Renascer Dourado escrita por Sargas


Capítulo 8
Convivência Forçada




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/539473/chapter/8

GRÉCIA

Ilha de Psinoe

Camus abriu os olhos com a sensação de um insólito pesadelo onde garotas e monstros mitológicos se misturavam num agrupado de imagens desconexas. Reconheceu para seu desgosto que nem tudo fora somente um sonho quando observou ao redor, a praia onde jazia ainda tonto pelos últimos acontecimentos.

A lua estava parcialmente coberta por nuvens volumosas e uma brisa marítima soprava chacoalhando levemente seus cabelos, marolas morriam na praia de areia fina onde ele agora se sentava, sentiu o desconforto das meias e dos calçados encharcados.

Camus sacudiu o cabelo para tirar os finos grãos de areia que se emaranhavam aos fios e enquanto o fazia olhou para trás vendo o grande rochedo que projetava sua sombra à volta dele. Logo abaixo do pedregulho, afastada de todos, estava a estranha Katrine, sentada abraçada aos joelhos observando apaticamente o mar.

Camus caminhou até Shaka que já estava em pé, esticando os braços para se livrar do formigamento que fazia seus ossos rangerem num protesto alto pela aventura marítima. Reparou também em Saga que se levantava igualmente confuso por não saber onde estavam dessa vez:

― Como... como viemos parar aqui?

Valkyria, que recebeu com bom grado a mão que Camus lhe ofereceu para que se levantasse, respondeu encarando diretamente Katrine que continuava afastada.

― Foi a Katrine. Ela possui o dom para se locomover através das sombras... – Usou o pé para remexer a areia onde a sombra do rochedo desenhara uma figura disforme ― Nos deixou logo embaixo de uma sombra, viram?

Saga relaxou um pouco.

― Então devemos um agradecimento á ela. Não teríamos sobrevivido a carga elétrica se...

Valkyria interrompeu-o enfaticamente.

― Não! Não temos que agradecer nada. Katrine só cumpriu uma ordem por um preço bem conveniente pra ela.

Os três rapazes ficaram quietos, demonstrando certa duvida com relação ao julgamento que a Caçadora do Fogo fazia da companheira que lhes salvara a vida. Valkyria respirou fundo para se acalmar e quando falou novamente havia preocupação na sua voz.

― Vocês não entendem, ela não está aqui pela mesma causa que nós. No passado, por ambição ela... ― Por mais que a Caçadora tentasse escolher palavras menos cruéis por fim ela decidiu optar pela sinceridade crua ― Ela traiu Ártemis e suas Caçadoras. Eu não posso me enganar acreditando que tenha mudado, nem vocês devem se dar ao luxo de confiar apenas no que veem. Já tiveram mostras suficientes de que nada é o que parece.

Shaka aproximou-se dela.

― Eu entendo. Não conheço essa garota tanto quanto vocês, mas sei que existe algo de errado. Aqueles olhos vazios não demonstram a generosidade abnegada que motivaria alguém a salvar outra pessoa.

Valkyria sorriu para Shaka agradecendo pela compreensão depois se virou para melhor observar a praia.

― Bom, pelo menos ela nos trouxe ao lugar certo. Mas não devemos ficar expostos aqui.

Camus não se moveu, pois embora o choque inicial pela maneira como chegaram o fizera esquecer, agora vinha tudo em sua cabeça como uma enchente de imagens.

― Espera Valkyria! Os outros que estavam no navio, o que aconteceu com eles? Por que não estão aqui conosco?

A Caçadora não se preocupou em se deter alguns minutos para tranquilizar a Camus, Saga e Shaka, que também se faziam as mesmas perguntas.

― Katrine transportou apenas nós quatro. Os outros estão com a Jana e provavelmente nos encontrarão no local combinado.

― Mas... – Saga não se mostrava satisfeito com aquela resposta ― Acredita que eles sobreviveram? Mesmo que tenham abandonado o navio a tempo de não serem atingidos é provável que estejam no mar à deriva.

Valkyria sorriu confiante, olhando para o mar que desaparecia bem mais calmo que horas atrás.

― Como eu já disse, Saga, eles estão com a Jana. Se eu posso confiar a minha vida a ela, posso confiar a vida de seus amigos também.

Os quatro se afastaram da margem do mar rumando para a inclinação de areia que dava para uma estrada. Os rapazes não pensaram em questionar a garota para saber para onde iriam, era obvio pelo modo que os conduzia que ela sabia bem o que estava fazendo e, acima de tudo, conhecia o caminho.

Katrine não fez menção de se mover. Nem mesmo para observar os quatro partindo, ela apenas continuou abraçada as pernas a sombra do rochedo olhando o mar sem vê-lo realmente. Seus pensamentos não vagavam para além da imensidão azul, não sentia o cheiro da maresia e da brisa que despenteava seus cabelos pálidos. Não havia pensamentos, não havia sentidos, não havia nada para ela.

O sol logo banharia a praia e muitas sombras mais se formariam.

Katrine teria tempo para se juntar aos outros.

...

Os passos vindo do corredor liberavam um solitário som metálico. Um feche de luz do sol matinal atravessava as espessas cortinas transparentes que ornamentavam as altas janelas espalhadas pelo corredor da mansão.

O cheiro de maresia misturada ao odor de peixe fresco subia pelo nariz de Mu, que acordou com um susto, vendo a porta do quarto onde se encontrava se abrindo vagarosamente.

Havia uma mulher curiosamente bela entrando no aposento, ela tinha longos cabelos louros estavam presos numa trança entrelaçada com miçangas e pequenas conchas, olhos azuis e grandes de cílios cumpridos e boca pequena levemente rosada. O Áries teve a súbita impressão de já tê-la visto. Quando a garota se dirigiu a ele, sua voz soou melódica como uma canção.

― Olá! Que bom que acordou. Você foi um dos últimos, sabia? O seu amigo grandão estava preocupado...

Mu tentando não parecer tão confuso quanto se sentia, não obteve um bom resultado.

― Grandão? O Deba? Ele, eles...

Lembrou como num filme mudo das cenas da noite anterior, a explosão do navio, o mar gelado e alguém se aproximando. Um carro puxado por golfinhos, seguido por três sereias! Era isso, ele reconhecera a garota do fundo do mar, ela era uma das sereias que seguia o carro puxado pelo homem de cabelos azuis portando um tridente.

― As pessoas que estavam no mar, elas estão bem?

A moça sorriu.

― Ah, claro que sim! O senhor Solo os encontrou antes que se afogassem. Estão lanchando lá fora.

Mu se levantava reparando melhor no quarto. Era grande, espaçoso e notava-se fazer parte de uma casa bem abastada.

― Onde... que lugar é esse?

A jovem pareceu se divertir com a falta de informação do rapaz.

― Que tipo de pergunta é essa? As Caçadoras de Ártemis não contaram a nenhum de vocês? – ela torceu o nariz de traços perfeitos ― Não me admira, um bando de mulheres amargas. Estamos na mansão do senhor Solo, Cavaleiro, numa das muitas que ele possui.

― Solo?

― Nunca ouviu falar dele também? – ela sentou-se comodamente ao lado de Mu, atirando para trás uma mecha dos longos cabelos dourados, não se importando nem um pouco quando fios delicados roçaram o rosto do Áries, que enrubescido desviou o olhar.

― Há muito tempo à família Solo é a líder do Comércio Marítimo. Eles dominam o mar. E sabe, não é uma força de expressão quando eu digo dominar. Na verdade o senhor Solo é...

A porta do quarto se escancarou com um barulho de maçaneta se chocando contra a parede de alvenaria, Aldebaran entrou esbaforido.

― Mu! – Precipitou-se sobre a cama, despenteando o cabelo do amigo com uma chave de braço e socos leves no alto da cabeça ― Achei que não ia acordar mais, seu preguiçoso! Como é que você ta?!

Mu reparou no olhar irritado da garota para o Touro, como se ele tivesse interrompido alguma coisa importante.

― To... to legal, Deba. Só queria saber como chegamos aqui.

― Foi o senhor Solo... – disse a garota olhando sem muita atenção para os

dois ― Ou melhor dizendo foi Poseidon, o deus dos Mares que vive dentro dele.

...

Carlo passou a mão pela gola da camisa e mesmo aquelas roupas leves que lhe foram emprestadas, depois que perderam todas as bagagens com a explosão do navio, o calor estava insuportável. Andou pelo jardim da mansão reparando em como era tudo silencioso e deserto. Alguns poucos empregados às vezes apareciam aqui e ali, mas tirando ele e os “novos hóspedes” não parecia haver mais ninguém naquela imensa casa. Procurou um canto para jogar fora seu cigarro que já estava na gimba, mas não achou um cinzeiro se quer.

Apagava a bituca na terra de um particularmente grande vaso, quando ouviu uma voz atrás de si.

― Creio que no é muito educado o que está fazendo...

Shura se aproximou dele sorrindo com simpatia sem notar a má vontade na resposta do Cancêr.

― Somos hóspedes, não é? Então não podem reclamar por nos sentirmos em casa.

― Heh. E costuma apagar seu cigarro nas plantas de sua casa, amigo?

― Não... – Carlo jogou a gimba dentro do vaso ― Eu costumo apagar na língua de gente intrometida.

Shura tentou ler no rosto de Carlo se suas palavras era algum tipo de brincadeira e riu quando o Máscara da Morte gargalhou de sua expressão confusa.

― Hehehe, esquenta não, carinha. Piadinha pra aliviar o climão pesado que ta aqui...

― Ah, compreendo... – Shura estendeu a mão para ele ― Shura e você?

― Pode me chamar de Máscara da Morte. – Carlo aceitou e retribuiu ao cumprimento.

― É, é un apelido incomum..

Os dois caminhavam até um banco no jardim enquanto falavam e a frente deles estavam Camus e Milo conversando, com Aiolia sozinho no banco ao lado, que de tão ansioso estalava os dedos pela terceira vez.

― Todo mundo no meu trabalho tem um apelido incomum. – continuou o Câncer.

― E fazia o que antes dessa loucura toda? ― quis saber Shura tentando criar um diálogo de amenidades que afastasse suas preocupações.

Máscara da Morte cheio de malícia encarou Shura, sabia que para se enturmar era melhor deixar certos aspectos de seu passado trancadinho num baú que foi pros ares junto com o navio. Depois ele sorriu furtivo.

― Extermínio. De pestes.

― Pestes?

― É... – disse ele acendendo mais um cigarro ― Cada baratão, algumas tinha o seu tamanho.

...

Milo cheio de desconfiança e de braços cruzados cravava Camus de pergunta. Desde que reencontrara o amigo o Escorpião estava inquieto pelo modo como ele fora resgatado e sobre o quanto colhera de informação pelas horas na companhia de Valkyria, a líder das Caçadoras.

― E a mulherada? Você sabe onde foram parar?

― Pela quinta vez, não Milo, eu não sei! Por que fica me perguntando como se eu soubesse de alguma coisa a mais que você? – respondeu Camus com uma crescente irritação.

― Porque você, o Shaka e o Saga foram os únicos com transporte vip do navio pra cá, junto com a Valkyria. Enquanto eu estava lá quase me afogando à noite no mar aberto, sabia?

Aiolia ao lado dos dois ouvia a conversa a contragosto posto que Milo não parecia querer baixar o tom da voz. O Leão estava cansado, preocupado e de saco cheio daquele papo que durara a manhã inteira. O desagradava a maneira como o Escorpião falava de suas preocupações como se fosse a única pessoa em maus lençóis. Aiolia deixou um comentário escapar em voz alta.

― Não foi só você que passou por maus bocados, Milo. Não fica falando como se fosse o único prejudicado.

Milo o encarou com raiva, quem era ele para se meter num assunto que não lhe dizia respeito? Ainda mais se usando dessa intromissão para pagar esporro?

― Ah! Num fode, seu bebezão! To sabendo que tu não é nada sem seu irmãozinho.

Aiolia não acreditava que seu comentário fora tão inoportuno a ponto de receber uma resposta tão agressiva de Milo. Ainda que o fosse, como ele ousava falar dele e de Aiolos daquele jeito?

Se levantou inflamado.

― Repete isso!

― É isso aí! Tu que veio se intrometendo num assunto que não te dizia respeito, seu merda. – Milo olhou pro lado e viu que Camus já tomava distancia dos dois, ignorando mais uma confusão em que o esquentado Escorpião se metia.

Milo, distraído e olhando boquiaberto o amigo que o deixara sozinho, nem percebeu a mão de Aiolia passar rente ao seu rosto.

O Escorpião soltou uma exclamação revoltada por ter sido pego de surpresa.

― Filho da puta! Na cara, é?!

O Leão só não acertara o rosto do Escorpião porque Aiolos chegou para lhe deter o golpe.

― Se liga, Aiolia! Não é hora nem lugar esse tipo de briga.

― Isso mesmo, Aiolinha, sossega esse teu rabo que teu mano chegou. - provocou Milo.

Os olhos do Leão se encheram de fúria e ele se desvencilhou do irmão, partindo pra cima de Milo que se defendeu com o braço.

― Seu bosta! Engole a língua!

― Cai dentro que não preciso de ajuda pra te ensinar boa educação, “gatinho”!

Shura com a ajuda de Aiolos segurou Aiolia pelas costas. O Leão esperneava tentando se soltar para socar o Escorpião, que ria em deboche sem baixar a guarda.

― Que pensam que tão fazendo!? No acham que já temos problemas suficientes? – dizia Shura ofegante por tentar segurar o agitado Aiolia.

Carlo soltou uma baforada de seu cigarro e riu com gosto.

― Humpf, se os caras querem brigar, deixa. Menos um ou dois pro tal Urano dar fim.

Saga correu até o foco da confusão ao mesmo tempo em que o Sagitário ordenava a Máscara da Morte.

― Cala essa boca! Se não ajuda, não atrapalha!

― Putz, a gente não pode nem brincar.

Dohko se aproximou de Milo que continuava encarando Aiolia com as mãos em punho.

― Vocês deviam guardar energia pra socar quem merece, isso sim.

Depois pegou o Escorpião pelo ombro.

― Vem comigo, Milo.

― Não sou de fugir de briga não, Dohko, se liga.

O Libra olhou sério pra ele e disse baixo.

― Tenho umas coisas pra conversar contigo, sobre a Jana...

― Sabe onde ela tá?

― Topei com a grandona, aliás, enorme Palas, estavam falando alguma coisa sobre uma viagem da Jana.

Milo se afastou, mas não sem mostrar o dedo do meio pra Aiolia, que era arrastado pra longe por Shura, Aiolos e Saga, que tentavam argumentar com ele. O que não adiantava muito já que vendo em riste o dedo médio do Escorpião que ria mostrando a língua em deboche, gritou a plenos pulmões.

― SENTA E RODA, SEU MERDA!

Milo ainda pouco feliz por não ter arrastado a cara do Leão no concreto, seguiu o caminho que dava para o salão de entrada da mansão.

― Enorme a Palas? O caramba, cê tá sendo generoso, a mina é um guarda-roupa. Ainda bem que ela tá do nosso lado. Mas falaram de viagem, é? Será que a Jana tá pensando em se mandar depois de ter enfiado eu e o Saga nessa zona?

― Enfiar vocês? Então quer dizer que você já decidiu enfrentar o tal Urano e seu exercito?

― Se tiver alguma outra opção pra me oferecer, eu tô aberto à negociação.

― Sei. E se você descobrir alguma me avisa também, ok? De qualquer forma a Palas contou algo sobre uma reunião mais tarde, conosco e o dono da casa.

― Pois eu vou é tratar de ficar de olho na Jana antes que ela suma. O mínimo que eu espero é que a minazinha explique melhor esse rolo que me enfiou. Se tá achando que vai sair fora assim, tá enganada.

Dohko sorriu com malícia.

― Ué, se ela for mesmo, ainda sobra às outras Caçadoras. Qualquer uma delas pode esclarecer as coisas pra gente, né?

― Ihh, qualé, Dohko? Tá achando o que? Essas Caçadoras aí nos salvaram lá do navio, tá certo. Mas foi a Jana que livrou meu pescoço na Grécia, e ela eu conheço... – coçou a cabeça ― Mais ou menos...

― Ahan, entendo. Se bem que posso te dizer que foi mais feliz que eu e o tal de Máscara da Morte. A Atalanta, a Caçadora que foi buscar a gente, é meio... bizarra. Enfim, entenda como quiser. Eu só te afastei mesmo pra não te ver se pegando com o Aiolia. Como já percebeu, não estamos em condições de arranjar confusão entre nós. Não enquanto tem um deus doidão surgido das entranhas mitológicas querendo nossas cabeças.

Milo preferiu não argumentar. Podia ser explosivo, mas não era burro pra não reconhecer que Dohko estava com a razão. O problema era que todos estavam tensos demais, não que isso tornasse Aiolia uma pessoa menos intrometida e insuportável. O Escorpião sabia que o Leão o encarava como um idiota, então não se censurou ao imaginar o mesmo a respeito do colega.

Dohko e Milo passaram por Shaka, Afrodite, Mu e Deba que conversavam sem nem mesmo notar a pequena balburdia que ocorrera entre os dois rapazes.

Shaka parecia curioso e talvez um pouco desapontado por não ter presenciado a visão do deus marinho com sua carruagem puxada por golfinhos.

― Não posso reclamar já que sai do navio bem a tempo e não cai no mar aberto como vocês, mas realmente essa parece uma visão digna de ser presenciada. É uma figura e tanto esse homem que você descreveu.

Afrodite jogou o cabelo para trás enquanto olhava de soslaio para os outros a sua volta como se verificando se alguém ousaria discordar dele.

― Ele não era um homem, Shaka! Entende? Não era como simplesmente ver um cara conduzindo um carro puxado por golfinhos e seguido por sereias, por mais que apenas isso já pareça bastante excepcional. Eu senti outra coisa. Uma energia...

― Cosmo? – tentou o Touro incomodado com o olhar surpreso que o Peixe lhe lançou ― Ué, por que não? A essa altura a gente falar em cosmo energia, é a menor das anomalias do mundo.

― Que seja. – concordou Afrodite desgostoso por finalmente ter que admitir que dentro dele existia mesmo aquela força descomunal e que isso o habilitava a ser um dos doze destinados a salvar o mundo ― O caso é que eu senti, esse tal cosmo dele era... imenso!

A menção desse ultimo adjetivo saída da boca do Peixes, fez Deba olhar para Mu que tentava segurar o riso discreto. Já o Touro não era muito treinado da arte da discrição.

― Hahahahaah, nossa como era grande, né Afrodite?

O Peixes indignado viu que Mu e Shaka se juntaram a ele no deboche, embora Shaka fosse mais sutil e olhasse pros lados para não encara-lo.

― Arre, vocês são tão infantis!

O Áries tentando controlar o acesso de risada aconselhou o companheiro.

― Sabe Afrodite, é que... bom, com esse seu jeito tão “delicado” deveria evitar palavras como imenso, grande, enorme...

Afrodite cruzou os braços com um olhar maldoso e superior para cada um deles.

― Bando de gente arcaica! Um homem tem que feder como um porco e se vestir como um mendigo para provar sua masculinidade? A única coisa que eu faço é ressaltar meus traços. Olhem o Shaka... – e apontou com a cabeça para o rapaz, que parou de rir imediatamente ― Ele também tem traços delicados e eu não vejo vocês caçoando dele.

Shaka abanou a mão para os rapazes e olhou sério para o Peixes.

― Não me coloca no meio disso não.

― É, Afrodite,até porque ele não tenta “ressaltar seus traços” usando maquiagem. – tentou justificar o Touro ao mesmo tempo em que defendia Shaka.

― Eu até encararia isso como uma ofensa, Aldebaran, se você tivesse a capacidade de ofender alguém. De qualquer modo ser maquiado faz parte do meu trabalho, muito bem remunerado por sinal. Enfim... – Afrodite acentuou cada palavra com uma maldade ferina ― Fico feliz apenas em dizer que mesmo que quisesse, não haveria maquiagem suficiente para destacar seus belos traços, já que não possui nenhum, Touro.

E saiu do meio deles deixando Aldebaran dando de ombros, nem um pouco ofendido com suas palavras, embora Mu e Shaka olhassem pra ele como se verificando se não havia mágoa pela ofensa em seu rosto forte.

...

Do alto de uma janela que descia do teto até o chão da biblioteca localizada no segundo andar da casa uma Caçadora observava o movimento dos rapazes logo abaixo, no jardim.

Jana sentada comodamente numa poltrona folheando um livro de filosofia, perguntou para a amiga Valkyria, que observava os rapazes pelo vidro impecavelmente limpo.

― E ai? Tão se pegando?

― Não, Jana... estão apenas se conhecendo. É claro que haverá atritos de personalidade, afinal, eles se encontraram um tanto tarde...

A Caçadora da Luz riu divertida e se levantou da poltrona atirando o livro sobre o móvel. Correu para olhar também, enfiando-se embaixo dos braços de Val.

― A-HÁ! Então alguém se pegou com outra pessoa! Quem, quem??

Valkyria sorriu empurrando a amiga.

― Quer mesmo saber? Foi o Escorpião com o Leão.

― Puta merda! – Jana deu um tapa da testa ― Já, é? A gente devia montar um ringue na lama e soltar os dois bonitões lá dentro. Rendia até uns trocados, heh! Tô precisando dar uma envenenada na minha moto...

A Caçadora do Fogo se distanciou da janela, ignorando o ultimo comentário de companheira. ― E como vai a Daphne e a Atalanta?

― Estão bem, nem parece que levaram uma descarga elétrica no meio dos córneos.

― Você não presta, Jana.

― Eu? Nada! Tô é feliz, não perdemos nenhum dos rapazes apesar de tudo estar contra a gente.

Val sentou-se na mesa de centro falando mais pra si que para a amiga.

― Nem me fala. Foi difícil.

― O Frente Fria?

Valkyria sorriu. ― Não chama ele assim, Jana.

― Tudo bem, ele é bonitinho e Frente Fria combina com o jeito caladão do Aquário.

Valkyria era discreta demais para comentar sobre o que achava dos aspectos físicos do cavaleiro.

― Ele despertou antes do que previmos, cheguei tarde demais...

A garota finalmente pareceu se concentrar na preocupação de Valkyria. Sentou novamente e inclinou-se sobre os joelhos para perguntar com interesse.

― O que foi que aconteceu naquele parque? Você não falou nada desde que chegamos e ta ai, toda peocupada por causa do Aquário. Deu merda, foi?

Mas não obteve respostas, pois Palas entrou desembestada como só ela era capaz, tropeçando na mesa de centro no escritório.

A Caçadora da Terra desabou sobre uma poltrona de três lugares interrompendo sem nenhum pudor o assunto de ambas.

― Pode parecer piadinha infame, mas tô só o pó!

A sala tremeu de leve, Jana esticou o braço para que uma peça feita de corais não se esfacelasse no chão. Val debochou da grande companheira.

― Cuidado aí, Palas! A gente já tem bastante trabalho, no momento não estamos precisando de nenhuma divisão nas placas tectônicas causada por um de seus terremotos.

Palas atirou uma almofada que pegou em cheio no rosto da Caçadora do Fogo, que se desequilibrou tamanha a força aplicada e caiu da mesa. ― Não enche, Profeta Incendiária!

Valkyria se levantou já preparando uma pequena bola de fogo para atirar na amiga, enquanto ria. ― Olha só quem fala, um Cataclismo ambulante!!

Jana reparou que alguém mais entrava na sala, tentou avisar.

― É... gente!

Mas Valkyria não ouviu e atirou a bola do tamanho de um punho contra Palas, que se abaixou para desviar.

― Gente...

A bola de fogo passou direito pela gigante e só não atingiu uma cortina na parede oposta porque alguém a deteve com a mão. Uma terceira voz, dessa vez masculina e séria dando amostras de chateação, falou pra elas.

― Eu realmente espero que estejam se divertindo, já que...

Palas e Valkyria se viraram completamente sem graça para o rapaz parado junto à porta com a pequena bola se extinguindo em sua mão. Jana coçou a nuca com desgosto, sabendo a bronca que lhes aguardava.

― O mundo não parece estar sofrendo nenhum tipo de ameaça, porque não nos juntamos aqui com aquele monte de moleques, acendemos uma fogueira no meio da minha biblioteca, queimamos marshmallows e damos as mãos cantando temas folclóricos?

Era um jovem alto de longos cabelos azuis claros como o mar. Vestia-se bem e mantinha uma postura altiva, mas essa não era sua maior peculiaridade, o mistério que detinha o olhar sobre ele era uma estranha energia que o cercava.

Valkyria recompondo-se olhou com respeito para o rapaz, sem esconder uma certa ofensa pelo que havia ouvido dele.

― Desculpe-nos, senhor Solo, estávamos apenas...

― Querendo atear fogo na minha mansão? Já não basta o que terei de aturar com esse monte de gente correndo pra cá e para lá, ainda tenho que ficar de olho nas Caçadoras de Ártemis? – olhou impaciente para Jana ― Devo crer que não pretende atirar na parede também essa peça decorativa que está em suas mãos, não é?

Só então a Caçadora de Luz reparou que ainda segurava o vaso enfeitados de corais. Ela o jogou para Solo, que agarrou a peça ainda no ar, empalidecendo com o susto.

― Ficou maluca!?

Jana deu de ombros.

― Ué, só devolvendo o seu vaso, Senhor. Antes que eu, retardada que sou, jogue ele na parede como vossa senhoria já sugeriu!

― Não abusa, Jana. Posso não ser tão tolerante quanto Ártemis ou Apolo. – respondeu Solo lhe lançando um olhar sério, depois depositou numa prateleira alta o objeto e virou-se para elas a fim de prestar atenção no que Vlakyria argumentava.

― Senhor Solo, devemos respeito a você por ser uma das maiores divindades, Poseidon, e todas nós já o agradecemos por salvar nossas vidas. Somos Caçadoras nos esforçando para salvar o mundo, mas acima disso somos humanas, passivas de erros e emoções. Novamente peço desculpas por essa distração.

Solo sorriu sem sentir efeito algum com aquela ressalva.

― Ah é? Enche a boca para dirigir-se a si mesma como Caçadora de Ártemis, Valkyria. Pois bem, apesar de ser a líder das guerreiras da deusa Lua, não deveria colocar tanto orgulho em suas palavras, todos nós sabemos que chegou a esse patamar com certa ajuda...

Palas tentou um tanto tímida expor o que achava.

― Pelo menos a gente tá ajudando. E por falar em ajuda, não vi nenhum dos Marinas por aqui até agora, senhor.

― Não é porque meus Marinas não são alarmistas ou indiscretos como vocês e os Cavaleiros de Athena, que significam que não estão fazendo algo, Palas. Mas não é comigo que têm que se preocupar, deviam se pensar em Aidan. Ele está chegando e não parece nada contente com o “pacote” que trouxeram consigo.

Valkyria se manifestou. ― Desculpe senhor Solo, mas agimos conforme ele nos ordenou. Trouxemos os Cavaleiros de Athena, conhecidos como os “matadores de deuses”, não imagino no que falhamos.

Solo caminhou calmamente até a janela onde antes Val observava os rapazes, saboreando a expressão confusa das garotas paradas em frente a ele.

― Ah é, Valkyria? Pois ou muito me engano, ou ele ordenou que trouxessem os cinco cavaleiros sagrados de Athena...

Ele puxou a cortina, mostrando o jardim e os doze rapazes conversando distraídos no pátio.

― E como estou completamente sóbrio, o que me impede de ver dobrado, digo com certeza que o que temos aqui é um grupo um “pouco” maior que cinco.

CONTINUA...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Um capítulo de respiro após o último cheio de raios, trovões e deuses com golfinhos. XD

Os nossos rapazes começam a se relacionar e alguns conflitos de personalidade começam a ficar claro. Ao mesmo tempo que em Valkyria, a Caçadora de Fogo, descobre que pode ter cometido um erro....

Agora vou comentar uma coisa que achei engraçada e que não tem tanto a ver com Renascer, mas que me deixou feliz. =D

Estou assistindo Soul of Gold e embora a animação seja uma porcaria cheia de erros de anatomia e tenha deixado os Dourados magérrimos, eu to rindo em perceber que o Milo realmente usaria uma roupa de motoqueiro e o Deathmask seria um fanfarrão (tal qual escrevi há quase oito anos quando comecei essa fic). Não é que eu acertei algumas coisas?

Só é chato que o anime não seja tão bem feito e que foque mais nos combates (vender bonequinhos, né?) que no material humano nos Dourados, mas to vendo pra saber onde vai dar.

De qualquer modo é uma pena que Lost Canvas tenha sido cancelada. Aquela série sim era linda, bem animada e os personagens mais trabalhos - ainda que não necessariamente os mesmos dourados da era Saory. Mas pra mim são só os mesmos dourados com nomes diferentes (menos o Afrodite, nesse caso o Albafica é um Afrodite sem purpurina mesmo, oi?).

Até o próximo capítulo de RD, povos! =D



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Renascer Dourado" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.