofá de dois lugares, enquanto Sara, sentou-se na poltrona, abriu a blusa, forçou o sutiã para baixo e começou a amamentar o filho, de poucos dias de vida.

— Ieca! — Reclamou Paulinho, com cara de nojo, ao ver a cena.

— Por que ieca? — Cobrou rindo o homem — O bebê precisa mamar.

— Por que ele não mama na mamadeira?

— Porque a mamãe tem o melhor leite!

— Eu mamo na mamadeira! — Explicou ele.

— Quando você era bebê como ele, com certeza também mamava na mamãe — insinuou Sara.

— Eu não! — O retrucou, fazendo careta.

— Mamava sim senhor! — Continuou Sara — E nem precisa fazer essa carinha de nojo, porque era muito bom!

— O que é nojo?

— É quando a gente não gosta de alguma coisa — explicou-lhe Luciano. — Fazendo essa sua caretinha.

O bebê, no início, mamava com voracidade, enquanto com as mãozinhas, explorava o máximo possível do corpo da mamãe, inclusive o outro seio; porém, aos poucos, foi diminuindo o ritmo e em dez minutos estava dormindo.

Paulinho, do mesmo modo, no início falava bastante, depois, aos poucos foi diminuindo o tom, se acomodou bem próximo ao homem e permaneceu olhando para o televisor ligado; depois de alguns minutos, deitou sua cabecinha sobre a perna direita do homem, que se sentindo até mesmo recompensado por aquela conquista sagrada, por tal candura, acariciou-lhe seus belos cabelos, muito semelhantes ao do irmão desaparecido. Em poucos minutos, assim como o bebê, ele também já estava dormindo.

Sara, levantando-se para colocar o bebê no berço, olhou para o marido, dizendo sorrindo:

— Outro filho?

— Que benção! Temos que agradecer ao Regis por isso.

Sara seguiu até o quarto, acomodou o bebê no berço. Cobriu-o com uma manta leve, deixou a luz de baixa potencia do corredor acesa e retornou à sala, perguntando:

— E agora, o que você vai fazer com ele?

O marido se levantou com muito cuidado, apanhou o menino no colo, insinuando:

— Vou colocá-lo na cama. A única diferença, é que a cama dele é em outra casa.

— Não quero! — Resmungou o pequeno, se espreguiçando. Na verdade já estava dormindo.

Acompanhado por Sara até o portão, Luciano levou-o até sua casa, a menos de cem metros; chamou no portão, onde apareceu seu pai.

— Este amiguinho foi nos fazer uma visita, só que acho que estava cansado e acabou dormindo no sofá.

O homem iria pegá-lo, mas para evitar acordá-lo, Luciano pediu:

— Deixe que eu o coloque na cama.

Seguiu com ele até o quarto do casal, onde havia um berço ao lado da cama. Colocou-o ali e sua mãe, que já os acompanhava, cobriu-o com pequeno cobertor.

©©©

Quase todas as noites, o pequeno Paulinho aparecia na casa dos novos amigos e acabava tendo que voltar para sua casa, carregado no colo. Com seu jeitinho tímido e meigo, foi se tornando em cada dia, também um novo membro daquela família, ajudando com isto, a amenizar o sofrimento, pela grande perda de Regis.

— Paulinho está substituindo Regis — alegou Sara, estando na copa com o bebê no colo. — Com ele por aqui, a gente até esquece que seu irmão, tão pequeno também, está perdido, não se sabe aonde.

— Acha! — Protestou o marido — Adoro Paulinho! Mas jamais me esqueço de Regis!

— Quando ele está por aqui, a gente se distrai... Se anima. Só fico pensando nos pais deles. Quando Paulinho vem pra cá, é ele que também lhes deixa saudades.

O fato era que, quando o relógio se aproximava das sete horas da noite, o coração daquele casal, já ia ficando ansioso pela chegada do menino; era como um filho que estava no colégio e sempre chegava ao mesmo horário. Porém os dias, em que porventura ele não aparecia, por qualquer motivo, a tristeza os dominava e a saudade de Regis, parecia corroer ainda mais seus corações. Colocavam-se em empatia com os pais desses dois anjinhos e outros quatro, sentindo o quanto era cruel, de repente, sem um motivo aparente, alguém tão sagrado, ser tirado de si, na maior tortura deste mundo, deixando no peito, realmente uma ferida aberta.

Uma noite, quando Luciano, o levou dormindo para sua casa, se atreveu a pedir a seus pais:

— Qualquer noite, quando ele estiver dormindo, pode deixá-lo passar a noite conosco?

— Senhor Luciano... — implorou dona Odete, chorando — Não faça isso com a gente! Ele dorme no meu quarto! Não o tire de mim!

Luciano se embaraçou, dizendo:

— Me desculpe dona Odete. Não devia ter lhe pedido isso.

— Não precisa se desculpar senhor Luciano. O senhor é um homem bom. Eu é que não toleraria ficar sem outro de meus filhos — chorava ela, colocando a mão no peito. — Dói muito aqui dentro.


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Notas finais do capítulo

Agora é real: faltam apenas dois pequenos capítulos pra descobrirmos (será?) o que aconteceu com o pequeno Regis.



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