Do Outro Lado do Oceano escrita por Laura Machado


Capítulo 81
Capítulo 81: POV Blake Arely


Notas iniciais do capítulo

Escrevi ouvindo "Let's Get Lost" do G-Eazy



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Não foi difícil deixar a festa sem que me notassem. Todos estavam preocupados demais em ir para a tenda e aproveitar tudo que podiam. Aproveitei para sair antes mesmo de segui-los e fazer alguém sentir minha falta. Entrei pelas portas do castelo logo atrás da princesa e de Alaric, dando uma distância boa o suficiente para não me ouvirem ou se virarem. Até entendi um pouco da conversa deles, mas eles eram dois que eu já tinha praticamente riscado da minha lista de suspeitos. No curto encontro que tive com a Lola andando pelo castelo, ela tinha me parecido bastante honesta. Talvez até demais. Poderia jurar que ela conseguiria guardar um segredo e criar planos políticos à perfeição. Mas demonstrava pouco interesse em Illéa, mesmo com sua Seleção sendo aqui. E Alaric, bom, ele realmente pensava em pouca coisa além da própria princesa.
Os guardas do segundo andar faziam rondas, mas não mantinham seus postos parados. Os do primeiro nem se importaram quando eu subi, provavelmente presumindo que iria para o meu quarto. Fiz até questão de subir pelas escadas laterais, já que eram mais perto de lá. Mas passei da minha porta a alguns metros dos guardas da ronda até chegar na do Keon.
Abri o mais cuidadosamente que podia, para que não me ouvissem. Mas, uma vez aberta, entrei rápido e a fechei atrás de mim.
O quarto estava vazio, como eu imaginava que estaria. Ele provavelmente estava ocupado na festa recebendo parabéns de todos e o que quer que fosse que ganharia depois de ter vencido a competição. Era bem por isso que eu tinha escolhido vasculhar o quarto dele naquela hora. O castelo estava deserto por causa da festa e ninguém apareceria por ali tão cedo.
Tudo estava muito bem arrumado. Desde o violão apoiado do outro lado do quarto, até sua escrivaninha. Ele não parecia ter passado muito tempo lá dentro. Até consideraria aquele um lugar que ainda esperava seu hóspede. As criadas realmente valorizavam seu trabalho.
Fui até o guarda-roupa, a primeira prova de que alguém vivia ali. Suas roupas estavam meticulosamente dobradas e separadas por cores, cada camisa pendurada junto com o terno que combinaria com ela. Cada sapato polido e do lado da meia que iria com ele. Era até arrumado demais, mas eu não esperava outra coisa de Keon. Ele parecia ser do tipo que não gostaria de perder tempo escolhendo ou vetando roupas. Tudo precisava ser prático, durar o mínimo de tempo possível para ser realizado. Mas o que me fazia querer descobrir mais sobre ele era que ele mantinha o máximo possível das suas coisas pessoais para ele. Era um dos únicos que eu ainda não conhecia direito. Era o mais difícil de investigar, apesar de seus pais e sua conexão tão próxima à família real illéana quase o transformar em pessoa pública.
Chequei nas suas gavetas, mas seria praticamente impossível ele esconder algo ali, sendo que suas coisas mal ocupavam espaço todas dobradas. Depois olhei dentro de cada sapato, não gastando tempo demais em nada. E então fui para a sua cama. Passei a mão pelo lençol tentando sentir alguma coisa, algum desnível. Mas não tinha nenhum. E mesmo quando levantei o colchão, não tinha nada ali. Voltei a arrumar a colcha e passei para o criado-mudo.
Nada de importante, praticamente nada de banal. Ele não devia ter coisas o suficiente para encher um quarto inteiro quando só estava de passagem. Olhei até dentro do violão, mas estava tudo normal.
Quando estava indo para o banheiro, ouvi um barulho do outro lado do corredor. Poderia facilmente ser os guardas voltando com a ronda, mas não queria arriscar. Entrei dentro da banheira e me abaixei o máximo possível. Contei minhas respirações e deixei o ouvido aberto para qualquer indício de que alguém estava para entrar. Tinha fechado a porta do banheiro e estava longe o suficiente para não ser visto por alguém que fosse até a pia. Mas ainda tinha o perigo de quererem ir exatamente aonde eu estava.
Depois de alguns minutos sem ouvir nada, fui até a porta e encostei meu ouvido. Não conseguia detectar nenhuma movimentação no quarto e, depois de abrir só uma fresta, percebi que não tinha mesmo ninguém ali.
Voltei correndo para a pia, procurando nas gavetas do armário, atrás do espelho, qualquer azulejo que estivesse levemente solto. Nada. Nem na banheira, nem em lugar nenhum que eu mesmo escolheria como esconderijo.
Quando voltei para o quarto, comecei a sentir as tábuas do chão com as mãos. O castelo não era muito antigo e elas estavam impecáveis. Mesmo embaixo da cama, nenhuma parecia solta. Mexi o criado-mudo, depois a cômoda, tudo que podia. Levantei quadros, tateei todo o rodapé. Um ritual que eu já tinha aplicado em vários outros quartos. Já estava começando a me dar por vencido. Eu mal encontrava fotos de Keon e da sua família, o mais pessoal de seus objetos era a escova de dente.
Até que eu cheguei na escrivaninha perto da porta. De fora, ela estava também meticulosamente limpa e organizada. Mesmo que usasse luva, me aproximei sem tocar em nada, com medo de um simples movimento denunciar minha presença ali. Os pesos de papel, os bloquinhos e cada caneta estavam um do lado do outro com a mesma distância entre eles. Nem tinha muito o que eu ver ali.
Até que percebi que a primeira gaveta era trancada. Tirei a mini que tinha entre ela e a mesa, propositalmente ali para guardar poucos papéis. Rapidamente consegui abrir a fechadura e dar uma olhada no que ele tanto guardava em segredo.
A primeira coisa que vi era uma foto dele e seus pais. E duas pessoas que eu não conhecia. Mas aquilo me importava pouco.
Me sentindo à vontade, me sentei na sua cadeira e puxei os papéis da gaveta para fora. A coisa que mais me chamou a atenção era uma pasta, como de um caso jurídico. Abri para encontrar uma proposta firmada por ele que deveria encontrar seu caminho até a princesa. Passando os olhos rapidamente por cima, vi que ele queria que ela o ajudasse a criar um projeto de inclusão social entre as maiores potências do mundo.
Aquilo me interessava um pouco. Fiz questão de passar os olhos por cada linha mais algumas vezes, esperando guardar com a minha memória fotográfica. Mas nenhuma palavra me saltou aos olhos, nada que estava perto das conversas que eu tinha interceptado enquanto trabalhava na Agência.
Passando a página, percebi que o arquivo tinha outras coisas. Pesquisas feitas por ele e psicólogos, médicos especializados em pediatria e outras coisas. Entrevistas com pessoas normais, parâmetros do passado para ajudar a convencê-la. Nada de especial, tudo esperado.
Mas, ao final, vários papéis estavam em branco. Um, dois, três, quase vinte papés em branco, mas ainda assim guardados dentro da pasta. Talvez ele quisesse escrever mais, fazer algum tipo de pesquisa pelo castelo. Mas ainda não o tinha ouvido falar daquilo nenhuma vez. E, se fosse isso, por que simplesmente não guardava os papéis em outro lugar?
Guardei de volta na gaveta, procurando o quê mais estava ali. Uma caneta simples, cinza, que eu testei em um dos bloquinhos e não fazia nada demais. Peguei o papel rabiscado e guardei no bolso. Aquele quarto me dava a impressão de que até o lixo seria inspecionado.
Outra coisa que era guardada por chave na sua escrivaninha era uma caixa pequena de papelão. Já estava aberta e eu só tive que forçar um pouco para conseguir ver o que estava dentro.
Era um potinho como de nanquim. Mas estava vazio. Nem tirei de dentro da caixa. Só a fechei e enfiei a mão um pouco mais fundo na gaveta para ver se alguma coisa estava me passando despercebida.
E encontrei uma! Era a última coisa que estava ali dentro, um caderno pequeno de anotações. Estava todo animado quando o abri, mas só encontrei mais páginas em branco. Sua capa estava um pouco sofrida, parecendo ter sido carregada para todos os lados. Mas as folhas estavam intocadas.
Estava para fechá-lo de volta, já desanimado pela falta de pistas em mais um quarto, quando percebi que a contra capa estava em relevo. Passei minha mão para ter certeza de que não era só um amassado. Mas não, era exato. E, ao ver contra luz, percebi que era um desenho.
Não consegui entender direito o que era para ser, só eram linhas em diferentes direções. Peguei meu celular e tirei uma foto, para não me perder na minha memória com algo que eu mal conseguia enxergar em pleno presente.
Quando fui colocar o caderno de volta na gaveta, vi que sua pasta de papel tinha o mesmo desenho! Era grande e no meio, apesar de ser só um tom mais escuro que a cor da pasta e já parecer desgastado. Ainda não sabia direito o que era. Tinha a leve impressão de que já o tinha visto antes, mas ainda não me lembrava de onde.
E, logo embaixo dele, um nome, quase ainda mais difícil de se enxergar: Projeto Leone.
Leone, repeti na minha cabeça. Aquilo poderia significar qualquer coisa. Mas eu pesquisaria depois. Keon ainda não estava completamente fora da minha lista de suspeitos.
Ouvi outro barulho do corredor, dessa vez tinha certeza que eram os guardas. Eles não só andavam, mas riam de algo. E o barulho da sua conversa ia na direção contrária ao meu quarto. Estava na hora de eu sair dali, ou teria que esperar mais uns dez minutos.
Peguei de volta a mini gaveta de papel e coloquei em cima da que era trancada a chave. Estava para fechar a outra, quando percebi que a caixinha de papelão tinha uma etiqueta que tinha me passado despercebida. Não consegui um endereço, nem nada parecido. Só três palavras. POUR BEASTINGS ARENE.
Pour Beastings Arene, repeti na minha cabeça várias vezes, tentando guardar. E então fechei a gaveta e fiz o serviço contrário de abrir uma fechadura. Depois de forçá-la e perceber que estava realmente trancada, me levantei e olhei em volta. Precisaria deixar tudo imaculado, senão perceberiam que alguém tinha entrado ali. Voltei a cadeira para o seu lugar, arrumei mais uma vez a colcha da cama, contando na minha cabeça o tempo que levaria para os guardas aparecerem do lado do corredor aonde poderiam me avistar.
Quando estava satisfeito, fui até a porta. Respirei fundo, relembrando o pouco que tinha encontrado e que só criava outras dúvidas na minha cabeça. E então saí de lá.


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