Shiver escrita por Aurora


Capítulo 20
The Sound And The Fury


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem!



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As pernas balançavam para fora da janela, enquanto analisava o extravagante convite que havia acabado de ser entregue. O papel grosso de cor dourada e branca imprimia as letras atestando-a do casamento. Sua mãe realmente havia decidido acelerar a data, marcando para este domingo.

Arqueou as sobrancelhas, colocando o convite de lado e bebendo um pouco de seu café. Via, não muito longe, as árvores da reserva, e um grande desejo de estar lá surgiu. Seu estômago roncou e sua pele se arrepiou quando sua cabeça soltou uma pontada amarga.

Um pensamento surgiu em sua mente e ela achou melhor dar ouvidos. Possivelmente seu lobo lhe dava os avisos de que sua fome chegava.

Saiu da janela e trocou os pijamas por roupas esportivas. Prendeu as madeixas e saiu do novo apartamento. Não seguiu pela rua pavimentada, pegando um atalho entre as casas para chegar de uma vez à reserva. Vez ou outra sentia olhos sobre suas costas, só não achou que valia a pena parar para ver do que se tratava.

Saltou sobre uma cerca de madeira baixa e logo os pinhos e carvalhos a cercavam. Respirou fundo o aroma florestal e a presença ativa de uma debandada de cervos não muito longe dali a deixou acesa. Correu para longe das casas, onde pudesse se transformar sem riscos de ser vista.

Guardou as roupas no que parecia uma toca de gambá abandonada, não contendo sua fera de apossar seu corpo.

Sacudiu o corpo quando a transformação havia acabado dando dois passos para frente e olhando ao redor. Sentia que não estava sozinha, mas como a talvez-presença não a incomodava, deixou para lá.

Trotou solitária entre as árvores, farejando o ar e chão na busca de onde os cervos poderiam estar agora.

Ao longe conseguiu avistar dois, e como pareceu melhor arriscar pegar um do que procurar mais e não encontrar nenhum, adotou uma pose furtiva e avançou silenciosamente naquela direção.

Para sua sorte a vegetação a camuflava bem, e o vento estava a seu favor.

Ambos cervos pareciam distraídos demais com sua pastagem para notar sua presença ali. Como uma cobra em ataque, saltou de seu esconderijo sobre o cervo mais próximo, cravando suas presas em seu pescoço fino e depositando todo seu peso contra o pobre animal, que não teve uma morte muito pesarosa.

Estava deitada debaixo de um pinheiro curto, enquanto lambia as patas esperando a digestão acabar completamente, para que pudesse voltar a sua forma humana.

Um cheiro diferente e estranhamente atrativo fez que seus sentidos ficassem a flor da pele, e ela se levantou devagar para ver do que se tratava.

Espiou ativamente sobre um arbusto de folhas amarronzadas avistando um homem de boné segurando uma espingarda de aparência velha. O homem usava um colete camuflado com compartimento para balas e parecia um pouco desnorteado no meio da floresta.

Ao vê-lo, sentiu que agora quem estava no comando era seu lobo. Parte sua sentia que estava vendo uma deliciosa refeição na sua frente, sem muito lugar para onde ir. E a mera ideia de devorar outro ser humano a causou repulsa.

Mas não restava muito a fazer senão assistir. Tentava desesperadamente retomar o controle, mas sentia que estava sendo ignorada. O lobo se abaixou, e diferente da caça com cervos e alces, se revelou para o caçador.

Ao sair do arbusto o caçador pareceu incrédulo no que via. A cor esvaiu-se de seu rosto e as pernas bambearam. Seu lobo rosnou, mostrando os enormes dentes brancos, andando num raio de três metros do homem.

À essa altura estava quase beirando o desespero. Precisava retomar o controle, ou então teria que viver com um fardo terrível pelo resto de sua vida.

Via que estava conseguindo, aos poucos, retomar a sensibilidade. O caçador correu para a direita, e seu corpo deu um impulso grande para frente, mas ela conseguiu contê-lo. Agora estava sozinha entre as árvores, se debatendo internamente para ver quem tomaria conta do corpo agora.

Demorou um pouco, mas finalmente seu lobo se rendeu. O alívio de ter seu corpo de volta a deixou sem fôlego, e ela deitou no chão por um instante. Estava numa bela enrascada.

Um hora se passou quando ela resolveu ir para casa. Não devia passar muito da hora do almoço, então ainda teria tempo de tomar um banho e descansar um pouco antes do encontro.

Ao chegar no apartamento – já como mulher, é claro – saiu tirando as roupas e indo direto para o chuveiro. Mesmo que o dia não estivesse muito quente, colocou a água tão gelada quanto podia, na intenção de acordar mais. Vestiu um short folgado com uma blusa do Woodstock, deitando no sofá e ligando a TV.

O que a voz feminina falou na programação fez que seu corpo inteiro gelasse.

Breaking News – Caçador da região clama ter visto algo nunca parecido antes!

Engoliu em seco, sentando-se ereta no sofá enquanto aumentava o volume. Uma repórter jovem apareceu entrevistando o caçador que tinha visto há pouco tempo. “Ele correu direto para imprensa!” pensou.

A repórter começou a falar.

– O caçador Etthan Mckennit clama ter visto, nessa manhã, uma criatura que nunca havia visto antes. O senhor poderia descrevê-la para nós?

O homem assentiu trêmulo, enquanto a mulher direcionava o microfone para ele.

Era simplesmente enorme. Maior que um urso, mas igual à um lobo cinzento comum. Tinha olhos negros e fundos, e parecia louco para me devorar. Achei que seria meu fim, não tinha como fugir de uma criatura daquela. Mas ainda assim arrisquei, e corri como nunca antes. Tinha certeza de que viria atrás de mim, porém deve ter achado melhor ficar na floresta.

A mulher continuou a falar, mas foi só até aí onde ela havia conseguido ouvir. Estava pasma. Quando os outros soubessem daquilo, levaria o maior sermão da sua vida.

Desligou a TV na hora, jogando-se com tudo no sofá, seguido por um gemido angustiado. Esfregou os olhos e encarou o teto. Ainda tinha tempo para um cochilo, antes de se arrumar para o encontro.

Quatro horas depois, ela acordou com o impacto da queda no chão. Fez um barulho resmunguento e se sentou no chão. O apartamento estava escuro e ela bocejou. Acendeu a luz da sala e foi para seu quarto.

Achou bom tomar um outro banho, e então começou a se arrumar. Vestiu um vestido vermelho e saltos negros. Prendeu o cabelo no alto da cabeça, quando foi pegar seu celular para ver que horas eram. Não passava muito das oito, então ela foi para a varanda. Viu um carro negro de vidro fumê estacionado na frente de seu apartamento.

Foi um pouco estranho, mas então o Lexus RX carvão de Kaito parou na frente de seu prédio. Respirou fundo antes de descer. Seria uma noite e tanto.


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