Do Outro Lado do Oceano escrita por Laura Machado


Capítulo 65
Capítulo 65: POV Marc Hynes


Notas iniciais do capítulo

Escrevi ouvindo "Get Your Freak On" da Missy Elliot e "10 Dollar" e "Bucky Done Gone" da M.I.A. Hahaha, é o que eu imagino que esteja tocando lá no lugar, pelo menos a Missy Elliott.



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"Foi você que ofereceu," a princesa insistiu, depois de me seguir do meu quarto até a pequena sala da cozinha que eu reservava para trabalhar.

Não a respondi, só levantei as sobrancelhas e continuei amassando a massa do pão. Vi com o canto do olho quando ela cruzou os braços, impaciente. Então larguei o que estava fazendo e a imitei, a mirando de volta.

"Você ofereceu," ela repetiu.

"Não," a corrigi. "Eu ia oferecer. Mas fui salvo a tempo," completei, sorrindo.

Ela abriu a boca com o que eu disse, fingindo estar ofendida. "Nem vem," acabou falando. "Você ofereceu sim, é desonesto dar para trás agora."

Bufei uma risada e descruzei o braço para começar a dar o formato do pão na massa. "Estou muito preocupado mesmo em ser honesto," falei, sarcástico.

Ela revirou os olhos, também soltando os braços. "Qual o problema de você me ajudar, posso saber?" Alguém passou pela porta da sala na hora e ela o acompanhou com os olhos, só voltando a falar quando nós estávamos sozinhos outra vez. "Você estava certo, eu preciso dar uma relaxada. E eu preciso que você me mostre um dos lugares absolutamente incríveis que você disse que conhece."

"Em primeiro lugar," eu disse, soltando a massa por um segundo para levantar um dedo no ar, "eu nunca disse nada sobre lugares incríveis. Abaixe suas expectativas, que eu não vou me responsabilizar por nenhuma decepção que você tenha. E em segundo lugar, eu já tenho o que fazer hoje."

"Tem nada," ela rebateu sem hesitar um milésimo de segundo.

"Tenho sim," falei, em meio a uma risada sem humor. Eu ia voltar a mexer na massa, mas ela revirou os olhos, então continuei a observando.

"Você realmente quer que eu acredite que você está ocupado hoje?"

"Eu não quero nada," me defendi, mas ela não pareceu me ouvir.

"Não adianta inventar desculpas, quero sua promessa cumprida hoje!" Só faltou ela bater o pé.

"Promessa?" Tive que mirá-la por alguns segundos para me certificar de que ela estava falando sério, e não tirando sarro da minha cara. Mas ela não desviou o olhar do meu por um segundo sequer. "Qualquer coisa que alguém falar para você é promessa?"

"Sim," ela respondeu, prontamente. "E você vai me mostrar um dos seus lugares incríveis hoje à noite."

"Já disse que tenho compromisso."

"Ótimo," ela disse, sorrindo. "Me leve com você."

Levantei uma sobrancelha pra ela, que me rebateu mirando seu queixo um pouco mais alto na minha direção.

"O lugar aonde eu vou não é apropriado para princesas," praticamente fiz uma careta quando falei a palavra, mas ela sorriu ainda mais largo.

"Perfeito," ela disse, suas sobrancelhas subindo com a palavra. "Exatamente do que eu estou precisando," ela passou as mãos na saia do vestido e já começou a sair da pequena sala. "Que horas devo te encontrar?"

"Eu não vou te levar," insisti, cruzando os braços. "A última coisa da qual eu preciso é ficar de babá de princesa a noite inteira."

Ela voltou até mim praticamente marchando. "Eu nunca disse que precisava de uma babá," ela disse, parecendo odiar a ideia tanto quanto eu. "Eu quero uma distração. Posso andar nos meus próprios pés, não precisa se preocupar comigo. Só me levar o mais longe possível desse castelo e dessa seleção."

Eu me deixei observá-la, enquanto ela levava aos mãos à cintura e me mirava de volta, esperando minha reação. Dava para ver nos olhos dela que ela realmente precisava da distração. Diferentes do resto do seu rosto todo, eles eram os únicos que deixavam transparecer o quanto ela parecia exausta. Tive a impressão de que ela já estaria gritando pelos corredores se ela se deixasse sentir o quanto estava estressada.

E eu até entendia que ela precisava daquilo. Ela precisava ir aonde eu ia aquela noite muito mais do que eu. Mas tinha planejado mostrar alguns lugares do castelo, onde ela poderia fugir. Como os caminhos secretos entre as paredes, onde ninguém a encontraria. A responsabilidade de levá-la comigo, como ela queria, era um pouco grande demais. Eu não precisava da atenção de todos no castelo em mim se alguma coisa desse errado.

Mas ela respirou fundo, enquanto ainda esperava minha resposta. Ela respirou fundo e calculado, como se deixar entrar ar demais dentro dela fosse liberar o estresse que ela combatia. E ela tinha a mandíbula travada, tentando morder o mais forte que podia para manter sua pose. Ela realmente precisava daquilo.

Mas foi ela levantar o queixo um pouco mais para mim que me convenceu a levá-la. Não só porque ela estava à beira de um colapso. Mas porque eu não pude evitar de imaginá-la tentando manter seus modos aonde eu planejava ir mais tarde. E aquilo seria bom demais para perder.

"Beleza então," voltei a olhar para ela. "Eu te levo. Mas com uma condição," acrescentei, para tentar testar o quanto ela queria ir comigo.

"Já sei, não ter que ficar cuidando de mim o tempo todo," ela disse, revirando os olhos.

"Isso e outra coisa," a corrigi. "Eu te levo, se você conseguir me encontrar do lado de fora do castelo às dez da noite."

Ela me mirou um pouco sério, como se tentasse pensar, mas lutasse para não ter que parar de me encarar. Devia achar que perderia toda a sua posição se cedesse, como se todas as conversas fossem brigas infantis para descobrir quem aguentava mais tempo sem desviar o olhar.

"Teria que ir só eu?" Ela perguntou, passando as mãos pelos cabelos e os colocando de um lado só do rosto.

"Eu não quero nem levar você e você tá querendo trazer amiguinho junto?"

Ela revirou os olhos. "Guardas, não amiguinhos," ela torceu o nariz.

"Definitivamente nenhum guarda," eu declarei. "Só você. Se você conseguir sair do castelo, o que eu duvido que aconteça," falando isso, eu bufei uma risada sem humor, mas ela só levantou uma sobrancelha na minha direção, aceitando o desafio. "Agora, se puder me deixar trabalhar," fiz um gesto com a mão para que ela tomasse seu rumo e ela o tomou, mesmo que relutante.

Quase todos já estavam dormindo quando eu saí do meu quarto. Os únicos que realmente sobravam eram os criados pessoais da família real, os que trabalhavam mais como escravos mesmo. Mas a cozinha estava completamente vazia quando eu entrei para pegar a tequila e encher meu flasque. Queria poder levar a garrafa inteira, mas eles acabariam dando falta.

Estava voltando-a para o armário, quando ouvi o barulho da porta se abrindo. Dei um salto, achando que alguém tinha me descoberto. Mas era só o gato, Johnny, que se espremia para passar por ela e andar até mim. Era como se ele soubesse que eu estava de saída e vinha me convencer do contrário.

Só me deixei fazer carinho nele por dois segundos, para que não achasse também que estava abandonando-o completamente. E, para aumentar no agrado, tirei da geladeira dois pequenos filés de sardinha que estavam separados para o almoço do dia seguinte e deixei em cima da bancada para ele. Não demorou até que pulasse lá e se distraísse o suficiente para eu poder sair da cozinha sem culpa.

O caminho até a saída dos caminhões era o pior. Passava por onde os guardas mais antigos e mais altos na hierarquia dos criados ficavam. Mas também era o jeito mais fácil de sair sem ser pego por câmeras. E o mais perto de árvores e arbustos do lado de fora. Era quase impossível que alguém conseguisse me ver entre eu sair e me esconder. Ainda mais depois de ter fugido dali tantas vezes. Aquela já era uma habilidade na qual eu era mestre.

Não demorei para chegar na frente do castelo. Teria que passar pelo portão, mas a toca da minha blusa era o suficiente para que ninguém percebesse que eu trabalhava ali. Estava para atravessar a rua quando eu me lembrei da minha promessa de levar a princesa comigo.

Bufei, impaciente, e olhei no relógio. Ainda faltavam dez minutos para as dez. Eu devia ter falado outro horário, ficaríamos muito em cima da hora para pegar o ônibus. E eu não podia perder aquele, não hoje.

De repente eu comecei a ouvir o barulho do portão do castelo se abrindo. Antes mesmo de me virar para ver o que estava acontecendo, eu corri para me esconder atrás da primeira árvore. Só quando eu sabia que estava longe do alcance das câmeras, que eu olhei para lá.

A princesa passava pelo portão, toda calma e acenando para o guarda dentro da guarita. Ela olhou para os dois lados, me procurando, e eu acabei dando um passo para o lado, só o suficiente para estar visível para ela. Assim que me avistou, começou a andar na minha direção.

"O que você tá fazendo?!" Perguntei, assim que ela conseguia me ouvir. Voltei um pouco para trás da árvore, para ter certeza de que os guardas não viam meu rosto. "Você contou para alguém que a gente está saindo?"

Aquela ideia estava ficando pior a cada segundo. Eu realmente não devia ter oferecido nada. E muito menos tê-la deixado me convencer de levá-la junto.

Ela revirou os olhos. "Não, não contei para ninguém. Não exatamente," ela disse, cruzando os braços e parando na minha frente.

"Então como é que você conseguiu sair do castelo?" Perguntei, duvidando da palavra dela.

"Suborno," ela respondeu, simplesmente. "E suborno não vem com perguntas."

Ela sorriu para mim, orgulhosa de si mesma. Eu ainda tinha a impressão de que alguma coisa ia dar errado. Eu não deveria a estar levando comigo. Eu realmente não precisava daquele problema. Mas ela ajeitou sua blusa e colocou todo o cabelo de um lado do rosto, ansiosa, depois voltou a cruzar os braços e me mirou, esperando uma reação minha.

Eu sabia que aquela era uma péssima ideia. Mas enfiei as mãos no bolso do meu agasalho e atravessei a rua, com ela logo atrás de mim.

Assim que eu parei no ponto de ônibus, ela olhou à nossa volta.

"O que exatamente nós estamos esperando?" Ela perguntou, e eu só apontei para a placa que indicava onde nós estávamos. "Você tá brincando, né?"

Bufei uma risada. "Desculpa aí se eu não tive tempo de encomendar uma carruagem."

Ela revirou os olhos.

"Se você quiser desistir, ainda dá tempo," ofereci, apesar de não querer que aceitasse.

Quanto mais se provava que ela não pertencia ali, mais eu tinha curiosidade de levar aquilo até o final. Que ia dar merda, eu já sabia. Mas queria poder ver com meus próprios olhos.

"Não vou desistir por causa de um mísero ônibus, pelo amor," ela disse, cantando seu sotaque e mantendo seus braços cruzados. "Não me assusta tanto assim."

Dei de ombros. "Se você diz."

Nós ficamos em silêncio enquanto esperávamos, apesar de podermos ouvir o barulho de um bar um pouco longe de nós. Eu não estava muito preocupado em tentar criar assuntos, mas não falar nada estava começando a me convencer de que o problema de levá-la não valia a graça de vê-la em um lugar ao qual não pertencia nem um pouco.

Por sorte, o ônibus apareceu na esquina logo e eu não tive que tomar nenhuma decisão. De longe, eu podia ver pelas suas luzes acesas que tinha algumas pessoas dentro. E a princesa estava ali, do meu lado, jurando que conseguiria passar despercebida só porque não estava de tiara.

"Aqui," eu disse, a pegando pelos ombros e a virando de costas para o ônibus. Eu tirei minha toca da cabeça e a coloquei nela.

"O que você está fazendo?" Ela perguntou, um pouco horrorizada.

"Tendo certeza de que ninguém vai te reconhecer," respondi, tirando meu agasalho e colocando em volta dela.

Ela parecia um pouco relutante, mas acabou vestindo-o e colocando todo seu cabelo dentro da toca. Eu só me contentei quando coloquei a do agasalho por cima, puxando-a para frente.

"Mantenha a cabeça baixa," eu a aconselhei, assim que o ônibus parou na nossa frente.

Ela só concordou e nós entramos. Eu paguei por ela, que nem percebeu que a carona não seria de graça e ficou de pé do meu lado, olhando fixamente para o chão.

Assim que o ônibus começou a se mexer, ela balançou e se agarrou no primeiro banco que viu, fingindo que sabia o que estava fazendo. Eu ia tirar sarro dela, mas me contentei em bufar uma risada e me sentar no banco do lado. Ela lutou para se equilibrar, mas acabou conseguindo se juntar a mim.

"Já se arrependeu?" Perguntei, enquanto ela tentava manter as laterais da toca do agasalho a cobrindo.

"Não," ela respondeu, baixinho. "E nem vou. Não adianta ficar torcendo."

Eu ri. "Não estou torcendo," estava, um pouco. "Só sou realista."

O ônibus brecou e ela teve que se segurar no banco da frente para não cair.

"Aonde nós estamos indo?" Ela perguntou. "Algum bar ou clube noturno?"

"Clube noturno? Quantos anos você tem?" Eu ri, fazendo algumas pessoas ali nos olharem.

Fiz questão de as mirar com cara de irritado, para que elas se intimidassem a não ouvirem nossa conversa. Funcionou o suficiente para eu voltar a olhar para a princesa.

"Como é que você chama, então?" Ela colocou uma mão na frente do rosto, enquanto a outra se mantinha segurando o banco da frente.

"Não interessa, não é para onde eu estou te levando," falei, apoiando os dois pés logo do lado de onde ela agarrava. "Por falar disso, vou deixar bem claro que não me responsabilizo por nada que te acontecer lá."

"Como é que é?" Ela fez questão de virar o corpo na minha direção. "Você vai me levar para deus sabe onde, não me deixou trazer um só guarda e agora fala que não é culpa sua se alguma coisa ruim acontecer?"

"Você é adulta, consegue se virar, eu espero."

Olhei para a frente, mas conseguia vê-la com o canto do olho se convencendo a não me contrariar.

"Pra que lugar exatamente nós estamos indo?" Perguntou, se dando por vencida e voltando a mirar à nossa frente também.

"Você vai ver quando nós chegarmos lá," respondi.

E então nós ficamos em silêncio. Infelizmente, o caminho era longo e, depois de um certo tempo, ela deve ter se sentido obrigada a falar alguma coisa.

"Então, me fale de você," pediu uma hora em que o ônibus tinha parado para outras pessoas entrarem.

"Como é?"

"Me fale de você," ela repetiu. "Me fale da sua vida. Como é que você veio parar no castelo?"

Eu bufei uma risada. Simples assim, ela queria que eu falasse da minha vida?

"Sei lá, simplesmente vim," respondi. "E seria ótimo se você não saísse por aí falando de onde veio e porquê."

"Pode deixar," me garantiu, respirando fundo. "Nossa, tudo já parece tão longe, né? O castelo, a seleção, parece que está tudo tão lá atrás. Já me sinto bem melhor."

"Se você quiser, você faz o caminho inteiro de volta e eu peço pro motorista te deixar na frente do portão," ofereci, já rindo da cara dela me ouvindo.

"Já falei para parar de tentar me fazer desistir," ela disse, balançando a cabeça, inconformada.

Não pude evitar de rir, mas depois esfreguei a testa, pensando naquilo. Seria bem mais fácil se ela simplesmente mudasse de ideia. O que eu estava fazendo? O que eu estava pensando?

Quando nós tivemos que levantar para descer do ônibus, ela já estava um pouco mais animada com tudo. Já conseguia andar um pouco melhor lá dentro, apesar de se segurar como se fosse morrer se soltasse. Ela também arregalou os olhos para as portas quando elas abriram e eu desci, fazendo sinal para que me seguisse.

Lá fora, ela parecia ainda mais impressionada. Ou talvez fosse assustada. Ela olhava para todos os lados e eu percebi que andava mais perto de mim do que antes. Também, de onde estávamos, não dava para ver muita coisa além de grama e terrenos abandonados e desertos.

Podia ver na cara dela que ela estava pelo menos nervosa e que adoraria me perguntar várias coisas. Mas fazia questão de não falar nada.

Quando estávamos chegando perto da casa abandonada, alguns bons metros da rua, já podíamos ver alguma luz e ouvir a música. Eu estava animado, andava um pouco mais rápido, enquanto ela continuava praticamente se escondendo atrás de mim. Mas foi a gente chegar do lado da casa e termos uma visão perfeita do lugar, que ela se colocou do meu lado para ver melhor.

Eu queria saber quem estava lá, quem ia correr, quem tinha trazido bebida, quem tinha aparecido das sombras, quem estava para socar quem. Mas a verdade era que eu preferia olhar para ela. Queria ver que estava assustada, queria ver a cara de inconformada dela e até rir de como ela não se encaixava ali.

A música estava alta, com a batida forte e quase distorcida. Mas ninguém ali se importava, quanto mais alto, melhor. A princesa estava com a expressão que eu esperava, mas não durou muito. Logo ela se virou para mim, já com a confiança renovada e seu queixo no ar.

"Onde, exatamente, nós estamos?" Ela perguntou, levando as mãos à cintura.

"Vai saber," respondi, dando de ombros e voltando a andar.

Ela veio logo atrás de mim. Nós passamos por alguns grupos de pessoas, algumas me cumprimentando, e depois chegamos à pista, onde cada corredor estava de pé do lado de seu carro. Estávamos nos aproximando do primeiro, quando ela finalmente entendeu o que estava acontecendo ali.

"Espera aí," ela disse, correndo para se colocar na minha frente e bloquear meu caminho. "Isso daqui é um racha?" Ela fez questão de baixar a voz e olhar à nossa volta, como se mais ninguém ali pudesse saber o que estava acontecendo.

Eu abri meus braços no ar. "O que você acha?" Perguntei, já que era óbvio.

"Mas é ilegal," ela disse. "Não é?"

"Por que você acha que eu disse que não era lugar para princesas?" Dei a volta nela e continuei andando na direção de um amigo meu, Joe, que estava posicionado como o último a largar.

Mas ela correu para se colocar na minha frente de novo e me forçou a parar. "Você não vai correr, não?"

Abri meus braços outra vez. "Está vendo algum carro em volta de mim?" Perguntei. "Não, eu não vou correr."

"Então por que é que nós estamos aqui?"

"Eu vim apostar em quem vai ganhar," respondi, apontando para mim, depois voltei meu dedo para ela. "Você, eu não sei o que está fazendo aqui."

Não esperava que ela fosse falar outra coisa, então continuei meu caminho até onde Joe estava. Ela ficou do meu lado enquanto eu falava com ele e ele me explicava as mudanças que tinha feito no carro, já que tinha acabado a última corrida com uma batida. Nós falamos de como era foda ter que bancar aqueles carros e eu disse que era bem por isso mesmo que eu mantinha meus hobbies um pouco mais em conta.

Achei que ela fosse ficar entendiada, mas a princesa nem parecia ouvir. E quando Joe me pediu para apresentá-la, ela fez a besteira de falar seu primeiro nome verdadeiro. Ninguém ali era muito de assistir televisão ou ler jornais. Alguns eu até apostaria que nem sabiam ler. Mas ultimamente era impossível conseguir fugir de fotos dela em todas as publicações do país. Então quando Joe a ficou olhando depois de ouvir seu nome, eu podia jurar que ele a reconheceria.

"Prazer," ele acabou dizendo, para meu alívio, bem a tempo de ouvir o sinal de que eles deviam se preparar para começar a corrida.

Peguei a princesa pelo braço e a arrastei para longe da pista.

"O que está acontecendo?" Ela perguntou, sem me contrariar.

"Vai começar," falei, e ela arregalou os olhos.

"E a gente vai ficar aqui do lado? E se alguém passar por cima de nós?"

"Ninguém vai passar por cima de ninguém, é uma pista fechada," falei, assim que Rafael chegou perto de mim.

Discretamente, eu tirei meu dinheiro do bolso, pagando por mim e pela princesa, e ele me ofereceu duas bebidas, já me perguntando quem era ela. Disse que era uma prima aí e dei as costas para ela pra gente conversar. Não queria que ele ficasse pensando que ela estava presa a mim. E ela também não podia ter essa impressão. Não era pra ela ficar me seguindo. Ela queria relaxar, eu já tinha feito minha parte, já a tinha levado até ali. Mas ter que ficar segurando na mão dela e a levando para conhecer meus amigos já era demais.

Quando ele se afastou para falar com umas meninas que tinham chegado, eu me virei para ela.

"Ele é italiano?" Ela me perguntou.

"Quê? Quem?"

"O cara com quem você estava falando," explicou. "Ele parecia italiano."

Não pude evitar de olhar na direção dele. "Sei lá," falei, voltando a mirá-la.

"O que foi aquilo que você entregou pra ele?" Ela perguntou, logo tomando um gole da cerveja que ele tinha trazido pra ela.

"Pagamento," respondi. "Ou você acha que pode simplesmente aparecer aqui e beber de graça?" Ela não respondeu, só levantou as sobrancelha atrás do copo. "É por pessoa."

"E você pagou por mim?" Ela inclinou a cabeça para o lado, como se quisesse me ver melhor.

"Não vai achando que isso significa alguma coisa," corri para explicar. "Mas eu tinha esquecido de te avisar que precisava trazer dinheiro."

"Então você pagou por mim."

"Você por algum acaso trouxe dinheiro?" Perguntei, e ela deu de ombros. "Exatamente. Mas isso não significa nada. Nem que você precisa ficar o tempo todo do meu lado. Você é livre para andar por aí, faz o que quiser. Se precisar de alguma coisa, o que eu espero que não aconteça, me avisa. Senão, a gente se encontra umas duas na porta da casa, beleza?"

"Duas da manhã?!" Ela perguntou, assustada. "O que eu vou ficar fazendo até lá?"

"Não é problema meu," falei. "Tem mais bebida ali," apontei para o carro que tinha o porta-malas aberto e cheio de caixas de isopor, "cerveja, tequila, vodka, o que você quiser. Faz umas amizades, umas apostas, o que você quiser."

"Ótimo," ela disse, apesar de não parecer estar nem um pouco contente. Levou as mãos ao cabelo e tirou minha toca, a segurando no ar pra mim. "Não preciso mais dela."

Não a contestei, peguei de volta e a vesti, já sentia o ar gelado da noite nas minhas orelhas e estava mesmo prestes a pedir de volta.

Fiquei esperando que ela fosse fazer alguma coisa, se afastar de mim, mas nada. E então a corrida começou e eu preferi assistir a me preocupar com ela, fingindo que nem lembrava que ela estava ali.

Não dava para ver muito de onde estávamos. Só víamos o começo e o final. Quem subia no telhado da casa assistia um pouco melhor e foi para lá que eu fui. Principalmente depois que eu avistei Natasha lá, com algumas das suas amigas.

Podia imaginar a cara da princesa, me observando fugir dela como um cachorro abandonado. Mas eu tinha falado que não seria sua babá. E ela não ia conseguir estragar minha noite me fazendo ficar culpado de não lhe fazer companhia. A escolha de ir tinha sido dela. Ela que se virasse.


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