Convergente II escrita por Juliane


Capítulo 28
Ele - section III




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Seus lábios estão quentes e úmidos exatamente como eu lembrava, o beijo se prolonga o quanto possível, de repente não há mais grades entre nós, encontramos um jeito de transpô-las. Esse momento poderia durar eternamente se estivéssemos dentro da nossa pequena bolha, onde não há nada nem ninguém além de nós dois. Mas infelizmente como de costume, estamos cercados por gente demais e tenho a vaga ideia de que estamos numa situação um tanto caótica. Eu afasto o pensamento, porque aqui e agora, só o que importa é ela.

_ Beatrice! Estou aqui o que houve! - Uma voz masculina interrompe nosso momento e imediatamente eu sinto um desejo incontrolável de matar seja lá quem quer que seja o dono dessa voz.

Ela se afasta e se dirige ao homem que chamou sua atenção, mas mantém sua mão agarrada a minha camiseta, como se eu pudesse fugir ou desaparecer a qualquer momento e seu gesto me deixa feliz, pois de certa forma me mantém preso a realidade.

_ Wes, Christina está ferida, levou um tiro! Rápido do outro lado da cerca! -Tris indica com a mão livre o corpo de Christina estirado em meio a relva.

Wes, que presumo ser um médico, corre em na direção de Christina após os portões serem abertos com alguma hesitação pelos mesmos guardas de desferiram tiros contra nós. Tris e eu vamos seguindo frente a frente as nossas mãos se tocando enquanto vamos percorrendo as grades, nossos olhos fixos um no outro... Tanta coisa para dizer, há tanto que eu quero saber, mas não vou estragar esse momento. Quando enfim não há mais barreiras entre nós eu a abraço forte, nossos corpos colados como se pudessem fundir-se. Ela está viva!

Então ouço gritos ao meu redor e quando levanto o rosto para entender o que está acontecendo, Cara, Caleb e Zeke estão sendo algemados e estão protestando. Eu me afasto um pouco de Tris para que ela possa ver o que está acontecendo e quando penso que ela tem poder suficiente para resolver as coisas, dois guardas armados me seguram pelos braços e ela grita:

_ Parem! Eles são meus amigos! Parem.

Mas eles não recuam, eles nos afastam enquanto ela avança sobre eles eu tento me desvencilhar e pelo breve momento que consigo acerto um soco o supercílio de um dos guardas e uma fenda se abre em sua pele que sangra encobrindo sua visão. Eu o desarmo e quando penso em empunhar a arma o outro guarda me prende em uma gravata com sua arma e um terceiro aparece e aponta uma arma para minha cabeça. Imediatamente eu largo a arma no chão.

_ O que vocês estão fazendo?! Enrico! - Tris está gritando agora.

Quem é Enrico? Então vejo um cara se aproximando a passos largos, ele é moreno, alto, tem os olhos escuros e selvagens.

_ Tris, eles serão detidos para interrogatório e para fazerem testes para sabermos se não estão contaminados pelo vírus. Não se preocupe. - Ele diz num tom condescendente enquanto põe a mão no ombro dela.

E por um instante penso que este gesto de intimidade foi calculado para me irritar. Ela afasta a mão dele como se fosse sujeira que a estivesse incomodando. Essa é a minha garota!

_ Não me preocupar?! Mande soltá-los agora! - Ela fala entre dentes

_Não posso, ordens são ordens! Você já devia saber. - Ele responde frustrado enquanto desvia o olhar rapidamente na minha direção e nesse momento percebo que ele sabe quem eu sou e isso o está incomodando! Esse patife está afim da minha garota!

_ Quero falar com o General Sparks agora! - Tris grita na cara dele e eu fico feliz em vê-la hostilizando, e então me dou conta de que eu já vi esse cara antes! Ele é o cara com ela saiu rindo ontem, com um capacete na mão, presumo eu, para dar um passeio de moto. Enrico é nome dele, e eu o quero morto.

O maldito puxa o rádio do seu cinturão, aperta um botão e diz.

_ General Sparks? -

O rádio chia e então uma voz responde:

_ Sim?

_ Senhor, a Soldado Prior quer discutir algumas questões pessoalmente com o senhor.

_ Diga a Soldado Prior que ela terá que aguardar até a manhã. Estou muito ocupado agora. Os invasores foram detidos?

O maldito não tem tempo de responder Tris toma o rádio de sua mão e responde por ele.

_ Eles não são invasores! São meus amigos! Minha família! - Ela grita com o general.

_ Soldado Prior se recomponha ou será detida também! - Ele responde rispidamente.

_ Não me importo! General Sparks mande soltá-los! - Ela pede ainda aos gritos e imagino que esta não deve ser um boa estratégia.

_ Eu vou dizer pela última vez Soldado Prior! Contenha-se. Eles serão detidos agora! São ordens minhas.

Irritada ela joga o rádio no chão e o esmaga com seu coturno militar. Lágrimas de ódio e frustração escorrem pelo seu rosto, então não tenho tempo de processar o seu próximo movimento. Ela saca uma arma do coldre e quando penso que ela vai atirar nos soldados ela aponta a arma para própria têmpora. Minhas mãos estão tremendo. Não, o que ela está fazendo?

_ Tris, o que você está fazendo? - Eu digo desesperado.

Ela não responde, engatilha a arma que continua apontada para sua própria cabeça! Estou desesperado! Tento me soltar para impedi-la mas as mãos que me prendem me seguram ainda mais forte.

_ Tris, calma. Agindo assim você não vai conseguir nada! - O tal Enrico diz, se aproximando lentamente dela.

_ Você não entende Enrico! Não aguento mais! Eu preciso dele! Você prometeu! - Ela diz enquanto as lágrimas transbordam dos seus olhos.

_ Vai ficar tudo bem! - Ele diz.

_ Não, não vai! Você sabe o que eles fazem com os invasores! Estou farta disso aqui! De compactuar com essa sujeira! - Ela diz aos soluços enquanto ele se aproxima.

_ Não vamos permitir que façam mal a eles. - A voz dele é mansa e cautelosa.

Então ele se aproxima com as mãos para o alto na defensiva.

_ Calma! Tudo que eu prometo eu cumpro não é verdade? - Ele levanta a sobrancelha esquerda esperando uma resposta que não vem. Enquanto ela continua com a maldita arma apontada para a própria cabeça.

_ Tris! Você não pode fazer isso comigo. Não consigo passar por isso de novo! - Eu digo e não me preocupo com o fato de haverem outras pessoas ao redor enquanto as lágrimas escorrem quentes pelo meu rosto.

_ Eu simplesmente não posso. Me levem daqui, podem nos prender e se tiver de haver alguma execução, que seja a minha. - Eu falo virando o rosto para não vê-la, porque de repente essa situação tornou-se demais para mim, não sei se é encenação, na verdade pouco importa, o fato é que isto é uma brincadeira de mau gosto, ela deveria saber o que eu passei, o quanto eu sofri, enquanto ela esteve este tempo todo aqui, bem viva com esse idiota, fazendo sabe-se lá o quê.

Então os guardas me conduzem para dentro junto com os demais sem encontrar qualquer resistência de minha parte. Quando passamos pelas portas de vidro eu a ouço gritar.

_ Tobias, me perdoe! Eu te amo.

Eu também, mais que a mim mesmo.

Os guardas me conduzem até duas grandes portas de aço e percebo que estamos entrando em docas paralelas aos corredores principais. Tudo cinza, do piso ao teto e apenas algumas lâmpadas pendentes do teto metodicamente instaladas a intervalos regulares ao longo de todo o corredor, um interminável túnel cinza.

Depois de percorremos o que me pareceu uns 500 metros descemos um lance de escadas, depois outro e mais outro, estamos no subterrâneo da base. Tento memorizar o caminho, o que não é uma tarefa complicada, visto que é tudo tão cinza e não há nada que possa me confundir além dos grandes olhos dela na minha mente a arma encostada na sua têmpora. Chegamos a o que parece ser um longo corredor com no máximo dois metros de largura e com inúmeras celas que parecem entalhadas nas rochas. Essa é minha nova casa.

_ Quatro?! É você? - Ouço a voz de Zeke vindo de uma das celas.

_ Sou eu Zeke. Você está bem? - Pergunto

_ Já chega! Vocês não tem permissão para conversar! - Um dos guardas repreende.

_ Quem sabe vocês cortam nossas línguas também! - Zeke responde amargamente.

_ Estou bem, Quatro! - Agora ele se dirige a mim.

_ Cara e Caleb? Como vocês estão. - Eu pergunto.

_ Eu estou bem, mas estou preocupado com Cara que está muda há algum tempo, espero que seja efeito do soro. Eles não me dão informações, nem falam conosco! - Caleb diz angustiado.

_ Calem a boca! - O outro guarda diz irritado.

Quando ele me conduz até a minha cela, vejo que esta, fica de frente para a cela de Cara e a imagem não é muito animadora, pois vejo que ela está deitada no chão de pedra. Começo a ficar preocupado com a sua imobilidade e rigidez.

_ Ei, você pode verificar se ela está bem, foi picada por uma cascavel, usamos soro antiofídico, mas ela está imóvel. - Eu peço a um dos guardas que estão abrindo o enorme cadeado que mantém a cela trancada.

_ Vou chamar um médico. - Ele responde enquanto me empurra para dentro da cela e fecha o cadeado.

Então ele pega o seu rádio walkie talkie e diz.

_ Enfermaria? Preciso de um médico no fosso.

Fosso, que ironia. Estamos de volta ao fosso.

O guarda não espera resposta. Eles viram as costas e desaparecem nos deixando sozinhos.

_ Caleb! Cara, ficará bem! Chamaram um médico. - Eu digo.

_ Eu ouvi. Alguém sabe da Christina? - Ele quis saber.

_ Só vi que a levaram numa maca. Nada mais. - Zeke responde.

_ Mas que merda toda é essa? - Caleb diz indignado, pareceu ignorar a resposta de Zeke e eu não compreendo até que ele continua:

_ Beatrice viva por todo esse tempo, eu me torturando pela culpa, desejando uma nova chance para reparar todo o mal que fiz a ela, o Tobias sofrendo feito um cachorro e ela nem para avisar! - Ele cospe as palavras e eu que devia me sentir ofendido por ser comparado a um cachorro, não me ofendo pois a sua indignação também é minha.

_ Não sei, ela deve ter tido um bom motivo para se manter longe. - Zeke diz.

_ Mas custava avisar: "_ Olha pessoal, vocês fizeram o funeral de outra pessoa, aquelas cinzas que você Tobias, espalhou por Chicago enquanto descia pela tirolesa era de outro defunto. Desculpe, mas vou ficar por aqui com a minha nova vida de soldado na base militar da porra dos Estados Unidos." - Caleb fala num tom de voz estranho, uma tentativa frustrada de reproduzir a voz da irmã. Todos nós estamos pasmos porque nunca o ouvimos falar palavrões, jamais ele deu alguma demonstração de ira diante de algum de nós, apenas aquela frieza e arrogância quando algo parecia lhe perturbar. Então penso que talvez ele esteja se tornando mais humano.

_ Você parou pra pensar na babaquice que você está falando? - Zeke o repreende.

_ Ela não faria isso com o Quatro por puro capricho. - Ele completa.

Zeke é o que menos a conhece de nós dois e a está defendo. Coisa que eu deveria estar fazendo nesse momento.

_ Quatro, você está bem?

_ Aham. - É tudo que consigo dizer.

*****

Não sei quanto tempo se passou, estou deitado no chão de pedras olhando para o teto de pedras e pensando nela, no beijo e em tudo que se passou desde que chegamos aqui. Então ouço passos descendo as escadas, imediatamente me levanto. Deve ser um médico para tratar Cara.

_ Tobias?! - Tris entra no fosso chamando por mim.

_ Aqui. - Respondo.

Ela corre em direção a minha voz e vejo o médico se dirigindo a cela de Cara.

_ Tobias, me desculpe. Eu fui uma tola, não devia.... - Eu a interrompo:

_ Tem notícias de Christina. - A frieza aparente em minha voz.

Ela inclina a cabeça levemente para o lado e me encara, tentando ler o que se passa na minha cabeça. E tudo que eu estou fazendo nesse momento é me distrair do pensamento de que ela foi capaz de me deixar na ignorância sofrendo por longos três anos.

_ Desculpe, eu devia ter imaginado que estariam preocupados. Ela está estável. Vai sobreviver. Wes cuidou dela. - Quem é Wes? Sei que se trata do médico que cuidou de Christina, mas quem ele é para ela?

_ Precisamos conversar. - Ela diz.

_ Sou todo ouvidos. - Eu respondo.

_ O que foi? Você continua chateado pelo que aconteceu mais cedo?! Olha eu não quis, eu não tive a intenção, só queria ajudar.

_ Me ajudar? - Eu faço uma pausa para tomar fôlego e encontrar a minha coragem para dizer a ela tudo o que está me atormentando nesse momento.

Ela me olha em expectativa, eu respiro fundo e começo:

_ Você nos faz acreditar que está morta por 3 longos anos. Depois coloca uma arma na própria cabeça e ameça se matar. Onde nisso tudo está a sua intenção em me ajudar? Por acaso você não acompanhou todo o meu sofrimento pelos malditos monitores da sala de controle dessa maldita base? Você por acaso, me viu descer a tirolesa espalhando suas supostas cinzas por Chicago? Não, você estava ocupada demais andando de moto ou fazendo sei lá o que com o tal Enrico não é mesmo?

_ Tobias, não seja injusto! Deixa eu explicar. - Sua voz é suplicante.

_ Você não viu quando eu quase tomei o soro da memória para apagar a dor que eu estava sentindo?! Você não viu quando esses seus malditos amiguinhos capturaram crianças e professores de uma escola na margem, os infectaram com um vírus mortal e os largaram na nossa cerca para nos matar também? Você também não viu isso, não é mesmo?

_ Você está sendo cruel! - Ela abaixa os olhos eu a estou magoando.

_ Cruel? Eu estou sendo cruel? Não me venha falar em crueldade, essa gente com quem você anda agora usa as pessoas como cobaia, você sabia disso?

_ Eu fiquei aqui para manter vocês a salvo! O trato que Wes fez com o presidente para não reiniciar todos foi que eu ficasse aqui, que vocês acreditassem que estou morta. Mas eu tinha um plano!

_ Deve ser um plano bem complicado, afinal em três anos você não conseguiu pôr em prática. - Digo amargamente.

_ Ela vai ficar bem, está em estado de choque, acho que vocês exageraram na dose de soro antiofídico. - O médico interrompe nossa discussão.

_ Ela vai ficar bem? - Caleb insiste, preocupado.

_ Sim, vou levá-la para hospital agora. Pode ficar tranquilo. - O médico respondeu atenciosamente.

_ Wes, você pode me dar mais tempo aqui? - Tris fala com o médico, eu não havia percebido que era o mesmo que tratara Christina.

_ O tempo que você precisar. Vou chamar os enfermeiros para levarem a garota para o hospital, mas ficarei aqui. E é o que ele faz, usa o seu rádio para solicitar 4 enfermeiros e uma maca.

_ Tenho muitas coisas para te contar Tobias. Não se trata só de Chicago. - Ela se aproxima e silenciosamente pede com um gesto que me aproxime e imagino que seja para que ela possa falar ao meu ouvido.

Estou confuso, ela parece confiar no médico. Então ela percebe a minha relutância e faz sinal para um pequeno ponto na extremidade superior direita da grade e quase não vejo pois ele tem exatamente a mesma tonalidade das grades. Então compreendo o que ela está tentando me mostrar. Uma escuta, uma câmera camuflada talvez.

Tris me puxa pela camisa e por um instante eu penso que ela vai me beijar então seus lábios estão colados ao meu ouvido e sua respiração quente tão próxima assim embaralha meus pensamentos, não consigo raciocinar com clareza.

_ Ouça Tobias, não vou deixá-los aqui. Não estive me divertindo com Enrico como você insinuou, não sei o que você viu, mas eu estive treinando esse tempo todo para me tornar piloto e poder sair daqui sem ser percebida ou detida, Planejava roubar um caça e ir até vocês. Enrico foi meu instrutor. Eu nunca nem por um instante desisti de você. Meu plano sempre foi voltar para você. Só peço que confie em mim... Se você desistir de mim agora, eu não conseguirei... Preciso de você Tobias. - Ela faz uma pausa esperando alguma objeção ou outra reprimenda, mas me mantenho calado.

_ Eu acompanhei a sua dor. Eu vi você sofrendo e desejei mil vezes estar morta para não ver isso. Mas me mantive firme e paciente, você insistiu em não abandonar a minha lembrança, eu devia minha vida e determinação a você por isso. - Ela se afasta para poder olhar nos meus olhos.

_ Eu te amo. Confie em mim.

_ Eu também te amo. - Confio, mesmo sem processar direito o que ela disse, porque eu não tenho alternativas, ela é a minha vida. Como poderia viver sem a minha vida?! Como o vegetal humano que fui durante esses três anos. Não, eu a quero com todas as minhas forças, não suporto mais ficar longe dela.

Ela abrevia toda a minha agonia com um beijo ardente e mais uma vez há uma barreira entre nós e uma platéia, mas eu não ligo. Ela está aqui comigo e agora é só o que importa.


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Notas finais do capítulo

Gente.... Agora nos despedimos de Tobias por enquanto.
Precisamos contar o que aconteceu com Tris até a chegada do nosso querido e seus amigos.
Obrigada pela paciência em aguardar as minhas postagens. :)



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