Stay With Me escrita por Fenix


Capítulo 14
A Mensagem




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O carro entrou na garagem de jeito lento e angustiante. Fecho meus olhos ouvindo o som da porta da garagem se fechar automaticamente, me tranquilizando aos poucos e me deixam mais confortável ao saber que agora poderia entrar no meu quarto. Ficar no meu mundo, onde poucos podem me ver nele.

Desci do carro com o um olhar e a mente vazios. Posso ter me desligado por uns instantes como modo de defesa para poder suportar tudo aquilo que ouvi. Bato a porta com calma, viro-me para ele e não encaro mais aquela figura paterna que deveria me proteger e ficar do meu lado para qualquer situação. Transformou-se em algo que passei a temer mais do que tudo. Quando o encaro, vejo um homem homofóbico do pior jeito que alguém poderia ver. Não consigo pensar como ele vai reagir quando eu me assumir, que Deus me ajude neste dia!

Caminhei para a porta de casa, alguns passos atrás dele, que parece não notar ou simplesmente ignorou qualquer mudança de reação que tive desde então. Entro em casa e fecho a porta, encaro todos na sala, conversando entusiasmados e com latinhas de cerveja nas mãos. Respiro fundo e vou em silêncio para meu quarto, passando de cabeça baixa ao lado de meu Pai.

Ao entrar em meu quarto, todo o mundo deixou de existir. É o meu lugar, o único que nesse momento me deixaria confortável para poder me expressar. Extravasar todo o sentimento que estou mantendo guardado há alguns minutos. Bati a porta com cautela encostando-me encarando o nada. Uma lágrima ousa a escorrer por meu rosto, a partir de agora eu sabia que não conseguiria parar de chorar. Os soluços eram inevitáveis, minhas mãos tremiam tanto que eu já estava ficando assustado.

O medo foi me consumindo por dentro de uma forma que eu não posso parar. Os julgamentos que meu Pai disse, foram tão preconceituosos de modo que nunca me afetaram tanto quanto antes. Vou ao meu guarda roupas, não sinto os meus passos... Não me sinto. Pode ser estranho, mas é como se eu estivesse aqui e ao mesmo tempo não. Seu corpo está presente, mas sua alma vaga por algum lugar desconhecido. Abro as portas do guarda roupas e sento na cama chorando sem parar.

– Eu realmente mereço isso?... - Pergunto olhando para cima. Vejo o teto um pouco embaçado de tanto que choro - Porque está acontecendo isso comigo? Eu não fiz nada...

Nunca me culpei tanto por se eu, por ser assim. "Imagina o constrangimento que você trará para sua família", isso ecoa pela minha mente sem parar. Todos os dias da minha vida, foram para agradar os pais, eu sempre estudei para tirar boas notas e deixá-los orgulhosos, mas eu não posso dá-los o que tanto querem... Não posso dá-los um filho hétero!

Muitas coisas se passaram pela minha cabeça nesse instante, eu não sei os planos que Deus fez para mim. Dizem que Deus nunca lhe dá uma batalha que você não consiga lutar. Não sei se aguento outras batalhas, eu só não quero viver uma vida cheia de dores e mágoas a todo tempo, tendo que sofrer as severas consequências de todos os atos que faço.

Deito na cama, olhando para o céu através da minha janela, procurando alguma esperança depois de hoje. Não tendo se quer uma estrela brilhante, o tempo nublado e a lua sendo coberta cada vez mais a cada segundo. Não concordo quando dizem que não é justo estar triste por que há pessoas em uma situação pior… É como dizer pra uma pessoa que ela não pode estar feliz por que há pessoas mais felizes do que ela. Cada um sabe da intensidade de seus sentimentos. Cada um tem direito de se sentir triste ou feliz e isso não é egoísmo.

Fecho olhos com o máximo de força que eu conseguia, as lágrimas escorriam sem parar pelo canto do meu rosto. Trinco meus dentes na tentativa de parar com a tremedeira do maxilar. Todas aquelas palavras foram demais para enfrentar sem uma recaída. Meu peito doía tanto que eu mal consigo respirar, você realmente não pode se sentir pior. Eu acho que você conhece isso. Acho que todo mundo conhece isso de vez em quando. Mas acho que eu tenho conhecido isso muitas vezes ultimamente.

Levanto-me depois de longos minutos tentando me tranquilizar na cama. Preciso tomar banho, no entanto eu teria que passar pela sala novamente. Respiro fundo e coloco uma expressão natural no rosto, ao menos preciso passar a imagem de que estou bem para os outros. Abro a porta do meu quarto e me preparo para outra curta batalha, meus passos nunca ficaram tão pesados antes.

Passo por eles em silêncio e entro no banheiro. Encaro-me no espelho e não sou capaz de reconhecer aquele que está refletido. Estou tão exausto, as olheiras estão mais fundas a cada dia, eu não consigo dormir direito, e hoje definitivamente não conseguirei dormir. No chuveiro, as palavras que meu Pai disse continuam a soar pela minha cabeça de novo e de novo, de novo, de novo... Um ciclo sem fim que vai me arrastando para o purgatório gradativamente. A tensão chegou a um estágio que eu nunca pensei que eu chegaria antes, derrubo com um gesto abrupto todos os produtos de banho que estão na prateleira. Meu choro é abafado pelo som da água quente do chuveiro que escorria pelas minhas costas.

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Passo na sala voltando para meu quarto quando sou abordado pela amiga da minha irmã.

– Pipo, você ta pegando a Michele? - Pergunta Liliane.

Eu paro de andar, engulo a saliva limpando a minha garganta para que não saísse com a voz de choro. Viro-me para eles e respondo.

– Não, por quê? - Meu tom de voz não foi um dos melhores, mas enganou alguns.

– Ela ta sempre com você, eu acho que ela tem uma quedinha por você - Liliane insiste, mesmo sem perceber o quanto inconveniente está sendo.

– Eu já falei isso com ele, eu também acho que ela tem uma quedinha por ele, só o Felipe que acha que não - Minha mãe fala.

– Você alguma fez já ficou com ela? - Liliane pergunta, me pegando de surpresa.

Encaro todos esperando a minha resposta. Meu Pai fixa seus olhos em mim, eu desvio meu olhar para minha Mãe, que também me olhava esperançosa. Toda aquela pressão foi algo absurdo.

– Não! - O máximo que consegui falar e entrei no quarto em seguida.

Esse com certeza entra para a lista dos piores dias da minha vida. É tão inacreditável, eu nunca pensei que minha vida fosse se transformar em um verdadeiro pesadelo, no qual eu me afundo sem parar, com breves intervalos de falsa alegria e tranquilidade.

Só precisava de alguém para me ouvir agora, de um abraço, de um ombro amigo que eu pudesse dormir depois de tanto chorar. Quem eu mais quero do meu lado, não pode me ajudar agora, e não faz ideia do quanto minha vida virou de ponta a cabeça quando ele saiu dela.

Muitos já me falaram para eu me permitir a ser feliz. Fiz isso e olha onde estou agora, um garoto cada vez mais perdido em seu mundo, até chegar um dia de não saber mais como voltar. A partida de Zac acabou comigo, e o pior de tudo é não poder tê-lo na hora que eu mais preciso dele.

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Deitei-me cedo para dormir, ao menos tentar dormir. Tiro breves cochilos até acordar chorando sem qualquer motivo. Em um instante posso sentir a porta do meu quarto abrindo lentamente.

– Pipo? - Minha mãe me chama por um sussurro.

Ela espera alguns instantes e fecha a porta. Abro meus olhos encarando a escuridão que domina meu quarto. A solidão nunca foi uma grande amiga, mas ultimamente tem sido a maior companheira que eu tenho tido.

Tento dormir diversas vezes e sempre acordo com um choro sem fim ou pesadelos que me assombram cada vez que fecho meus olhos. Essa foi a pior noite que já tive desde que eu assumi para mim mesmo que sou homossexual. Tive muitos pesadelos em uma noite, todos incluindo o que passei com meu Pai no carro.

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Acordo no susto de um pesadelo, chegando a me reerguer na cama com falta de ar. Estou farto de todo esse sofrimento, toda essa angustia e culpa que ficam me culminando a todo tempo. Por um instante, tive coragem suficiente para pegar três comprimidos para dormir. Tomo o primeiro com meus olhos cheios de lágrimas. O segundo já me deixa tremulo, o choro passa a ser inevitável. Se minha coragem durasse um pouco mais... Jogo o terceiro comprimido pelo ralo da pia e ponho o copo ao lado da bica.

Praticamente arrasto meu corpo para o quarto novamente e deito na cama, olhando para o teto e espero o remédio fazer efeito. Talvez eu nunca consiga tem coragem suficiente para me matar. Esse ato de egoísmo me irrita profundamente. A sua dor pode ser passageira, mas para as pessoas que te amam, será uma dor eterna, que jamais vão superar completamente.

Não posso fazer isso com meus amigos e família. Eles não têm culpa do que eu sou, ou do que estou passando. Acredito que seja algo passageiro, então tento me manter firme, até que as coisas boas voltem a acontecer.

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Zac volta para o Rio de Janeiro no dia seguinte, passo o dia tentando me recompor e esquecer um pouco do que passei na noite anterior. Não direi que esquecerei tudo e seguirei em frente, não tem como esquecer o que meu Pai me disse, mas posso tentar amenizar a dor que sinto com tudo isso.

Passei o dia inteiro no meu quarto, vendo televisão ou ouvindo musica no fone de ouvido. Meu celular vibra em cima da mesa do computador, o pego sem levantar da cama e observo a mensagem de Michele.

"Fe, como você ta?"

Conto tudo que aconteceu e a espanto com o modo que meu Pai disse.

"É tão difícil de acreditar que ele disse isso... É um absurdo...".

"Eu estou frio com ele, não quero assunto depois de tudo que disse".

"Até eu mudaria, ele foi totalmente escroto.".

"Agora estou deitado, sem fazer nada...".

"Não quer ir ao shopping? Se distrair um pouco".

"Não, eu to bem aqui...". Não estou com animo para sair, talvez ajudasse, mas eu prefiro ficar no meu quarto, quieto, porque eu me entendo melhor do que ninguém.

"Tudo bem... É que estou preocupada!".

"Não fique, eu vou ficar bem".

Coloco o celular de volta a mesa de computador e tento relaxar, algo que parece ser bem difícil agora.

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O dia inteiro passei dentro do meu quarto. Enquanto assistia televisão durante a madrugada, recebo uma mensagem de Zac.

"Não quero que me busque no aeroporto"

Fico surpreso com a frieza da mensagem e sento na cama sendo tomado pela angustia. Respondo-o perguntando o motivo de ele ter dito isso e passei a noite toda no aguardo. Como se meu dia já não tivesse sido o pior suficiente, me senti um verdadeiro lixo. Não sabia o que tinha acontecido com Zac, muito menos o motivo de ele ter sido tão frio comigo.

Algo não está certo nisso e quero descobrir logo.

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