Do Outro Lado do Oceano escrita por Laura Machado


Capítulo 127
Capítulo 127: POV Carolyne Muñoz


Notas iniciais do capítulo

Escrevi ouvindo "Dear John" da Taylor Swift.



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Nunca gostei de sonhar. Nunca gostei de passar meus dias pensando em uma coisa distante, torcendo para alcançá-la. Nunca me fez bem. Porque o final era sempre igual. Eu acabava sempre no mesmo lugar.
Já tinha passado anos demais sonhando em reencontrar meu pai até que percebi que nunca mais o veria. Estava cansada, exausta de querer mais e não sair do lugar. Até entendia porque as pessoas gostavam tanto de sonhos. Era algo no que pensar. E, enquanto você ainda acredita neles, parece que está constantemente a centímetros de agarrá-lo. Não importava quão longe eu estivesse de Will pensar em mim, só de não conseguir tirá-lo da minha cabeça, já tinha a impressão de que era possível.
Mas não era. Eu ainda era eu. Ainda era invisível. Aos olhos de todos, ele tinha ido para o castelo para se casar com uma princesa, não podia sair de lá com uma criada. Ele nunca nem me veria com os mesmos olhos que usava até mesmo só para pensar em Tessa. Até agora, depois de tudo que ele tinha descoberto dela, não me consideraria uma opção.
Eu queria rasgar o bilhete que ele tinha me mandado, o bilhete que dois dias atrás ele tinha admitido ser dele. Sabia que não tinha feito por mal, que não tinha um centímetro de crueldade em seu corpo. Mas ele não entendia o quanto aquilo machucava. Para ele, era só uma brincadeira, uma boa ação para tentar me animar. Ele não sabia o quanto eu realmente queria ouvir aquilo dele. Da boca dele. Não por dó, não por pena da garota de quem ninguém gostava. Mas por nutrir algum sentimento por mim.
Não foi maldade dele, mas me dava raiva. De mim mesma, bem mais do que dele. Do mundo inteiro, talvez, e da minha incapacidade de entender que sonhar com aquilo era inútil. Perder o ar por vê-lo era inútil. Ele tinha vindo e ele iria embora, e eu continuaria ali. Invisível. Esquecível.
Tirei mais uma vez a carta do bolso, repassando cada palavra.
Sonhar não me levaria a lugar algum. Não importava o quanto eu o queria ou como já conseguia imaginar uma vida inteira ao seu lado. Ele não me via como eu queria. E eu não poderia apostar minha vida em uma esperança tola e infantil como aquela. Não podia me dar o luxo de ser iludida. Ou de deixar uma oportunidade como aquela passar.
Era estranho. Eu tinha me inscrito para aquele emprego semanas atrás e, apesar de ter me esforçado para bloquear qualquer expectativa que poderia criar, realmente gostava da ideia de trabalhar em um escritório. Talvez a força que eu tenha feito para não demonstrar que me importava só provava o quanto aquilo era importante para mim. E agora que eu finalmente tinha conseguido, agora que segurava em minhas mãos a carta em que me chamavam para começar na próxima semana, tudo que eu queria era ficar.
Mas minha razão para ficar não duraria. Meu sonho se desfaria. E eu continuaria presa ali se não aceitasse.
Eu tinha que aceitar. Tinha que me afastar de Will de uma vez por todas.
Nesse exato momento, as portas do salão se abriram. Eu tinha minhas costas para elas, mas enfiei a carta de volta no bolso e continuei o que estava fazendo. Limpava as bancadas dos selecionados e tinha feito questão de começar pela última, a dele.
Eu precisava me considerar sortuda de já tê-lo conhecido, de ter tido a chance de conversar com ele, de ele não ter ido embora assim que descobriu sobre Tessa. Meu medo naquele sábado era maior do que qualquer outra coisa. Medo de acordar no dia seguinte e já não o ver. Simplesmente descobrir que ele tinha ido embora sem falar comigo.
É, percebi. Pelo menos eu mesma ir embora doeria menos, seria mais fácil do que ter a prova concreta de que, enquanto ele significava já tanto para mim em tão pouco tempo, eu ainda não era nada para ele. Nunca seria nada. Uma distração passageira só.
Com o canto do olho vi que quem tinha entrado ali eram só outros criados, que ainda precisavam instalar a parte elétrica da brincadeira. Uma gincana para descobrir qual deles se importava mais com a princesa, qual sabia mais sobre ela.
Parei de tirar o pó da bancada de Thor para olhar na direção do painel do placar. Tinha quase inveja dela, de toda essa atenção. Tinha passado a vida inteira ouvindo outras criadas dizendo que a vida era assim, alguns nasciam na realeza, outros para criadagem. Mas existia outra divisão que me incomodava bem mais.
Algumas pessoas simplesmente nasciam para serem notadas. Não importaria a quantidade de tropeços que dessem ou a falta de responsabilidade e respeito que tivessem. Algumas pessoas sempre venceriam. E outras sempre perderiam. Outras, como eu, estariam fadadas à escuridão. E tinham que se considerar sortudas, já que poderia ser pior.
E poderia, mesmo. Eu estava sendo egoísta, mimada. Ingrata. O que só me dava ainda mais raiva de mim mesma.
Era isso que sonhos faziam comigo, isso que ter me apaixonado por ele me causava. Eu tinha virado a pessoa que conseguia um emprego bem melhor em outra cidade, uma chance de carreira com um salário maior, mesmo que a carreira fosse só de secretária. E eu ainda reclamava. Queria negar só para continuar me agarrando à esperança de que um dia Will não me elogiaria por pena, de que, antes que ele fosse embora, me notaria de verdade.
Respirei fundo, desviando os olhos para as janelas. Alicia, que me ajudava, já estava quase chegando perto de mim, tendo feito sua parte e metade da minha.
Mas talvez fosse a última vez que eu visse o jardim daquele ângulo. Talvez minha última terça-feira ali. E o sol parecia saber, pois se escondia e deixava que as nuvens tomassem conta do céu.
Eu sentiria falta dali. Não mais do que de Will, mas mesmo assim. Sentiria falta de poder ver Alicia crescendo. Ela trabalhava com vontade para alguém que queria ser qualquer coisa além de criada. E eu poderia apostar que não tinha a menor ideia do que a esperava em alguns dias.
O aniversário dela seria minha última festa ali. Menos de uma semana e eu precisaria deixar aquele castelo. Aquela era mesmo uma decisão que eu conseguiria tomar?
"Carol," a voz da Alicia estava mais perto do que eu esperava. "Está tudo bem?"
Eu sorri para ela, que colocou suas mãos nos meus ombros.
"Se você não estiver passando bem, eu posso terminar sozinha," ela continuou.
"Eu estou ótima," falei, respirando fundo. "Você que pode ir para o seu quarto. Já fez mais do que devia e eu consigo finalizar aqui."
Ela me olhou de lado por um tempo, tentando ver algum sinal de que eu estava mentindo.
Mas não estava. No máximo, estava desanimada. E logo ela se convenceu e tomou seu rumo até o quarto. Nem suspeitava que estávamos lhe dando mais folga do que o normal.
Eu terminei de limpar a bancada de Thor já quando os outros criados testavam a parte elétrica. Olhei no relógio. Não demoraria até que os selecionados chegassem. E a prova disso eram as criadas que apareceram com carrinhos de comida.
Fui logo ajudá-las a organizar pela mesa, mesmo que não fosse minha tarefa. Elas tagarelavam sobre alguma fofoca de um guarda que parecia estar saindo com duas criadas ao mesmo tempo, mas eu só ouvi. Sentiria falta daquilo também, de estar no meio delas e me esquecer de todo o mundo inalcançável para nós lá fora.
Pensei em contar da minha proposta, até cheguei a abrir a boca, mas não queria atrapalhar. Deixei que continuassem com a conversa até terem terminado.
E então, antes mesmo dos selecionados chegarem, uma criada de cada se posicionou atrás de sua bancada. Eu fui ficar na área da de Keon.
William ficaria a duas para a esquerda. Só duas. Cinco metros. E meus olhos já se recusavam a olhar para qualquer outro lugar, quando as portas principais se abriram de novo.
Eram eles, eu constatei, me virando para a frente e segurando a respiração. Amassava uma mão na outra atrás de mim, me perguntando se ele me veria, se eu poderia me esconder atrás da bancada de Keon antes que me percebesse.
"Carolyne."
Meu nome em sua voz fez meu coração parar de bater por um segundo.
Eu precisava me manter firme. Não poderia tomar uma decisão por fraqueza. Não poderia deixá-lo me afetar assim.
"Carol," dessa vez, sua voz estava baixa, precisando de pouca força para chegar até meus ouvidos quando ele já tinha se colocado ao meu lado.
Não poderia continuar olhando para a frente, tentando ignorá-lo. Fui obrigada a me virar na sua direção.
"Will."
"Tudo bem?" Ele fez questão de abrir um sorriso e mostrar todos os seus dentes e sua felicidade.
Era bom vê-lo assim. Não estava mais para baixo, não estava desanimado de viver. Era bom. E difícil.
"Tudo," disse, todas as palavras que tinha pensado há alguns minutos sobre ele ainda estavam frescas na minha cabeça. Todas as conclusões, as duras realidades correndo pela minha mente, se esticando até a ponta da minha língua.
Engoli a seco. Tinha a impressão de que, se me atrevesse a abrir a boca, acabaria falando tudo, sairia dali tendo lhe contado todo e cada pensamento que já tinha tido sobre ele, cada sonho, cada decepção, cada esperança que tinha esmagado. Quanto menos eu falasse, melhor.
"Tem certeza?" Ele perguntou, franzindo as sobrancelhas. "Você parece estranha."
"Não," a palavra saiu antes que eu pudesse evitá-la. "Quer dizer, é só que eu preciso tomar uma decisão e ainda não sei o que fazer."
Seu sorriso desapareceu devagar e ele assentiu, me entendendo. "Posso perguntar qual é?"
Meus olhos se prenderam nos seus no momento em que ele voltou a levantar o rosto.
Aquilo não era normal. Ele não era normal. Não era possível que o mundo estivesse cheio de homens como aquele, com aquele olhar, com aquela expressão, aquela cabeça. Não era nem possível que houvesse mais um único homem que chegasse perto de ser como ele.
Talvez valesse a pena sonhar um pouco. Ele era único. Seu charme genuíno e contagiante era único. Se tinha alguém no mundo por quem valesse a pena perder todas as melhores oportunidades da vida, era ele.
Talvez eu não estivesse tão errada assim em arriscar tudo pela chance de ter seus olhos em mim mais um pouco.
As portas principais se abriram outra vez e praticamente todos ali dentro se viraram para ver quem era. Eu me virei para encontrar a princesa entrando. Mas Will continuou me olhando, ignorando o que estava acontecendo atrás dele.
"Eu recebi uma proposta," falei, abaixando o rosto para não ter que encará-lo, "de emprego. Só preciso decidir se vou embora."
"Você vai embora?"
Ele falou tão baixo, tão desapontado, que tive que olhá-lo.
Nunca tinha sentido um aperto no peito tão forte quanto quando eu lhe respondi. "Talvez."


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Notas finais do capítulo

Vocês conhecem o Wattpad? É um site de livros, fanfics e histórias, aonde eu posto tudo que eu já escrevi na vida. Acabei de começar lá uma nova edição da minha história, 'Diário de uma Princesa Escondida.' É um livro que escrevi uma vez em inglês e que costumava postar aqui traduzido. Agora estou escrevendo do começo, revendo detalhes que me incomodavam e melhorando muita coisa. Se alguém quiser ver, entre no Wattpad. Vocês podem encontrar essa fanfic lá também. Acreditem, vão se apaixonar pelo aplicativo.



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