Anjo da Cara Suja - betada escrita por Celso Innocente


Capítulo 13
Uma nova amizade pode curar velhas feridas?


Notas iniciais do capítulo

Deveria faltar apenas dois capítulos para o final deste drama, mas devido os capítulos serem longos, resolvi dividi-los.



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Antes das nove horas da manhã seguinte, Luciano chegava ao fórum, para um novo dia de trabalho e surpreso, se deparou com Rafael, o aguardando na entrada.

— Bom dia Luciano! — Cumprimentou-o esse, sem contudo lhe estender a mão.

— Bom dia! O que faz aqui?

— Na noite de ontem, logo após o noticiário na tevê, que falou sobre o menino desaparecido, a gente recebeu uma informação anônima, dizendo que viu uma criança, com fisionomia semelhante e uma bolsa escolar nas costas, caminhando sobre as pontes pênseis, do salto do Avanhandava, no dia de seu desaparecimento, pouco após as treze horas.

— Ah meu Deus! — Se espantou Luciano — E o que mais?

— O informante alegou que viu o menino atravessar uma das pontes e permaneceu no local por quase uma hora, sem, contudo vê-lo retornar. É uma pista.

— E o que você pretende?

— Estou indo lá agora. Achei que você toparia ir comigo.

— Com certeza! Espere só até eu informar meu pessoal.

©©©

Menos de uma hora depois, os dois peritos, já estavam caminhando sobre as incríveis pontes suspensas por grossos cabos de aço, sobre as inúmeras e bonitas quedas d’água, às vezes se deparando com o reflexo do sol sobre as águas, como em um gigantesco espelho, que reluzia aos olhos; outras vezes, com as grandes muralhas, de até dez metros de altura, que deixavam rolar grande quantidade de água, formando grande massa branca, como se fossem toneladas de espumas de sabão, devido o atrito com as rochas, as quais a natureza modelou, durante milhões de anos, no famoso Rio Tietê, a trinta quilômetros do centro de Penápolis, atravessando por Barbosa, sentido São José do Rio Preto.

Sem conversarem muito a respeito, os dois homens caminhavam sobre as pontes, com muita cautela, fazendo questão, em observar atentamente, cada detalhe sobre as pedras, relevos, encostas...

— Regis não esteve aqui! — Negou Luciano.

— Por que você pensa isso? — Questionou Rafael.

— Se esse menino tivesse caído aqui em algum lugar, já teria sido encontrado.

— Pode ter caído nas cachoeiras e se afogado.

— O corpo boiaria em menos de três dias.

— Pode ter ficado enroscado nas pedras! Pode também ter sido arrastado pela correnteza. Ou até, ter sido devorado por peixes.

— Peixes não comem tecidos! Nem bolsa escolar!

— A bolsa pesada não boia — Justificou Rafael.

— Pedaços de roupas boiam!

— E a correnteza as arrasta!

— Regis não esteve aqui — Negou Luciano, convicto.

— O informante disse que o menino usava uniforme escolar e o horário também coincide. Disse também, que ele atravessou uma das pontes e não retornou.

— Como ele viria até aqui? — Duvidou Luciano.

— Viação Anhenzine! Ela transporta menores sem problemas. A lei não impede, devido ser curta distância. A viagem de Penápolis pra cá não é considerada intermunicipal.

— Até concordo com esta hipótese. Regis, porém, saiu da escola às onze e meia. O horário do ônibus é dez e meia.

— Então ele veio de carona.

— Ninguém dá carona pra uma criança!

— Ninguém deveria dar carona pra uma criança — Corrigiu Rafael.

Os dois peritos, continuaram vistoriando o local, inclusive, descendo das pontes e caminhando com muita cautela, sobre algumas das pedras, que eram lisas e escorregadias, iguais a sabão molhado.

Depois de caminharem e vistoriarem por toda extensão das três pontes pênseis, sobre tal sol de rachar mamona, já até vermelhos e suados, Luciano insinuou:

— Vamos falar com alguém do restaurante.

Seguiram juntos para o restaurante, ali mesmo, no início de uma das pontes, bem no meio das quedas d’água, o qual, com certeza, se Regis tivesse estado por ali, teria sido visto.

Conversaram com uma faxineira do local, com o barman e um garçom, apresentando-lhes uma foto do menino, que Luciano sempre carregava no bolso. Todos, no entanto, apesar de já fazer muitos dias, negaram com muita convicção, ter visto tal criança, caminhando por aquelas cachoeiras.

— Por que quem deu tais informações não se identificou? — Questionou Luciano.

— Para denúncias, a gente não exige que se identifique — justificou Rafael. — É uma forma de encorajar pessoas de bem a denunciar bandidos.

— Neste caso, seria de grande ajuda à identificação — concluiu Luciano. — E tal denunciante não correria risco nenhum de levar um tiro na cara.

— Na verdade, algum imbecil, que assistindo a reportagem na tevê, resolveu brincar conosco.

— Tomara que este pesadelo aconteça a um filho dele, pra que possa brincar bastante! — Se irritou Luciano.

— Calma parceiro — riu, de certa forma irritado também, Rafael. — O filho dele não tem culpa!

— Na verdade, um cara que brinca assim, não tem filhos. Pelo menos não deveria ter.

— Com certeza, não. Vamos embora!

Enquanto seguiam, do restaurante até o carro, estacionado a cerca de duzentos metros, continuavam contemplando aquela maravilhosa, porém perigosa, obra da natureza.

— Sabia que tudo isso aqui, será destruído pela mão do homem? — Questionou Rafael.

— Como assim?

— No início da década de oitenta, tudo aqui será inundado, devido a construção de várias usinas hidrelétricas, por toda a extensão do Rio Tietê.

— Verdade — concordou Luciano — O próprio Regis me disse, que seu pai mudou-se do bairro Córrego dos Pintos pra cidade, por questão dessa inundação.

Pensou um pouco, deu leve sorriso e continuou dizendo:

— Como é o destino, não?

— O quê?

— O homem resolve destruir uma grande obra da natureza; com isto, a família de Regis é obrigado a se mudar do sítio para a cidade. Mexeu até com meu destino, ao me tornar amigo dele. Se ele ainda morasse no sítio, não seria meu amigo, não teria desaparecido e nós não estaríamos aqui, procurando-o, se feitos de idiotas, por um vadio que passa trote até na polícia.

©©©

Quase sete horas daquela noite, Luciano estava sentado na poltrona da sala, brincando de conversar com o bebê, que acordado em seu colo, o olhava firme no rosto, como a perguntar: “O que este babaca tá falando? Ele não vê que o que eu quero mesmo é o mamá de minha mãe?”. Fazer o que? Lembrou-se de um pensamento de um autor desconhecido que mostra o comentário de um bebê que diz em respeito a seu pai: “Vou roubar sua esposa, lhe tirar as noites de sono, fazer um rombo em seu orçamento e ainda assim, você vai ser louco por mim”.

De repente, ouviu mexer no portão e quando se virou para ver, notou que Paulinho, ao contrário do irmão, que sempre se calava sentado do lado de fora, já caminhava para dentro de sua sala, sentando-se em silêncio no sofá de dois lugares. Luciano parou de brincar com o bebê e também em silêncio, ficou o observando. Diria que ele tinha a fisionomia do menino mais triste deste mundo e ele sabia por quê. Justo ele, que era muito apegado ao irmão desaparecido, sofria então pela falta, de tão fiel companheiro.

Sara entrou na sala e o vendo quieto no sofá, cumprimentou-o:

— Oi!

— Oi — respondeu cabisbaixo.

— Não tinha percebido você aí.

— Como você está? — perguntou-lhe então Luciano.

Ele sabia que talvez não devesse ter-lhe perguntado isto.

— O senhor não vai procurar meu irmão? — perguntou ele, com lágrimas brotando, no canto dos olhinhos sofridos.

O homem levantou-se da poltrona, ainda com o bebê no colo e sentou-se a seu lado, dizendo:

— É claro que vou procurar seu irmão! Vou procurá-lo até encontrá-lo!

— Ele se perdeu no mato mesmo?

Nem aquela inocente criança, acreditava mais nessa história de mato.

— Ele se perdeu, a gente ainda não sabe aonde. Mas vamos encontrá-lo com certeza!

— É que a minha mãe chora a toda hora.

— Eu sei. Claro que eu sei!

— Eu não gosto de ver minha mãe chorar. Dói todo meu coração.

Luciano colocou a mão sobre seu ombro, dizendo:

— Isso vai passar! Você já conhece meu nenê?

Embora triste, Paulinho olhou para a carinha do bebê, que continuava acordado.

— Ele é bonito! — Insinuou.

— É tão belo quanto você! — esboçou leve sorriso, o homem, a fim de cativar o menino.

— O senhor acha que eu sou bonito?

— Claro que você é lindo! É também um principezinho!

Deu um sorriso.

— Quer segurar o nenê? — Colocou o bebê, em seu colinho infantil.

Ele achou o máximo e por um momento, até se esqueceu de seu triste drama. Passou a mãozinha esquerda sobre o corpo do bebê, como a protegê-lo e a mão direita, passou de leve, sobre seus ralos cabelos negros.

— Seu cabelinho é muito macio — riu Paulinho.

— Gosta de bebê?

Sorrindo acenou que sim.

— Você pode me ajudar a cuidar dele — brincou Sara.

— Eu posso vir na sua casa?

— Você é muito bem vindo à nossa casa, Paulinho — insinuou Sara, pondo a mão em sua cabeça. — Venha aqui sempre que quiser.

— Só tem um porenzinho — emendou Luciano. — Não gosto que você venha à minha casa sozinho.

— Por quê?

— Você é muito pequeno e a rua não é lugar de criancinhas.

— Não sou tão pequeno! — negou ele — Segure o nenê.

Entregou o bebê ao homem e se levantou, ficando na ponta dos pés, dizendo animado.

— Veja!

— É! Tá grande! — riu Sara.

— Será que se baixar os pés não vai ficar menor? — pediu o homem.

— Eu venho pela berada da rua.

— Precisa ter muito cuidado. E também, toda vez que vier aqui, avise a mamãe.

— Eu avisei ela!

— E ela deixou? — questionou Luciano.

O menino olhou firme para Sara, protestando:

— Ele tá doido é? Se ela não tivesse deixado eu não tinha vindo!

— Ainda bem! — concordou o homem, rindo.

— Agora eu já vou embora.

— Vou levar você.

Entregou o bebê à Sara e saiu com o menino para a rua. Após fechar o portão atrás de si, lhe pediu:

— Posso segurar sua mão?

Estendeu-lhe a mãozinha e juntos seguiram até sua casa.

Na entrada do portão, Luciano soltou sua mão, lhe pedindo:

— Chame a mamãe, ou o papai.


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Notas finais do capítulo

Que tal um comentário dizendo se foi melhor dividir o capítulo em dois?



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