O sinal da meia-noite foi como um aviso de que eu estava livre. Não demorei nem um segundo sequer para tirar aquela máscara quebrada e balançá-la no ar como uma bandeira de vitória. Liberdade é uma coisa bem simples às vezes. E deliciosa.
"Finalmente!' Gritei, sem parar de girar a máscara.
Não que eu precisasse de outra razão para continuar dançando, mas assim que o sinal terminou, a música que começou a tocar era bem animada. Ou então eu que a estava imaginando, pois combinava perfeitamente com meu jeito de fingir que era a rainha da pista de dança.
Thor revezava entre rir de mim e tentar me acompanhar. Eu tinha que admitir, ele levava jeito para a coisa. A falta de coordenação dele era tão aguda, que ele devia combinar muito bem com a minha dança visto de fora. Eu sabia que não tinha nada que eu mudaria naquela noite.
Parecia que nós tínhamos sidos amigos há anos. Devíamos ser como irmãos, só que perdidos pela vida. Quem sabe tínhamos sido separados no nascimento e só então nós nos encontramos. E se nós tivéssemos colares iguais que indicariam que éramos gêmeos?
Tá, não era muito possível. Ele era ruivo. E branco, bem branco. De uma brancura quase rosa, se é que isso fazia algum sentido. E a minha brancura era mais pérola, mais ou menos da cor do meu cabelo loiro - que eu tingia quase sempre de cores diferentes. Ele era alto, eu era bem pequena. Ele tinha sardas pelo corpo inteiro, eu só tinha que sonhar em ter algumas nas minhas bochechas algum dia.
Mas nós éramos gêmeos mesmo assim. Na falta de coordenação, no jeito que a pista de dança se resumia a nós dois. Ele sabia curtir como eu, sabia que o mais importante era chegar no seu limite de ridículo e curtição, desafiando todos à nossa volta a se compararem com a nossa genialidade incompreendida. Ele era bem o amigo que eu estava precisando.
Nem precisávamos combinar nada. Era como se estivéssemos ensaiado. Nós quase conversávamos pela dança, encenávamos partes das músicas, enquanto eu fingia que cantava segurando um microfone, ele fazia a guitarra invisível do meu lado. Nem vi quando a pista começou a ficar vazia.
Quando olhei para os lados e percebi, vi que a grande maioria dos convidados também tinha tirado as máscaras.
"Quer ir ver quem é quem?" Perguntei para o Thor, que ainda fingia que tocava sua guitarra de ar.
Ele parou e se esticou. "Tipo quem?"
"A princesa! Quer ir procurar a princesa?" Ele torceu o nariz, pensando. "Vamos, é minha missão te fazer ganhar essa competição," peguei na mão dele e comecei a sair da pista, olhando para todos os lados.
Vi a Princesa Gabrielle dançando com o Príncipe Charles, Nina e Sebastian se amassando num canto qualquer e várias criadas aproveitando nossa noite de férias com os guardas. Mas não conseguia achar a princesa.
Thor não reclamou enquanto eu arrastava ele pelo salão todo, mesmo quando tive que fazer curvas fechadas ou dar freadas bruscas. Ele parecia que ainda estava dançando atrás de mim.
"Não consigo achar ela em lugar nenhum!" Falei, quando já não aguentava mais andar. Estava começando a ficar tonta, então parei ali mesmo.
"Não tem problema," Thor disse, dando a volta em mim dançando.
"Tem sim! Você precisa ganhar!"
"Por quê?"
"Porque você é o meu selecionado. Meu bonequinho que eu vou enfeitar com uma coroa!"
Ele parou na hora, mas estava atrás de mim. Então teve que me segurar pelos ombros e me girar pra poder me encarar.
"Bonequinho?"
"Não se preocupe, não vou contar pra ninguém!"
Ele revirou os olhos.
"Não vou dividir com ninguém os momentos em que eu vou pentear seu cabelo, engomar sua gravata-" minha intenção era que ele fizesse uma cara de irritado ainda pior.
Mas ele estava muito distraído com alguma coisa atrás de mim. Me virei para encontrar um casal que se amassava contra uma cortina. Nós estávamos no canto e eu tinha certeza de que só nós dois podíamos vê-los. Aquilo era esquisito. Mas não me mexi um centímetro.
"Thor-" chamei, mas ele me cortou levando um dedo à boca e me silenciando. Então resolvi continuar com um cochicho. "O que nós estamos vendo?"
"Eu acho..." ele começou, mas parou assim que o cara levantou a cabeça do decote da menina. "É ele!" Thor soltou, alto o suficiente para o cara ouvir e se virar para a gente.
Em um reflexo um tanto impressionante, Thor, me puxou para o lado e nos escondeu atrás de um espelho.
"Quem é?" Eu perguntei, sentindo meu estômago dar reviravoltas de nervosismo.
Eu nem sabia o que estava acontecendo! Mas estava claro que nós tínhamos acabado de testemunhar uma coisa incrível! E eu precisava muito saber o quê!
"O Dylan," Thor me respondeu.
"Oh, meu deus! O Dylan!" Eu falei, sarcástica, levando uma mão à minha boca aberta. Depois fechei e o mirei séria. "Quem é Dylan mesmo?"
"Um selecionado," Thor sorria, de um jeito meio assustador, "que não devia estar beijando alguém que não é a princesa."
Minha boca caiu. E eu levei minha mão a ela. E dessa vez foi de verdade.
Babado. Babado forte. E eu tinha visto! E eu precisava contar para alguém! Eu precisava contar pra todo mundo!
Nós ouvimos um barulho vindo do canto do Dylan e Thor decidiu que estava na hora de nós sairmos correndo dali.
No caminho até a porta, eu vi várias pessoas que adorariam saber do que eu tinha acabado de ver!