Do Outro Lado do Oceano escrita por Laura Machado


Capítulo 9
Capítulo 9: POV Blake Arely


Notas iniciais do capítulo

Me perdoem pela demora. Eu saí de viagem, fui conhecer algumas gotinhas (fãs das fanfics) em Curitiba!
Mas agora eu estou de volta. E com tudo.
Escrevi esse capítulo ouvindo, "Live Your Life", do T.I. com a Rihanna.
Espero que gostem.



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Eu já tinha pegado aquele elevador incontáveis vezes. Tantas que até tinha me virado automático. Eu entraria, me viraria para a frente, apertaria o botão. E então eu me prepararia emocionalmente para o que me esperava mais para a frente.
Mas dessa vez era diferente. Assim que me estiquei e vi que meu dedo ia direto para o botão número nove, tive que parar por um segundo. Não era um dia comum. Eu não estava indo para lá. Eu subiria um pouco mais. Eu encontraria os cachorros grandes. Eu veria aquele que tinha por tanto tempo sido como um chefe invisível para mim e todos na minha divisão.
Respirei fundo e apertei o botão que me levaria até o décimo quinto andar. Antes que o elevador começasse a fechar as portas, outras várias pessoas a seguraram e entraram. Dei alguns passos para trás para deixá-las se acomodarem e logo vários outros botões estavam acesos.
O caminho até lá pareceu interminável. E quando eu sentia que era hora de sair, ainda tinha um pouco mais para chegar. Era estranho pensar como algo tão banal podia ter se infiltrado na rotina. Apertei a alça da bolsa que estava pendurada no meu ombro, sentindo a grandeza do que estava para acontecer.
Eu. No décimo quinto andar. Eu. Encontrando Don Harris, chefe da DDN. Logo eu. Trabalhando diretamente para ele.
O curto alarme do elevador soou para me avisar que eu tinha chegado. Demorei um quarto de segundo para engolir a seco e passar pelas pessoas que estavam entre eu e a porta e não pareciam se preocupar com qualquer que fosse a minha obrigação.
Assim que pisei no chão de mármore e ouvi o barulho de meu passo ecoando, alguém apoiou sua mão no meu ombro.
Levei um susto, mas tentei esconder meu nervosismo assim que vi quem era.
"Davidson," falei e ele sorriu para mim.
"Vamos lá, Blake. Aqui você pode me chamar de Clifford," levemente, ele usou sua mão para me indicar que precisávamos começar a andar. "Agora sim você está na Divisão da Defesa Nacional. Esqueça tudo que sabia antes, sua vida vai mudar muito daqui para frente."
"Eu imagino," respondi. Eu nem me importava muito como mudaria. Estava já preparado para aquilo. O que me deixava nervoso era esse caminho lento até começar de verdade.
E Don Harris. O mito. A lenda. Meu ídolo.
"Aqui," Clifford me fez parar na frente de uma porta e a abriu para que entrássemos. "Estava falando com Stace e ela me disse que está tudo encaminhado. Só faltam os retoques finais."
"Stace?"
"Jones," ele me explicou com um sorriso um tanto condescendente. Como se eu fosse o menino que não entendia a complexidade de chamar as pessoas pelo primeiro nome. Naquela falsa intimidade que nós ouvíamos falar lá no departamento de investigação.
Eu poderia voltar e contar para todos por lá que era verdade, que eles eram como nós falávamos. Mas eu provavelmente nunca voltaria. Eu já não era mais um deles. E não era muito um dos outros também. Estava preso entre o nono e o décimo quinto andar.
"Eu trouxe o dossiê," falei, puxando uma cadeira e me sentando.
"Não precisa," Clifford deu a volta na mesa, parando na frente de uma tela eletrônica que tomava a parede toda na minha frente.
E, com um toque, ele a acendeu. Todos os meus arquivos, todas as informações que me tinha demorado dias para conseguir estavam reunidas ali, empilhadas em imagens de vários tamanhos, documentos com telefonemas, contas bancárias, registros e até fotos de passaportes. Todo o meu trabalho.
Deixei minha bolsa cair no chão, agora desprezível.
"Nós vamos repassar o mapa e você terá que entrar em um regime de treinamento intensivo."
"Como é?" Perguntei, um pouco perdido por estar passando meus olhos pela tela.
Eu nem sabia direito o que ele tinha falado.
"Você terá que passar por um treinamento intensivo," ele repetiu.
Mas para quê? Eles tinham algum jeito de trabalhar aqui que eu desconhecia? Era tão especial assim estar ali que eu teria que treinar antes de me sentar na frente da minha mesa? Ou será que era para conhecer Harris? Não. Não podia ser.
"Entendi," respondi, apesar de ter milhões de perguntas brotando na minha cabeça.
"E eu te mostrarei o papel que você vai exercer," ele continuou, sem se preocupar muito com o que eu poderia estar pensando. "Nós vamos manter seu nome, mas você ainda terá que decorar algumas informações."
"Que tipo de informações?" Aquilo tudo parecia muito errado. Eu não poderia simplesmente continuar respondendo o que respondia? Eu já tinha toda uma história que usava para quando alguém me perguntava o que eu fazia. Era simples. Por que eu precisava mudar?
"Sua profissão," ele disse, apertando algo em um teclado que ficava bem na sua frente na mesa. E então uma ficha com a minha foto apareceu tomando toda a tela.
Nome: Blake Arely. Profissão: Analista Financeiro para o Banco Nacional de Illéa. Formação: Economia na Universidade de Brown.
Na Brown. Alguns vários quilômetros de onde eu realmente tinha estudado.
"Por que tudo isso?" Perguntei, repassando meus olhos pelo meu currículo inventado.
"Nós tivemos que melhorar seu perfil para termos certeza de que a princesa te escolheria-"
Ele foi cortado pelo barulho da porta. Antes que eu pudesse entender do que ele estava falando, umas oito pessoas entraram. Uma mulher foi direto até ele, enquanto os outros se sentavam do meu lado, ajeitando suas coisas em cima da mesa.
Eles não pareciam nem um pouco incomodados com a minha presença, quase como se não a notassem. E eu estava mais preocupado com o que Clifford tinha dito.
"Espera," eu pedi, mas ele não me ouviu.
Um cara magrelo me deu uma empurrada com o ombro para poder esticar melhor o papel que ele colocava bem no centro da mesa. Meus olhos caíram no desenho e eu vi que era a planta do castelo. E logo na ponta, uma das mulheres que tinha entrado colocou uma ficha oficial da Seleção da Princesa Lola Farrow. Com a minha foto. Meu nome. Minhas informações. Aquilo estava errado. O que eu estava fazendo ali? Eles tinham entendido tudo errado!
Eu me levantei na hora. "Clifford?" Chamei, alto e direto. Tão alto e direto que todos pararam o que estavam fazendo para me olhar. Inclusive ele.
"Algum problema?" Ele perguntou, balançando a cabeça como se eu o estivesse interrompendo uma conversa muito importante.
"Posso falar com você lá fora por um minuto?"
Ninguém se atreveu a mover um centímetro. Talvez fosse pelos meus punhos cerrados do lado do meu corpo. Talvez fosse a expressão no meu rosto.
Clifford pareceu pensar, como se ele estivesse tentando aceitar que ele teria que ir falar comigo. Ele claramente não parecia gostar daquilo.
Mas acabou concordando. E depois me guiou para uma porta lateral que levava a um caminho simples alguns metros acima de um salão enorme cheio de mesas e pessoas atarefadas.
Assim que ele fechou a porta atrás dele, eu falei.
"Alguém se enganou completamente," comecei, um pouco irritado por ter feito uma investigação enorme e vê-los errar algo tão básico. "O plano era outra pessoa entrar infiltrado no castelo. Não eu. Eu não sou ninguém. Eu só investiguei."
Clifford parecia querer revirar os olhos. Mas se contentou a abaixá-los por um segundo. E então voltou a me mirar.
"Ninguém seria melhor do que você," ele disse, me segurando pelos ombros. "Você conhece cada detalhe desse caso melhor do que todos nós. E nem tivemos que mudar muito o seu perfil para que ficasse perfeito para a Princesa. Não tem ninguém melhor do que você para essa missão."
"Mas eu nunca saí em uma missão!" Protestei, apesar de que não queria convencê-lo do contrário. Parecia errado eu ser o centro dessa missão, mas um errado meio ótimo."Eu nem sei o que fazer."
"Por isso que passará pelo treinamento," ele me respondeu e eu me senti bastante ignorante.
Eu não era idiota. Eu só não estava esperando aquilo. Podia jurar que eu só tinha vindo aqui para poder explicar e coordenar a missão daqui. Atrás de uma mesa. Vendo o infiltrado por uma tela.
E então ele falou a única coisa que me faria esquecer tudo que poderia ter planejado antes.
"Don Harris mesmo decidiu que você seria o infiltrado."
Eu sorri. Não queria, mas sabia que já tinha entregado tudo. Don Harris. Ele tinha olhado para a minha ficha. Ele tinha decidido que eu era perfeito para aquilo. Se ele achava isso, quem era eu para contrariar?
"Só isso?" Clifford perguntou.
Só concordei com a cabeça. E depois, sem nem pensar direito no que fazia, o segui de volta pra sala e me sentei na cadeira que antes tinha ocupado.
As pessoas lá dentro não nos esperaram, continuavam com seu trabalho. Um mural enorme tinha sido montado na tela eletrônica na minha frente e um de cortiça tinha sido ocupado de papéis diversos. Minha foto. Meu currículo. De um lado, o caso todo. Tudo que eu tinha descoberto. Do outro, o plano daqui pra frente. A missão.
O magrelo do meu lado escorregou uma folha para ficar na minha frente e eu passei meus olhos rapidamente por ela.
A cada palavra eu animava ainda mais. Não era um erro. Eles queriam que eu me infiltrasse. Eles tinham planejado tudo. A mando de Don Harris. Eu trabalharia no campo. Eu. E meu sonho de ser um espião.
O medo de fazer tudo errado deveria estar me corroendo. Mas não me afetava em nada. Eu li a minha programação. O estudo pelo qual teria que passar. O treinamento físico. As pessoas com nomes de peso que eu conheceria. As habilidades que eu desenvolveria. Eu me tornaria um agente de verdade.
Eu poderia ter começado ali mesmo. Queria me levantar e começar alguma coisa. Algum treinamento, qualquer coisa. Ou pelo menos conhecer Harris logo.
Mas meus olhos encontraram um pequeno cronograma no final da página.
"Quanto tempo eu tenho para todo o treinamento?" Perguntei para o magrelo.
Ele soltou uma risada, como se fosse muito engraçado. "Duas semanas."
"Blake, você está pronto?" Clifford perguntou, se aproximando de mim como dava por cima da mesa. Sem esperar minha resposta, ele empurrou um arquivo enorme na minha direção que deslizou até que eu o segurasse. "Isso é tudo que você precisa saber sobre o que implementamos na sua vida. Sobre a universidade, sua família, tudo. A maioria é detalhe. Mas eu lhe aconselho a saber tudo melhor do que você sabe da sua vida de verdade.
"Na sexta-feira eu vou te testar. É bom que você não erre nenhuma pergunta. Depois segunda eu te testarei de novo, dessa vez com o polígrafo. E de novo logo antes de você ir para o castelo.
"Você vai ter que decorar cada um dos cômodos do castelo, cada árvore da floresta atrás dele, cada caminho no país que leve para lá. E cada nome de criados que trabalhem lá, já tenham trabalhado ou sonhem trabalhar.
"A única pessoa que sabe que você está infiltrado é o próprio Rei Maxon. Essa missão é completamente confidencial. Olhe em volta. Além dele e de Don Harris, só quem está aqui dentro sabe que você está indo. Nós não sabemos quem lá dentro está planejando o ataque. Pode ser um guarda. Pode ser uma criada. Pode ser alguém perto da princesa. Cabe a você descobrir. E não confiar em ninguém até ter certeza absoluta.
"Essa vai ser uma infiltração profunda. Você não terá quase nenhum contato com a gente. Praticamente nenhum. Seu handler será o próprio Rei Maxon. Mas mantenha-se longe dele o máximo possível. Você não deverá falar com ele sobre a missão a não ser em caso de emergência. Se alguém desconfiar da sua relação com ele ou de algum tipo de preferência dele por você, toda a missão pode estar em risco. Para falar com ele em casos de emergência, o código será a cor da gravata que ele estiver usando.
"Você está completamente proibido de criar qualquer vínculo emocional com alguém lá dentro. Quem quer que seja. Especialmente a princesa," na hora em que ele falou isso, algumas pessoas ali se viraram para ver a minha reação. Eles podiam olhar o que fosse, até cinco minutos atrás eu nem sabia que estaria entrando nessa competição. E agora que eu sabia, minha última preocupação era ela. Na verdade, eu nem lembrava direito que ela estaria lá. Sabia que era a sua Seleção. Mas era quase como se a presença dela me fosse irrelevante.
"Por último, você vai passar por algumas sessões com Auggie Wells," Clifford apontou para o magrelo, que me sorriu por dois segundos. "Ele vai te ensinar tudo que você ainda não sabe sobre computador e tecnologia. Mais do que só o básico que a agência exige. Você terá que aprender a hackear qualquer que seja o objeto, de um centro de comandos a um controle de televisão. Tudo que nós o entregarmos será o que você levará. O resto você vai ter que encontrar por lá.
"E então você passará por algumas aulas intensivas de química e física. Além de uma básica de sobrevivência. Nós precisamos ter certeza de que qualquer que seja a sua necessidade, você vai conseguir supri-la sem a nossa ajuda.
"Não há espaço para dúvidas. Não há espaço para falhas. Você precisa se manter infiltrado. Precisa que ninguém o descubra. Mas precisa principalmente descobrir quem está planejando o ataque, quando acontecerá e como o impedir sem levantar suspeitas. Sem. Levantar. Suspeitas," ele repetiu, como se cada palavra pesasse trinta quilos nos meus ombros.
Ele estava bem diferente do que eu normalmente via no bar do outro lado da rua da agência. E pela primeira vez na vida eu senti algum respeito por ele.
"Entendi," eu respondi, e ele acentiu. Ia começar a falar outra coisa, mas eu o interrompi. "Mas espera. Como vou conseguir fazer com que a princesa me escolha?"
"O rei está tomando conta disso," ele respondeu.
"Mas e se não der certo? Nós não precisamos de um plano B?"
Todos se entreolharam. Eu realmente não era idiota. Mas aquele era o dia em que eu saberia de todo o plano. Lá do nono andar, tudo que eu conseguia era juntar informações e mandar para cima. Ninguém nunca nos falava nada, nem o que eles tinham conseguido com nossas investigações. Não era burrice minha. Era só a arrogância deles.
"O plano B seria você entrar como guarda," Clifford falou depois de alguns segundos. "Mas nós voltaremos a ele se chegar sexta-feira e ela não o tiver escolhido. Ele não é nem de longe ideal, mas mesmo assim."
"Entendido," respondi, apesar de ainda achar muito frágil não poder fazer nada para assegurar de que eu entraria no castelo como selecionado.
O que será que o Rei Maxon estava planejando para persuadir a princesa a me escolher?
Olhei rapidamente para a minha ficha de inscrição da Seleção e corri os olhos pelas informações. O que de tão incrível tinha naquilo? Por que aquilo a faria me escolher? Quem é que queria um analista financeiro? Não me parecia muito romântico. E nem saber que eu tinha 1,89m de altura e que pesava 80kg. O que ela estava procurando exatamente? E como eu conseguiria ser perfeito para entrar, mas errado o suficiente para ela nem olhar para mim? Eu não poderia deixá-la estragar a missão.
"Agora," a voz de Clifford me fez olhar de volta para ele, "nós temos que começar pela sua fraqueza."
"Fraqueza?"
"Quanto tempo você passou na Fazenda?" Ele já sabia a resposta, mas queria me fazer falar.
Já fazia tanto tempo que eu demorei alguns segundos para lembrar que Fazenda era onde nós fazíamos nossos primeiros treinamentos quando entrávamos na agência. Mesmo que depois fôssemos confinados a uma mesa, esses treinamentos eram obrigatórios. Era o jeito dos Todos Poderosos saberem se nós seríamos leais, inteligentes, excepcionais. Eu mesmo tinha ficado bastante surpreso por ter sobrevivido à Fazenda. Era o pior da turma. Nunca tinha sido muito bom em atividades físicas e sofri para conseguir acompanhar todos os outros. Mas eles tinham visto alguma coisa em mim. E lá estava eu.
"Três meses," respondi e Clifford abriu um sorriso.
"Pois em duas semanas, você vai passar por um treinamento equivalente ao dobro disso," ele parecia bastante satisfeito, como se gostasse de me assustar.
Mas eu estava bem. Eu estava pronto. E vontade de correr atrás e terminar essa missão não me faltava. Eu superaria qualquer obstáculo, eu seria o melhor. Não tinha mais 18 anos. Não era mais o prodígio do exército, aquele que era empurrado para todos os lados pela sua memória fotográfica. Eu era mais que isso. Eu tinha crescido e sabia que conseguiria. Afinal, Don Harris acreditava que eu conseguiria.
"Quando eu começo?"


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Notas finais do capítulo

Prometo que o próximo não vai demorar muito.



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