Os grandalhões agarram meus braços e começaram a me arrastar corredor afora. Suas mãos causaram grande desconforto pois apertavam demais os meus braços. Tudo bem que sou algo inexplicável, mas não sou de aço né!

Miguel e Ithuriel discutiam atrás de nós, muito baixo, mas ainda sim, audivelmente. Nem prestei atenção no que exatamente discutiam pois minha atenção estava focalizada no corredor. Era tudo branco. Literalmente. O corredor era tão longo e tão silencioso que dava nervoso andar. Depois do que pareceu horas andando, finalmente viramos a esquerda e logo vi uma forte luz saindo de uma porta no final do corredor. Será essa a saída? Paramos bruscamente em frente a porta e eu vi. Meus olhos se arregalaram diante daquela cena. Aquilo era de fato uma saída, mas ao invés de algo mais humano, aquela saída era um salto para morte para alguém que não tivesse o privilégio de voar. Estava de frente para o céu. As nuvens cor de rosa indicavam o final da tarde e dali, pareciam algodão doce em grande porção. Estava prestes a perguntar o que eles iriam fazer quando fui subitamente virada jogada pelos aires. O pânico durou apenas um segundo, pois eu precisei disso para minhas asas me pararem e me manterem no ar. Minha boca se abriu para xingar Miguel independente de ele ser um anjo ou não. Porém, o mesmo e seus grandalhões, pularam logo em seguida. Os grandalhões me seguraram enquanto Miguel amarrava uma corda vermelho brilhante em volta do meu pescoço. Olhei para cima, para Ithuriel, e antes de ele sumir, lançou-me seu olhar de determinação e se não me engano, um pouco de raiva.

–Vamos, parem vocês com isso. É muito incômodo.-Miguel me olhou com reprovação.

–Cale a boca.

Sua mão voou no meu rosto com força.

–Me respeite, menina. Não sou um dos seus amiguinhos humanos. Sou algo superior a eles e a você.

–Tenho certeza de que só há um superior a mim. E esse alguém com certeza não é você.

–Menina estúpida. Não sabe com quem está mexendo.

–É você que não sabe.

Dessa vez ele não respondeu, apenas virou-se e me puxou pela corda. Começamos a voar em direção ao norte, bem rapidamente. Uma descida brusca fez a corda me queimar e eu berrei um palavrão para Miguel, que revidou com puxão mais forte. Vou matá-lo! Depois de passarmos sobre as nuvens, enxergamos a terra. Respirei fundo. Estávamos indo para a terra. Miguel de repente encolheu as asas, fazendo-as desaparecer. Os outros fizeram o mesmo. E então, eles ganharam velocidade. Me desesperei pois a corda me puxava fortemente, me cortando.

–Coloque-as para dentro, menina estúpida! Quer se matar?

Obriguei minhas asas a entrarem e logo senti a velocidade tomar meu corpo. A corda já não puxava mais meu pescoço, já não me cortava. Me senti como um meteoro caindo do universo. E por um momento realmente pareci um. Uma aura dourada se formou não só ao meu redor, mas também nos anjos abaixo de mim. A terra se tornou mais visível pois nos aproximávamos do chão mais rápido do que considerei normal. Quis desesperadamente ver Miguel abrir suas asas mas não vi. E no último segundo, quando achei que poderia atingir o chão com força, Miguel abriu suas asas e as minhas fizeram o mesmo antes que eu sequer concluísse o pensamento. Pousaram no chão delicadamente, já eu quase cai de tão cambaleante que fiquei. Miguel riu e eu mostrei-lhe minha língua. Olhei ao redor. Tínhamos pousado numa floresta. E algo familiar me chamou a atenção. Eu conhecia aquele lugar, tinha quase certeza. Mas antes que qualquer memória resolvesse aparecer, Miguel ergueu a mão fechada e me deu um soco na cabeça. Cai no chão com a visão borrada. Vários chutes foram investidos de diferentes pés. Eu até então já cuspia sangue quando minha visão borrada identificou algo branco e alto pousando delicadamente no chão, e quando as investidas acabaram, braços gelados me envolveram e eu desmaiei.