Quando colocaram os pés do outro lado do portal, um sentimento familiar tomou conta das duas irmãs. Era algo que não sentiam há muito tempo... Elas finalmente estavam em casa.

— Sui, reconstruíram tudo! – disse Soranin ao entrarem na vila que antes moravam, admirada. – Ficou até mais bonito do que antes!

— Sim, Soranin, está bem melhor... Mas... Olhe! – alarmou Andrômeda, apontando para a outra direção.

As duas olharam para onde era sua casa, mas a única coisa que viram foi uma estátua em mármore da deusa Atena. Certamente ela fora construída pelos novos moradores e sobreviventes.

— Como... Como Atena pôde? Era a nossa casa!

— Ela é uma deusa... – Soranin colocou a mão no ombro da irmã. – Provavelmente reconstruiu esse lugar e essa foi a maneira que a população achou para retribuir o favor.

— Talvez você tenha razão... Mas é incrível a arrogância dos deuses.

— Realmente, eles nem sempre tomam boas decisões.

Caminharam por um tempo até que enfim saíram da vila e chegaram ao centro do Santuário. Quase nada havia mudado nos últimos anos. As pessoas ainda treinavam para se tornarem Santos, o anfiteatro era usado para comemorações, as doze casas estavam ao fundo – cada uma guardada por um guerreiro representando o respectivo signo zodiacal – e a parte preferida das duas, o Star Hill, continuava lindo, mesmo distante.

O sonho delas quando menores era um dia poder subir até aquela montanha, onde o Papa lia as estrelas, e admirar a paisagem lá de cima. Um sonho que infelizmente não seria realizado, já que é triplamente mais difícil chegar na base dele do que no Santuário em si. Chegar até o topo deveria ser considerado mais impossível ainda.

— Veja Sui, aquele ali de roupa verde não é o mestre Alceu?

— Alceu!

O homem se voltou para elas, confuso. Era jovem, alto, moderadamente forte, com cabelos pretos curtos e espetados e os olhos cor de caramelo. Não demorou muito e ele abriu um largo sorriso no rosto.

— Meninas, há quanto tempo! – disse enquanto se aproximava e abraçava as duas. – Como vão?

— Bem... – confirmou Sui, tentando respirar em meio ao abraço do homem. – Eu e Soranin quase não te reconhecemos... Você está tão diferente!

— É verdade, vocês também mudaram bastante desde nosso último encontro... Estou surpreso por terem voltado aqui depois de... bem... vocês sabem.

— Não era nossa intenção vir até aqui mestre, mas nós precisávamos. Acabamos de chegar... Me surpreende ver o senhor aqui também. – comentou Soranin. – Aconteceu alguma coisa?

— Na verdade, sim... Lembram-se de minha ajudante, Kareen?

— Claro, ela é uma pessoa muito boa! Ela está bem? – perguntou Fênix.

— Este é o problema. Kareen morreu há algumas semanas, lá onde treinávamos os novos Santos... Ninguém sabe o motivo, mas certa noite ela demorou para voltar para casa. Meus aprendizes ficaram preocupados quando ela voltou toda ferida... Então tivemos que cuidar dela. Infelizmente, Kareen não resistiu.

— Que terrível! Sui e eu podemos fazer algo?

— Não é necessário. Voltei até aqui a mando de Atena. Ela disse que um novo ajudante seria designado para mim. Depois de receber sua armadura, ele irá me ajudar a treinar novos aspirantes. Ele será reconhecido por sua constelação protetora amanhã, junto aos demais cavaleiros e amazonas novatos... Gostariam de ir comigo assistir?

As irmãs se entreolharam e pensaram que o novo ajudante poderia ser na verdade uma amazona, e consequentemente Meanlife. Seria uma oportunidade perfeita para observarem sem serem criticadas.

— Com toda certeza! – vibraram ambas.

— Ótimo! Bom... Parece que as duas não tem onde dormir esta noite, já que a casa de vocês... Hã... – ele se interrompeu, se arrependendo de ter tocado no assunto.

— Ah, não se preocupe, nós damos um jeito. Não precisa se incomodar... Soranin, vamos.

— Oh, tudo bem então... Hum, meninas... vocês pegaram uma daquelas missões "especiais" de novo, não foi?

— Pode-se dizer que sim... – respondeu Soranin.

— Certo. Me prometam então que irão tomar cuidado. O Santuário está meio diferente se comparado com a última vez que estiveram aqui... As pessoas... hum... mudaram um pouco.

Ele se virou e seguiu para uma das vilas. Começou a chover e as irmãs voltaram a caminhar de volta para sua antiga casa. Pararam em frente a estátua de Atena, olhando fixamente para ela durante algum tempo.

Pensaram na vida que tiveram dentro do Santuário. Era pra ser um lugar seguro. Tinha que ser. Porém inúmeras tragédias aconteceram. A vila de ambas pegou fogo, Alceu abandonou sua armadura de Prata, a esposa do cavaleiro e sua ajudante Kareen vieram a falecer – tudo bem que ambos não moravam de fato lá dentro, mas só pelo fato de serem guerreiros de Atena já era inaceitável que coisas assim ocorressem – e segundo o mestre as pessoas haviam mudado um pouco... Como tudo isso poderia estar acontecendo? Os cavaleiros deveriam proteger as pessoas, isso era um fato, mas quem os protegeria? Onde estava Atena nessas horas? Se em sua própria casa não era seguro, onde seria? Pois é, quando mais se precisa dos deuses eles viram as costas.

Não tinham onde dormir, então decidiram ficar ali durante a noite, no meio da chuva, sem proteção alguma... Temos apenas uma a outra, pensaram... Como nos velhos tempos... Duas crianças sozinhas noite afora, recordaram... Como nos velhos tempos... Vai acontecer tudo de novo, refletiram... Como nos velhos tempos... Ninguém virá nos buscar ou prestar ajuda, imaginaram... Como nos velhos tempos...

Como nos velhos tempos.