Sombras do Passado escrita por BastetAzazis


Capítulo 10
Os Meninos Crescem - Parte 1


Notas iniciais do capítulo

Três anos agitados se passam em Hogwarts...



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Capítulo 5: A Vassoura Pinoteante

Sombras do Passado

escrito por BastetAzazis

DISCLAIMER: Os personagens, lugares e muitos dos fatos desta história pertencem à J. K. Rowling, abaixo são apenas especulações do que pode ter acontecido com alguns de nossos personagens favoritos!

BETA-READERS: Ferporcel e Surviana – muito, muito, muitíssimo obrigada!

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Capítulo 10: Os Meninos Crescem – Parte I

– Afaste-se, Remo – Sirius ordenou com a varinha empunhada. – Você só sai daqui depois que nos responder umas perguntas.

Remo Lupin tentava chegar perto do seu malão, que estava arrumando para voltar para casa por algum motivo que, agora ele tinha certeza, seus amigos não acreditaram. A lua cheia estava próxima, e ele precisava chegar até seu esconderijo abaixo do Salgueiro Lutador antes que começasse a se transformar. Olhou atônito para seus outros dois colegas de quarto; Tiago e Pedro estavam parados na porta, impedindo que qualquer pessoa entrasse ou saísse. Vendo a confusão do amigo, Tiago explicou num tom apaziguador:

– Eu usei minha capa da invisibilidade para seguir você e a Madame Pomfrey no mês passado. Você não voltou para casa, nem ficou isolado na ala hospitalar, nem foi para qualquer outro lugar que você diz que vai todo mês, desde o ano passado. Vocês entraram na Floresta Proibida, e a Madame Pomfrey voltou sozinha de lá.

Remo abaixou a cabeça, envergonhado por ter mentido por tanto tempo para os seus melhores amigos. Em poucos minutos sua mente relembrava os momentos mais alegres do seu primeiro ano em Hogwarts. Em todos eles, seus melhores amigos estavam sempre presentes. Ele tinha que pensar numa desculpa para explicar suas idas à Floresta Proibida antes que eles descobrissem a verdade e nunca mais quisessem chegar perto dele. Mas a voz de Sirius interrompeu seus pensamentos, e ele descobriu que já era tarde demais para outra desculpa esfarrapada. Havia subestimado seus amigos.

– Uma vez por mês, Remo – Sirius começou –, sempre na lua cheia... Tome Pedro. – Ele jogou um livro para Pedro, que caiu no chão antes do menino conseguir agarrá-lo. Sirius continuou para Remo: – Nós encontramos algumas informações muito interessantes naquele livro. O Pedro pode ler para nós, enquanto eu e o Tiago cuidamos para que você não faça nada precipitado.

Vendo que o quarto ficara em silêncio, Pedro abriu o livro "Lobisomens: um Guia de Auto-Defesa" na página em que eles já tinham lido e relido diversas vezes aquela tarde na biblioteca e leu em voz alta, uma voz nervosa e hesitante:

– É praticamente impossível reconhecer estas criaturas quando estão na sua forma humana. Entretanto, seu comportamento peculiar próximo às noites de lua cheia pode ser usado como diagnóstico. Entre eles pode-se citar... – Pedro fez uma pausa, olhando para Sirius e Tiago que acenaram para ele continuar. Remo sentou-se na cama, sentindo-se derrotado. Ele já sabia o que estava prestes a ouvir.

– Entre eles, pode-se citar – Pedro recomeçou –, a visível palidez e abatimento da criatura durante os dias precedentes à primeira noite de lua cheia do mês. Além, é claro, da necessidade de isolamento para sua transformação num... – Pedro gaguejou ao recitar as palavras seguintes –, num... lo-lobisomem... completo.

Assim que parou de falar, os três amigos olharam para Remo, que continuava sentado em sua cama, de cabeça baixa. Sirius, com um aceno da sua varinha, tirou o livro das mãos de Pedro e o pousou na cama, ao lado de Remo.

– Se você insistir que estamos enganados – Sirius dirigiu-se para Remo –, temos um livro inteiro com descrições que se encaixam direitinho em você.

– Eu fui mordido com apenas um ano de idade – Remo começou a falar de repente, numa voz tranqüila e desapontada. – Meus pais tentaram de tudo, mas não há cura para... para isso. Desde então, uma vez por mês, eu tenho me transformado... – Remo levantou os olhos para encará-los –, nisso que vocês estão pensando.

Os três amigos se entreolharam e baixaram as cabeças, envergonhados pelo modo como ameaçaram Remo. Sirius recolheu sua varinha. Após um minuto de silêncio, Tiago perguntou:

– Mas como? Como você faz para se transformar e não atacar ninguém? – Depois de um momento, acrescentou: – Você nunca atacou ninguém, não é?

– Claro que não – Remo respondeu. – Eu só estou em Hogwarts graças a Dumbledore. Ele procurou os meus pais e os convenceu de que poderia tomar algumas precauções, e assim, eu poderia freqüentar a escola sem nenhum problema.

 

– Que precauções? – Pedro perguntou.

Remo olhou para Tiago e depois para Sirius, um leve sorriso cresceu em seu rosto.

– Eu imaginei que vocês já tivessem adivinhado isso também.

Sirius olhou para o amigo com os olhos estreitos, agora tudo fazia sentido.

– O Salgueiro Lutador – disse. – Por isso Hagrid estava tão preocupado naquela detenção. E por isso você nunca nos deixou investigar isso melhor. Você não queria que nós descobríssemos...

– Na verdade – Remo o interrompeu –, eu fiquei com medo que vocês tentassem entrar na Floresta Proibida enquanto eu estava... fora. Se isso acontecesse, eu podia ter atacado um de vocês.

– Eu não entendo – foi Tiago quem falou desta vez –, como o Salgueiro Lutador pode nos manter protegidos de... de você?

– O Salgueiro Lutador foi plantado para esconder um túnel que leva até Hogsmeade. É uma passagem secreta até a vila. Dumbledore mandou construir uma casa na saída do túnel, e eu fico lá, trancado, quando estou transformado.

– Você fica lá sozinho? – Tiago perguntou, arrasado com a história do amigo.

Remo apenas assentiu com a cabeça.

– Nós temos que fazer alguma coisa – disse Tiago. – Não podemos deixá-lo passar por isso tudo sozinho!

– Impossível – Remo respondeu. – Eu não os reconheceria como meus amigos e acabaria atacando-os.

– Espere um minuto – Sirius chamou a atenção dos dois, uma idéia surgindo em sua cabeça. – A McGonagall falou alguma coisa sobre bruxos que se transformam em animais...

– Animagos – Remo o interrompeu. – Mas não é a mesma coisa que...

– Você não está entendendo, Remo – Sirius o interrompeu então, pegando o livro que estava em cima da cama, já excitado com sua idéia. Procurando por uma página específica do livro, leu o parágrafo que queria em voz alta, vagarosamente: – Preste atenção: "Uma singularidade entre as demais criaturas fantásticas, o lobisomem dá preferência a presas humanas. Entretanto, alguns observadores garantem que estas criaturas convivem pacificamente com animais silvestres, comuns nas florestas que usam para se esconderem".

– É perfeito, Sirius! – Tiago exclamou, entendendo a idéia do amigo. – Nós só precisamos nos transformar em animais e, então, poderemos lhe fazer companhia nas noites de lua cheia.

– Mas... – Pedro ainda não estava convencido da idéia dos amigos –, não é assim tão simples. A Profa. McGonagall disse que só bruxos adultos conseguem isso e, ainda assim, depois de muito esforço. E nós estamos apenas começando o segundo ano!

– Então nós vamos ter que nos esforçar ainda mais, não é Tiago? – Sirius replicou. – Pense nas oportunidades, Pedro. Nós vamos poder sair do castelo todo mês, fazer o que quiser sem o Filch e aquela gata intrometida no nosso pé. Vai ser melhor até que a capa da invisibilidade do Tiago!

Pedro analisou a idéia, e a possibilidade de mais aventuras com seus amigos superou o medo de serem descobertos perambulando fora do castelo ilegalmente transformados em animais.

Remo olhou para os amigos, emocionado. Estava morrendo de medo que eles o abandonassem quando descobrissem a verdade sobre ele, mas não, eles o apoiaram e, ainda por cima, estavam tentando ajudá-lo. Remo ainda tinha dúvidas se os amigos conseguiriam realmente transformarem-se em animais, mas só a intenção já o enchia de esperanças.

Uma batida na porta e a voz do monitor da Grifinória avisando que Madame Pomfrey esperava impaciente por Remo Lupin os fez despertarem de seus devaneios.

– Eu tenho que ir – Remo disse levantando-se. Andou até Tiago e colocou uma mão no ombro dele. – Lamento não poder assistir sua estréia no quadribol. Mas tenho certeza que você fará um ótimo jogo.

– Obrigado – Tiago respondeu. – Vai ser um ótimo jogo. Grifinória contra a Sonserina. Não vejo a hora de derrotar aqueles metidos.

Os dois riram. Remo despediu-se dos demais amigos e seguiu para a Floresta Proibida acompanhado da medibruxa. Os demais garotos desceram para o Salão Principal para jantar e preparar-se para a partida do dia seguinte.

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No dia seguinte, sábado, Severo seguiu para o café da manhã com os excitadíssimos amigos Evan e Isabelle. Era a estréia dos dois no time da Sonserina, e eles não viam a hora de colocarem seus uniformes e seguirem para o campo. Severo não sabia o que era pior: agüentar os dois amigos discutindo estratégias de jogo, o que já durava a semana inteira, ou lembrar-se, toda a vez que a palavra quadribol era pronunciada, do seu fiasco durante os testes classificatórios. Até agora ele não entendia por que tinha se candidatado. Já montava perfeitamente numa vassoura e conseguia voar sem problemas, se isso fosse necessário. Entretanto, correr atrás de bolas voadoras ainda não lhe parecia sinônimo de diversão. Isabelle lhe aconselhara a tentar uma posição como goleiro então, e até agora ele se perguntava como ela conseguira convencê-lo disso. Claro, ela usara o argumento da popularidade. Os jogadores de quadribol eram sempre os mais populares na escola, e ele considerou que isso poderia ser-lhe de grande valia se quisesse fazer com que todos na escola o respeitassem como se fosse um bruxo de sangue puro. Afinal, como o Lorde das Trevas lhe dissera, era importante manter seus aliados pensando que tinham idéias em comum.

Todavia, o quadribol mostrou-se muito mais complexo do que ele imaginara. Além de ter que guardar o gol, precisava ficar prestando atenção nos balaços que vinham de todas as direções, e para ajudar, a equipe da Grifinória aparecera no final, desconcentrando-o. Para o divertimento de todos, Severo caiu da sua vassoura e, por sorte, fora agarrado por Evan antes de se espatifar no chão. Sirius aproveitou a deixa para provocá-lo, recebendo em troca um balaço muito bem lançado por Isabelle, que aliás, garantiu sua posição como batedora graças a ele. Enquanto isso, os capitães dos times da Grifinória e da Sonserina discutiam quem tinha o direito de usar o campo naquele dia, mas os alunos do segundo ano das duas Casas estavam mais interessados no duelo que se passava entre Severo e Sirius. Os dois haviam lançado pequenas azarações um no outro, sempre repelidas, até que Filch apareceu e os colocou em detenção. Como resultado, nem Sirius e nem Severo entraram para seus respectivos times (embora Severo tivesse certeza que isso não aconteceria, já que não conseguira defender nenhuma das goles jogada em seu gol), e a partida de hoje estava sendo mais aguardada que nunca, pois a rivalidade entre as duas Casas aumentara ainda mais.

– Nem acredito que o jogo é hoje – disse Régulo Black, irmão de Sirius que entrara para a Sonserina naquele ano e insistia em fazer amizade com Severo e sua gangue. – E graças a você Severo, meu irmão nem conseguiu fazer os testes para entrar no time! Quero ver a cara dele quando a Sonserina ganhar!

Régulo venerava os quatro alunos do segundo ano da Sonserina, famosos por perambular pelo castelo em busca de vítimas para suas azarações. Era exatamente esse tipo de amizades que ele precisava para provar a seus pais que, ao contrário do seu irmão, ele era um autêntico Black e não desgraçaria o nome da família.

Assim que terminaram o café da manhã, Isabelle e Evan seguiram com o resto do time para se concentrarem para o jogo. Severo, Roberto e Paulo juntaram-se a multidão que já se dirigia ao campo para conseguirem os melhores lugares, sempre perseguidos por Régulo e seu amigo, também do primeiro ano, Bartô. Como a maioria dos sonserinos, Bartô era de uma família de sangues puros, e seu pai, Bartolomeu Crouch Sênior, era um Auror muito famoso, cotado para ser o próximo Chefe do Departamento de Defesa das Leis Mágicas, um cargo muito respeitado, principalmente depois dos boatos de ataques de bruxos contra trouxas e nascidos trouxas que vinham assustando a população do mundo bruxo. Régulo percebeu que ficar amigo do Crouch Jr. podia ser uma grande oportunidade, e agora os dois estavam decididos a entrar para a Gangue da Sonserina, perseguindo os sonserinos mais velhos por todos os lugares.

Em pouco tempo, as arquibancadas em volta do campo de quadribol já estavam lotadas; de um lado pintadas de vermelho e dourado, as cores da Grifinória, e de verde e prata, cores da Sonserina, de outro. Estimulados pela confusão que ocorrera durante os testes preliminares, as duas torcidas já se provocavam antes mesmo dos jogadores entrarem em campo. Quando Madame Hook apareceu, anunciando o início da partida, o urro das duas torcidas foi tão alto que era quase impossível ouvir os comentários de Lino Jigger, um corvinal do quinto ano escolhido para narrar a partida.

Como era de se esperar, foi uma partida difícil, especialmente para a Grifinória. A Sonserina parecia especialista em faltas, principalmente Isabelle, que parecia ter entrado em campo apenas para lançar balaços em tudo o que era vermelho e se movia.

 – É – narrava Lino –, parece que a Malfoy é a arma secreta da Sonserina. Os artilheiros da Grifinória não conseguem fugir dos seus balaços. Quem me dera receber uma "catimbada" de uma garota como essa!

A Profa. McGonagall estava prestes a chamar a atenção de Lino Jigger, mas não foi necessário. Atendendo ao seu pedido, Isabelle desviou um balaço bem na direção do narrador, que foi paralisado pela juíza, Madame Hook.

– Ei – Lino continuou a narrar –, isso realmente foi uma catimbada! É falta da Sonserina!

Mas ninguém mais o ouvia. Enquanto Madame Hook chamava a atenção de Isabelle por ter jogado um balaço nos espectadores, o pomo de ouro fora avistado pelos dois apanhadores, que agora o perseguiam desesperadamente sob os olhares atentos da platéia. Era a única chance da Sonserina ganhar a partida, pois estavam perdendo por um pouco menos dos cento e cinqüenta pontos que ganhariam se agarrassem o pomo. Aproveitando a distração dos demais jogadores, Tiago, o artilheiro que mais marcara pontos naquele dia, conseguiu entrar na área da Sonserina e marcar mais um gol para a Grifinória, no mesmo instante em que o apanhador da Sonserina erguia o pomo de ouro em suas mãos.

As duas torcidas levantaram em polvorosas, comemorando a vitória de seus times. O capitão da Sonserina alegava que o gol marcado por Tiago não valera, pois eles já tinham apanhado o pomo de ouro. O capitão da Grifinória alegava que Tiago lançara a goles antes, e por isso os pontos eram válidos. Madame Hook, irritada com o jogo sujo da Sonserina, acabou concedendo os pontos para a Grifinória, que venceu a partida por apenas dez pontos de diferença.

Os jogadores da Grifinória abraçaram-se e levantaram Tiago, correndo com ele em volta do campo. Sirius e Pedro juntaram-se ao amigo para seguirem para as comemorações na sala comunal. Enquanto isso, os sonserinos se retiravam do campo reclamando da juíza e exigindo que a partida fosse anulada. Isabelle e Evan juntaram-se aos amigos, xingando Potter e os demais jogadores da Grifinória.

Antes de retirar-se para sua sala comunal, Tiago, seguido de Pedro e Sirius, dirigiu-se para Isabelle e Evan com um sorriso largo no rosto:

– Foi uma excelente partida – disse, estendendo a mão.

– Aproveite seu momento de glória, Potter – Isabelle respondeu sem voltar o cumprimento –, pois da próxima vez...

– Não fique chateada, Isabelle – Sirius a interrompeu. – Nós somos os melhores, você tem que admitir! Mas você sempre será bem-vinda para comemorar conosco. Só você, é claro. Já tem muito homem na Grifinória.

Isabelle respondeu com uma risada.

– Se eu fosse sair com um Black, Sirius – ela acrescentou –, seria com o seu irmão! Vamos Régulo! – E saiu, segurando Régulo pelo braço.

Os demais sonserinos também saíram em direção ao castelo, deixando Severo para trás, que ainda teve tempo de ameaçar Sirius:

– Nós ainda não terminamos aquele duelo, Black.

– Não seja tolo, Ranhoso. Eu tenho uma comemoração para ir, não vou perder tempo com você. Quem sabe quando vocês tiverem um artilheiro tão bom quanto Tiago, vocês saibam o que é ganhar uma partida de verdade!

Os três amigos deram as costas para Severo, seguindo também em direção ao castelo, rindo e comemorando a recente vitória. Severo continuou observando-os até desaparecerem nas grandes portas de carvalho. Seu ódio por aqueles grifinórios só aumentara ainda mais depois da partida. Era insuportável vê-los alegres daquele jeito, caçoando dele e de seus amigos. A visão de Tiago sendo carregado no campo pelos colegas do time o incomodara mais do que ele queria admitir. Pois era assim que ele queria ser visto pelos seus colegas. E, embora a gangue da Sonserina já fosse temida por toda a escola, ele sentia que isso mais o afastava que aproximava de algumas pessoas. Ele não tinha amizades semelhantes à amizade de Tiago e Sirius, tinha apenas colegas que se aproximavam dele para não sofrerem com suas azarações. Até mesmo Isabelle só ficara sua amiga por causa do seu desempenho em Poções. De repente lembrou-se que a única pessoa que pareceu querer realmente conhecê-lo, sem nenhuma intenção escusa, fora Lílian Evans. Mas eles nunca mais se falaram, a não ser algumas poucas vezes nas reuniões do Prof. Slughorn, depois que as rivalidades entre Sonserina e Grifinória começaram a ficar mais sérias, no início daquele ano.

Percebendo que estava sozinho nos jardins do castelo, Severo balançou a cabeça, decidindo livrar-se daqueles pensamentos e voltar para sua sala comunal. Mesmo com a Sonserina perdendo a partida, ainda tinham um fim de semana inteiro pela frente e muito tempo para pensar numa maneira de importunar àqueles grifinórios que tanto o incomodavam.

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Desde o dia da morte de sua avó, quando conversara por um longo tempo com o Lorde das Trevas, Severo notara que seu avô começara a tratá-lo de maneira diferente. Concluiu que ele também era um dos seguidores Daquele–Que–Não–Deve–Ser–Nomeado, como os covardes se referiam ao Lorde das Trevas. Então, ao ver o próprio mestre conversando com o neto, seu avô não seria tolo de ignorá-lo ainda mais. Essa era a única explicação que Severo encontrara para a mudança repentina de comportamento do seu avô, quase dois anos atrás. Desde então, ele fora chamado em várias ocasiões para passar o dia na Mansão dos Prince durante suas férias, onde aprendera muitos feitiços novos e acabara conhecendo vários amigos do avô, sempre bruxos de famílias importantes e muito ricas. Algumas vezes o Lorde das Trevas também estava lá, e estas eram as melhores ocasiões, pois assim ele começou a aprender os segredos da Legilimência e das maldições imperdoáveis, coisas que ele jamais aprenderia em Hogwarts.

Agora que estava no terceiro ano, feitiços tolos e azarações simples não empolgavam mais Severo, e ele sentia que Hogwarts não tinha muito mais a lhe oferecer. Ele sabia que bruxos mais velhos, recém-formados, como Lúcio, já estavam a serviço do Lorde das Trevas, e ele também queria se juntar aos Comensais da Morte, como eram chamados os bruxos e bruxas mascarados que agiam em nome de Você–Sabe–Quem contra as leis estúpidas do Ministério. Ele e seus amigos encontraram-se algumas vezes com Comensais da Morte disfarçados, num bar chamado Cabeça de Javali, durante as visitas programadas à Hogsmeade. Lúcio sempre estava lá, geralmente com Belatriz e Rodolfo Lestrange, contando vantagens sobre seus trabalhos ao lado do Lorde das Trevas.

Mesmo com sua admiração pelo Lorde das Trevas, entretanto, Severo esquecera-se completamente do livro que ganhara dele como presente de Natal, já há alguns anos. Até agora ele não precisara recorrer a um livro tão avançado para seus estudos em Poções. Os trabalhos que o Prof. Slughorn mandava como dever de casa eram relativamente simples, e Severo nunca teve dificuldade para realizá-los. Nunca, até hoje. Desta vez, o mestre de Poções pedira uma redação sobre diferentes ingredientes comumente utilizados em antídotos, e ele não estava familiarizado com muitos deles. Como Isabelle continuava sendo sua companheira nas aulas de Poções, eles estavam juntos na biblioteca tentando terminar o trabalho, e sua amiga lembrou que o irmão havia estudado sobre formulações de antídotos no sexto ano. Lembrando-se que o Lorde das Trevas comentara que havia deixado algumas anotações no livro que lhe dera, Severo decidiu então, buscá-lo na sala comunal. Afinal, anotações feitas pelo próprio Lorde das Trevas com certeza eram muito mais instrutivas que qualquer outro livro da biblioteca. Mas após folhear as páginas rapidamente, Severo percebeu que não havia nenhuma anotação relacionada com o preparo de Poções, e expressou sua frustração para Isabelle:

– Não acredito! Nem mesmo o Lorde das Trevas pode nos ajudar!

– Psiu! – Isabelle censurou-o com os olhos arregalados e acrescentou sussurrando: – Você não quer que Dumbledore saiba que vocês se conhecem!

Severo apenas a olhou com uma expressão de tédio. Continuou folheando o livro, percebendo que as anotações existentes podiam não estar relacionadas com Poções, mas eram muito interessantes. Reconhecendo algumas palavras e observando os rabiscos e sinais de que foram muitas vezes apagadas e reescritas, Severo julgou que tinha em mãos um registro de azarações criadas pelo próprio Lorde das Trevas. Parou em um que lhe pareceu muito útil para ser usado na biblioteca: o Abaffiato.

– O que você disse? – Isabelle perguntou em voz baixa, levantando os olhos do pergaminho que estava escrevendo.

– Eu acabei de fazer um feitiço – Severo respondeu. – Se o livro estiver certo, nós podemos falar a vontade sem nos preocuparmos com a Madame Pince.

– E como vamos saber se funciona?

– É só você falar mais alto – Severo respondeu com um sorriso debochado.

Isabelle estreitou os olhos, olhando para Severo e depois para o livro todo rabiscado a frente dele.

– Madame Pince – ela chamou em voz alta, sem tirar os olhos apertados de Severo –, o Severo está escrevendo nos livros da biblioteca!

Severo desmanchou o sorriso, mas voltando-se para Madame Pince, viu que ela continuava entretida catalogando novos livros que chegaram para a biblioteca. Se ela não ouviu a acusação que um aluno estava riscando livros, então realmente ela não poderia ouvir nada. Olhando em volta da sua mesa, viu que os demais alunos que estavam estudando perto deles também não tomaram conhecimento do aviso de Isabelle. Ele voltou-se novamente para a amiga com uma expressão de triunfo.

– Acredita em mim agora?

Isabelle o encarava com os olhos arregalados e um sorriso enorme no rosto.

– Você quer dizer que o Lorde das Trevas lhe deu, pessoalmente, um livro com anotações dele? Com uma seleção dos feitiços preferidos dele?

– Do jeito que algumas anotações estão borradas – Severo respondeu –, eu diria que são feitiços que ele mesmo criou.

– Você deve ser mesmo muito especial, Mestiço! O que você fez para ele te dar esse livro? – ela perguntou desconfiada.

– Nada – Severo respondeu, claro que não diria que ele sabia de um grande segredo do Lorde das Trevas. – Ele disse que estava me dando o livro porque viu que eu gostava de Poções.

– Ah, claro! – Isabelle retrucou. – Então por que ele não me deu os livros que ele usou em Defesa? Ou em Feitiços?

– Sei lá – Severo deu de ombros –, vai ver ele não gosta de você.

Como resposta, Isabelle estreitou os olhos novamente e tirou o livro das mãos de Severo, que tentou protestar, mas não conseguiu. Tinha alguma coisa em Isabelle que fazia com que ele, apesar de gostar de vê-la irritada, não conseguisse dizer não a ela.

– Tem muita coisa inacabada aqui – Isabelle disse depois de uma rápida folheada. – Olha isso – ela apontou para o rodapé de uma página.

Severo leu algumas palavras, ou melhor, pedaços de palavras que estavam anotadas no rodapé da folha: Corpus, Levio, Levia, dium, vbl.

– Parece que era para fazer alguma coisa levitar – Severo calculou.

– Pois é – Isabelle concordou. – Mas pelo jeito, nenhuma das combinações funcionou.

Severo ficou olhando para as palavras, tentando se lembrar das aulas de Feitiço. Com exceção do Vingardium Leviosa, nunca aprendera outro feitiço semelhante. Depois de dois anos aprendendo sozinho novas azarações, Severo sabia que havia uma seqüência lógica nas palavras que canalizavam sua magia até a ponta da varinha.  Não deveria ser difícil terminar aquilo, a parte mais complicada já estava pronta. Levio... Leviosa... Levi... era isso! – pensou.

Levicorpus! – disse segurando a varinha.

Mas nada aconteceu. Apenas umas faíscas saíram da ponta da varinha, mas nada que pudesse ser chamado de feitiço. Já estava virando a página do livro quando Isabelle o chamou:

– Espere! É isso mesmo! A sua varinha respondeu. Você só deve ter feito alguma coisa errada. Mas o que pode ser?

Olhando novamente para os rabiscos, Isabelle franziu a testa pensando no que mais seria necessário para o feitiço funcionar. Levicorpus com certeza era para ser usado em levitação, provavelmente para coisas muito pesadas, pois feitiços simples de levitação já eram conhecidos há séculos. A única coisa que ainda não era possível fazer levitar era... claro! Fazer uma pessoa levitar não era trivial. Um objeto inanimado, sem vontade própria, era fácil. Mas uma pessoa, assustada ou com raiva, jamais obedeceria a um bruxo desconcentrado. Ela expôs suas idéias para Severo, que concordou.

– Mas então – ele suspirou –, eu só preciso me concentrar mais?

Isabelle deu de ombros. Não parecia ser tão simples assim. Olhou novamente as anotações, e uma coisa que antes lhe passara despercebida chamou-lhe a atenção.

– Tem uma palavra borrada, não consigo ver o que está escrito. – Passando a varinha pela folha, ela limpou os rabiscos e conseguiu decifrar o que faltava: n-vbl. – É claro! Não-verbal! – ela exclamou quando entendeu o significado daquelas últimas letras.

– O que você quer dizer com não-verbal? – Severo perguntou.

– O feitiço! Não funcionou porque tem que ser não-verbal! Você sabe – ela continuou explicando –, um feitiço mudo.

– Não, Isabelle. – Severo olhou para ela desconfiado, cruzando os braços. – Não sei.

– Você tem que se concentrar, e pensar no feitiço. Sem pronunciá-lo em voz alta, entendeu?

– Isso é impossível!

– Não é, não – Isabelle insistiu. – Tente. Pense no Levicorpus, mas não diga nada.

Severo ainda olhava desconfiado para a amiga, mas fez o que ela mandou. Pegou distraidamente a varinha e pensou: Levicorpus. No mesmo instante, Ronaldo Spore, um aluno do segundo ano da Lufa-Lufa subiu violentamente no ar e ficou pendurado de cabeça para baixo, como se estivesse preso por um gancho invisível. Quando viu aquilo, Severo escondeu rapidamente a varinha, mas o menino continuava flutuando no ar. Toda a biblioteca começou a rir e ficar em volta de Ronaldo, inclusive Severo e Isabelle, que fingiam também não entender o que estava acontecendo.

Madame Pince saiu da sua mesa e começou a gritar com a multidão de alunos que se formara em volta do desafortunado lufa-lufa, mas não conseguiu descobrir o autor da brincadeira. Ronaldo ficou um bom tempo no ar, até que o Prof. Flitwick fora chamado e, depois de muitas tentativas, conseguiu fazer o menino descer e o encaminhou para a ala hospitalar. Tanto Madame Pince quanto o professor de Feitiços olharam desconfiados para um grupo de alunos do sexto ano, mas não disseram nada. Jamais lhes passaria pela cabeça que os verdadeiros autores desta traquinagem nem sequer haviam passado pelos NOMs.

Tiago, Sirius, Pedro e Remo, que também estavam na biblioteca estudando arduamente Transfiguração para tornarem-se animagos, ficaram deslumbrados com o feitiço que viram. Levitar uma pessoa parecia ser uma brincadeira muito legal, principalmente contra sonserinos metidos.

– Nós temos que descobrir quem fez isso! – Sirius exclamou olhando admirado para o teto, onde há poucos minutos Rodolfo Spore ficara pendurado. – E principalmente: como fizeram isso!

********

Assim que as coisas voltaram ao normal na biblioteca, Severo e Isabelle saíram correndo para a sala comunal da Sonserina. Chegando lá, encontraram seus demais amigos que não entenderam porque estavam tão animados e ofegantes, sorrindo de orelha a orelha, se também não tinham conseguido terminar o trabalho de Poções. Depois que contaram o que acontecera na biblioteca, todos se sentaram em volta de Severo, tentando pensar qual seria o feitiço para desfazer o Levicorpus. Não levou muito tempo para concluírem que Liberacorpus seria o contra-feitiço ideal, e depois de testarem em Bartô, Severo o anotou, com uma letra apertadinha, logo abaixo do feitiço original.

Apenas um mês após a misteriosa flutuação de Rodolfo Spore na biblioteca, Hogwarts inteira já conhecia o Levicorpus. Filch teve bastante problema em evitar que alunos desavisados aparecessem pendurados no ar naquele ano, principalmente porque ele não tinha a menor idéia de como fazê-los descer, e sempre precisava recorrer à ajuda de algum professor. Mas o que mais o incomodava era que, como se tratava de um feitiço não-verbal, ele dificilmente conseguia identificar o aluno infrator, e o número de detenções diminuíra consideravelmente naquele ano.

Tiago era um dos alunos que melhor desempenhava o novo feitiço, que aprendera com um aluno da Corvinal. Ele desempenhava o Levicorpus e o Liberacorpus tão rapidamente que conseguia enganar Filch levantando e descendo suas vítimas sem que o zelador percebesse o que tinha acontecido. Certa vez, ele fizera isso no Três Vassouras, sem notar que Dumbledore estava por perto, e como resultado, os alunos do terceiro ano da Grifinória foram proibidos de sair do castelo na próxima visita à Hogsmeade, e os quatro amigos ficaram conhecidos como os piores encrenqueiros da Grifinória.

Evan e Roberto entraram rindo na sala comunal da Sonserina quando ficaram sabendo da sentença do Diretor. Ao ouvir aquilo, Severo comentou com raiva:

– Bem feito para aqueles covardes. Aposto que eles só atacam quem está sozinho, e ainda por cima usando um truque que eu inventei.

– Você devia ter contado que inventou o Levicorpus – disse Bartô. – Aposto que eles nunca mais implicariam com você.

– Claro que não! – Isabelle exclamou. – Se Dumbledore descobrir que o Levicorpus foi inventado por um aluno do terceiro ano, ele vai desconfiar que tem alguma coisa por trás disso, e vai chegar no livro do Severo.

– E daí? – Bartô insistiu.

Isabelle olhou para o garoto mais novo com uma cara de quem queria estrangulá-lo, mas explicou:

– Dumbledore não é tão tolo quanto aparenta. Se ele descobrir que o Severo tem um livro do Lorde das Trevas...

– E como ele vai saber que o livro pertenceu ao Lorde das Trevas? – Roberto a interrompeu.

– É – Régulo argumentou –, o livro é do Severo agora. Ele pode dizer que as anotações são todas dele.

Isabelle simplesmente bufou e foi para o seu quarto. Não conseguia acreditar como aqueles meninos podiam ser tão estúpidos. Será que eles iriam crescer algum dia? Felizmente, Severo parecia não dar ouvidos a eles, ele sabia que estaria encrencado se Dumbledore soubesse que tinha alguma coisa haver com o feitiço da moda em Hogwarts, ou pior, se descobrisse que um livro cheio de anotações do Lorde das Trevas estava solto na escola.

Refletindo sobre isso, Severo lembrou que não tinha colocado seu nome no livro. Enquanto os amigos discutiam se ele devia ou não revelar que fora o criador do Levicorpus, Severo abriu o livro na segunda página e começou a escrever, onde antes havia lido o nome do Lorde das Trevas:

Este livro pertence a

Mas então parou, decidindo que talvez não fosse prudente colocar o seu nome nele. Considerou que Lord Voldemort provavelmente também não era o verdadeiro nome do Lorde das Trevas, mas um codinome para não trazer-lhe problemas caso o livro caísse em mãos erradas. Ficou pensando por um bom tempo em o que escrever ali. Pensou em usar o nome do avô, mas Prince não era um nome comum, e certamente acabaria levando a ele de qualquer maneira. Pensou então em Isabelle, de certa forma ela também tinha uma parte na criação do feitiço. Às vezes ele pensava que ela era a única pessoa razoável perto dele, a única que o entendia e que parecia ter uma visão mais ampla do que estava realmente acontecendo fora dos muros que cercavam Hogwarts. Nos últimos tempos, ele estava preferindo a companhia dela, uma garota, que dos seus outros amigos sonserinos. Sorriu ao lembrar como ela o irritava no primeiro ano, chamando-o de Mestiço, mas que depois ele percebera que não era por maldade e que ela realmente não se importava com a descendência dele. Entretanto, ela ainda era a única pessoa capaz de chamá-lo de Mestiço e sair ilesa. Ainda pensando em Isabelle, ele completou a frase que começara a escrever:

Este livro pertence ao Príncipe Mestiço


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Notas finais do capítulo

N.A.: Este capítulo acabou ficando tão grande que acabei dividindo-o em dois, a Parte II vem logo em seguida!

O título do capítulo é uma homenagem ao livro homônimo do escritor paranaense Domingos Pellegrini. Fui obrigada a lê-lo em 1994 para o vestibular da UFPR e, apesar de não ter nada haver com Harry Potter, me ajudou a entender bastante como os "meninos crescem". … uma coletânea de contos abordando diferentes aspectos que fazem os meninos transformarem-se em homens, e me pareceu caber direitinho neste capítulo. Recomendo a todos!

Embora fora citado no primeiro filme que Tiago era apanhador da Grifinória, J. K. Rowling afirmou numa entrevista que ele era, na verdade, artilheiro, e assim será nesta história, pois a palavra da J. K. Rowling vale muito mais que o filme estragado do Chris Colummbus.

A seguir: Os meninos continuam crescendo, e Snape terá várias surpresas...



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