Rosa do Deserto escrita por Y Laetitya


Capítulo 5
Enfermaria




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–Rose Hope Campbell... Achamos que estivesse morta, demorou para achar o caminho desta vez. Mas isto serviu para provar que não facilitamos as coisas para novatas como você... –Ele cuspiu no chão. –Vou chamar alguém para lhe mostrar a tenda da enfermaria, espero que este buraco na sua barriga tenha aumentado seu ódio pelos fiends.

–Com toda a certeza, senhor. –Aperto minhas mãos, prontas para dar um soco na cara deste velho.

–Vocês realmente só nos dão trabalho, odeio novatos, e ainda por cima a única coisa que nos trazem são gastos com suprimentos médicos ou transporte de corpos para a família enterrar, vocês vieram aqui para vagabundear e ter comida à vontade, é? –Ele chuta a terra do acampamento. –Lugar de mulher é na cozinha ou no bordel. –Os outros soldados começavam a chegar mais perto, curiosos com o barulho.

–Escuta aqui, seu velho frouxo, quem você acha que eu sou para cuspir essas palavras na minha cara? –Rebato, enquanto tento afundar meu dedo indicador o mais forte possível em seu peito.

Ele me dá um soco na barriga tão forte que caio de joelhos, cuspindo sangue na areia, aquilo doeu pra caralho, levanto-me um pouco cambaleante, partindo para cima dele aos socos, mas dois soldados que assistiam à nossa discussão me agarram e arrastam para longe da vista dos demais enquanto disparo palavrões muito grosseiramente.

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–Eu não sei qual é a sua, até parece que não sabia quem ele era... –O médico enfaixava meu ferimento depois de tê-lo higienizado. Ele tinha uma aparência de no máximo 30 anos –embora um pouco castigada pelos meios estressantes que deveria trabalhar–, um pouco jovem demais para esta profissão em um lugar como esse. –E sobre este machucado, então... Há quantos dias você está com ele aberto? Tinha muitas partes infeccionadas, está horrível! Com sorte não deixará uma marca muito grande... Também está ardendo em febre, pergunto-me pelo que andou passando nestes dias que esteve desaparecida.

–Como sabe que eu...?

–Seu parceiro Collins me contou que você ficou quase uma semana sem dar notícias.

–Collins... É, eu... Tomei um tiro por aí e acabei me perdendo. –Eu queria saber quem diabos era Collins, mas não podia perguntar, aquilo me deixava inquieta.

Ouvem-se batidas na porta improvisada e o doutor pediu licença para atender. Passos de duas pessoas estavam vindo em minha direção, podia ouvir o doutor explicando sobre meu ferimento e a febre que ele poderia ter causado, sobre eu estar em um possível estado de confusão e que precisaria descansar até que tudo entrasse em acordo, uma voz jovem assentia tudo com um “aham” tranquilamente. Os passos pararam em frente à minha maca, tudo o que me separava de um novo rosto era apenas uma cortina.

–Com licença. –Era um jovem de cabelos dourados, um aspecto quase limpo, sabia que já o tinha visto em algum lugar, fitou-me, um pouco confuso. Ele provavelmente conhecia a verdadeira Rose Campbell.

–Você é...

–Não faça muito esforço, Rose. –Sentou-se ao meu lado e sorriu.

Aquele sorriso parecia alguma droga, pois tirou toda a minha preocupação –ou quase toda– de que tudo poderia ir por água abaixo. Ele talvez não conhecia tanto a Rose quanto eu pensei.

–O médico disse que você está com febre, acho que foi por isso que reagiu daquele jeito com o major Brown. –Ia protestar, mas ele colocou a mão em meu braço e o abaixou como forma de me calar. –Peço que não faça mais isso. Ninguém nunca o desrespeitou daquele jeito, mesmo tendo que ouvir todas aquelas merdas que ele cospe nos nossos ouvidos. Sei que você é novata, mas tente segurar a barra, não sei exatamente de onde você veio, mas não é na porrada que as coisas funcionam conosco aqui.

–Cale a boca. –Olho para o tecido da tenda à minha esquerda, desviando meu olhar do dele, um pouco envergonhada.

–Você parecia que era mais “adorável” do que isto, mas não a culpo, ficou muito tempo sob tensão, não é? –Sorriu e se levantou, arrumando sua roupa. –Precisa apenas descansar. –Ele deu tapinhas em meu ombro e saiu, deixando-me deitada e sozinha.

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–Aqui, tome estes remédios, são para aliviar a dor. –O médico estendeu sua mão com algumas pílulas nela.

–Desculpe a grosseria, mas... –Deveria ser cautelosa. –Como mesmo é seu nome?

Ele riu.

–Ah! Claro, vocês nunca irão decorar, deveria me apresentar sempre... Meu nome é Peter White. –Sorriu.

–White é um bom nome para um médico. –Retribuí o sorriso. –Meu nome é... Rose.

–Rose é um bom nome para uma dama de cabelos tão vermelhos como os seus.

Silêncio.

–B-bem, vou retirar este curativo, você poderia aproveitar para tomar um bom banho, depois volte aqui para eu colocar bandagens novas.

Era manhã, o sol começava a tingir as terras da Wasteland de amarelo, White me dera um sabonete e um esfregão, alegara que parecia que eu nunca tinha tomado um banho de verdade, eu não podia dizer, mas ele estava certo. Caminhei até os banheiros e comecei a me limpar, era muita água, achei o chuveiro fabuloso, o sabonete muito cheiroso, o esfregão uma maravilha, descobri que meus cabelos eram mais avermelhados do que sempre imaginava que eles seriam e a água ia para o ralo com uma cor tão marrom quanto as poças que formavam depois da chuva no meu antigo “lar”. Peguei-me sorrindo como uma criança. No baú da verdadeira senhorita Campbell achei roupas novas que me serviam, embora ainda um pouco largas, e uma foto em família. Aparentemente era ela com seus pais, onde será que eles estão agora? Senti-me um pouco culpada por roubar a vida de sua filha. Por via das dúvidas, guardei a foto o mais fundo no baú que consegui.

Antes de passar na tenda da enfermaria, andei um pouco pelo acampamento para fazer reconhecimento de rostos, é claro que o número de soldados para soldadas é incrivelmente diferente, alguns deles me olhavam, talvez tinham visto a confusão de ontem com o tal de major Brown. Alguns sorriram para mim e disseram que eu era muito corajosa, outros apenas lançavam olhares de desaprovação. Não que eu me importasse.

Voltei à enfermaria e White higienizou a ferida, que parecia muito melhor de um dia para o outro.

–Realmente você tem um corpo ótimo... Digo, n-não é exatamente o sentido que você está imaginando. –Gaguejou, seu rosto estava corado. –Quis dizer que ele cicatriza muito bem... Desculpe pelo duplo sentido da frase, eu nunca fui muito bom com palavras...

–Tudo bem, já ouvi coisas muito grosseiras por aí. Terminou?

–Espere, falta apenas... Isto. Prontinho. –White sorriu e deu uns tapinhas no meu ombro. –Sabe, eu admiro sua coragem, é claro, não estou encorajando-a a novos atos agressivos contra Brown, mas... Bem, quem diria que você seria destas, hem?

–Digamos apenas que onde fui criada favoreceu este meu temperamento... –Sentei-me na maca, sorrindo.

Batidas na porta fizeram nossa atenção voltar-se a quem estava entrando. Era o garoto dos cabelos dourados, e novamente me veio uma estranha sensação de já tê-lo visto em algum lugar.

–Com licença, mas você não tem apenas ela para cuidar, não é doutor? –Ele disse, sentando-se em uma maca à minha frente.

Doutor White caminhou até ele e fez menção para ele tirar a jaqueta, e assim que o fez foi logo desenfaixando seu ombro esquerdo.

–Malditos fiends, estes rifles a laser não são tão mortais, mas um tiro faz um belo estrago, com certeza, não é, Collins? –O médico disse, enquanto higienizava a queimadura.

É claro. As lembranças de quando levei o tiro na barriga vieram à tona, e com ela o rosto do atirador: o garoto de cabelos dourados e de aspecto limpo, meu parceiro Collins. Sorri: havia conseguido acertar ele também.


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