Do Outro Lado do Oceano escrita por Laura Machado


Capítulo 4
Capítulo 4: POV Dane Lewis


Notas iniciais do capítulo

Escrevi ouvindo "Times Like These" do Foo Fighters



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"Merda!" Minha voz ecoou por dentro do avião que chacoalhava no seu melhor para imitar o impacto que a tela demonstrava tão claramente. Ainda bem que era um simulador, senão meu cérebro estaria espalhado pela pedra na montanha e meu corpo seria jogado para fora como um manequim. Pelo menos era isso que eu via.
De raiva, dei um soco na lateral do avião, fazendo vários botões soarem. Mas isso não ajudava com a minha dor. Pelo contrário, eu senti todos os músculos do meu braço se contraírem, desde o ombro até as pontas dos meus dedos. Minha raiva só me fazia querer socar tudo que estivesse na minha frente. E a voz de Elliot no meu ouvido não estava ajudando. Eu tirei o capacete como dava, na pressa, e arranquei os fones e o microfone. Não tinha nem espaço para tanta raiva ali dentro e isso me deixava louco! Eu não conseguia ficar longe o suficiente de tudo, eu queria sair dali para poder descarregar a minha dor.
Mas sem Elliot me perguntando o que tinha acontecido, eu pude concentrar no meu braço. Eu estava cansado daquilo! Cansado de entrar ali, ficar preso ali sem conseguir voar. Cansado de errar por besteira. E mais do que tudo, cansado de sentir aqueles espasmos que trancavam meu braço inteiro em uma posição e me impossibilitavam de controlar o avião. Já faziam três semanas, eu já devia estar tendo um progresso maior. E nada.
Só de pensar naquilo, eu já queria socar o painel de novo. Mas vi Elliot descendo do outro avião do simulador e andando na direção do meu. Me forcei a respirar fundo e tentar relaxar só o suficiente para não sentir o peso da dor constantemente.
Assim que ele chegou perto o suficiente e subiu os poucos degraus para chegar na altura de onde eu estava, eu abri o vidro.
"Não se preocupe, a gente tenta de novo amanhã," Elliot disse e eu simplesmente bufei.
Ele era o segundo tenente, eu era para ser seu superior. Mas desde meu acidente, era ele que treinava o meu pelotão. E eu sabia que ele só estava fazendo o trabalho dele, mas odiava quando ele mudava alguma coisa, mesmo que fosse o horário de certos treinamentos. Às vezes tinha a impressão de que ele estava tentando aproveitar a minha condição para ganhar uma promoção e eu me odiava por pensar assim. O fato era que eu tinha passado a vida inteira esperando que ele me odiasse por ter entrado junto com ele e ganhado uma posição bem melhor bem antes. Talvez eu só estivesse refletindo nele meus próprios medos.
"Vamos lá," ele disse, "não foi tão mal. Você quase conseguiu passar da montanha."
"Quem quase morreu ainda está vivo," respondi, mal humorado.
"A cada dia que passa, você chega mais perto. Você vai ver, amanhã você vai passar com facilidade."
"Não sei."
Ele desceu os degraus para me deixar sair. Assim que eu apoiei as minhas duas mãos nas laterais do avião para me levantar e depositei ali todo o meu peso, senti de novo o meu braço inteiro contraindo. Apesar da dor, eu não parei e me levantei. Não queria que Elliot soubesse que aquilo já era algo constante. Talvez aprender a lidar com a dor fosse a minha única opção. Superar minha frustração e aguentar da próxima vez. Tentar um pouco mais, me acostumar com ela e aprender a mexer mesmo quando todos os músculos dizem que não. Ou então desistir de vez.
"Te vejo na sala do Capitão Zero Novecentos horas?" Elliot perguntou logo antes de passar pela porta do salão do simulador e sair dali.
"Te vejo lá," respondi.
Desci os degraus do meu avião já tirando minhas luvas e fui abrindo o meu macacão até chegar na porta. Era inacreditável o quanto eu conseguia ressentir aquele lugar. Até o cheiro dali me incomodava. Todo dia quando eu entrava ali, eu sentia menos esperança ainda de melhorar. Eles estavam me jogando ali para poderem falar que tinham feito de tudo, que me tinham dado uma chance antes de me colocarem atrás de uma mesa. Quando eu ainda era cadete e tinha acabado de entrar na academia, aquele lugar era um santuário. Todos os meus sonhos de menino em um lugar só. Video games de verdade, a adrenalina pura. E agora eu voltava ali só para poder adiar o meu fim.
Assim que abri a porta para sair, o sol bateu na minha cara e me impediu de ver que tinha alguém me esperando. Mas não demorou para ela correr para mim.
"Dane, Dane, espera," era a voz de Enny, que andava do meu lado, tentando acompanhar meu ritmo.
Eu apressei meu passo, mas só porque sabia que se ela estava livre, era porque eu não tinha muito tempo até ter que encarar o capitão.
"O que houve, Enny?" Perguntei.
"Como foi no simulador? Alguma melhora?"
Sabia que ela só queria ser legal, mas era o último assunto que eu queria discutir. Enquanto estivesse sóbrio, pelo menos.
"Foi igual," falei simplesmente. "Era só isso?"
Nós tínhamos chegado no prédio principal e eu não hesitei em entrar e já me encaminhar para o vestiário masculino.
"Não, na verdade," ela disse e eu podia ouvir que ela só estava enrolando para me falar o que realmente queria. Mas eu não estava com muita paciência para ficar curioso. "Tinha uma coisa que eu queria te mostrar, mas eu não sei se você vai querer saber..."
"Pelo amor de deus, Enny, fala de uma vez," eu realmente estava com o pavio curto. Nós chegamos até o vestiário masculino e eu parei na porta. "O que você tem que me mostrar?"
"Isso daqui," ela disse, se virando para mim.
Ela colocou a mão dentro do blazer que usava e tirou um papel dobrado. Eu esfreguei meu queixo, esperando que ela fosse um pouco mais rápida. Eu realmente não estava com cabeça para enrolação.
Finalmente, ela o abriu e o segurou na minha frente.
"Eu não queria abrir," ela disse e eu percebi que tinha o meu nome bem no começo carta. "Mas eu vi um símbolo que me era muito familiar. Eu juro que achava que estava louca, que devia ser qualquer outra coisa menos a que eu estava pensando que era-"
"Enny, o que é isso afinal?" Eu peguei o papel da mão dela e tentei ler, mas era difícil me concentrar depois de passar horas olhando para uma tela eletrônica.
"É uma carta da Seleção."
"Seleção para o quê?" Passei meus olhos por cima, mas nada que eu lia fazia sentido.
"Para encontrar o marido da princesa do Reino Unido," nem o que eu ouvia fazia sentido.
Olhei da carta para ela, que sorria como se tivesse feito algo de errado e quisesse que eu a perdoasse.
"Eu juro que eu não tenho a menor ideia do que você está falando," eu disse e ela bufou, desanimada.
"A princesa do Reino Unido precisa se casar. Pai doente, único jeito de manter o seu trono," ela falava como se eu devesse já saber tudo aquilo. "Meu deus, você não assiste jornal, não?"
"Não ultimamente," admiti.
"Bom, que seja," ela continuou. "Ela vai fazer uma seleção aqui em Illéa. Uma seleção masculina!" Seus olhos praticamente brilhavam. "Como aquela que eu participei, só que com homens."
"Parece divertido," eu disse, sarcástico. "E o que eu tenho a ver com isso?"
"Mas será que essa cicatriz te deixou tapado?" Ela me deu um tapa no meu ombro de brincadeira, mas realmente doeu. Ela podia se controlar um pouco melhor no futuro. "Isso daqui é uma carta te convocando!"
"Me convocando?"
"Bom, te convocando para se inscrever!" Ela praticamente gritou, animada. "Você TEM que se inscrever!"
Por alguns segundos, eu só olhei para ela, que sorria e arregalava seus olhos. Ela não podia estar falando sério. Ou então ela estava completamente maluca.
Bufei uma risada e empurrei a porta do vestiário sem olhar de novo para trás.
E ela veio logo atrás de mim.
"Você vai se inscrever, não é?" Me perguntou.
"Você sabe que esse é o vestiário masculino, não é?" Eu terminei de abrir o meu macacão e deixei a carta no meu armário.
"Nada que eu não tenha visto antes," me respondeu, mas estava vazio por lá, então não tinha muito o que ela ver. "Mas eu to falando sério, Dane. Você seria perfeito!"
Eu só balancei a cabeça, não acreditando que ela ainda estava falando daquilo.
"Pensa só, você tem uma carreira na Força Aérea, tem a idade apropriada, é bonito, inteligente e tem contato com uma ex-selecionada incrível. Você daria um ótimo rei."
"REI?!" Foi como um choque para mim.
"É, né? Ela não está só procurando um marido. Quem casar com ela vai virar rei do Reino Unido! Oi, Gary," eu só percebi que ele tinha entrado no vestiário quando ela o cumprimentou.
Ele olhou de mim para ela com cara de confuso, mas depois continuou seu caminho, segurando a toalha na sua cintura um pouco mais forte.
Eu precisava tirar ela dali.
"Eu não tenho nada a ver com o Reino Unido," disse.
"Não importa," ela não se abalava. "Você aprenderia. E mesmo que não desse em nada, pensa em como seria incrível se toda vez que alguém olhasse para você, visse um candidato a rei!"
"Eu não sei porque você acha que isso vai ajudar na minha imagem," tirei a regata que usava por baixo do macacão. Já nem sabia quanto tempo eu tinha e ela só estava me enrolando. Eu não podia simplesmente me trocar na frente dela, não é?
"Bom, pelo visto a princesa só vai escolher dez selecionados. DEZ, Dane. Se você entrar, vai significar que ela viu em você alguém digno de virar rei. Quer imagem melhor do que essa?"
Ela estava praticamente na ponta do pé, como se não aguentasse de empolgação.
Ouvi um barulho atrás de mim e lembrei de Gary. Me virei para ele. "Você vai participar disso daqui?"
Ele demorou para perceber que eu estava falando com ele. Mas depois soltou uma risada seca.
"Já estou," ele disse.
"Tá falando sério?"
"FALEI!" A voz de Enny estava tão aguda em meu ouvido que tive que tampá-lo por alguns segundos.
Gary deu de ombros. "Eu não me importaria de conhecer o Rei Maxon."
"E você quer SER rei?" Essa era a parte que eu não entendia direito.
"Não sei," ele falou, um sorriso abrindo em seu rosto e o traindo completamente.
"Será que eu sou a única pessoa que nunca gostaria de tomar conta de um país inteiro?"
"Não se preocupa," Enny me falou. "O Reino Unido é pequeno. Mesmo que você estrague o país inteiro, não vai ser grande coisa."
Eu só revirei os olhos.
"Mas é sério, olha," ela me segurou pelos ombros mas soltou assim que percebeu que talvez estivesse indo longe demais. Como se entrar no vestiário masculino não fosse longe demais. "Eu realmente acho que você é o candidato perfeito. Ainda mais que você tá precisando de um pouco mais de férias para melhorar desse acidente com o seu ombro. Você ficaria famoso, poderia virar rei e depois você poderia escolher praticamente o emprego que quiser."
"Eu quero o emprego que eu tenho," a contrariei.
"Tá! Mas mesmo assim! Pelo menos pensa nisso!" Ela insistiu, pegando o papel que eu tinha deixado dentro do meu armário. "Você pode mudar de ideia a hora que for! Ela não deixaria você continuar lá se você não quisesse. Duvido que ela queira um rei indeciso! Pelo menos pensa, vai!"
Ela balançou o papel na minha frente e eu me peguei imaginando que ela parecia a minha irmã mais nova. Se eu tivesse uma.
Mas pelo menos toda aquela conversa tinha me feito esquecer da minha dor e da minha raiva. Não tinha passado tanto tempo, mas pela primeira vez em três semanas, eu não estava pensando na pressão de ter que melhorar logo.
"Está bem," eu falei e ela jogou os braços no ar, comemorando. "Não anima, não. Eu só prometo pensar!"
Principalmente porque talvez isso me faça esquecer dos problemas por mais alguns minutos, acrescentei na minha cabeça.
"Tenho certeza de que você vai acabar aceitando!" Ela não tinha me escutado e parecia ainda mais animada. "Vai ser lindo assisti-lo se apaixonando pela TV!"
"Pela TV?! Pelo amor de deus, não me fala que eles vão passar isso pela TV!" Eu pedi.
Atrás de mim, ouvi Gary rindo.
"Não é um reality show, não precisa se preocupar com eles te filmando tomando banho!" Ela me deu outro tapa no ombro e logo me olhou com cara de quem não deveria ter feito aquilo. "Você prometeu pensar!"
"Que seja," eu disse, tirando o meu macacão.
"Imagina o país inteiro torcendo por você e a princesa-"
"Enny, eu já prometi pensar. Agora você tem cinco segundos para sair daqui," eu a cortei.
Mas eu nem precisava ter falado nada, assim que coloquei minhas mãos no cós da minha cueca, ela entendeu o que viria, deu meia volta e saiu do vestiário.
Gary riu de novo e dessa vez eu me juntei a ele.
Logo depois alguém bateu na porta.
"Pois não?" Eu perguntei, já imaginando que seria ela.
"Eu esqueci de deixar a carta aí," a voz dela parecia encabulada.
E logo depois dela falar isso, eu ouvi o barulho da folha sendo passada por baixo da porta. Assim que a peguei, meus olhos caíram sobre o nome da princesa.
Lola Farrow. O que será que a levaria a fazer uma seleção? E do outro lado do oceano?


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Notas finais do capítulo

Mil desculpas se o capítulo não ficou dos melhores.
Espero que vocês tenham gostado do primeiro selecionado! Todos que tiverem capítulos serão dos dez que a Lola vai escolher. Eu não faria você lerem sobre alguém que nem vai aparecer na história direito! Haha

Aceito comentários com dicas, opiniões e críticas! E quem puder divulgar, também agradeço!



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