Do Outro Lado do Oceano escrita por Laura Machado


Capítulo 69
Capítulo 69: POV Kyle O'Malley


Notas iniciais do capítulo

Escrevi ouvindo "99 Biker Friends" do Bowling For Soup.



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Quando dei minha ideia da festa na piscina para Clarissa, não sabia que estava praticamente me voluntariando para organizá-la. Se soubesse, a teria deixado sem ideias. Ou pensaria em algo bem mais fácil, bem mais simples.
Fazia três dias que eu tinha aberto minha boca e insistido para que fizéssemos uma competição. E, no primeiro, eu estava animado. Animado demais. Vinte piscinas, tiro ao alvo, arco e flecha para atirar em balões de água jogados no ar. Não tinha nenhum filtro, então só fui vomitando ideias. Por sorte, Clarissa estava junto e conseguiu diminuir tudo que as leis da física tornavam impossível. Ela também deu outras ideias e ajudou a tornar as que eu mais gostava mais fáceis. Mas ainda assim, eu não sabia que aquele primeiro passo era o mais simples.
O próximo seria trazer aquilo para a realidade. E eu jurava que eu estaria livre daquilo. Eles já tinham se beneficiado da minha mente brilhante, já era o suficiente na minha opinião. Mas não. Marlee Woodwork, que eu nem sabia direito quem era, me carregou para todos os lados para ter certeza de que tudo estava acontecendo do jeito que eu tinha planejado. E ainda fez questão de me fazer perguntas e me obrigar a tomar decisões.
Mas era quarta-feira e eu andava pelo jardim com mais do que cansaço. Eu tinha também um certo orgulho. Tinha ido dormir no dia anterior às nove da noite, exausto até meus ossos. Mas tudo estava dando certo. Tudo estava sendo montado perfeitamente, faltando poucos parafusos aqui e ali. E eu que tinha trabalhado naquilo. Era fruto do meu esforço.
Tudo bem que não tinha chegado a apertar um só dos parafusos. Mas mesmo assim.
Conforme fui passando por cada uma das instalações, fui repassando na minha cabeça tudo que aconteceria naquela tarde. Era bem cedo, o dia mal tinha começado a amanhecer na minha opinião. O relógio batia dez horas, mas eu já estava de pé trabalhando. Surpreendente, mas nem parei para me questionar.
Começaríamos com uma guerra de bexigas bem simples. Quase um paintball, mas menos violento e com um espaço bem menor. Claro, teria que ser visível do alto trono que tínhamos colocado para Lola (e para mim, é claro). Era o menor dos espaços, quase só o suficiente para uma partida de futebol entre dez amigos. Ficava logo do lado dos portões do jardim, o que deixaria bem desconfortável para convidados passando pelo caminho atrás com o intuito de chegar às arquibancadas.
Mas isso só provava que nós teríamos que esperar que todos tivéssem chegado antes de começarmos. A família real - e até a Lola - tinham feito questão de convidar o máximo de pessoas possível. Queriam transformar em um grande acontecimento, com câmeras para todo o lado, que transmitiriam cada jogo para os quatro cantos do mundo. Só de pensar que algo que eu tinha criado seria assistido por pessoas até na Nova Austrália me animava. Estava mesmo na hora de eu aparecer menos na televisão como o criador de problemas e começar a tomar o trono do meu irmão de queridinho da Irlanda.
A melhor parte era que, se tudo desse errado, eu poderia culpar outra pessoa. Marlee, por exemplo. Ela que organizava coisas no castelo. Era minha primeira vez e eu nem tinha pedido toda aquela responsabilidade. Claramente tinha sido loucura dela confiar em mim para fazer tudo aquilo.
Isso se desse errado.
Mas aparentemente tudo estava indo bem. Fui andando até a piscina, a única que tinha no castelo, que ficava bem de frente ao trono. Como centro da festa, metade das coisas aconteceriam ali. E nós só precisávamos preparar tudo.
Por sorte, ela era grande e, mesmo dividida ao meio por um iceberg inflável de escalada, ainda sobraria bastante espaço para os outros jogos. Quando eu cheguei perto dela, os caras a estavam tampando. As dez ripas de madeira que ficariam do outro lado do iceberg estariam escondidas até a hora do circuito aquático. Eram difíceis de instalar, já que apoiavam de um lado no fundo da piscina e tinham que medir certinho para dar espaço para todos os selecionados caírem e terem que voltar ao começo quando isso acontecesse. Era a única coisa que os contra-regras já deixavam preparada.
O segundo jogo seria um cabo de guerras onde a ideia era jogar a outra dupla na piscina. Um mata-mata simples, quem perdesse saía. Até só sobrar uma dupla invicta. Como a primeira fase seriam cinco duplas, a que demorasse mais para tirar o outro estaria também eliminada.
Depois, o terceiro seria as duplas caçarem moedas embaixo da piscina para juntar um certo dinheiro e comprar a quantidade de chaves que quisessem para tentar abrir o grande baú que seria colocado do lado da piscina. Dentro dele estaria um prêmio extra de deixar a dupla se sentar no trono da gente com a princesa. Não era grande coisa, mas mesmo assim. Passei pela mesa aonde eles 'venderiam' as chaves aos selecionados. Cada dupla era formada por um deles e um convidado. E eles teriam as mesmas chaves para comprar, mas a certa era diferente para cada um.
Eu não sabia exatamente qual era a que abria o baú. No começo, eu tinha tentado decorar. Mas era difícil demais e acabei desistindo. Não estava competindo, não era problema meu.
Mas alguns dos jogos me davam vontade de competir. Como o próximo, que era o circuito na piscina. Começando com todos os selecionados e suas duplas em bolhas gigantes. Aquela fase seria a pior. Eu já tinha aquilo como um hobby e já tinha pegado as manhas. Mas não era fácil. Ia ser muito engraçado vê-los tentando se equilibrar. Eu mal podia esperar.
Chegando até o iceberg, eles teriam que abrir a bolha de dentro e cair na piscina, depois começar a escalá-lo. Não ia ser nada fácil, quanto mais molhados. Mas ainda assim parecia muito legal. E a última parte, por menos divertida que fosse, era uma das mais difíceis. Os caras tinham que descer direto do outro lado do iceberg para as ripas. E se equilibrando em oito centímetros de madeira, teriam que andar até o final da piscina.
Depois daí vinha a grande razão de termos transformado aquela competição para duplas. Segundo Lola, além de que ajudaria os selecionados a fazerem outros amigos, seria loucura colocá-los para participar do próximo jogo sozinhos.
A mesa era a mesma de onde as chaves estariam. Mas seria dividida em sessões para que cada dupla tivesse vários picolés. Eles teriam que usar os palitos para construir uma coroa com cola e sei lá mais o quê. Mas os picolés estavam inteiros e eles teriam que chupar um por um.
Aquele era um jogo do qual eu não queria participar.
Com a festa começando às duas e meia da tarde, a última parte da competição provavelmente só aconteceria mais de noite. Além de ser a que mais valeria pontos, era a que precisava de mais preparativos. Teriam que tirar as ripas de madeira, o iceberg e tudo que já tivesse acontecido ali. Em toda a piscina, vários balões neons seriam espalhados. Embaixo d'água e fora também, em vários níveis. E em só um deles, estaria um prêmio extra. Nem a princesa sabia o que era. A ideia foi minha. E a minha parte preferida daquela festa inteira seria ver a cara dela quando ela descobrisse o que era. Mal podia esperar!
Cada uma das partes da competição valeria pontos. E quem tivesse mais ganharia um encontro com a princesa na praia. O selecionado, não a dupla. A dupla só estava ali de graça, para queimar a boca com os picolés e não levar crédito algum.
A piscina realmente era imensa. Normalmente estava ocupada de fontes submersas e escondida por flores ao redor. Mas se eles realmente soubessem do que era bom na vida, a usariam mais. Ela era incrível. E o comprimento era perfeito para podermos colocar todas as pessoas que vinham nos visitar que faziam parte da família real do lado dos tronos. Mas a parte mais alta ainda era a da Lola, com lugar especial para Clarissa e um menos especial para mim. Ambos seriam ocupados pelos ganhadores da prova do baú durante a festa, mas pouco me importava. Nessa hora, as câmeras estariam na tenda do lado da arquibancada que circulava quase toda a area da competição. E eu provavelmente estaria no bar.
Me virei para ver os caras montando a tenda. Não tinha a menor inclinação de ir até lá. Era Marlee que cuidava dessa parte.
Estava só passando os olhos pelo jardim, percebendo como estava diferente de qualquer festa que já tinham dado ali, quando eu pude jurar ter visto Karen.
E que hora! Eu estava com a carta dela dentro do meu blazer, só esperando encontrar Clare para lhe entregar. Seria bem mais da hora se eu pudesse entregar diretamente para ela.
Ela estava passando atrás das arquibancadas e meu instinto foi ir até lá, mas era impossível eu conseguir passar no meio delas com o pano que colocaram para os convidados não se sujarem. Tive que dar a volta correndo, com medo de perdê-la de vista. Já tirava sua carta do bolso, quando consegui chegar lá. Mas não tinha ninguém por perto.
Fui direto para a tenda, o único lugar aonde ela poderia ir sem que eu a visse dali. Fiz questão de levantá-la para entrar por ali mesmo e não dar a volta e usar a 'porta'. E assim que estava lá dentro, a vi conversando com a Marlee bem no meio das mesas.
"Karen?" Chamei, mas ela não se virou.
Eu não estava louco. Tinha certeza de que era ela. O cabelo enrolado, o jeito que ela virava o pé, ameaçando torcê-lo enquanto conversava com Marlee. Era ela, tinha certeza.
Esfreguei minhas duas mãos na calça, trocando a carta de lado algumas vezes. Não queria estar suando quando chegasse perto dela. Aproveitei e arrumei meu cabelo e a gola da minha camisa. Ajeitei tudo que podia e então, me fazendo de distraído, fui até elas.
"Woodwork, já checou se todos os selecionados tem duplas?" Cheguei perguntando, como se realmente me importasse com aquilo.
"Já, Alteza," ela disse, não parecendo nem um pouco feliz de eu tê-la interrompido.
Mas eu não me importava se ela estava de saco cheio de mim. Meus olhos estavam na garota ao seu lado, que se virou devagar para mim quando eu cheguei até ela.
Não era Karen. Era Clarissa. Eu mal podia reconhecê-la. De roupão, por incrível que parecia, mas já arrumada. E estava completamente diferente.
"Uau," eu falei, sem pensar direito.
Clare arregalou os olhos, com medo. Ela devia achar que tinha alguma coisa errada, pois logo levou a mão ao cabelo.
"Você está linda," me apressei para dizer.
Nem estava tão desapontado por não ser Karen. Já tinha me acostumado a não encontrá-la. Mas era estranho ver Clare daquele jeito. E ela também parecia estar achando aquilo estranho, pois olhou mil vezes para o chão nos poucos minutos que eu estava ali.
"Obrigada," ela respondeu, logo em seguida do meu elogio. Mas ela praticamente cochichou, o que me fez ficar a olhando por bem mais tempo do que o normal.
Quando ela finalmente levantou o rosto e nossos olhos se encontraram, eu ri nervoso.
"Vou dar uma conferida na piscina," falei, apontando para trás de mim, apesar de ter acabado de vir de lá.
Ela concordou com a cabeça, mas eu não me movi na hora. Não era nem que minhas pernas não me obedeciam, meu cérebro simplesmente não tinha dado a ordem. Eu já devia tê-la visto daquele jeito algum dia, apesar de só conseguir lembrar dela nas festas de Lola vestida de criada. Mas tinha alguma coisa muito familiar ao jeito que ela afastava os cachos do rosto. Como eu pude ter me esquecido de quando ela tinha estado tão bonita? Era bem o tipo de coisa que eu fazia questão de me lembrar para sempre.
"E então?" A voz de Marlee me acordou. "Você não vai checar a piscina?"
"Ah," me virei para olhá-la. "Claro, vou," levei uma mão ao peito e senti a carta dentro do blazer. Não era a Karen, mas pelo menos eu podia entregá-la de um jeito ou de outro. "Clare," falei, voltando a mirá-la. Ela sorriu, de um jeito esquisito. Era quase como se ela estivesse bonita demais para que qualquer expressão parecesse natural. "Tem como você entregar para mim?" Pedi, tirando a carta do bolso e a segurando à sua frente.
Ela olhou para o envelope por alguns segundos, parecendo tentar lembrar o que era aquilo. Eu não queria explicar na frente de Marlee, mas precisava ter certeza de que ela sabia o que eu estava pedindo.
"É para a-"
"Eu sei," ela me cortou, pegando a carta da minha mão. "Achei que tivesse desistido," acabou falando, quase como se aquilo fosse motivo de decepção para ela.
"Não," eu disse. "Demorei porque não sou muito bom de escrever. Talvez você possa me ajudar da próxima vez-"
"Não," ela me cortou outra vez, com urgência. "Cartas ruins e autênticas são bem melhores do que boas e falsas," concordei com a cabeça, mas ainda assim não me mexi. Nem me deixei olhar para nenhum outro lugar. Mesmo que fosse o cabelo, ou sei lá o quê que ela tinha passado na cara toda que a deixava tão bonita, eu ainda só conseguia olhar para seus olhos. E desviar deles só foi possível quando ela continuou falando. "Marlee, vamos ver se a princesa está pronta?" Ela se virou para ela e as duas saíram da tenda, me dando um sorriso e pedindo para eu avisar se tivesse algum problema com a piscina.
Eu as segui com os olhos até que estivessem no castelo. E ainda fiz questão de ir até as portas do jardim para conseguir ver um pouco mais enquanto elas subiam as escadas.


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