Renascer Dourado escrita por Sargas


Capítulo 9
Uma Longa Primeira Noite




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GRÉCIA –

Ilha de Psinoe –

A noite mantinha o típico ar abafado e com o aroma característico de cidades litorâneas. O mar ruidoso estava agitado e correntes de vento uivavam fazendo tremer as grandes janelas da sala de jantar.

Afrodite chegou ao lado de Aiolos a sala, naquela tarde todos já haviam se acomodado em aposentos previamente preparados e em cada quarto haviam roupas e acessórios pessoais necessários que se perderam quando o navio afundou. Agora os rapazes se encontravam reunidos à mesa para um farto jantar que lhes era servido.

Máscara da Morte torceu o nariz vendo a abundancia demasiada sobre a mesa repleta de pratos exóticos. Já aprendera com a vida que quando a esmola é demais, todo santo devia desconfiar.

Camus servia-se de um pouco de água gelada do jarro de vidro a sua frente, o calor da ilha não abrandara a noite, aliás, parecia até aumentar. Milo, ao lado do Aquário, estava inquieto e passara a tarde toda reclamando da ausência de Jana e das demais Caçadoras. O que claramente não se mostrava um bom sinal. Camus de inicio não pareceu se importar, porém depois de horas sem noticia alguma das garotas, também começou a se preocupar.

Deba estava ocupado demais com uma particularmente grande coxa de frango para notar a tensão de Mu ao seu lado. O Áries compartilhava do desconforto de Camus e Milo diante daquela situação.

Afrodite sentou-se ao lado de Dohko, com Aiolos a sua esquerda e perguntou ao Libra enquanto olhava com má vontade para Deba.

― Parece que já começaram sem nós.

― Não apenas sem vocês, Afrodite. A empregada disse pra gente se servir, parece que não teremos a companhia das garotas essa noite.

Shura deu de ombros servindo-se de uma posta de salmão.

― Se é assin...

― Não é estranho? ― perguntou Saga que demonstrava tão pouco interesse no jantar quanto Camus ― Até agora o dono da casa não se apresentou e desde cedo não vemos Valkyria e as outras. Não poderemos saber o que esperam de nós sem informações, não acham?

Carlo revirava com o garfo a pinça de uma particularmente grande lagosta, em busca do resto de carne presa no fundo.

― Claro que sabemos, elas querem que a gente salve o mundo. Agora come! A hora da refeição é sagrada já dizia minha mama.

Shaka arregalou os olhos diante da disposição de Carlo.

― Não está nem um pouco preocupado? Fala como se estivesse de férias.

O Câncer engoliu o pitaco de carne resgatado, tomando uma golada de vinho em seguida.

― Aê, se eu me preocupar vai fazer diferença? Não, né? E depois no meu trabalho eu corria esse tipo de risco todo dia. To acostumado com essas merdas.

Shura encarou Carlo com um olhar desconfiado, parando no ar o copo de suco natural.

― No trabalha com extermínio de pestes?

O Câncer engasgou ao perceber que quase foi pego em sua mentira. Deu dois socos no peito para a comida descer, limpando a boca com as costas da mão, em seguida.

― Claro que sim! Quer coisa mais arriscada que veneno contra barata? Uma praga que não morre nem com radiação?

Aldebaran riu divertido, entrando na conversa.

― Na minha terra o melhor remédio contra barata é um chinelo de dedo.

Mu interrompeu a conversa, não estava com disposição para entrar em assuntos relacionados a inseticidas.

― Acho que o Saga tem razão. Talvez o melhor fosse procurar por elas depois do jantar.

Aiolia respondeu para o Áries, observando distraído quem cruzava a sala até eles.

― Nem vai precisar, Mu.

Valkyria se aproximava da mesa com Atalanta, Daphne e Palas ao seu lado.

Sorriu para os rapazes enquanto se acomodava numa na cabeceira direita da mesa.

Saga vendo que gigante Palas se iria sentar ao seu lado e se arrependeu-se por não ter erguido sua taça a tempo, viu com desgosto a mesa sacolejar quando a Caçadora se jogou na cadeira, derrubando uma boa quantidade de água na sua impecável camisa pólo azul e na sua calça de jeans escuro.

Palas olhou pra ele vermelha como um pimentão.

― Puxa vida! Me perdoe! Eu... eu devia ter...

Aiolos a interrompeu, piscando consolador.

― Não estressa, Palas. É só água.

“Claro”, pensou Saga, “é só água na MINHA camisa. Por que ele se importaria?”

Deu um salto da cadeira quando sentiu uma mão na sua perna, desviou imediatamente os olhos de Aiolos que sorria divertido de sua situação: Palas apanhara um guardanapo na mesa e se preparava para secar a água.

― Pode deixar que eu limpo essa bagunça que...

― NÃO!

O tom de Saga foi mais incisivo e estridente do que pretendia, fez com que todos virassem a atenção para os dois. Se não estivesse tão desconfortável com aquela situação, certamente riria de Deba, que trazia uma segunda coxa de frango presa entre os dentes e os dedos gordurosos. Dohko escondeu a risada com a mão fechada em concha junto à boca e Aiolos ria tanto que para não fazer barulho sufocava a gargalhada com o suco.

Saga estava preso num momento de total horror com a giganta esfregando o guardanapo com força em sua perna. “Em nome de Deus, se ela continuar esfregando minha perna assim, vai ficar me causar uma fratura exposta!”

― Senhorita Palas... ―sua voz deu uma esganiçada, criando mais alguns pequenos uivos de riso pela mesa ― Palas! Deixa isso ai! Não precisa se preocupar!

Olhou com rancor para o Sagitário que agora ria tanto que teve que pegar mais um guardanapo para limpar o suco que começava a escorrer pelo nariz.

― Como disse o Aiolos, é só água...

A giganta continuava com o rosto em brasa, olhou sem jeito para todos em volta vendo Valkyira lhw acenar com a um riso num sinal de que estava tudo bem. Entregou o guardanapo para o Gêmeos.

― Vou tomar mais cuidado da próxima vez.

Saga preferiu não responder, apenas aceitou o pano. “Mais cuidado, aham”. Ele desejava a gigante conseguisse ser cuidadosa, embora duvidasse de sua capacidade para tal. Devia ser muito difícil demonstrar delicadeza com todo aquele tamanho.

Shura piscou maroto para Saga, recompondo-se do ataque de riso.

― Relaxa, hombre! Está muy tenso.

O Gêmeos pensou em mostrar-lhe o dedo do meio, mas pela bendita boa educação que recebera, sabia que não era a melhor maneira de resolver a questão. Preferiu esboçar seu sorriso mais frio em resposta.

Após alguns minutos de silencio constrangido à mesa, onde se ouviam apenas o som de talheres contra os pratos de porcelana fina, Milo perguntou para Val.

― Valkyria, onde estão as outras?

― O senhor Solo precisa tratar de um assunto urgente com a Jana e a Katrine, Milo. Melhor você se servir, provavelmente elas não vão descer pra jantar conosco.

O Escorpião se jogou contra o assento da cadeira, bufou por alguns segundos, mas foi vencido pela fome. Dane-se. Ia forrar o bucho e se preocupar depois.

Aiolia observou de soslaio o Escorpião, sentindo ímpetos de cuspir no prato dele, mas não. Haveria muitas oportunidades de devolver a ofensa, era apenas uma questão de tempo.

Aiolos reparou que o irmão sorria perdido num devaneio muito particular, o que não era ruim. Sinal de que mesmo estando preocupado com Marin, aquilo não seria impedimento para o Leão seguir em frente.

Deu alguns tapinhas afetuosos no ombro do irmão, que olhou para ele sem entender nada.

O Touro olhou para Daphne e percebeu que a jovem parecia muito abatida, bem diferente da primeira vez que a viu, cheia de vida ajudando a ele e Mu durante a tempestade que inundou o hospital.

― Ahn... Daphne?

A pequena olhou para ele com um sorriso simpático.

― Eu! Fala grandão!

― Como você... bom. Melhorou?

Daphne fez um movimento rápido, girando o braço, expondo seus músculos.

― Prontinha pra outra, grandão! Meu elemento não ia me trair assim, qualé! ― e apesar de demonstrar estar muito bem, o Touro sabia que ainda restaria alguns dias para que suas bochechas novamente se tornassem rosadas.

Atalanta nada dizia, apenas mastigava com total desinteresse um pedaço de peixe, que mais parecia uma borracha em sua boca. Shura se distraiu olhando para a expressão carregada da garota. Vira quando Atalanta fora atingida pelo raio e imaginava que tipo de ser humano poderia resistir a uma carga elétrica tão grande sem qualquer sequela aparente.

Foi pego de surpresa por uma piscadela rápida da jovem, que cruzou um olhar com o seu.

O Capricórnio estreitou os olhos para averiguar com precisão se não se enganara, afinal Atalanta mostrava-se a mais arredia entre as Caçadoras, com exceção de Katrine, que não era nem arredia, nem expansiva, nem coisa alguma. Na verdade, ninguém sabia qual era a da Caçadora das Trevas.

A jovem negra não desviou os olhos dos seus, encarava-o com a mesma intensidade e Shura pode confirmar de uma vez. Não se enganara! Lá estava ela novamente, a piscadela furtiva pra ele.

O espanhol riu divertido e vaidoso por dentro. Então Atalanta não era totalmente indiferente ao seu charme espanhol? Lançou-lhe seu mais provocante sorriso acompanhado de uma piscada premeditadamente prolongada.

Todos na mesa tomaram um susto quando Atalanta levantou-se derrubando a cadeira atrás de si, lançando faíscas pelos olhos para o Capricórnio.

― Que merda é que você pensa que ta fazendo, moleque?

Valkyria segurou no braço da companheira sem entender nada, mas tentando controla-la, sabia que a Caçadora não era nenhum exemplo de autocontrole.

― O que aconteceu, Atalanta?

A Caçadora apontou para Shura com desdém.

― Esse moleque acha que está num daqueles barzinhos onde trabalhava!

O espanhol sacudiu os ombros sentindo os pares de olhos sobre ele.

― Yo no fiz nada, foi você quem começou!

Atalanta crispou o punho.

― EU?!!

Shura coçou o nariz com despreocupação.

― Sim, tu! Piscou para mim, achei que seria de mal tom no corresponder.

Daphne soltou uma gargalhada. Ninguém estava entendendo absolutamente nada e aquele ainda era o primeiro jantar. Shaka imaginou o que ainda lhes aguardava no decorrer daqueles dias.

Daphne ainda ria, quando tentava explicar tudo e Valkyria continha o riso divertido para segurar Atalanta, que já tinha ganas de agarrar Shura pelo pescoço.

― Como se atreve, seu... cavaleirinho de merda?

― Relaxa, Atalanta! A culpa é sua! ― dizia Daphne com tranqüilidade.

― Minha? ― a raiva da jovem dirigia-se agora a amiga, que sacudia os ombros sufocando a risada.

― É! Ninguém tem a obrigação de adivinhar as sequelas de seu acidente com o raio, né?

O Capricórnio pareceu se interessar.

― Sequelas?

Val, vendo que Daphne não conseguiria conter a crise de riso, continuou a explicação.

― É, por causa da carga elétrica.

― Não ouse, Valkyria!

― Melhor eu falar agora pra não surgir outros maus entendidos, Atalanta.

A jovem de pele negra sentou-se novamente, vencida pelo argumento da amiga. Cruzou os braços e virou o rosto, o que não impediu que Shura visualizasse novas piscadelas, dessa vez ainda mais rápida e repetitivas.

Continuavam ouvindo Val, que afagava com carinho o ombro da amiga irritada.

― Pois é, a carga foi forte demais. Podemos ser guerreiros sagrados, mas nosso corpo é frágil como o de qualquer outro humano. Atalanta talvez fique com esse tique durante alguns dias... ou...

Val ouviu uma risada debochada quase incontida vinda de Carlo, olhou séria para ele.

― Isso é sério, Câncer! Poderia ter sido algo muito pior, espero realmente que considerem esse fato daqui pra frente. Não importa quão forte é o Cosmo de vocês, ainda possuem corpos frágeis de carne e osso. Não é motivo de graça.

Mas para o Cancêr aquela observação não fazia a menor diferença por enquanto. Bom mesmo era ver aquela garota irritante que o prejudicara no cerco policial se dando mal. Ele gargalhava a ponto de faltar o ar e com os olhos lacrimejando batia com a mão fortemente na mesa.

― Antes ela do que eu! HAUHAUAH!!

Daphne não agüentava mais, tinha que estourar ou acabaria se urinando toda.

― Desculpa, Val e Atalanta... vocês estão certas, não é graça, é DESGRAÇA!! HAUAH!!

Val se deu por vencida e gargalhou junto com os demais, realmente aquela era uma situação ridícula.

Atalanta pegou uma colher e atirou um punhado de ervilha contra a baixinha, rindo sem jeito de si mesma, sabia que era a única coisa a fazer no momento.

Mu era o único que não parecia se divertir tanto quanto os outros. Perguntou para Valkyria, interrompendo as risadas.

― Valkyria, posso te fazer uma pergunta? Acredito que é do interesse de todos.

― Pois não, Mu.

Mu escolhia cada palavra, sabia que fosse o que fosse que estivesse acontecendo, talvez as Caçadoras não lhes contasse tudo. Precisava tirar o máximo de informação que pudesse.

― Até agora não ficou muito claro o motivo pelo qual estamos aqui ou o que esperam que façamos.

Valkyria não parecia surpresa com a pergunta, o que era um bom sinal.

― Estão aqui porque essa é a uma área protegida, Mu. Toda essa ilha pertence ao senhor Solo, que há essa altura todos já sabem se tratar de Posseidon.

Aiolos aspirou o ar, ainda ficava em choque ao ouvir se falar das divindades que conhecia apenas por lenda. Valkyria continuou.

― Sendo assim, por enquanto é um dos poucos locais seguros para todos nós. Está isolada pelo Oceano, reino de Posseidon.

Ela olhou para todos a mesa.

― Sobre o que esperamos que vocês façam, será revelado após o retorno de Katrine e Jana. Elas precisam cuidar de alguns assuntos de ultima hora e dependendo da resposta que obtiverem, poderei lhes esclarecer mais alguns fatos. Espero que isso tenha acalmado um pouco a tensão por aqui.

Ela sorriu para Mu, que apesar de corresponder observou em Shaka o ar desconfiado que ele mesmo guardava.

...

Jana ouvia as instruções com atenção, mas seu estômago não se mostrava disposto a cooperar, roncava mais que motor de carro velho. Não se lembrava direito se havia tomado café, almoçado e tinha certeza de que não jantara.

Sacudiu a cabeça tentando se livrar dos devaneios famintos, imaginando os pratos servidos no andar de baixo pelos aromas diversos que lhe chegavam até o nariz.

― Ta me ouvindo ou quer que eu repita, Jana?

A jovem concentrou-se no rosto de Solo, disfarçando um falso entendimento.

― Claro. Ta querendo que eu desça lá, bata uma real com o dono da parada pra ver se ele libera de boa os treco, né?

Solo ergueu uma sobrancelha consultando seu dicionário interno de gírias de rua para traduzir o que a garota lhe respondera. Concluiu que ela havia entendido.

― Exatamente. Não dispomos de muito tempo, então Katrine irá te acompanhar até a entrada, já que é de ‘casa’. Lá se juntará a vocês o Mensageiro.

Jana colocou a mão na cintura, olhando sobre os ombros para Katrine que permanecia sentada numa poltrona, a sombra projetada da janela no carpete.

― Beleza, eu não quero passar muito tempo com essa zumbi atrás de mim. Dar as costas pra essa traíra, nem pensar. Vou me sentir um pouco menos insegura com o Mensageiro com a gente. Quer que eu vá agora?

O rapaz negou com a cabeça.

― Creio que as empregadas já retiraram a mesa, mas será melhor você comer algo antes de sair. Estou ouvindo seu estomago daqui. Vá até a cozinha e sirva-se de qualquer coisa.

Jana resmungou baixinho.

― Que gentil.

Ignorando o comentário da Caçadora da Luz, sempre tão transparente, ele olhou para a indiferente Katrine.

― Leve-a contigo.

Jana sacudiu o ombro, abrindo a porta.

― Não. Ela não precisa comer não. Ela não come faz eras, já até esqueceu o que é isso.

Solo apoio os cotovelos sobre a mesa e cruzou as mãos sob o queixo.

― Leve-a mesmo assim. A presença dessa garota me incomoda.

Jana parada junto à porta chamou Katrine ao mesmo tempo em que resmungava para Solo.

― Vem, Katrine. E não pensa que é só o Senhor que ela incomoda. Se não estivéssemos precisando de toda a ajuda do mundo, essa peste podia apodrecer lá embaixo.

Foi o tempo apenas de Jana bater a porta atrás de si para o telefone sobre a mesa de Solo tocar.

― Solo falando, boa-noite. ― silenciou-se ouvindo a voz do outro lado da linha e franziu o cenho diante do tom arrogante que o locutor se dirigia a ele ― Sim, eu sei. Não, não tive nada a ver com isso, acho melhor perguntar para a líder delas. É? Sei lá, fazer o que? ― começava a se irritar ― Não acho uma boa idéia já que o lugar é meu, mas se é realmente necessário. Ok. Eu dou um jeito nisso. Ah! Só mais uma coisa, você arca com os prejuízos.

E desligou o telefone batendo com força o aparelho.

...

Valkyria conversava com Atalanta e Daphne encostada na porta do quarto que ambas ocupavam no terceiro andar, o mesmo andar onde os rapazes se acomodaram. Palas sonolenta já trajada de um largo pijama abria a porta de seu quarto, segurando uma caneca onde guardava sua escova de dente.

― Boa noite, meninas. Vou deitar cedo porque o dia de amanhã promete.

Atalanta de braços cruzados e usando shorts e um camisão largo balançou a cabeça, ainda piscava muito.

― Acho que não. O treinamento só começa quando a Jana voltar. Não queremos nenhuma turma atrasada.

― Falando nisso, Val, sabe o que o Solo queria com a Jana?

Val olhou para os lados a fim de verificar se algum dos rapazes estava próximo, como não havia ninguém, respondeu a Daphne.

― Tem alguma coisa a ver com as Essências. Não podemos esperar toda a determinação sem isso.

― Então, ela vai ter que descer? ― indagou uma surpresa Palas diante do vislumbre do que a amiga teria que enfrentar.

― Vai. – Valkyria remexia nervosamente no rabo de cavalo no alto da cabeça ― Descer com aquela cobra peçonhenta. Queria poder ir com ela.

― Bom, mas se o Solo não te convocou, Val, é porque você como líder tem que ficar de olho nos tios aqui. Já viu, né? O Aidan ta pra chegar e vai querer explicações sobre a dúzia de homens que a gente arrastou pra cá.

Valkyria riu divertida da própria imagem do sermão que estava pra tomar.

― Aquela safada da Jana vai tirar o dela da reta, isso sim! Me deixar enfrentar o Aidan sozinha.

Atalanta estalando os dedos com força.

― Se ele folgar, manda a merda! Não estamos aqui por Ele, nem por Sua ordem. Estamos aqui por Ártemis, seguindo o que nos foi destinado.

Valkyria sacudiu o ombro.

― Isso não faz muita diferença, já que estamos todos unidos pela mesma causa, Atalanta. E se acha que é tão fácil assim, vou te mandar no meu lugar, topa?

A jovem negra lançou-lhe um olhar felino de desafio, que mal mantinha pelo tique

Incômodo.

― Bah! Vou dormir, esse papo já deu. Boa noite, vocês.

Palas também achou melhor se despedir, começava a cochilar com a mão na maçaneta.

― Boa noite Atalanta e pra vocês duas também.

Daphne deixou uma fresta aberta, por onde conversava com Val.

― Acha que o Aidan vai fazer o que sobre os caras?

― Não há muito que ele possa fazer, aceitar é a saída mais racional. Até porque se pensar bem, foi melhor assim. Aumenta nossas chances de vitória com os mais fortes guerreiros de Atena ao nosso lado.

De dentro do quarto de Daphne, veio à voz forte e rouca de Atalanta, parecia bem chateada.

― Fecha essa porta que a claridade ta me atrapalhando dormir, Toquinho!

Daphne revirou os olhos.

― Troca de quarto comigo, Val. A Atalanta ta intratável!

― E ficar no mesmo aposento que a Katrine. Não, obrigada. Boa noite, Daphne.

― Té! ― e a baixinha sorriu fechando a porta.

Val cruzava o corredor apagando as luzes pelo caminho, mal percebeu que havia mais alguém no final dele.

Tomou um susto com a voz atrás de si.

― Valkyria, será que a gente poderia conversar?

A moça restabelecia-se da surpresa.

― Não faça isso! Num momento como esse, se dar ao luxo de me pegar de surpresa, pode fazer mal pra sua saúde, Camus!

Apesar de esboçar um sorriso tímido, Camus sabia que ela não estava brincando, afinal estavam ou não numa situação de crise com vidas sendo ameaçadas?

Ele se aproximou dela.

― Absolument, mas agora estamos quites. Um a um pelo que aconteceu no parque. E posso te garantir que o susto que me deu foi maior.

Ela riu lembrando-se da ocasião.

― Realmente, que situação mais chata. Foi mal, mas já te expliquei que não foi porque eu quis.

Ele deu de ombros e ambos começaram a caminhar juntos pelo corredor parcialmente escuro. Mal notaram que havia uma terceira pessoa parada no meio dele. Talvez porque a pessoa não desejasse se fazer notar, ainda.

― Isso não diminui o estrago do dia. Mas aceito suas desculpas.

― Valeu. Quer falar sobre o que? Por acaso... ― então ela sentiu um rápido estalo, será que o Aquário havia ouvido a sua conversa com as amigas?

― Ouviu o que eu falava com a Daphne?

― Não. ― mas agora ele parecia levemente curioso, embora não ousasse perguntar sobre ao que ela se referia ― Eu queria mesmo é saber sobre o dia no Parque.

Val sentiu um calafrio diante daquele assunto. Não seria muito seguro dizer naquele momento o que Camus havia feito com todos no local. Talvez isso fizesse com que ele se retraísse diante de seu próprio poder. Esforçou-se para parecer tranquila.

― Ué... eu já contei. Você desmaiou.

― Foi? Curioso, me lembro de algumas imagens, embora pouco nítidas. Havia pessoas gritando... estava frio e ventava muito. Afrodite estava lá, ele berrava qualquer coisa...

A jovem tinha medo de saber, mas precisava perguntar.

― E se lembra de mais? Viu mais alguma coisa?

Camus encarou-a mantendo o olhar sério para a jovem, que se sentia ironicamente ameaçada por ele. Não era fraqueza, nem medo. Mas sabia que era uma sensação familiar há centenas de anos esquecidas atrás de uma cortina de tempo.

― Eu vi você.

...

Shaka acordou assustado com o travesseiro acertando seu rosto com violência. Por alguns segundos esqueceu de onde estava, só depois de focalizar melhor a visão, reparou em Carlo parado de cabeça pra baixo no beliche de cima, seus cabelos caídos de forma hilária pra baixo, o que não combinava nada com sua expressão zangada.

― PORRA! Tu parece um trator, como é que uma criatura tão magrela pode roncar tanto?

O Virgem atirou o travesseiro do Câncer no chão ao lado da cama. Resmungou ainda sonolento.

― Eu tenho desvio de septo. Não é culpa minha.

― Ah é? ― o Cancêr saltou do beliche rindo divertido de forma maldosa para Shaka, que o olhou cheio de suspeitas ― Ouvi dizer que isso se corrige colocando o nariz no lugar. E se tu não parar, eu ponho ele no lugar certinho, com uma porrada.

O jovem Virgem desafiou calmamente.

― Queria ver você tentar. Existe uma grande diferença entre querer e fazer, Carlo.

Máscara da Morte ficou algum tempo encarando Shaka, que manteve o olhar para ele. Depois percebeu que não seria uma boa idéia arranjar confusão logo de cara. E tinha alguma coisa de bizarro no olhar daquela peste.

Achou de maior bom senso esperar uns dias até conhecer melhor o companheiro de quarto.

Virou-se de costas.

― Pelo menos vira de lado. A gente não tem que agüentar essa bosta de barulho só porque tu tem o nariz torto, né não, grego?

Milo não parecia ouvir a pequena altercação, estava muito mais interessado em espiar pela janela o movimento estranho logo abaixo, no jardim de entrada da mansão.

Carlo deu-lhe um soco leve nos ombros, mas que fez o corpo do Escorpião inclinar-se para frente.

― Quié? Ficou surdo? Vai ver por isso não ta ligando pros roncos do lourinho.

― Meu nome é Shaka!

Máscara da Morte sacudiu os ombros.

― E eu te perguntei?

Depois de apanhar um cigarro previamente colocado a sua disposição dentro da gaveta que lhe pertencia na cômoda, chegou-se a Milo.

― Que tanto tu olha pra fora, grego?

Milo apontou desconfiado para os três vultos que conversavam no jardim.

― Ali, ta vendo?

― Tô, e...?

― E, que ta acontecendo alguma coisa estranha aqui.

O Escorpião estreitou os olhos, quando ouviu o Câncer reconhecer um dos vultos lá fora.

― Ih, a lá! É a ragazza da Luz lá embaixo junto com a branquela, não é? Tem um figura com elas, será o dono dessa maloca?

Carlo soltou uma baforada de cigarro.

― É, tão saindo. Porra, nem se despediram. Gente mal educada.

Mas Milo não ouviu essa ultima parte e agarrando a jaqueta de couro saiu em disparada do quarto, batendo a porta com força atrás de si.

Shaka olhou da porta para Carlo, e mesmo arriscando ouvir uma resposta atravessada, tentou.

― Acho melhor a gente ir com ele.

― Por quê?

― Nem imagina?

...

Milo passou esbaforido por Camus e Valkyria no corredor. A jovem sem entender achou melhor perguntar o que havia.

― O que foi, Milo?

A resposta veio de Carlo e Shaka que se chegava aos dois sem correr, mas com passos rápidos.

― Parece que ta acontecendo alguma coisa lá fora.

― Como assim?

― O grego viu a ragazza da Luz de papinho com a branquela e ta desconfiado da parada.

Val sorriu sabendo tratar-se de algo irrelevante.

― Mas não é nada com o qual vocês devam se preocupar.

O Virgem olhou sério para a garota.

― Pelo modo que vejo, Valkyria, estarmos aqui já é um motivo de preocupação.

...

Jana despediu-se de Solo e caminhava lado a lado com Katrine que arrastava preguiçosamente os pés enquanto andava. A garota tinha gastura do ruído dos passos da companheira, mas achou melhor remoer a raiva do que esboçar o que achava, já que nada parecia importar a Katrine.

Sentiu um alivio tão grande quando o ruído cessou ao seu lado, que mal percebeu que Katrine havia estacado no lugar a poucos passos dela.

Virou-se pronta para reclamar da lerdeza da companheira, mas foi interrompida por Milo, que sorria desconfiado.

― Já vai tão cedo, Jana?

― Delicinha! ― ela voltou-se a ele com um sorriso largo, gostara do jeitão daquele grego de olhar arredio desde que o vira pela primeira vez de longe na pizzaria

― Não devia estar dormindo?

― Pois é, mas achei que talvez tivesse algo pra compartilhar com a gente e não queria perder as ultimas noticias.

Jana deu de ombros, tranqüila com a mão nos bolsos traseiros.

― Tenho nada não. Pode voltar pra cama.

― Ah é? Podia jurar que tu ta de saída, logo assim depois de me arrastar pra cá junto com o Saga. Mas aí, pensei, “não, ela não ia fazer isso, sair sem nem se despedir”. Me enganei?

Ela suspirou. Ótimo! O Escorpião com seu ferrão em riste cercando-a para um bote. Era uma questão de tempo até a primeira dose de veneno, certo? Porém, ela não se chatearia com o jogo, se dispusesse de tempo até se agradaria da brincadeira e do tom sarcástico do rapaz. Deu-se por vencida.

― Ta legal, Milo. Eu vou num lugar.

― E é claro que vai contar pra mim, né? Até porque já tá todo mundo de saco cheio de tantos segredinhos pra cá e pra lá.

A garota deu um tapinha no ombro dele, depois olhou divertida pra expressão séria do Escorpião.

― Sempre alerta, Escorpião! Beleza. To indo pro inferno. Quer me dar o prazer da sua companhia ou me libera pra continuar sozinha com a tia abissal aqui?

Milo olhou para Katrine, que não demonstrava nada além de tédio diante daquela conversa pouco convencional. Carlo, Shaka, Camus e Val chegavam-se até os três.

O Escorpião analisou bem as feições de Jana e percebeu que ela não parecia estar brincando. Depois de uma rápida olhada para Katrine a fim de confirmar suas suspeitas. Deu de cara com aquela expressão de caderno brochura da moça, respondeu ainda de ombros retesados.

― Inferno, é? Não, pode ir tranquila, não quero esse programa de índio pra mim.

Jana sorriu para ele e acenou para Val, Camus, Carlo e Shaka que agora estavam ao lado de Milo.

― Valeu! Te trago uma lembrancinha se jurar que vai sentir minha falta, palavra! Té mais pra vocês!

Os cinco viram as garotas se afastarem e sumirem de vista na ladeira mais a frente. Carlo acendia um novo cigarro, resmungou para Shaka.

― Puta merda, por que só ele vai ganhar lembrancinha? Senti um favoritismo.

― Talvez seja sua sutileza.

Camus olhou para o amigo que trazia a sobrancelha arqueada, conhecia aquela expressão. Milo estava desconfiado até o ultimo fio de cabelo, afinal odiava quando lhe escondiam algo.

― Pra onde ta indo a Jana, Milo?

― Pro inferno.

Carlo engasgou com a fumaça do cigarro, Shaka riu dele.

― Ainda quer um souvenir, Carlo?

CONTINUA...


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Notas finais do capítulo

Eu revisei esse capítulo e notei que esse tempo decorrido desde que o escrevi fez algumas coisas mudarem na minha escrita. Nada ruim, pelo contrário, mas notei que posso condensar melhor alguns trechos e ainda assim me faço entender.

É engraçado como notamos essas coisas depois de um tempo, não? =D

Btw, no capítulo 9 quis mostrar mais da interação se formando entre os dourados e as caçadoras e ainda semear mais uns misteriozinhos no ar. Quem será o vulto que espiava a Valkyria e o Camus? E quem será esse tal Aidan? E o que são essas tais essências? >)

Continuem acompanhando a Fic pra descobrirem. =D



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