Fluxo - JuGil escrita por HJ


Capítulo 12
Capítulo 12


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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(Pov Gil)

Quando chegamos ao hospital, a Ju foi logo encaminhada para a sala de parto e eu fui junto, meio zonzo com tudo o que estava acontecendo. O Dr. Sérgio não estava de plantão e quem nos atendeu foi uma médica que parecia bem segura de si. Já na sala de parto, foi feita a anestesia parcial e a Ju segurou a minha mão. Ela tremia desesperadamente.

Foi iniciado o procedimento e um tempo depois eu vi um bebê pequeno, minúsculo. Porém eu não ouvi o seu choro, afinal, crianças mortas não choram. Mas o seu pai sim, e foi isso o que eu fiz. Chorei tudo o que eu vinha guardando desde o diagnóstico, todo o medo, toda aflição, toda a alegria em ser pai, em ter uma família. Tudo tinha acabado, ele estava morto. Enxuguei minhas lágrimas e olhei na direção da Ju. Ela estava de olhos fechados. Ela não podia estar morta também. Eu nem sabia se isso era provável, porque em todas as consultas que tivemos perguntávamos sobre o bebê e nunca sobre a mãe dele. Esperei alguns segundos que pareceram uma eternidade. Apertei mais a sua mão e então obtive uma resposta. Ela estava viva e eu aliviado, quem sabe até feliz. Desvincilhou-se de mim e levou as mãos ao rosto. Eu não sabia o que fazer, então apenas fiquei ao seu lado, acariciando os seus cabelos. Aos poucos os profissionais que estavam na sala foram saindo e eu, pelo menos, me senti desamparado. Quando restava apenas o som dos nossos choros, a médica surgiu com uma pergunta:

– Vocês querem vê-lo?

– Ã? Quem? - eu estava muito confuso.

– O filho de vocês. - eu pensei que pudesse ter havido, sei lá, um milagre, e o nosso filho estivesse vivo. Mas aí eu percebi que tinha entendido tudo errado quando ela prosseguiu: - Hoje em dia, nós proporcionamos essa escolha aos pais: conhecer ou não o filho natimorto. Se vocês acham que se encontram em condições de viver este momento, ele vos será concedido.

Eu realmente não sabia a resposta para aquela pergunta. Mas também, nem tive tempo de arrumar, pois antes que eu me manifestasse, a Ju respondeu:

– Eu quero - devia ser mais difícil para ela. Tudo o que diminuísse a sua dor me agradava, por isso eu concordei, mesmo não sabendo direito se estava preparado para tal.

Pouco tempo depois, adentrou na sala uma técnica de enfermagem com o nosso bebê no colo, enrolado em uma manta hospitalar. Ele foi posto no colo da mãe, que havia voltado a chorar. A Ju suspirava entre os seus soluços dizia:

– Me desculpa... Eu queria de dar uma vida , mas... eu não consegui... Me perdoa...

Eu estava chocado, vendo mulher que eu amo com o nosso filho morto nos braços. Eu não sabia o que pensar, muito menos o que fazer. Mesmo assim, eu que arrisquei a dizer:

– Não fica assim... Não foi culpa sua.

Foi como se eu nem tivesse falado, porque eu acho que a Ju nem ouviu. Ela só foi tirada do transe que estava quando a técnica falou:

– Agora, você precisa ir para o quarto, descansar um pouco. Mais tarde a médica vai passar no quarto para falar algumas coisas. - retirou o bebê dos braços da Ju e chamou outras pessoas para conduzirem a maca até o quarto.

Quando eu estava saindo da sala, um funcionário me parou e peguntou:

– Você era o pai da criança?

– Sim, era. - dizer aquilo me doeu mais do que eu imaginava.

– Nós precisamos organizar o velório e o enterro...

– Eu vou falar com uma pessoa que vai responder a tudo o que você precisa, porque agora eu realmente tô sem cabeça.

Foi em direção ao quarto e quando cheguei encontrei no leito uma Ju mais calma, mas com o olhar perdido. Sentei-me na poltrona ao lado da maca e fiquei em silêncio. Eu não estava bem e o clima de hospital não me ajudava em nada. Quem quebrou o silêncio foi a Ju:

– Você demorou. Onde você tava?

– Resolvendo algumas coisas. - preferi não entrar em detalhes.

– Coisas como o enterro? - ela olhou para mim. Seus olhos estavam inchados e vermelhos, o que contrastava com a palidez da sua pele. Decidi falar a verdade:

– É, mas eu não tô com cabeça pra isso. Vou pedir para a Lia ou pra Fatinha cuidar disso pra mim.

Ela apenas concordou e voltou o seu olhar para o nada. Pensei que fosse a minha vez de falar alguma coisa, então tentei consolá-la:

– Ju, não fica assim vai... Por favor. Olha, não foi sua culpa, tá bem?

Ela apenas concordou novamente. Ela não acreditava que eu realmente pensasse aquilo, mas eu também não tinha mais forças para defender meus argumentos. Havia sido um longo dia e já estávamos no meio da noite, mesmo assim, fui ao corredor e liguei para a Lia para avisar tudo o que havia acontecido e para pedir que ela resolvesse as coisas do enterro para mim. Quando voltei ao quarto, encontrei-a já dormindo e resolvi fazer o mesmo.

Pela manhã, a médica apareceu no quarto pouco depois de acordarmos. Ela tinha grandes olheiras abaixo dos olhos, resultado de um plantão movimentado. Ela continuava séria, mas agora tinha um olhar que beirava a pena. Indagou:

– Como estão?

– Exatamente do mesmo jeito que deixamos aquela sala de parto ontem. - acho que nenhuma das duas esperava aquela resposta de mim, pois me olharam surpresas. A médica continuou, um pouco desconfortável:

– Certo, o que eu vim falar diz respeito a você - inclinou a cabeça na direção da Ju - Juliana, não é? Eu quero lhe dizer que não é porque não deu certo dessa vez que você não pode ter filhos, você pode, ok? - a Ju assentiu - Eu quero lhe pedir também que não se assuste com o que você vai ver quando for tomar banho. O corte que nós fizemos ontem certamente resultará em uma cicatriz, mas você é uma menina linda e não vai ser ela que vai tirar a sua beleza. Se a recuperação ocorrer como a prevista, hoje a noite vocês já serão liberados. Fiquem bem, certo?

Certo, claro, como se fosse fácil. Nem preciso dizer que a primeira coisa que a Ju fez quando a médica saiu foi tomar um banho. Perguntei se ela precisava de ajuda, mas ela disse que não. Logo que ela saiu do banheiro, percebi que ela tinha voltado a chorar. Estava prestes a redizer tudo aquilo que eu já tinha dito antes quando ela me interrompeu:

– Gil, eu quero que você saiba que você tem sido maravilhoso. Perfeito, até. Mas agora, nesse momento, eu preciso ficar um pouco sozinha, colocar os pensamentos em ordem, sabe? - não, eu não sabia. Mas ela não esperou a minha resposta. - Não entenda isso como um término, ou como um pedido de tempo, longe disso. Eu só preciso reorganizar a minha vida e você precisa descansar. Vai para casa, dorme, depois eu volto com a Lia, que por sinal já deve estar chegando aí.

Eu concordei, afinal se era aquilo que ela queria, o que eu podia fazer?

Mas antes de ir para minha casa, passei no apartamento que antigamente era da Ju. Bati na porta e quem me atendeu foi a Marta.

– Eu preciso falar com a senhora. - falei, tentando parecer melhor do que realmente estava.

– Já veio pedir ajuda? - ela estava com um ar de vitória.

– Não, não vim. Pelo menos não o tipo de ajuda que a senhora está pensando. Eu estou vindo agora do hospital. A Ju acabou tendo uma doença chamada toxoplasmose durante a gravidez, e ontem o bebê nasceu, já morto. Eu tô péssimo, e olha que eu não passei pela metade que ela passou. Eu não sofri com dores na cabeça, nos músculos, na garganta, com vômitos e tonturas. Eu não tive que me dopar durante meses com vários remédios. Eu não engordei uma só grama. Eu não tive que ficar deitado a maior parte dos últimos dias. Eu não fui humilhado e expulso de casa pelos meus pais. Eu não fiquei com uma cicatriz que vai me lembrar para sempre do que aconteceu. E mesmo não passando por tudo isso, tudo o que eu queria agora era um carinho da minha mãe, mas ela não está mais aqui. Por favor, não tire isso da Ju enquanto ela ainda tem. - virei as costas e saí. Eu também já estava cansado e já tinha feito a minha parte.

(Fim do Pov Gil)

(Pov Ju)

Depois que o Gil foi embora eu fiquei pensando se não havia sido forte de mais, afinal ele também estava sofrendo. Mas eu realmente precisava pensar. Eu estava diferente agora e não queria que o Gil me visse daquele jeito tão cedo.

Foi então que uma pessoa chegou. Pensei que era a Lia, mas vi que era a minha mãe. Ela veio na minha direção e me abraçou. Eu estava com saudade, muita saudade. Depois do longo abraço, eu perguntei:

– Como você soube que eu estava aqui?

– O Gil me contou agora a pouco. Ele me disse que vocês dois estavam precisando do carinha da mãe agora, mas como ele já não tinha, não queria que você não tivesse também. Ele me surpreendeu, aliás, vocês me surpreenderam.

Começamos a conversar e percebi que o Gil estava certo e senti pena dele. Comecei a me achar uma idiota por não ter dado apoio a ele, afinal ele estava sofrendo tanto quanto eu!

Pouco tempo depois a Lia chegou e também entrou na conversa. Eu estava me sentindo um pouco melhor quando perguntei:

– Quando vai ser o enterro?

– Vai ser amanhã de tarde.

E pareceu que o tempo passava mais devagar. Durante o enterro, tentei evitar o Gil. Apesar de estar precisando dele, eu não tinha certeza se ele aceitaria bem o meu corpo agora, com quilos a mais e uma cicatriz.

Depois que o enterro passou, o Gil chegou perto de mim e indagou o porque da distância, já que eu havia dito que a nossa última conversa não era um término. Decidi, então, ser sincera:

– Porque eu não tenho coragem de te dizer que você não está mais namorando aquela velha Ju. Eu mudei. Psicológica e fisicamente. E eu não tenho certeza que você vai continuar gostando da nova Ju. - esperava que ele tivesse entendido.

– Eu gosto de você de qualquer jeito. Pra mim, você sempre vai ser a mulher mais linda que existe. - dava para perceber que ele estava sendo sincero, mas eu não estava muito segura.

– Me dá só mais um tempinho, para eu mesma me acostumar comigo, pode ser?

– Pode - ele respondeu, meio contrariado. Queria que ele visse que eu falava seria quando disse que não era um pedido de tempo, então puxei-o para um beijo, curto e sereno, mas era um beijo. Eu não saia por aí beijando qualquer um.

– Às vezes, eu queria voltar uns dois anos no tempo, sabe? Quando a gente tava no início de namoro? Era tudo tão mais fácil, né? - comentei.

– Era, bem mais fácil. - ele disse, mas eu percebi que ele nem prestou muita atenção no que estava falando.

Fui para casa. Para a minha casa. Mesmo gostando de morar com o Gil, era tão bom ter feito as pazes com a minha família!

Lá pelas 20h, recebi uma mensagem do Gil:

"Pode vir aqui na praça um pouquinho?

É importante

Bjs"

Respondi que já iria e realmente não demorei muito. Estava apenas esperando o outro dia para ficar novamente com o Gil, mas durante o caminho eu pensava que o Gil podia estar me chamando para terminar comigo, já que eu não quis ficar com ele, dar apoio quando ele precisou, ele podia ter achado outra pra fazer isso.

Cheguei na praça e fui logo perguntando:

– Você vai terminar comigo?

– Ã? Por quê? - eu tinha sido direta demais. Melhor mudar de tática.

– Por que você me chamou aqui?

– Porque você disse que queria voltar no tempo, e esse lugar aqui é um marco na nossa história, não é mesmo, sua romântica e fútil? - ele sorriu. Percebi qual era a sua ideia.

– Claro, seu pichador mau-humorado!

– Devia ter dito curioso também! - ele estava se aproximando e o meu coração começou a bater forte demais.

– É? Por quê?

– Porque agora, por exemplo, eu tô curioso...

– Curioso com o quê?

– Ju, você acredita em amizade entre homens e mulheres? - fiquei surpresa ao perceber que ele se lembrava mesmo de tudo.

— Acredito. Claro que acredito. Por exemplo eu e você, a Morgana e o Rafa…

— Sim. Mas eles começaram a namorar. Minha mãe disse que sempre chega uma hora que pinta uma curiosidade, uma dúvida…

— Por isso que você disse que é curioso? - saber o que ia acontecer em seguida só me trouxe de volta aquele mesmo nervosismo de antes.

– Não, foi por fazer de novo isso - e então ele me beijou. E eu viajei no tempo, a uns dois anos antes, como se aquele fosse mesmo o nosso primeiro beijo. E como antes, ele só me fez gostar ainda pelo meu pichador.


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Notas finais do capítulo

Capítulo triste ou feliz? Comentem!



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