O céu estava todo tingido de branco – acinzentado e infinitas gotas d’água caíam sucessivamente dele.

            A cena do dia anterior se repetia: dentre os colegas de classe se divertindo, Ichigo estava em seu canto, encarando a janela, seu olhar era distante, e desta vez, parecia triste. Os amigos, preocupados, vieram tentar animá-lo, com palhaçadas e brincadeiras, porém as risadas se misturavam com o som da chuva, e tudo ao redor estava vago, como se o tempo parasse.

“ Mas porque será?

Como quando estou rodeado por muitas pessoas,

Sentir-me só neste mundo,

E acabo procurando por sua presença”

            E automaticamente, inconscientemente, ele virava a todo momento para a carteira ao lado, que permanecia vazia. Esta emanava um ar de melancolia e solidão, parecendo, sentir falta de algo...

            Sem conseguir ficar naquela agonia, saiu da sala e mergulhou em seus pensamentos; na carta escrita tão duramente e secamente, com ausência daqueles desenhos nada artísticos e brincadeiras toscas, que envolviam códigos sem nexos, mas muitas vezes divertidos e fáceis de interpretar; nas lágrimas quase derramadas pela garota; na repentina partida dela e... Naquele sentimento inexplicável que estava dominando-o.

            - K-Kurosaki-kun! – uma voz fina interrompe-o de seus pensamentos – O-O que aconteceu a Kuchiki-san?

            - Não sinto mais a sua pressão espiritual... – completou Ishida levantando os óculos com o dedo indicador.

            A afirmação de Ishida confirmara a Ichigo que Rukia já não estava mais perto, já que o quincy era bom em localizar as pessoas. E cabisbaixo com os punhos fechados fortemente, respondeu:

            - ... Ela foi embora...

            O Silêncio tomou conta do ambiente naquela hora, Ichigo parecia muito abalado com o inexplicável desaparecimento de Rukia, não era difícil de perceber isso, até que se pode ouvir a delicada voz de Orihime.

            - E porque você não vai atrás dela?

            - Inoue... – Ichigo agora a encarava, com os olhos surpresos

            - O que está fazendo parado aqui? – ela continuava – O Kurosaki-kun que conheço iria procurar e trazê-la de volta, sem se importar com as conseqüências!

            - Mas... É que eu... – novamente ele abaixou a cabeça, apertando ainda mais forte os punhos

            - Seja sincero consigo mesmo, e faça o que o coração manda! Nós estaremos te esperando retornar com a Kuchiki-san!

            Ichigo olhou para os amigos, que sorriam para ele.

            - ... Valeu, Inoue! – as palavras da ruiva fizeram-no perceber, finalmente, o que ele devia fazer, e há muito tempo.

            Virou-se e correu. Os três apenas o observaram, e depois que perderam-no de vista, Ishida, sem conter sua curiosidade, perguntou:

            - Inoue-san, por que falou tudo aquilo para o Kurosaki? Você gosta dele, e esta não seria uma situação favorável?

            Inoue, agora, olhava atentamente a chuva que caia lá fora, o olhar longe, então apenas virou-se para Ishida e Chad, sorriu e disse:

            - Você não reparou como Kurosaki-kun estava? Está claro que sem a Kuchiki-san, ele se sente incompleto, vazio. A sua maior felicidade é tê-la sempre ao seu lado, por isso eu desejo que os dois estejam juntos, pois se Kurosaki-kun continuar a sorrir, não importa se não sou eu quem está perto dele, eu também serei muito feliz...

            A chuva continuava a cair incessantemente, mas não impedia o Ichigo a correr sem rumo entre as ruas, e gritar pela procurada.

“ Por tanta paixão, chamei seu nome.

Devia ter te amado do jeito que o coração falava.

Repito varias vezes o motivo do adeus,

E apesar de ter colocado um fim nisso,

Não consigo apagar.”

            As gotas de água caiam na ponta de seus cabelos, e escorriam pelo corpo todo como se estivessem em câmera lenta. Flash-backs daquela noite vinham em sua mente, e as cenas mudavam a cada pingo de chuva que caía sobre si.

            Foi a cada ponta da cidade que passava-lhe pela cabeça, e todos fizeram-no lembrar dos momentos com a shinigami. E mesmo com a respiração ofegante e cada membro do corpo dominado pelo cansaço, continuou; porém, não tinha um rastro sequer em lugar algum em lugar algum. Por fim, com a escuridão dominando o céu, foi para a estação de trem e pegou o caminho para casa.

“ A chuva nunca avisa quando vai parar,

E apenas continua a cair.

O casal que se aproximam

no ultimo trem do dia, sempre pontual

De repente, o pensamento volta ao sentimento

daquele dia, sem apressar,

o tempo passa, mas as lágrimas

deste céu nublado não querem parar”

Perguntava-se por quê a discussão havia chegado naquele ponto. Por quê do tapa e da expressão chorosa dela. Por quê ele disse aquelas coisas e não conseguia falar a verdade. Por quê  ela se incomodava em ser protegida. Será que o problema era com ele?

“ Estava sensível, por exemplo,

se você é a flor que aqui desabrocha,

murcha de tanta água que acaba dando.

Fica sem receber luz de tanto que protejo.

Sinto sua falta a ponto de não entender.

Mel muito doce são odiados pela própria doçura.

Assim, quando este equilíbrio frágil for quebrado,

fico com medo, e fingindo entender o que é importante,

acabei deixando escapar o amor.

Repetindo para mim mesmo,

que a separação é o começo do encontro,

hoje também vou andando, mas...”

            Com tanto rancor e agonia, socou o poste ao lado e abaixou a cabeça deixando escorrer os pingos de chuva. Já estava chegando em casa. A rua desértica, era iluminada pelas luzes fluorescentes, e banhado por ele, o garoto sentia um peso, mas não eram das roupas molhadas e das águas que pareciam empurrá-lo cada vez mais ao chão, e sim do seu coração. E no meio do som da chuva, um grito foi liberado, por Ichigo.

“Por tanta paixão chamei seu nome.

Meu coração não quer se conformar.

Agora, mesmo sabendo que não posso mais te encontrar,

ainda estou procurando a razão...

Repito várias vezes o motivo do adeus,

sem conseguir mentir para o meu coração...”

            Ao finalmente chegar em casa, sem dizer quase nada a sua família, subiu as escadas e tomou um banho. Quando entrou no seu quarto, silencioso e vazio, reparou que a chuva cessara, e em seu lugar, surgiu uma lua minguante, entre as nuvens ainda carregadas. Ficou olhando-a vagamente por um bom tempo, e talvez continuaria vendo mais, se não fosse por uma visita repentina que surgiu pela janela:

            - Oláááá!!!1 Kurosaki-san! Boa noite, vejo que está procurando algo, e ficou com a cabeça tão quente que esqueceu o mais provável!

            - U-Urahara-san?! O que você quis dizer com isso?! Você sabe de alguma coisa?

            - Ora, ora!  Acalme-se Kurosaki-san! Pense, se não sente a pressão espiritual dela, onde mais poderia estar a não ser na...

            - Soul Society!

            Finalmente uma luz surgiu neste céu dominado pela escuridão...