Stay With Me escrita por Fenix


Capítulo 23
Quantos anos são necessários para esquecer um minuto?




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Ao cair da noite, minha mãe grita-me da escada para que eu fosse jantar. Não sei se Aline já havia comentado sobre a visita de Zac durante a tarde e particularmente prefiro acreditar que não. Desço a escada cabisbaixo como sempre e dirijo-me para cozinha.

– Vai comer saladinha hoje? - Aline pergunta para mim enquanto colocava arroz em seu prato.

– Não sei - Respondo brincando.

– É, eu que fiz a comida aqui hoje e não sou como a minha Mãe que deixa você escolher o que vai comer.

– Iiiihhh... Começa não! - Pego meu prato em cima da pia e viro-me para o fogão pegando o frango empanado.

– Mas é, você nunca come nada de bom. Vai comer sim! - Então põe o alface em meu prato e me encara - E se reclamar eu coloco mais.

– Você é chata, sabia?

– Você precisa começar a comer melhor... E nada de beber muito refrigerante.

– Eu vou beber uma garrafa de dois litros - Respondo-a.

– Vai nada! - Ela diz e sai da cozinha rindo.

Nego a cabeça dando uma risada e caminho para sala após ter feito meu prato. Paro ao lado da escada e encaro todos sentados em frente à televisão ao mesmo tempo em que comiam, meu olhar vira para o lado e observa a escada. Uma decisão que eu preciso tomar em poucos segundos, jantar com a minha família ou me isolar novamente no meu quarto.

Decido jantar com todos, já que eu sempre subia para comer em meu quarto. Apesar de saber sobre os ricos de algum assunto se virar para mim, eu quis arriscar, preciso saber que eu ainda tenho uma família, pelo menos por enquanto.

Não me junto completamente com todos. Eles ficam mais próximos da televisão e eu sento no chão ao lado da poltrona e encostado na parede. Assisto ao jornal da noite que fala algo sobre as olimpíadas de 2016. Mantenho-me calado enquanto todos debatem assuntos aleatórios.

O tempo passa e consigo terminar minha janta sem que ninguém puxasse assunto comigo. De certa forma parecia que eu nunca estive ali, assim como um fantasma, que senta na sala de estar e observa quieto a sua conversa. Levanto-me em silêncio e caminho para levar o prato à cozinha. Meu Pai segue-me com o olhar que posso sentir que sabe de algo. Não foi uma simples olhada, mas que ele espera alguma brecha para poder dizer algo a mim.

Deixo rapidamente as coisas na cozinha e apresso meus passos em direção a escada, antes que pudesse subir sou convocado por ele na sala. Respiro fundo com meus olhos fechado, viro e aproximo-me do sofá.

– Aline me disse que aquele garoto, Zac, veio aqui em casa hoje - Meu Pai comenta.

Ótimo, era exatamente isso que eu precisava. Eu realmente fiquei surpreso dele ter guardado isso durante todo o jantar.

– Sim, por quê? - Pergunto.

– Ele não é um garoto que você deveria ficar andando - Ele comenta.

Levanto as sobrancelhas surpreso e dou uma rápida e abafada risada sarcástica.

– Espera ai, vocês sempre falam para eu sair com garotos e finalmente eu tenho um amigo e vocês querem que eu não ande com ele? - Digo dando um passo a frente.

– Você já esta pegando os jeitos dele - Meu Pai fala um pouco rude.

Bruna e Aline disfarçam e caminham para a cozinha. Nego a cabeça cabisbaixo e tomo fôlego para poder aguentar essa situação.

– Você naquele dia que a sua Tia dormiu aqui, parecia uma menina falando - Ele diz.

– As pessoas percebem - Minha Mãe desvia o olhar da televisão para se pronunciar. Na verdade ela não estava nem assistindo, ela só não queria participar desse julgamento desnecessário, mas não poderia deixar meu Pai falando sozinho, já que não é o único que não quer um filho gay.

– Eu estava normal.

– Não estava, Felipe, não estava - Ela diz.

– Claro, todo mundo percebeu, eu fiquei sem jeito pelo seu Padrinho.

Fico sério encarando-os. Eu só penso que eu nunca vou viver longe disso, eles só faltam me culpar pela minha própria existência.

– Você tem ficado com uns jeitos meio estranhos, e isso é o convívio com aquele garoto - Minha Mãe fala.

– Você disse que tinha gostado dele - Digo.

– Sim, mas ele não é uma pessoa que você deveria ficar tão grudado.

– Não é, cara, no mundo em que vivemos hoje, temos que aprender a conviver com viados, sapatonas, maconheiros, bandidos... Mas você precisa saber que isso não quer dizer que você precise se amigo deles - Meu Pai diz diminuindo o tom de voz e ficando mais calmo.

– Eu não entendo... Eu juro que eu não entendo vocês... - Falo apertando minhas mãos o máximo que eu podia para que o choro não viesse agora - Uma hora vocês falam para eu parar de andar com tantas meninas, outra hora vocês falam que não é para eu andar com garotos... É para eu viver como? Da forma que vocês acham que eu devo viver?

– Que isso? Está maluco? Olha como você fala comigo, garoto - Diz Hélio - Eu sou seu Pai, me respeita.

– Desculpa - Falo com o som arranhando lentamente a minha garganta. Minha voz foi tão áspera que foi mais doloroso que qualquer coisa - Posso ir para o meu quarto agora, ou ainda tem mais?

– Esse ai não tem mais jeito não - Meu Pai diz revoltado.

Saí da sala com meus olhos queimando e minha visão ficando mais embaçada, tenho poucos minutos antes que a primeira lágrima escorra pelo meu rosto. Subo rapidamente a escada e presumo que meus olhos já estejam vermelhos. Toda essa adrenalina faz com que eu não me concentre em nada, mal pude sentir meus passos subindo a escada, ou se ao menos eu me lembrei de não pisar com meu pé recém-operado.

Eu estou realmente abatido, tão mal por eles terem me dito tudo isso que eu pensei que talvez eu não fosse conseguir superar mais essa noite. Bato a porta do meu quarto e agacho deixando que o choro me domine. É uma sensação tão ruim, você se sente cada vez mais perdido, mais sozinho e parece que as pessoas não se importam com isso.

Sempre pensei em minha família como minha força, aqueles que quando eu caísse eles iriam me levantar... Mas não é exatamente assim. Eles estão com tanto medo de que eu me tornar gay, que não pensam nas consequências de suas palavras, ou sabem o efeito que causam e acham que assim eu irei mudar. Acreditam que o medo pode mudar alguém, mas estão enganados. Esse é um dos grandes motivos de jovens homossexuais cometerem suicídio, porque ficam com tanto medo dos pais, e acham que se nem eles podem aceitá-los, ninguém mais poderá.

Os Pais também têm medo, eles têm medo do que vamos enfrentar, dos preconceitos e das agressões. Mas alguns têm mais medo do que as pessoas vão falar do que com o que o próprio filho vai pensar.

Essas questões ecoam pela minha mente sem parar. Sou um garoto fraco, eu sei disso, mas eu vou me fortalecendo a cada discussão, a cada briga, e assim, algum dia eu me tornarei alguém forte. Eu acredito nisso!

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Até o fim da semana esse assunto não foi mais comentado em casa. Foi como se aquela conversa nunca tivesse acontecido, como se eu não tivesse direito de ficar chateado com tudo que disseram. O que os meus Pais sabem fazer de melhor é fingir que nada aconteceu!

Com o aniversário do meu Primo hoje, minha Tia Rita veio dormir aqui em casa. Assistimos mais um filme de Terror quando ela chegou na Sexta-Feira à noite. Afinal isso é algo sagrado, temos que assistir algum filme de Terror quando ela vem dormir aqui.

Durante o filme eu fiquei conversando com Zac pelo chat e comentando sobre a festa que eu não queria ir.

Como seus pais vão te deixar sozinho em casa? Eles são loucos? ­– Ele escreve.

– Eu sei, mas não posso impedir eles. Eles não podem ficar presos em casa por minha causa, então tudo bem, eles podem ir se divertir e eu fico em casa... Afinal, a escolha é minha! - Respondo.

Mesmo assim você ainda defende eles... Você é um garoto incrível, sabia?

– Seu bobo! - Respondo rindo - Vou terminar de assistir o filme com a minha Tia, beijos.

Bye!

– Bye!

Se meus Pais descobrem que estamos nos falamos, eles acabariam comigo, mas não posso evitar, eu preciso conversar com Zac. Tenho que saber como ele está, como foi seu dia, as novidades... Porque eu me importo com ele, e não me interessa se eu estou me arriscando com isso. Porque vale apena me arriscar por ele!

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Acordo no dia seguinte com minha mãe conversando com Bruna e Vinícius no meu quarto. Pego meu celular e olho a hora.

– Sério que vocês estão conversando alto a essa hora? Tenha dó, ainda são meio dia - Reclamo com olhos fechado e a cabeça no travesseiro.

– É muito preguiçoso - Vinícius brinca.

Viro o rosto para o outro lado e tento voltar a dormir. Não demorou muito, minha Tia Rita entra no quarto e senta na cama feita no chão, o falatório fica mais animado e definitivamente não voltarei a dormir.

– Vai lá Vinícius, acorda ele - Minha Mãe diz.

Depois de ouvir a deixa, só sinto ele puxando minhas cobertas de forma abrupta e bater em mim com seu travesseiro. Continuo com os olhos fechado e a cara no travesseiro, ele então pula em cima de cima e me abraça com força.

– Coitado Vínícius - Ouço minha Tia dizer.

– TA BEM... TA BEM... ACORDEI - Grito enquanto sou espremido - JÁ ACORDEEEEI...

– Acho bom - Ele me solta.

– Ih... - Digo.

– Vai voltar a dormir? - Ele se vira com os braços abertos.

– Não, já acordei, sério! - Digo rapidamente.

Bruna fica rindo. Agora já despertei e me rendo a eles, sento na cama e fico mexendo no celular. Meu Pai abre a porta do quarto e se depara com todos sentados no chão conversando.

– Que isso, reunião família? - Ele pergunta.

– Pelo visto - Respondo - Entra também, agora já acordei mesmo!

– Então agora não tem mais graça - Ele brinca e senta no chão ao lado da minha Tia.

O assunto começa entre eles, quanto a mim, fico focado no celular conversando com Zac e Michele. Desligo-me um pouco da conversa deles e quando volto a prestar atenção, Vinícius está falando sobre seu irmão e o homossexualismo.

– Na verdade ele é do GLS - Diz Vinícius, ele olha para Bruna - Você sabe o que é GLS, né?

– Gays, Lésbicas e Sapatões... - Ela responde.

– Oi? - Minha Tia fala - Se a garota é Lésbica, ela já não é sapata?

– Ih é! - Bruna da uma risada.

Confesso que até eu tive que rir nessa hora. A cara que Bruna fez de envergonhada foi impagável.

– Tem os transexuais também - Minha Tia lembra.

– Mas ai já é a sigla LGBT - Vinícius fala - Que quer dizer Lésbicas, Victor, Bissexuais e Trans.

– Victor? - Minha Mãe inocente pergunta.

– É, os viados!

Reviro meus olhos com essa piada totalmente sem graça e idiota da parte dele.

– Cara, Vida, eu te salvei hein, você quase foi... - Bruna comenta.

Não pude resistir, se eu contasse isso para alguém, ninguém acreditaria, então comecei a gravar e enviar para Michele.

– Tem o Victor, meu primo de Araruama, ele tem a nossa idade... - Vinícius conta.

– Mas são mais contidos ou são mais escandalosos, como eles são? - Minha Mãe pergunta deitada na cama feita no chão.

Surpreendo-me um pouco com ela dando corda para tal assunto. Meu olhar fixa no meu Pai, como ele ainda não disse nada? Imagino que logo virá com um dos seus argumentos homofóbicos.

– Ele é mais ou menos, eu não vejo muito ele.

– Eu tenho um primo, mas ele é escancarado - Minha Mãe diz.

– Eu tenho um outro primo que é da Petrobras... - Vinícius fala.

– Ah, aquele é mais calminho - Bruna se pronuncia.

– Rafael, você conheceu - Diz Vinícius - Ele é contido!

– Aquele ali é muito calmo... Muito calmo mesmo - Diz Bruna.

– Mas é viado também - Vinícius continua.

– Caralho, a sua família não é brincadeira não hein - Meu Pai finalmente se pronuncia.

– Eu que salvei o Vida - Bruna diz, se gabando como se tivesse ganhado um prêmio por namorar o Vinícius.

Eu estou realmente surpreso com tudo que estou ouvindo. Podia jurar que Vinícius era diferente, eu pensei que ele entendesse, ao menos um pouco, mas a verdade é que ele é só mais um homofóbico. Ele não aceita os gays, ele só aceita o irmão porque não pode mudar isso.

– Então eu acho melhor você ficar só na Sophia - Minha Mãe diz para Bruna.

– Pelo visto, eu também acho - Minha Tia comenta. No entanto eu não acredito que tenha sido um comentário como dos outros, mas esse "Pelo Visto" não se referia à família do Vinícius, mas sim a reação de Elisa sobre tudo isso.

– Acho que se eu tiver o Guillerme, eu não vou dar pro Victor batizar não - Bruna diz.

– Pelo amor de Deus, tem nada haver isso - Minha Tia comenta logo em seguida.

Dou uma risada e olhando para ela, minha Tia Rita só se mostra cada vez mais uma das pessoas mais incríveis que eu conheço. Ela é uma ótima pessoa e defende qualquer pessoa que seja injustiçada. Ela não defende a homossexualidade porque apoia, ela defende nas horas de injustiça, e isso me faz admirá-la cada vez mais.

– O Victor desde pequeno, mas desde pequeno mesmo, ele não gostava de jogar bola, não gostava de nada de menino... Ele ficava brincando de barbie com as meninas - Diz Vinícius.

– Mas outro dia eu estava vendo na televisão, sobre um caso que o Pai deu um tiro na cabeça do filho... - Minha Mãe começa a contar.

– Meu Deus - Minha Tia se espanta.

– É, o Pai descobriu que o filho era gay e deu um tiro na cabeça dele!

– Que isso?! Que horror - Minha Tia fica levemente transtornada com o que ouviu.

Ajeito-me um pouco tenso na cama. Respiro fundo e tento não levar seus argumentos muito a sério.

– 17 anos, o Pai matou o filho - Minha Mãe diz.

– Ele tinha é que metralhar - Meu Pai fala mais alto que todos.

– O que? - Minha Tia olha pra ele - Tinha que metralhar o Pai, né? Isso sim!

– Metralhar o Pai nada - Ele se defende.

– O Pai sim, por ser um babaca imbecil... Que horror... Quem é ele pra pode fazer isso com o próprio filho? Esse ai sim vai pro inferno... Meu Deus! - Minha Tia retruca.

– Ai o cara no programa estava falando, que o avô do garoto disse que a maior decepção da vida dele, não foi o garoto ser gay, mas o filho ter matado seu neto - Minha Mãe continua a contar - O problema é que tem uns que são gays por safadeza mesmo, mas os que são mesmo, vem desde pequeno.

Nesse instante, um flashback de toda a minha infância passa diante dos meus olhos. Lembro-me de quando eu ficava cantando RBD em frente a televisão da sala, eu sempre imitava a Dulce Maria e minha Mãe ficava irritada pedindo para eu imitar os rapazes. Também me lembro de ficar assistindo a cada episódio novo de Hannah Montana e Feiticeiros De Warvely Place. Além de acompanhar a carreira da Britney Spears e ficar cantando e dançando suas músicas no quarto que eu dividia com as minhas irmãs.

– É genética - Minha Tia comenta.

– Sim, tem um estudo pra comprovar que isso vem da genética da pessoa - Diz Vinícius.

– Eu acho que isso é culpa da sua mãe - Bruna fala - Ela me contou, que quando o Victor nasceu, ela levou laçinho pra ele porque achou que era uma menina.

– Então beleza, você quer tanto a Sophia, se você tiver primeiro um menino, ele vai ser gay?

– Não vou levar laçinho pro meu filho - Bruna responde.

– Felipe, então ela deveria ser sapatão, né? - Meu Pai tenta me trazer para o debate.

Dou um sorriso de canto e assenti levemente. Não quero ter que entrar nisso, mal estou conseguindo apenas observar. Não posso sair do quarto sem que venham falar comigo depois, então preciso ficar, apenas para evitar futuros estresses.

– Eu queria tanto um filho homem - Ele diz.

– É, o Hélio era louco para ter logo um filho - Minha Mãe fala.

– Portanto que quando o Victor foi se assumir, ele falou pra minha mãe e ela falou pra mim e eu disse "Ta e qual a novidade? Eu já sabia dessa porra" - Vinícius conta sem qualquer problema. Sem nem pensar no que os outros vão achar do seu próprio irmão. Expor a intimidade dele para as pessoas que Vinícius sabe que são homofóbicas.

– Acho que quando mais novo, quem sofre mais por isso, é você - Minha Mãe sustenta o assunto.

– Eu?

– É, porque os garotos ficam zoando você - Diz minha Mãe.

– Não, eu vou te falar... - Meu Pai começa. Toda vez que ele se pronuncia meu coração se acelera e se prepara para o pior.

– Não, Viviane, eu nunca passei por isso não - Vinícius a responde.

– Ah... Porque quando jovem, os garotos ficam zoando você porque é irmão dele.

– Não, não... Eu nunca passei pra isso!

– Vou te falar... - Meu Pai insiste novamente até que param de falar e prestam atenção no que ia dizer - É triste pra caralho... Principalmente para um Pai saber de uma porra dessa...

Nesse momento eu paro de mexer no celular olho para ele, o encaro sentindo o peso de suas palavras, e o quanto ele fazia questão de que todos ouvissem aquilo. Posso estar sendo louco, mas sinto que ele queria dizer isso pra mim.

– Hoje em dia a gente até... Sabe... - Ele não conseguia continuar.

– Aceita? - Minha Tia pergunta.

– É... Mesmo assim é muita porrada - Meu Pai fala com uma angustia explicita em sua voz.

Em nenhum momento seus olhos se fixaram em mim ou ao menos passaram pela cama. Ele não poderia me olhar enquanto dizia essas coisas.

– A gente pensa mil coisas para o filho e o caramba... Nos amigos e tals... A gente fala "Não é pelo amigos", mas também é pelos amigos... - Meu Pai diz.

– A sociedade cobra muito - Minha Tia Rita pronuncia-se ao meio dos disseres de meu Pai.

– É... - Meu Pai concorda com ela.

Se eu lhe dizer que pisquei alguma vez ou que não estou nervoso, estaria mentindo. E vê-lo concordar com o que minha Tia havia dito, foi realmente um choque.

– Você está com os amigos e perguntam "E ai, como vai fulano de tal?"... As pessoas já começam a não perguntar e ai a gente já sente... Então eles falam do filho, e a gente já ficar "Porra...". Sem graça de conversar, quebra a pessoa, entendeu? - Diz Meu Pai.

Eu nunca o vi dizer algo com tanta dor e sinceridade. A sua expressão enquanto falava era de pura tristeza e rancor. Podia sentir que ele talvez eu fosse a verdadeira vergonha da família ou pra ele, tal como ele já me disse.

– É que esse mundo é muito machista, homem tem que pegar mulher, mulher tem que pegar homem, eles cobram muito - Diz minha Tia.

– É, com certeza... - Vinícius concorda.

O assunto continua a deriva, quanto a mim, fico deitado na cama um pouco pasmo com tudo que ouvi. Digo para que eu não desanime por causa dos problemas que estou enfrentando hoje. Pois saiba que o mundo dá voltas e, com certeza, chegará o dia em que as coisas vão melhorar. Só preciso ser forte até que este dia chegue.

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Passo o resto do dia em meu quarto. Mandei os áudios gravados para Michele e Zac, que foram tão pacientes e amorosos comigo na hora que eu estava um pouco abatido. Sim, apenas um pouco, pois eu já ouvi coisas piores vindo dos meus pais.

Isso nunca mais vai sair da minha mente, cada palavra que meu Pai disse... Acredito que foram realmente para mim e Michele se mantém na mesma teoria. Zac sabia que as coisas aqui em casa não eram as melhores, mas pela primeira vez, ele definitivamente viu o que eu passo na maior parte dos dias.

Nunca desejei tanto algo como eu desejo tê-lo agora ao meu lado. Poder ter alguém para abraçar e nunca mais soltar, ter alguém que me entende e está aqui porque se importa completamente comigo. Deus, eu só quero isso... Só quero um abraço, um gesto de carinho nas horas mais escuras. Porque as coisas precisam ser tão difíceis? Droga, somos todos humanos, ser homossexual não me torna um monstro que você tem que caçar ou temer. Eu sou tão humano quanto você!

Fico quieto, no silêncio do meu quarto iluminado pelos raios de sol que passavam pela janela. O clima pode estar claro e limpo, mas do que adianta enquanto meu interior está frio e escuro? Eu tento fazer o mínimo de estrago possível, para que os ferimentos não demorem a cicatrizar e logo estar pronto para outra luta. Mas aprenda, os ferimentos são inevitáveis!

Todas as vezes que penso nas coisas que já ouvi do meu Pai em toda a minha vida, eu posso dizê-las a todos sem esquecer se quiser um momento... Então eu lhe pergunto, quantos anos são necessários para esquecer um minuto?


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Notas finais do capítulo

Bom, eu espero que tenham gostado desse capítulo =)
O próximo será postado no Domingo que vem.
Boa noite e boa páscoa para todos!