Do Outro Lado do Oceano escrita por Laura Machado


Capítulo 67
Capítulo 67: POV Alicia Collins


Notas iniciais do capítulo

Escrevi ouvindo "Amnesia" do 5 Seconds of Summer.
Antes que vocês animem, eu não costumo ouvir essa banda. Foi a primeira vez hoje e só porque a menina que criou a Alicia gosta.
Essa música é a que aparece no capítulo.



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Já faziam algumas horas que eu estava me revirando na cama, mas finalmente me dei por vencida e escorreguei para fora. Não me levantei, me escorreguei. Não teria ânimo o suficiente para esticar as pernas. Só o mínimo possível para conseguir colocar os pés nos chão e enrolar a coberta em volta de mim no caminho até o banheiro.
Estava encurvada, mas alta o suficiente para enfiar a cara embaixo da torneira. Nem fiz questão de abrir os olhos, só tentei mirar meu nariz e rezei para conseguir chegar na água.
Mas a torneira era curta demais e o máximo que eu conseguia era molhar minha bochecha e meu queixo. Longe de ser o que eu precisava se eu quisesse continuar vivendo.
Me estiquei para olhar no espelho. Eu estava horrível. Absolutamente horrível. Era um monstro que estava olhando de volta para mim. Cabelo indo em todas as direções, olheiras profundas e cara de que estava realmente morrendo. E minha mãe tinha dito que era só uma gripe!
Tentei respirar fundo, sem o menor sucesso. Nem um pouco de ar conseguia entrar pelo meu nariz, nem o mínimo possível. Estava entupido demais, e respirar pela boca estava me sufocando. Era engraçado pensar que um buraco tão maior podia conseguir bem menos ar. Estaria rindo alto e ouvindo ecoar pelo banheiro, se minha vontade maior não fosse de chorar.
Droga. Eu só queria por um segundo me sentir como se não estivesse sido atropelada por um caminhão.
Abri de novo a torneira, forçando um pouco mais para tentar fazer chegar até meu nariz. Tentei outros ângulos, apertei minha cara contra a porcelana pra ver se funcionaria. Mas nada. Absolutamente nada. E quando me olhei no espelho de novo, tudo que eu tinha conseguido era outra mancha vermelha na minha bochecha.
Na frustração, mandei a coberta pra longe. Ela caiu dentro do chuveiro, que, por sorte, estava seco. Eu já ia espernear que meu azar era grande demais quando avistei uma coisa bem interessante.
O chuveirinho. Corri pra arrancar minha coberta de lá e jogá-la pra dentro do quarto. Depois puxei o chuveirinho até estar em cima da pia. Sorte que meu banheiro era minúsculo. Abri e vi a água começar a sair. Respirei fundo e então o mirei na direção do meu nariz.
Um jato bem mais forte do que eu estava esperando entrou pela minha narina e chegou até o fundo do meu cérebro. Em um milésimo de segundo eu estava engasgando, o chuveirinho no ar e molhando todas as paredes. Mas eu não me importava. Tinha ido de mal a pior. De gripada a sem cérebro. Podia sentir o caminho que a água tinha feito, entrando pelo nariz e saindo na minha garganta, que agora arranhava. Tossi e cuspi o que podia, e acabei sendo forçada a assoar o nariz, uma coisa que eu odiava.
Mas quando voltei ao controle da minha pessoa - e do chuveirinho, - tive que admitir uma coisa. Eu já podia respirar de novo. Milagrosamente, tinha funcionado! Claro que, se eu tivesse alguma ideia antes de que seria tão brusco e dolorido, teria pensado bem antes de levar isso adiante. Mas o alívio era quase mágico. Então me forcei a sofrer mais um pouco e fazer a mesma coisa com a outra narina.
Quando me arrastei de volta para a cama, não estava muito melhor. Sim, eu conseguia respirar pelo nariz. Mas não muito bem. Quase nada, aliás. O que continuava sendo melhor que nada, mas longe do que eu tinha sonhado para aquela noite.
Eu amava minha cama, mas já não era mais tão confortável como nos outros dias. Revirei mais algumas vezes, trocando de lado quando meu nariz entupia de novo e rezando para adormecer e não ter que ficar mais nem um segundo aguentando aquilo. Nem conseguia abrir os olhos direito que já sentia meu nariz latejar. Ver TV seria impossível. Tentei pegar um livro para ler, mas a página era branca demais e eu não consegui passar da primeira frase. O mundo inteiro tinha luz demais. Preferia ficar no escuro.
Mas eu tinha passado praticamente a noite inteira dormindo. Era quase meia noite e eu já não estava mais cansada. E tudo porque minha mãe tinha insistido que eu não deveria trabalhar de nariz entupido, que era coisa de gente nojenta.
Que era nojento, eu entendia. Mas minha mãe tinha prometido que se eu descansasse, evitaria ficar doente. Mas eu não acordei melhor. Eu acordei bem pior. Completamente pior. Eu mal conseguia me levantar! E agora, horas depois, eu estava no mesmo estado múmia enferma.
Me encolhi na cama, numa luta entre decidir se estava com calor e queria aquela coberta o mais longe possível de mim e morrer de frio e não conseguir sobreviver sem ela cobrindo cada centímetro até a minha cabeça. Estava com ela passando das minhas orelhas, quando ouvi alguém bater à minha porta.
Coloquei a cabeça para fora. Eu devia estar imaginando. Era quase meia noite. Quem viria me ver?
A batia se repetiu. Devia ser minha mãe. Fechei os olhos, fingindo que estava dormindo. Não sabia bem porque, era só instinto. Fiquei o mais imóvel possível, ouvindo a porta se abrindo e depois se fechando.
Isso era estranho. Ela já tinha ido embora? Ou ela estava querendo ficar ali? O normal dela era simplesmente checar pra ver se eu estava respirando e ir embora. Mas costumava me dar um beijo antes.
Eu ouvi passos. Quase os contei, tentando deixar minha respiração o mais normal possível, o que não era nem um pouco fácil quando eu mal conseguia fazer o ar chegar até meus pulmões.
Tinha acabado de discretamente abrir minha boca, quando senti um toque no meu ombro.
"Alicia?" A voz não era da minha mãe. Nem era de mulher. "Você tá acordada?"
Tive que abrir os olhos. Tive que ver se eu não estava imaginando aquilo.
Pisquei várias vezes para conseguir enxergar o máximo possível. Meu quarto não estava tão escuro, a luz de fora do castelo deixava impossível chegar a um breu completo (ainda bem). Mas eu devia estar realmente imaginando aquilo. Porque Thor não podia simplesmente estar no meu quarto. Não àquela hora. Não assim.
"Uau, o remédio é mesmo bem forte," falei, esfregando meus olhos. "Pra chegar a dar alucinações."
Ele se esticou na minha direção e me deu um empurrãozinho no ombro. "Não sou uma alucinação."
"Isso é exatamente o que uma alucinação diria," eu falei, me sentando e limpando discretamente meu nariz e o suor da minha testa com um lenço.
Thor procurou uma cadeira e se sentou perto da minha cama. Aquela era a prova de que ele estava mesmo ali. Eu não podia simplesmente estar imaginando uma cadeira se mexendo sozinha, não é?
"O que você tá fazendo aqui?" Perguntei, me esticando até ele e dando um toque de volta no seu ombro. "Uau, você é mesmo de verdade."
"Falei," ele disse, enfiando a mão dentro do terno que ele ainda usava e tirando um saco pequeno de papel. "Valerie disse que você estava doente. E eles serviram brownies de sobremesa."
Assim que ele falou a palavra, eu ataquei o saco, trazendo-o para mim. Thor só riu da minha reação.
"E você simplesmente trouxe a melhor do comida do universo para mim?" Perguntei, já abrindo o saco e enrolando em volta do pedaço para servir de guardanapo.
Foquei nele por um segundo antes da primeira mordida. Queria segurá-lo com as duas mãos, apreciá-lo e abraçá-lo com os olhos. Era muito amor em forma de chocolate assado e eu precisava saborear com todos os sentidos. Fiz até questão de cheirá-lo antes de me deixar aproveitá-lo como deveria.
"Na festa," Thor disse, se inclinando na cabeça. "Você atacou todos os pedaços que podia dos brownies e não estava nem aí pra mais nada."
"Precisava guardar espaço para as coisas importantes," expliquei, com a boca um pouco cheia.
Ele sorriu para mim, mas logo seu sorriso desapareceu. "E o que você tem?"
Dei de ombros.
"É só um resfriado ou doença contagiosa?" Ele continuou. "Devo me sentar um pouco mais longe?"
Balancei a cabeça, mas esperei ter engolido o pedaço que comia antes de responder. "Pode sentar até no meu colo, se quiser," falei. "Apesar de que, só para você saber, resfriado é contagioso."
"Mas nada que precisa de quarentena, então não conta," ele disse. "Aliás, vou cobrar essa oferta sua," terminou, piscando um olho.
Eu revirei os meus, fazendo-o rir.
"Como você chegou até aqui?" Perguntei, mordendo o penúltimo pedaço do brownie com pesar de saber que estava acabando.
Thor olhou para o quarto, como se tentasse ver tudo que tinha ali. "Segui um guarda aí," ele falou. "É um que normalmente fica de dia no corredor, mas nunca de noite. Achei que fosse me trazer para o dormitório. Agora, achar seu quarto, isso foi mais difícil."
"Como conseguiu?"
"Perguntei pra ele. Que era seu irmão, aliás."
"Chris," falei, sorrindo e colocando o último pedaço de brownie na boca.
"É, ele achou estranho eu vir-"
"Porque é estranho," não pude perder a chance de falar, mesmo que ainda estivesse mastigando.
"Não é estranho," Thor se defendeu, se inclinando pra frente e se apoiando nos joelhos. "Você é minha amiga e está doente, vim ver se você precisa de alguma coisa."
"Você é um selecionado e eu sou uma criada, é estranho."
"Não é-"
"É sim!"
"Você que é," ele acabou dizendo, pegando uma almofada da minha cama e jogando na minha cara.
Juro que o mundo inteiro balançou quando ela me atingiu.
"Outch," eu falei, tentando fazer meu cérebro se acostumar com a estabilidade de novo. "Para quem veio ajudar uma amiga doente, você está fazendo um péssimo trabalho."
"Desculpa," ele pediu, se ajoelhando no chão para chegar mais perto de mim. "Sério, eu devia ter pensado melhor."
Ele pegou a almofada e a abraçou. E então me olhou como se não fosse conseguir viver mais nem um segundo sem meu perdão.
"Tá desculpado," falei. "Mas só porque você me trouxe um pedaço de brownie! Que fique avisado que próximos ataques serão retribuídos."
"Tá avisado!" Ele voltou a se levantar, mas dessa vez se sentou na cama, então fui para o lado, abrindo espaço para que ficasse do meu lado.
Nós não cabíamos perfeitamente lá. Ele era bem maior do que seu rosto de criança deixaria parecer. Ele era alto e comprido e nós tivemos que ficar praticamente competindo pelo espaço dos nossos ombros.
"E como foi o encontro?" Perguntei, me esticando por cima dele e pegando um lenço, caso precisasse. "Não tive chance de te perguntar. Ela se apaixonou por você?"
"Só de ela não ter adormecido em cima de mim, eu já me considero vitorioso," assim que ele falou, eu abri a boca de surpresa e arregalei meus olhos. "Por tédio," ele completou, me acalmando. "Ela não parecia nem me ouvir."
"Talvez Mitologia Grega seja chato demais para ela."
"Mitologia Grega é a coisa mais legal do mundo," ele se defendeu, levantando tanto a voz, que eu tive que levar um dedo à boca. "Ah, mals."
Mas o problema não era só alguém nos ouvir. O que mais me incomodava era como tinha um ponto exato da minha cabeça que parecia sentir a voz dele mais do que o resto. Eu tinha decidido ignorá-lo, já que tinha estado ali desde que tinha acordado. Mas conversar estava me cansando e piorando.
"Nem sei o que vim fazer aqui no castelo, pra te falar a verdade," Thor continuou. "Sei lá o que ela estava pensando quando me escolheu."
"Ei, tem candidatos muito piores do que você-"
"Valeu."
"Não, sério," lhe dei uma empurradinha com o ombro. "Pelo menos você não a está traindo."
Thor se afastou um pouco da cabiceira da cama para poder me olhar sério. "Você não contou para ninguém, né?"
Revirei os olhos. "Não. Mas não é justo, sério. Que tipo de pessoa você pensa que eu sou? Como você acha que eu sou forte o suficiente para guardar uma fofoca dessas?" Foi minha vez de levantar a voz e senti-la ecoando dentro da minha cabeça.
Thor voltou a se apoiar. "Eu não contei para ninguém. E nem quis," ele disse, me fazendo bufar uma risada. "Mesmo assim. Não sei porque estou aqui. Eu nunca vou ganhar isso. Duvido que algum dia a princesa me enxergue. Vou ter é que correr para ler os diários antes que ela perceba que eu não pertenço aqui."
Eu estava ouvindo, estava mesmo. Mas quanto mais palavras ele dizia, menos eu conseguia prestar atenção. Sem nem pensar direito, eu esfreguei minha testa, bem no meio, bem aonde me doía.
"Você tá bem?" Ele perguntou, me fazendo perceber que eu estava de olhos fechados e os abrindo de novo.
Não, eu não estava bem. Quase não me restava forças para olhar para ele. E o sono que eu tanto queria antes estava começando a bater.
"Não," admiti. "Eu estou morrendo," falei, me encolhendo embaixo da coberta, que ele estava sentado em cima e impedia de eu conseguir me cobrir inteira.
Ele percebeu que eu a estava puxando e se levantou. Eu aproveitei para deitar.
Ele fez menção de ir até a porta. "Vou te deixar dormir então-"
"Não," eu segurei a mão dele a tempo de ele nem tentar alcançar a maçaneta. "Pode ficar," falei. "Gosto da companhia."
Eu não sabia bem porque queria que ele ficasse ali. Só não queria ficar sozinha.
Thor não contestou. Eu fechei os olhos, mas dei mais espaço para ele na cama. Ouvi quando ele tirou os sapatos e senti quando ele deitou do meu lado.
"Me fala dela," eu pedi. "Da princesa, você gostou dela?"
Pude ouvir quando ele respirou fundo. "Ela não é para mim," ele disse. "Já conheci muitas meninas como ela na vida e já percebi faz tempo que nós somos de mundo diferentes."
"Você já conheceu várias princesas?" Perguntei, abrindo meus olhos para ver sua reação.
Quando voltei a descansar a cabeça no travesseiro, aproveitei para fazer outra massagem na minha testa.
"Dor de cabeça?" Ele perguntou.
"Melhor que febre," respondi. "Mas ainda assim, infernal."
Não esperei ouvir a resposta dele. Para falar a verdade, eu estava já sentindo que ia dormir em poucos segundos. Repetia na minha cabeça que eu deveria falar alguma outra coisa, inventar um assunto. Mas já não tinha controle da minha boca.
"I drove by all the places we used to hang out getting wasted," Thor cochichou do nada, me fazendo abrir os olhos na hora, bem mais desperta.
O que ele estava fazendo?
"I thought about our last kiss, how it felt, the way you tasted," ele continuou, só então pegando um pouco de ritmo.
Ele estava mesmo cantando? Ou aquela sim era uma alucinação do remédio?
"And even though your friends tell me you're doing fine," ele não parou e eu fechei meus olhos, tentando não atrapalhar, "are you somewhere feeling lonely even though he's right beside you? When he says those words that hurt you, do you read the ones I wrote you?"
Aquilo era muito esquisito. Quem cantava do nada?
Tá, eu cantava do nada. Mas eu me achava esquisita por aquilo. E o que tinha dado na cabeça dele de cantar?
"Sometimes I start to wonder, was it just a lie?" Ele não era muito bom. Ele só estava cochichando, mas eu ainda poderia apontar como ele desafinava. "If what we had was real, how could you be fine? 'Cause I'm not fine at all."
Mas quanto mais ele cantava, menos eu me importava. Menor minha vontade de rir. Menos estranho tudo aquilo parecia. Pelo contrário, parecia a coisa mais graça que alguém poderia ter feito por mim. Ainda mais naquele momento.
Ele se mexeu na cama, deitando um pouco mais do meu lado, e eu fiz questão de fechar bem meus olhos. Queria que ele achasse que eu estava dormindo, queria saber o que faria.
Não sabia se estava esperando ouvi-lo ir embora ou me confessar algum segredo incrível. Mas ele só continuou cantando, chegando ao refrão da música que eu não só conhecia, como amava.
Eu já nem sentia meus braços e pernas, sabia plenamente que estava adormecendo. Mas não queria dormir. Não queria simplesmente parar de ouvi-lo cantar. Não queria deixar que aquilo acabasse. Não era justo que ele cantasse quando eu não conseguia ficar de olhos abertos.
Sem que ele percebesse, eu fechei minhas mãos em punhos bem forte, tentando fazer com que a dor me mantivesse acordada. Mas só me cansou. De dor, eu estava cheia. E, até então, nenhuma tinha me impedido de dormir.
Acabei desistindo, deixando a voz dele tomar conta da minha mente e relaxar todos os meus músculos tensos da gripe. A última coisa que eu podia me lembrar era dele encontrando minha mão embaixo da coberta e a segurando firme. Mas talvez eu tivesse imaginado aquilo. Era estranho demais para ser verdade. E mais estranho ainda o quanto eu tinha gostado.


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Notas finais do capítulo

Esse capítulo antes costumava ser meio que um aviso. Na verdade, eu ainda quero saber a opinião de vocês. Ando achando a maioria meio desanimada. Quero saber se é algo na história e o que eu posso fazer para melhorar. Se der, comente com a sua opinião!
Mas não, eu não vou desistir da fic. Só queria poder fazer meu melhor, por isso que é tão importante saber o que vocês estão achando!



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