“Em outra vida, eu seria sua garota e nós manteríamos todas as nossas promessas. Em outra vida, eu te faria ficar. Então não precisaria dizer que você foi aquele que foi embora.”

The one that got away – Katy Perry.

O som da campainha me puxava para fora das minhas lembranças, forçando-me a afastá-las para longe. De volta para o lugar do qual não deveriam ter saído. Minhas mãos ainda estavam trêmulas e talvez eu estivesse branca como um fantasma, mesmo assim consegui recuperar minha consciência e me levantar.

Desci as escadas devagar, sentindo o mal estar se esvaindo lentamente. Tão lentamente que se eu não estivesse tão concentrada nisso, nem notaria.

Meu coração já sabia quem estava do outro lado da porta, mas talvez não fosse uma boa ideia vê-lo agora. Não queria que ele me visse assim. Ele pedirá explicações e não faço ideia do que dizer.

— Quem é? — perguntei ainda com voz de choro.

— Louise? O que aconteceu? Sou eu, Thomas.

— Nada aconteceu, Thomas. Está tudo bem.

— Eu posso entrar? Por que não apareceu na Universidade hoje?

— Eu estava um pouco indisposta.

— Vai me deixar entrar ou não?

Ele perguntou com um tom preocupado e então eu resolvi ceder e abrir a porta. Abri a esquadria devagar, encostando-me na quina da mesma. Minha cabeça baixa não me ajudava muito a manter meu disfarce de que estava tudo bem.

— Louise...

Ouvir sua voz baixinha e carinhosa me fez correr para seus braços e me aconchegar ali. O choro saindo livremente no exato momento em que suas mãos se enroscaram na minha cintura, apertando-me em um abraço compreensivo. A mão de dele migrou de minha cintura para meus cabelos e ele os afagou enquanto repetia:

— Shiu... Tá tudo bem. Já passou.

Sem nem fazer ideia do que tinha acontecido.

{...}

— Um chocolate quente no capricho. Especialidade do chefe.

— Obrigada.

Sorri ao pegar a xícara com o líquido e bebericar um pouco. Estava gostoso. Ele sentou-se ao meu lado, mas não muito próximo de mim. Fixando seu olhar em meus atos.

— O que achou do chocolate quente?

— Dá pra tomar... — desdenhei dando de ombros e rindo. Ele me olhou com os olhos semicerrados e um sorriso malandro nos lábios. Retribuí o sorriso, mas de uma forma não tão intensa.

— Não fica com essa carinha, princesa...

— Thomas, obrigada por cuidar de mim.

Cheguei mais perto dele e me aninhei em seu peito. O cheiro de Thomas me acalmava. Seu toque, sua simples presença me tirava toda a preocupação que eu possa ter. Ele afastava as lembranças ruins e me confortava. Nada mais justo, do que eu dividir com ele meus segredos.

— Preciso te contar o que aconteceu... — comecei e ele me interrompeu.

— Não precisa contar se não quiser, não quero te pressionar a nada.

Olhei em seus olhos e sorri, puxando-o para um beijo terno. Selei nossos lábios carinhosamente e ele acariciou minha bochecha. O nosso beijo tornava-se cada vez melhor com o tempo. Mais cheio de significado, mais valioso.

— Isso foi bom — ele comentou quando nos separamos. Eu sorri e respirei fundo.

— Gosto mais de você do que deveria.

— Ei! Essa é minha frase. Não a roube de mim.

Nós rimos.

— Nesse final de semana meus pais vão dar uma festa. É o noivado da minha tia que ainda mora com a gente e graças a Deus vai se casar. Eu gostaria de saber se você quer ir comigo?

— Na sua casa? — ele assentiu — Com seus pais?

— Sim, Louise. Já disse que eles quem darão a festa.

— Eu não sei...

— Qual é! Não é como se eu fosse te apresentar como a mulher da minha vida... É só uma festa.

— Tá! Eu vou.

— Ótimo! — ele estampou o conhecido sorriso vitorioso e me deu um selinho rápido — Agora pode me contar o que houve.

— É complicado de explicar e não sei se eu deveria falar sobre isso agora, mas acho que você precisa saber sobre isso.

Ele me fitava interessado, mas sem me pressionar. Na verdade, eu não estava desconfortável com aquilo. Estava realmente inclinada a contar minha história com Jamie. Então comecei:

— Quando eu tinha 16 anos eu conheci um garoto muito legal que se chamava Jamie.

— Aposto que ele não era mais legal que eu.

Lancei um olhar repreensivo para ele.

— Desculpa. Prossiga.

— Bom, a gente começou a namorar e eu me apaixonei por ele, sendo isso recíproco. Vivi os melhores dois anos da minha vida ao lado dele. Porém, no nosso aniversário de dois anos de namoro, ele foi à minha casa com um buquê lindo e acabou com tudo.

— Que droga! — Thomas falou entretido.

— Foi o que eu pensei. Primeiro, passei a me odiar, por não ter conseguido ficar com ele para sempre. Em seguida, passei a odiá-lo, por ter me dado um pé na bunda, mas depois, nada disso fez nenhum sentido.

Sua expressão mudou para uma confusa. Ele me olhava com uma das sobrancelhas erguidas e com os lábios fechados, pressionando-os.

— Quando a irmã dele chegou à minha casa para ter “uma conversa muito séria” — fiz aspas com as mãos para representar a fala da loira e então continuei — Eu não esperava por nada daquilo. Cada palavra que saía de sua boca parecia inimaginável e nunca, nunca mesmo aquela possibilidade passou por minha cabeça.

— O que ela queria dizer? — ele questionou curioso e eu engoli em seco, minhas mãos voltando a tremer, enquanto meu cérebro revivia aquele dia.

— Bom, ela veio me dar uma péssima notícia. Escondida de Jamie, ela foi até minha casa me noticiar que ele tinha apenas um mês de vida.

Thomas assumiu uma postura assustada e preocupada comigo, cortando a distância entre nós dois e me abraçando.

— Não precisa contar. Não precisa reviver isso.

— É que... Já faz dois anos que ele morreu e eu ainda sinto tudo aquilo. Eu só... — minha voz cortava e eu não conseguia completar as frases.

— Ei, você vai ficar bem. Você é forte Louise! — ele ergueu meu rosto e me olhou ternamente — Uma verdadeira inspiração para mim. Vai ficar tudo bem. Eu garanto.

E voltou a me abraçar, acariciando meus cabelos e ouvindo meu choro baixo. Eu fiquei ali, encolhida no seu abraço, sentindo seu cheiro, recebendo seu carinho e me acalmando. Até que adormeci.