Do Outro Lado do Oceano escrita por Laura Machado


Capítulo 6
Capítulo 6: POV Carolyne Muñoz


Notas iniciais do capítulo

Escrevi ouvindo "Don't" do Ed Sheeran



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Meu alarme mal tinha começado a despertar, quando eu me estiquei e bati nele com a minha mão. Desligado. Antes que pudesse curtir demais minha cama, joguei as cobertas para o lado e me levantei.
Enquanto me arrumava, olhei de relance pela janela. Chovia. Pouco e constante, bem devagar, como se a delicadeza das gotinhas fosse essencial para as flores que cresceriam ali. A primavera tinha demorado esse ano, mas finalmente eu podia ver que chegava. Estava cansada do inverno, mesmo que não fosse dos mais rigorosos.
Vesti meu uniforme como de costume, sem nem parar muito para pensar no que fazia. Depois fiquei de pé na frente do espelho para amarrar meu cabelo em um coque. Queria me sentar na frente da penteadeira, mas estava ainda um pouco cansada, não tinha dormido direito. Se eu me sentasse, tinha medo de ter preguiça de me levantar de novo.
Preferi nem passar nada de maquiagem. Pra quê, se ia sair na primeira hora?
Peguei meus sapatos e saí do meu quarto. Nas pontas dos pés, eu andei até a porta de Alicia e bati de leve. Depois de alguns segundos sem resposta, bati mais uma vez, um pouco mais alto. Ainda nada.
Bem naquela hora, vi um guarda passando por mim.
"Chris," chamei e ele parou de andar com um susto. "Sua irmã ainda está dormindo?"
Ele deu de ombros. "Eu tentei acordá-la, mas ela não está nem um pouco inclinada a se levantar."
Ele continuou seu caminho e eu me voltei para a porta. Eu poderia bater mais uma vez, mais alto ainda. Ou chamá-la pelo nome. Quantas vezes eu teria que bater até poder entrar?
Não gostava de me intrometer assim. Me sentia desconfortável de entrar no quarto dela enquanto ela dormia. Mas era para o bem dela. Então eu engoli a minha vergonha e virei a maçaneta.
Lá estava ela, seu cabelos loiros completamente camuflados pelo seu edredom. Era a única prova que eu tinha de que ela estava mesmo ali.
"Alicia," eu falei, talvez baixinho demais para despertar alguém. Dei os passos que tinha entre a cama e a porta, mas hesitei na hora de tocar nela.
Aquilo era ridículo! Por que eu me sentia tão inadequada? Eu estava lhe fazendo um favor!
"Alicia," chamei de novo, dessa vez bem mais alto. Ela murmurou alguma coisa.
Melhor acabar logo com isso, não?
"Alicia," chamei bem alto, tocando em seu ombro e a balançando devagar.
"Quê?" Ela perguntou, irritada.
"Você tem que acordar," eu disse. "Hoje é seu primeiro dia de trabalho."
"Eu não quero acordar," ela reclamou, girando na cama sem sair debaixo do edredom.
"Não tem querer," eu a balancei pelo ombro de novo. Sabia que estava sendo chata e odiava muito estar naquela posição. Mas eu precisava ajudá-la. Era para o bem dela, repeti na minha cabeça.
Ela continuou imóvel, sem me responder.
"Tá bom," eu disse, finalmente. "Eu falo para a Marlee que você não quer ser criada de um dos selecionados."
Na hora em que eu terminei de falar, ela jogou o edredom para o lado. "Criada dos selecionados?" Ela perguntou, seus olhos brilhando para mim.
"Sim," eu disse, cruzando os braços à minha frente. "Você achava que eles deixariam que eles se vestissem sozinhos?"
Os olhos dela arregalaram de felicidade. "Eu vou poder ajudar um selecionado a se vestir?"
Eu bufei uma risada. "Sabia que essa era a única coisa que faria você se levantar."
Ela pulou da cama. "Eu vou poder escolher no quarto de qual eu vou trabalhar?"
"Acho que antes de começar a pensar nisso, você deveria pelo menos aprender algumas regras básicas de como ser uma criada pessoal-"
Ela me cortou com uma mão esticada na minha frente. "Sem café, sem regras."

A sala comunal já estava cheia e barulhenta quando nós chegamos. Eu esperava que tivessem poucas pessoas acordadas àquela hora, mas todos estavam despertos e animados. Se sentavam na beira do banco e comiam rapidamente. Todos os nervos à flor da pele para o grande momento em que a princesa chegaria ao castelo.
"Eu ouvi dizer que ela é brava," Alicia me disse. "E mandona. Eu acho que vou adorá-la!"
"Você adora todo mundo que ninguém gosta," eu disse.
"Não é verdade!"
"Claro que é," Chris se intrometeu na conversa. "Você era a única que fazia questão de ir atrás da Amélie quando ela estava planejando aquele casamento dela. E ela nunca nem quis você por perto."
Alicia mordeu o lábio. "Tá, mas isso não conta," disse. "Vocês que não vêem como ela é incrível. A culpa não é minha se eu tenho uma percepção muito melhor das pessoas do que vocês."
"É assim que você chama?" Seu irmão perguntou e ela mostrou a língua pra ele.
"Gente," alguém pediu, batendo uma colher em uma panela e todos nos viramos para olhar para ele. Era Thomas, um dos guardas pessoais de Charles. "Nós estamos conduzindo uma aposta aqui para quanto tempo vai demorar essa Seleção," ele continuou com um sorriso no rosto.
Eu revirei os olhos, mas quase todos ali se animaram com a ideia.
"Nada muito caro," Loric completou para ele. "Só uma aposta divertida entre amigos!"
Seu sorriso brilhava de longe e por um segundo eu pensei que talvez fosse uma boa ideia. Se por nada mais, pelo menos para ficar perto dele.
Não me leve a mal. Eu não estava interessada nele nem nada desse tipo. Era só que o Loric tinha uma aura muito boa. Daqueles que fazia todo mundo sorrir só de olhar para ele. E mesmo com todo esse poder, esse carisma, ele nunca se importava de passar despercebido. Ele era confiante o bastante para não precisar da aprovação de ninguém.
E eu admirava isso nele. E muito.
"Eu apostei em duas semanas," Thomas disse. "Loric em um mês. E Marc em dois dias. Alguém aí tem mais algum palpite?"
Todos começaram a falar alto e junto e eu voltei a me concentrar na minha xícara. Era uma brincadeira inocente, eu sabia disso. Era bem a cara deles fazer aquilo. Mas me incomodava. Queria perdoar porque queria acreditar que Loric não entraria em algo idiota. Mas não era idiota? Aquela menina não era muito mais velha do que eu e estava sendo obrigada a viajar para outro país, onde teria que buscar um marido no meio de um mar de estranhos. E tudo porque seu pai poderia morrer a qualquer segundo. Nós estávamos nos divertindo desse lado do oceano, mas eu não conseguia esquecer de todo o lado negro dessa brincadeira.
Não demorei muito para terminar meu café, mas quando me levantei da mesa, todos já tinham acalmado e vários já tinham começado a trabalhar. Até Thomas e Loric tinham desaparecido. Quando é que eles tinham ido embora que eu nem tinha percebido?
"E aí, qual é o nosso primeiro trabalho?" Alicia me perguntou, se levantando comigo. "Eu vou ter que passar por mais alguma aula?"
"Duvido," eu disse. "Sua mãe já deve ter te ensinado tudo que podia na teoria. Agora só precisamos colocar em prática."
Seus ombros caíram de desânimo. "Acho muito mais legal ficar estudando."
"Que pena," eu disse. Nós andamos até a cozinha, trazendo conosco nossas xícaras.
"Pai," ela chamou assim que o viu. Foi até ele e lhe deu um beijo no rosto.
"Edward," eu sorri para ele, que acenou com a cabeça.
"Podem deixar a louça aqui, meninas, eu lavo," ele disse, como fazia todas as manhãs. Mesmo sendo o chef principal, ele nunca se importava de fazer pequenos agrados. "Vocês já viram suas tarefas?"
"Ainda não," eu disse, enquanto Alicia ia até a geladeira roubar um doce.
Edward abriu um sorriso em sua cara cansada. Mal tinha começado o dia e ele já devia estar trabalhando por horas.
"Acho que vocês vão gostar," disse, se divertindo com o segredo.

"O que nós temos que fazer aqui?" Uma outra criada, Kasey, perguntou, assim que Marlee abriu a porta de um grande salão para nós.
Estava vazio, salvo pelo piso de madeira e os detalhes nas paredes.
"Vocês precisam me ajudar a criar um Salão dos Homens," Marlee disse, entrando no cômodo.
Nós criadas trocamos olhares curiosos, enquanto os saltos dela ecoavam ali.
"Salão dos Homens?" Algumas de nós perguntaram juntas.
Marlee se virou para nos olhar. Ela tinha o maior dos sorrisos do mundo. Dava para ver que estava gostando muito de substituir Silvia.
"Sim," ela respondeu, contente. "Será como um salão de jogos. Um lugar onde os selecionados vão poder encontrar os príncipes e o rei e conversar sobre coisas de homens."
"Ou seja, esportes?" Alicia perguntou.
"Tanto faz," Marlee disse. "O que importa é que nós precisamos fazer esse ser o lugar onde eles queiram passar seu tempo. Precisamos de ideias do que eles gostariam de fazer, do que trazemos para cá."
"Por que nós não trazemos um ringue de luta?" Kasey perguntou. "Eles poderiam resolver essa seleção em alguns poucos minutos."
"Ha. Ha," Marlee disse, não muito feliz com o comentário de Kasey. "Eles sabem que violência é completamente proibida. Se algum encostar algum dedo no outro, estará eliminado. De brincadeira ou não."
O tom sério dela era algo completamente inesperado. Talvez fosse porque ela nunca tinha sido a nossa 'chefe'. Ou a posição estava subindo à sua cabeça.
"Você está pensando em coisas tipo uma mesa de sinuca, um alvo de dardos, coisas assim?" Perguntei, um pouco querendo ficar no seu lado bom, um pouco querendo livrar Kasey.
"Isso!" Ela apontou para mim, animada. Era a Marlee de sempre. "Exatamente, coisas assim! Um lugar para jogar baralho, talvez um lugar para video games! Nós precisamos decorar e limpar a tempo de quando os selecionados chegarem."
"E quando eles chegam?" Alicia perguntou, fazendo todas rirmos da animação dela. "Eu sou uma pessoa curiosa, é só isso."
"Deixe-me ver," Marlee olhou para a prancheta que carregava. "Se hoje é quarta-feira, os selecionados vão ser anunciados na sexta. Então, semana que vem. Quinta-feira."
"Como a princesa vai conseguir escolher no meio de tantos selecionados em dois dias?" Eu perguntei, já sentindo de novo uma certa pena dela. Talvez nem fosse ela que tivesse escolhido isso, talvez só a estivessem apressando.
"Ela já nos fez separar todas as fichas filtrando por idade, profissão e altura," Marlee respondeu. "Eu sei, coisa de doido. Mas ela é assim. E é a Seleção dela. Nós só estamos aqui para ajudar e nos certificarmos de que ela não sairá correndo atrás de um príncipe qualquer de outro país."
"Ouvi dizer que ela só vai escolher dez para entrar na seleção," Uma outra criada disse.
"É verdade," Marlee confirmou. "Não serão 35 e eles podem ser da mesma província. Ela quer fazer as regras dela, né," ela olhou no relógio de relance. "Ah, meu deus. Ela já deve estar chegando! O quarto dela nem está pronto!" Ela correu para a porta, passando por nós, mas se virou no último segundo para nos olhar. "Vocês cuidam das coisas por aqui?" Seus olhos caíram em mim. "Carolyne. Você está de líder. Você é a responsável pelo Salão dos Homens! Tem toda a liberdade para tomar as decisões. Bom, até eu poder voltar! Vejo vocês depois?!" Não era uma pergunta de verdade, ela já corria de novo pelos corredores, balançando a prancheta no ar, tentando não cair de seus saltos.
Lola estava deixando todos nervosos.


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Notas finais do capítulo

Me desculpem pela demora para postar! E espero que estejam gostando! O começo é sempre meio parado mesmo.



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