Do Outro Lado do Oceano escrita por Laura Machado


Capítulo 118
Capítulo 118: POV Lola Farrow


Notas iniciais do capítulo

Escrevi ouvindo "Timing is Everything" do Garrett Hedlund (SIM, o MARC cantou essa música para eu escrever haha) e "Secrets" da Kat Graham (ouçam o cd dela, Roxbury Drive. Está ótimo!).

Ah, sobre o capítulo: não sei se vocês estão preparadas!



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O toque era simples, estudado. Ele só seguia o que a nossa professora lhe falava para fazer. Mas no momento em que Will deslizou a mão pelas minhas costas, eu me lembrei da noite anterior. De cada vez que Marc tinha feito o mesmo, discretamente me obrigando a recuperar meu fôlego e esconder para todos o quanto aquilo me afetava. Os olhos de Will me lembravam os dele. E todo o caminho de volta para o castelo durante o qual tivemos que nos contentar com olhares e coisas não ditas.
E por mais educados e calorosos que fossem os sorrisos de Will, nenhum deles conseguiu evitar que eu voltasse a pensar no último que tinha visto em Marc. Marlee ocupava meus ouvidos então, não me deixando ficar sozinha com ele mais nem um segundo desde voltarmos do evento. Ele se afastou tão sorrateiramente, devia pensar que eu já o tivesse esquecido. Mas, quando estava já prestes a virar o corredor, ele virou o rosto para me olhar.
E parou.
Eu finalmente voltei a respirar. Não tinha ideia do que tinha que estar ouvindo Marlee falar, pois tinha acompanhado seus passos e contado com cada um as chances que eu tinha de vê-lo de novo.
Mas ele parou. Nossos olhos se encontraram outra vez e ele parou logo antes de sair de vista. E sorriu. Não largo, não de lado, nada que fosse o suficiente para mostrar suas rugas. Ele sorriu como se respirasse.
Fui o caminho todo até meu quarto ainda ouvindo Marlee falar. Mas, do mesmo jeito que fazia com Will e a irmã da Princesa Gabrielle, simplesmente não dava ouvidos. Tinha a leve impressão de acompanhar o assunto, reagia quando era minha vez, não perdia um passo da dança. Mas tudo no automático.
Minha cabeça estava ainda presa na noite anterior. Meus sentidos também. Will me girou de leve, provando que eu já tinha dançado o suficiente para não ter que prestar atenção no que fazia para acertar. E assim que ele voltou a me segurar pelas costas, eu senti as mãos de Marc me abraçando, subindo até minha nuca, me levando até ele.
Respirei fundo, sorrindo para encobrir o arrepio que percorria meu corpo inteiro. Will estava feliz, quase fazendo com que eu me sentisse culpada de não me importar tanto com aquele encontro. Mas eu realmente ainda estava na noite anterior. Ainda podia sentir o calor daquele armário de casacos. Quase podia sentir o gosto de champanhe na boca. Definitivamente ainda via tudo à minha volta refletindo no brilho do vestido que tinha usado.
Will me girou outra vez, agora fazendo com que eu inclinasse para trás, e todos no salão bateram palmas. Ele falava com a câmera, simpático e inegavelmente charmoso. E eu só deixava que minhas lembranças brincassem com meus sentidos.
A terceira música que nós dançávamos acabou e nós paramos de um jeito bastante desajeitado. Mas o jeito de Will era amigável demais. Ele não perdia a pose por um só segundo e a câmera o adorava. Todos ali pareciam não conseguir evitar imitá-lo no instante em que ele resolvia sorrir. E eu não precisava falar nada. Estava grata por ele conseguir roubar a atenção de todos e me deixar com meus pensamentos.
Em algumas palavras, eu o agradeci pelo encontro incrível. Avisei as câmeras que as veria logo mais, para o almoço, mas que descansaria um pouco agora. Uma repórter que nos assistia perguntou se eles teriam a chance de me ver em outro encontro. A palavra que saiu da minha boca foi sim. E ela mesma completou me perguntando o mais detalhadamente possível se seria naquela tarde, ainda no castelo, quem sabe com Blake Arely, às cinco?
O jeito mais fácil de sair de lá foi confirmar, mesmo que isso me obrigasse a falar com Marlee assim que consegui deixá-los para trás. Por sorte, ela estava esperando na porta, ansiosa para ver se tudo tinha dado certo. A ideia do encontro veio dela outra vez e assim foi marcado. Às cinco da tarde eu pintaria quadros com Blake. Segundo ela, a melhor parte seria exatamente o fato de nem eu e nem Blake termos qualquer tipo de passado nessa área.
Tinha estado pronta para ficar sozinha desde o momento em que entrei na Sala de Jantar para o café da manhã. E só o fato de não ter que olhar para ninguém ou fingir estar escutando o que falavam já era o suficiente para eu me sentir sozinha. De um jeito ótimo.
Não tive a menor pressa durante o caminho até meu quarto. Vários minutos deviam ter se passado e eu ainda estava no mesmo corredor.
Andava me segurando os braços quase como se tivesse mudado de ideia antes de cruzá-los. De vez em quando me arranhava de leve, testando para ver se ainda tinha qualquer sensibilidade na pele. Nem olhava por onde ia, nem saberia dizer que horas eram, aonde queria chegar mesmo?
Eu poderia facilmente acreditar que dava, sim, para voltar no tempo. Embaralhava memórias, toques que tentava acompanhar com a mente, mas que só conseguia sentir na pele. Tinha que recuperar o fôlego a cada dez segundos, mordia os lábios depois levava minha mão a eles. Deixava que meus dedos os traçassem de leve, tentando me agarrar à memória do beijo, tentando senti-lo outra vez.
Quanto mais alto era o barulho das várias equipes de filmagem fazendo takes do castelo, mais eu me fechava. Não tinha a menor pressa de chegar no meu quarto, pois nem sabia bem o porquê de ir para lá. A única coisa que eu queria era poder ficar sozinha. E, se eu andava, era só por andar.
Acabei chegando até o final do longo corredor e o virei. Na hora, lembrei do último sorriso de Marc. Sabia que ele devia estar no castelo. Sua presença ou até mesmo só a probabilidade dela era o suficiente para eu segurar a respiração a cada porta que abria, corredor que virava, pessoa que via. Não tinha nada no mundo que eu quisesse mais do que o ver outra vez. E, ao mesmo tempo, não queria.
Não. Não queria vê-lo, porque não sabia como seria. Não sabia o que estava passando pela cabeça dele. E, independente do que tinha sentido na noite anterior, eu não tinha a menor garantia de que ele não tinha mudado de ideia de um dia para o outro. Ou talvez nem fosse como eu achava que era. Provavelmente não era. E eu não queria ter a certeza daquilo.
Então era melhor que não o visse. Era medo, sim, mas um medo quase palpável, que eu quase sentia como fato. Me perfurava por dentro, porque, no fundo, eu sabia que a próxima vez que o visse, teria toda a esperança dentro de mim destruída. Qualquer que fosse, ainda que eu mesma já lutasse contra ela, ele acabaria pela destruindo.
Era melhor que eu não o visse.
Uma vez já no novo corredor, foi impossível não notar uma garota em um banco perto da janela. Impossível, pois o sol refletiu no seu cabelo quase branco de tão loiro e me cegou por um rápido segundo.
Ainda assim, eu teria passado por ela sem me importar, se não tivesse notado, assim que ela saía da minha vista, que era Amelia Woodwork.
Meus pés pararam involuntariamente. Ela olhava pela janela como se esperasse alguém chegar, suspirando de vez em quando. Assim que me percebeu parada do seu lado, me arriscou um olhar. Parecia não se lembrar do meu nome. Ou talvez do seu próprio.
"Você está bem?" Perguntei, só para acalmar a impressão que tive de que ela não estava.
Pelo contrário. Ela parecia extremamente abatida, como se tivesse passado a noite em claro.
Amelia fez que ia responder, mas não pareceu encontrar ânimo o suficiente. Acabou só voltando a olhar pela janela, sua cabeça apoiada nos braços.
Eu ia continuar meu caminho, no máximo avisaria a sua mãe. Mas, antes que pudesse dar o primeiro passo, outra coisa chamou a minha atenção.
Bonequinhos de madeira. Todos enfileirados na sua frente. Todos feitos pelo mesmo que tinha me dado um ursinho. Alexander Dobrovisky.
Talvez tenha sido por ela. Talvez por ele. A única certeza que eu tinha era das palavras que saíram da minha boca.
"Universidade de Kent."
Amelia se virou de novo para me olhar, dessa vez com bem mais energia. "Quê?"
"Alex voltou para a Universidade de Kent. É onde ele trabalha," expliquei.
Seus olhos brilhavam tanto, que achei que choraria. Mas ela só balançou a cabeça, parecendo se recusar a piscá-los. "Eu sei," disse, de volta ao desânimo.
Não tinha sido o suficiente. E ela merecia o suficiente. Ele definitivamente merecia.
"Alex saiu por sua causa," falei, dando um mínimo passo na sua direção. "Ele me pediu para sair, porque se apaixonou por você. E, sim, ele falou seu nome. E agora ele já deve estar em Kent E amanhã já deve voltar a trabalhar."
Seu queixo caiu, como se ela quisesse falar alguma coisa, mas não tivesse forças o suficiente.
"Universidade de Kent," repeti. "Leve um casaco."
Não quis esperar. Eu sabia que agora tinha sido o suficiente. E precisava me afastar.
Porque, pela primeira vez desde a noite anterior, foi impossível não pensar em outra coisa.
Na minha Seleção.
Eu andava pelos corredores principais, longos e ligados a tudo. Logo depois de Amelia, passei por uma abertura que dava a um jardim interno, onde uma equipe de filmagem rapidamente me notou. Eu sorri. Acenei. Continuei meu caminho.
O que eu ia fazer?
No fundo da minha mente, talvez aquela pergunta já estivesse me assombrando faz tempo. Talvez eu já soubesse que acabaria tendo que chegar nela. Devia ter adiado de propósito, porque era difícil demais admitir sua existência. E, ainda mais, a falta de resposta.
O que eu ia fazer? Qual era o próximo passo? O que eu ia fazer com os oito caras que ainda celebravam a chance de ter um encontro comigo? Caras que dormiam e acordavam todos os dias naquele castelo, só para confirmar a sua intenção de casar comigo. O que eu faria com eles?
Mas o que eu podia fazer? Não era como se muita coisa tivesse mudado. Mesmo que parte de mim acreditasse que tudo, sim, estava diferente, eu ainda tinha que ser racional. O mais racional que eu pudesse.
Parei de andar e me apoiei na parede logo antes de virar o corredor, já que meus passos vinham me impedindo de pensar direito.
Eu precisava ser racional. Mesmo que tudo tivesse mudado dentro de mim, o mundo ainda era o mesmo. A minha situação ainda era a mesma. Eu precisava de mais tempo. Mais tempo de Seleção, só um pouco mais de tempo com os selecionados embaixo do mesmo teto que eu. Só o bastante para eu ver se conseguia mudar o resto também para encaixar naquilo que queria.
Não faria nada, decidi, voltando a andar. Não tomaria decisão alguma. Não antes de ter certeza. E, de preferência, uma certeza que fosse além de mim mesma. Além do que eu senti. Porque qualquer mudança significativa não dependia só de mim. Dependia também de-
Marc.
Seu nome apareceu na minha cabeça no mesmo instante em que nossos olhos se encontraram. Mas ele estava longe, bem longe. Longe demais. Devia ter virado o corredor logo antes de mim. Do outro lado.
Nós dois paramos quando notamos a presença um do outro, mas não demoramos para retomar nossos caminhos. Ele vinha até mim, eu ia na direção dele.
O resto do corredor estava vazio, mas o resto do castelo, não. As câmeras que eu tinha deixado para trás no corredor de Amelia se faziam ouvir sem qualquer sombra de dúvida. Poderia apostar que estavam na minha nuca, registrando cada passo, cada batida do meu coração, de tão altas que pareciam. E Marc passava pela porta do Salão dos Homens, onde praticamente todos os meus pretendentes estavam. De todos os lugares que poderíamos ter nos encontrado, aquele era o pior.
Um olhar. Era o máximo que eu sabia que teria. Quem sabe um esbarrão nem tão acidental, onde eu tivesse a chance de deixar minha mão tocar a dele. Só alguns segundos em que eu pudesse sentir sua presença ao meu alcance. Um pequeno encontro secreto no meio do barulho que nos rodeava, barulho de pessoas que nunca poderiam descobrir o que eu estava pensando.
Quanto mais nós nos aproximávamos, mais eu parecia diminuir a minha velocidade. Não queria que aquele encontro acabasse rápido demais. Antes de tocá-lo, eu já podia sentir a decepção de ter que deixá-lo ir.
Mas talvez fosse melhor. Tinha coisa demais que eu queria dizer, que eu queria explicar. Coisa demais para lhe perguntar, que ainda precisava perguntar a mim mesma. Eu não saberia por onde começar. E, só de pensar em quando finalmente teria a chance de conversar com ele, já podia sentir meu medo descer como um calafrio pelas minhas costas.
Ele não diminuiu seus passos. Pelo contrário, quanto mais perto chegava, mais parecia estar me mirando. Não estava ajudando em nada em fingir que aquele encontro era como qualquer outro.
Mesmo que nenhum de nós desviasse o olhar, parecia que concordávamos em nos contentar com aquela mínima interação. Só trocando nosso segredo pelos olhos e ansiando pelo toque rápido e discreto que teríamos quando finalmente estivéssemos lado a lado.
Era impossível olhar nos olhos dele sem lembrar de todo o tracejado de suas mãos em mim. Impossível não calcular a pequena distância que eu estava de finalmente conseguir sentir outra vez como era poder beija-lo. E, se não fosse pelo barulho que todos os outros no castelo pareciam intensificar a cada segundo, mais alguns passos e eu teria esquecido completamente tudo que me obrigava manter o que tinha acontecido em segredo.
Mais alguns passos. Só mais alguns e eu estaria do seu lado. Já esticava meus dedos, mesmo com o braço para baixo. Já dava um passo ao lado e ele fazia o mesmo. Já saímos do caminho um do outro. Mais alguns passos. Um, dois, e nossas mãos se esbarrariam e poderia sentir aquela eletricidade viciante voltar a correr pelas minhas veias.
Só. Mais.
Um.
Desviei meus olhos para a frente, segurando a respiração, esperando o momento em que finalmente o tocaria.
Mas meus dedos não encontraram os dele. O que eu senti foi bem diferente. Não foi leve e nem discreto. Foi o braço inteiro de Marc me segurando pela cintura, me virando até que eu estivesse de frente para ele. Foram os lábios dele encontrando os meus antes que eu tivesse tempo de pensar, roubando absolutamente todo o ar que eu achei que ainda tinha. Suas mãos firmes subiam até meu rosto, determinadas em garantir que eu não conseguisse pensar em mais nada no resto do dia.
Ele ignorar o perigo fez eu o sentir em cada centímetro do meu corpo. Nós estávamos no meio do corredor mais frequentado do castelo, no dia em que tínhamos recebido vários convidados, cada um deles armado de câmera e sede por fofoca. Mas ele não se importava. Me beijava como se fôssemos a únicas pessoas do mundo, como se não tivéssemos absolutamente nada a perder a não ser o momento.
O medo de sermos pegos amortecia meus sentidos, se acumulando no meu peito. Minhas pernas fraquejaram, me obrigando a agarrar a Marc com as duas mãos. Ele era louco. Era óbvio. Ele era louco. Completamente louco.
Mas, no exato momento em que ele se afastou, assim que percebi que já não sentia seus lábios nos meus, sua loucura me fez falta. Ele pareceu me girar outra vez, me deixando de costas para as janelas agora. Em meio segundo, suas mãos buscaram as minhas e, conforme ele começou a se distanciar, pude sentir o rastro de seus dedos se desprendendo de mim.
Ele se virou de costas, me deixando para trás, como se nada tivesse acontecido, como se só tivéssemos mesmo passado um pelo outro. Ainda podia ouvir as câmeras no outro corredor e os selecionados a alguns metros de mim. Um castelo inteiro à nossa volta, cheio de pessoas que não sabiam da velocidade que ele fazia meu coração bater, que não tinham ideia do que eu guardava dentro de mim. Não poderiam adivinhar que eu tinha que me apoiar na parede e respirar fundo alguns minutos antes de continuar.
Cada vez que eu inspirava parecia ser a primeira. Não conseguia me acalmar. Ele já tinha desaparecido do corredor, mas eu sentia como se ainda estivéssemos arriscando demais. Como se desse para ver em meu rosto tudo que eu ainda estava tentando entender.
E devia dar. Devia estar mesmo escrito no meu rosto, em meus braços, em todos os lugares que continuavam quentes pela lembrança do que tinha acabado de acontecer. Mesmo quando voltei a andar para o meu quarto, não tinha me acalmado. Ainda tentava recuperar meu fôlego. Ainda podia sentir o perigo daquele encontro correndo pelas minhas veias.
Mas, quanto mais eu me afastava de onde tinha acontecido, mais queria arriscar de novo. Queria voltar para lá, fingir por mais alguns minutos que não tinha risco algum.
Assim que os guardas britânicos da porta do meu quarto me notaram, deram caminho para eu passar. Até apressei meu passo, querendo entrar logo, me jogar na minha cama e repassar cada toque de Marc outra vez na minha cabeça.
Mas todos os meus planos foram por água abaixo quando abri a porta. Alguém me esperava. E ela se virou para me encarar assim que me ouviu entrar.
Clare.
Droga. Tinha me esquecido. Mas, como era de se esperar, ela não estava nada feliz.


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Notas finais do capítulo

Se você leu esse capítulo até o dia 15/10, a universidade onde Alex trabalha era de Paloma*. Para encaixar no mapa de Illéa que veio com o livro Happily Ever After, eu troquei Paloma por Kent.