Equestria: Depois da Meia-Noite escrita por Dezenove


Capítulo 3
Realidade e Corrupção


Notas iniciais do capítulo

Mais uma vez, obrigado por lerem.

Espero que gostem.



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Algumas horas depois.

Cloudy Skies é um pônei marrom genérico, olhos negros, pelo sem brilho, cauda não tão longa e crina curta, porém ele possui um toque de magia, carregando um chifre no topo de sua cabeça, que serve apenas para furar coisas já que nunca teve a chance de estudar magia nem possuiu nenhum tipo de aptidão nata para isso. Cloudy Skies já é maior de idade, e ainda não tem uma cutie mark, nem emprego, nem sonhos. Teve uma infância feliz, até o seu pai se tornar um alcoólatra e espancar ele e sua adorável mãe. Ele carrega e esconde embaixo de seu pelo as marcas dos abusos que sofreu, e que ainda sofre, porém é silencioso, ninguém sabe pelo o que ele já passou, e muito menos sente falta dele. Cloudy Skies é invisível para a sociedade, e ele está fadado a ser esquecido, assim como muitos, mas isso não quer dizer que esse pônei ordinário e miserável não seja importante. Em alguns minutos, ele irá mergulhar Equestria em caos e destruir os Elementos da Harmonia, mas ele não sabe disso.

Alguém assistia seus pesadelos, e via nesse mísero pônei grande potencial, uma criatura que carrega muito ódio da vida e pouca esperança não tem nada a perder. Uma criatura assim é o fantoche perfeito, ela alegremente aceitará os cordões que lhe prenderão aos dedos do manipulador, pois logo ela terá um palco, palco da onde assistirá o mundo que tanto odeia arder em chamas. Esse alguém era Nightmare, noite após noite ela mantinha um olho sobre Cloudy Skies, examinava seus pesadelos, e escondia-os de Luna, e aos poucos, o guiou para um caminho sem volta. O pequeno cavalo conheceu os colegas errados e montou uma gangue, se tornou um rebelde, um vândalo, um ladrão.

Applejack é uma égua especial, forte e robusta, tão teimosa quanto amigável, possui lindos olhos verdes e carrega consigo o Elemento da Honestidade, o mesmo que pertencera à Princesa Luna eras atrás. Um pônei muito trabalhador ocupado, e que agora estava no Sweet Apple Acres cuidando de sua avó, Granny Smith, enquanto o resto de sua família participava da 19ª Feira de Frutas e Tortas em Ponyville, um evento que sempre fora muito lucrativo e importante para a família.

“Applejack... cê sabe que eu to legal, cê podia ter ido pra Ponyville cos otros.” – Disse Granny Smith, lentamente trotando para fora do galpão onde ela e sua neta estavam conversando, sua tosse havia melhorado para o alivio de todos, e seu pelo verde lima havia recuperado um pouco de seu fraco brilho.

“Sem chances vovó, a senhora ainda não se recuperou, e o seu bem estar é muito mais importante que uma feira boba.” – Applejack sorria enquanto arrumava o galpão, por mais que a feira fosse trabalhosa, ainda havia muito para ser feito no rancho, e ela podia muito bem adiantar alguma ou outra coisa. – “Como você está se sentindo?”

“O que? Ah, eu estou bem, só sentindo um friozinho, fiquei muito tempo nesse galpão... acho que vou pegar uma maçã...” Um pequeno sorriso brotou em sua face castigada pelo tempo e trabalho árduo.

“Eu posso fazer um suquinho pra senhora, devem ter sobrado poucas maçãs lá atrás.”

A jovem égua sabia o que a sua anciã queria, maçãs eram a vida de sua família, um presente que a terra lhes dava, e todos possuíam uma conexão com elas. Sua avó ficara tanto tempo longe das macieiras, e não sentira a terra sob seus cascos por longos dias, coisas que poderiam muito bem serem consideradas como um castigo para sua família.

“Suco? Não, eu vou dar uma volta lá nos fundos, e ai cê me ajuda e pegar uma maçã, tá bom?”

“Negativo vovó, você não vai a lugar nenhum sem mim, só um momentinho que eu já te acompanho...”

Applejack então terminou arrumar algumas caixas, pegou um chapéu extra para proteger a sua avó do Sol e logo saiu para acompanhá-la. As duas éguas caminhavam lentamente, jogando papo fora enquanto o vento acariciava seus focinhos e ondulava suas crinas e caudas.

Ao passarem da cerca que protegia as macieiras, a jovem égua começou a notar sinais estranhos no solo e nas arvores, eles haviam terminado a colheita dois dias atrás, mas haviam muito mais folhas no chão do que o normal, e a terra parecia mais seca do que o usual, mesmo que os últimos dias houvessem sido de muito calor e sol forte, algo estava errado, e a sua conexão com a natureza lhe dizia isso. Enquanto isso, a égua mais velha parecia não ter tomado conhecimento, e continuava a contar de suas aventuras quando era jovem como sua netinha, muito do que ela contava já não continha mais a mesma veracidade que antigamente, algo com que Applejack não se importava desde que ela estivesse se sentindo bem. Então ela resolveu ficar quieta sobre a situação das maçãs, sua avó não precisava de coisas para se preocupar agora, Big Mac certamente iria lhe ajudar depois.

Depois de algum tempo caminhando, elas finalmente chegaram às últimas macieiras do rancho, essas eram poupadas da colheita, e serviam de reserva pessoal da família. As árvores que estavam lá eram altas, carregadas e belas, eram de estimação e seu preço não poderia ser mensurado em moeda.

Os olhos de Granny se encheram de lágrimas e Applejack entrou em choque quando viram as árvores, seus cascos estavam podres, e incontáveis maçãs estavam no chão, todas estragadas entre pilhas de folhas amarelas. O cheiro de decomposição era nauseante e revoltante, sentira vontade de gritar e chutar, porém ela deveria manter a calma ao lado de sua avó que...

“Vovó!” – Ela exclamou quando notou que a senhora Smith cambaleou, e se não fosse pelo seu corpo ágil e reflexos, a anciã teria se estatelado no chão, segurando a sua anciã em suas pernas dianteiras, Applejack a posicionou do melhor jeito que podia em suas costas, e começou a carregá-la de volta para o balcão. Algo estava muito mais errado do que pensara, agora ela podia ouvir a terra gritar e suplicar por ajuda, as arvores ao seu redor pareciam tentar alcança-la com seus galhos, em sua mente, clamando por algum tipo de conforto. Ela já vira isso acontecendo em algum lugar, disso tinha certeza, mas aonde?

“Guenta firme vovó... a gente tá quase lá...” – Ela tentou confortá-la, mesmo que a égua em suas costas não respondesse mais. O que diabos era isso? Twilight provavelmente poderia ajudar, mas ela não podia deixar Granny sozinha, e Ponyville era muito longe, seja lá o que estivesse acontecendo agora, ela teria que resolver sozinha.

A égua de cor gamboge respirou fundo, e deixou o seu fiel chapéu com sua avó, ela não queria correr o risco de estragá-lo, e se ela acordasse, saberia de que fora era quem a trouxe ali, e que estava bem, pois ela voltaria para pegar seu item de volta, de um jeito ou de outro. Em outro cômodo, ela pegou alguns metros de corda, isso seria uma boa arma caso necessário, e também seria útil em uma eventual escalada.

E com passadas determinadas, ela correu para fora em direção às macieiras com a corda enrolada em volta de seu pescoço, os cascos golpeando a terra seca sem dó, e logo ela notaria que a situação do lugar piorava rapidamente em um ritmo assombroso, de certo modo, lhe confortava que a colheita havia terminado alguns dias atrás, mas e de agora em diante? Qual seria o futuro de sua família se eles não desse um jeito de concertar isso? Como eles ficariam tanto tempo sem suas árvores?

Após alguns minutos ela freou e ergueu sua cabeça, logo à sua frente um grupo de meia dúzia de pôneis, todos vestidos com roupas marrom simples, mas que cobriam o corpo inteiro e a face, dois deles pareciam ser unicórnios pelo volume embaixo do capuz que lhe escondiam a cabeça, outro possuía asas e os outros três ela assumiu que eram pôneis comuns. Eles recitavam cantigas em uníssono em uma língua esquisita, um enorme cristal negro cravado no centro da roda que eles formavam.

“Mas que diabos está acontecendo aqui?!” – Exclamou Applejack, chamando atenção dos pôneis que logo pausaram as suas atividades e olharam para ela. Pelo pouco que ela podia ver de suas caras, eles não haviam ficado felizes com sua interrupção.

Os pôneis começaram a murmurar entre si, até que um deles removeu seu capuz e caminhou até a égua com passos firmes e cheios de confiança. Applejack não recuou, mas não se atreveu a avançar.

“Vejam só rapazes, o Elemento da Honestidade está aqui, hoje não era o Festival das Frutas e Tortas em Ponyville? Eu acho que você está no lugar errado, gracinha...” – Disse o unicórnio que se aproximara, era um macho, pelo marrom pálido, crina negra, e pelo estado em que estava, não devia ter tomado um banho nos últimos dias.

“Gracinha é a tua mãe, eu vou perguntar de novo, o que vocês estão fazendo aqui?!” – Ela exclamou, um silêncio se instaurou no lugar enquanto os dois se encaravam, até que finalmente os pôneis que formavam uma roda começaram a cantar novamente, e o chifre do unicórnio começou a brilhar com uma luz de cor caramelo, o mesmo brilho que se formou em volta do pescoço de Applejack e a levantou no ar, como se uma enorme mão agarrasse seu pescoço de modo sufocante.

“M-Mas oque?!” – E ela lembrou como odiava magia enquanto a mão invisível a asfixiava e deixava o seu mundo escuro, se debater era inútil, será que isso era a força dos cinco pôneis que estavam no círculo combinados? Nada disso importava agora, ela estava ficando sem ar, sua visão girava e escurecia, até que tudo ficou preto.

“E esse era o poderoso Elemento da Honestidade...” – Disse o unicórnio, cancelando a magia, deixando o corpo de Applejack se estatelar contra o chão seco.

“Hey Cloudy... ela até que é bonitinha heim?” – Um dos pegasus que estava no círculo se aproximava agora, e com ele o outro unicórnio também.

“Hmm, chefe, teria algum problema se nós... nos divertíssemos com ela?” – Perguntou o segundo unicórnio, um sorriso malicioso brotava em seus lábios.

“Façam o que quiserem com ela, nós merecemos um pouco de diversão depois de ter usado tanta magia pra destruir esse lugar, não é mesmo?” – Cloudy respondeu, se espreguiçando enquanto observava a desolação que haviam instaurado no local, as árvores logo tombariam, e o solo permaneceria inútil por décadas, tudo isso graças ao livro e cristal negro que ele havia achado meses atrás enquanto fugia de casa para esconder de seu pai que recém havia bebido muito, quem seria louco de deixar artefatos tão preciosos dentro de uma caixa de papelão em um beco escuro? Ele esperava um dia descobrir a resposta, porém seu tempo estava ficando curto.

O unicórnio marrom se virou e caminhou até o cristal enquanto os seus colegas checavam se a égua ainda estava viva, e estava, ao estar em frente à ele, estendeu um casco e o acariciou com uma expressão de alegria no rosto. Finalmente ele teria a sua vingança, pouco a pouco ele iria queimar o mundo que o havia machucado tanto. O Elemento da Honestidade nunca mais seria o mesmo, e Ponyville agora ficaria sem suas preciosas maçãs, mas claro que isso era apenas o começo, eles iriam destruir tudo o que podiam,eles haviam encontrado a sua felicidade na infelicidade dos outros.

Applejack então abriu seus olhos. E tentou abri-los de novo. Nada. Tudo continuava escuro, até que ao olhar para cima ela viu dois enormes olhos azul turquesa a fitando, emanavam uma luz fraca, porém era o suficiente para torna-los visíveis.

Os olhos se fecharam apenas para abrirem novamente, dessa vez apenas alguns centímetros acima do nível dos de Applejack, e eram muito mais vívidos. Lentamente sua visão se acostumou com o escuro, até que era possível distinguir a forma à sua frente.

“Nightmare Moon...” – Ela murmurou entre um ranger de dentes, seria tudo isso obra dela? Teria ela dado um jeito de voltar? Mas como, por que ela e seu rancho? Palavras falhavam em descrever a ira que sentia.

“Applejack, minha querida... pelo o que eu vejo, você não está na melhor das situações, não é mesmo?” – A monarca respondeu, sua crina e cauda flutuavam, as estrelas contidas nelas ajudavam as duas éguas a enxergarem uma à outra.

“Escute aqui Nightmare! Não importa o que você está tramando, você não vai escapar dessa okay?! Logo minhas amigas vão chegar e chutar o seu traseiro de volta pra Lua!” – Um bufar escapou de suas narinas.

“Oh, mas por quê? Eu apenas estou tentando ajudá-la.” – Ela respondeu, sua voz realmente mostrava algum tipo de preocupação, ou então fingia, pensou Applejack.

“Me ajudar? Destruindo o rancho da minha família, e me capturando? Você é um monstro!” – Por mais quanto tempo eu terei que jogar esses joguinhos? Ela refletiu, a pior coisa da magia era não possuí-la, se sentir inútil nesse tipo de situação era terrível.

A égua de ébano fechou seus olhos e sacudiu sua cabeça, deixando um “tsc tsc” escapar de seus lábios.

“Você ainda não entendeu, Applejack? Eu lhe avisei disso tudo, você não lembra? Eu aposto que você não tem dormido bem nessas últimas noites, não é mesmo? Vamos lá, me conte como foram os seus... pesadelos.” – A última palavra saiu praticamente soletrada de sua boca, e atingiu o pequeno pônei como um ônibus.

Seus olhos se arregalaram e sua boca se abriu, porém ela não havia notado nada disso, já que começou a se lembrar de terríveis pesadelos onde ela vira o rancho destruído, todas as árvores mortas e o solo desolado. As imagens contavam os eventos que estavam acontecendo agora nesse exato momento, ela assistiu à gangue abusar de seu corpo até o anoitecer, quando suas amigas iriam finalmente chegar para ajuda-la. Mas ai seria tarde demais, no fim, ela estava sozinha, sua família havia se separado, e em frente à ela, estava o tumulo de sua avó. Lágrimas escorreram de seus olhos, como isso havia acontecido? Checar o pulso dela nem havia passado por sua cabeça, será que a sua situação frágil e o choque que sofrera teria tomado a sua amada vovó dela? Ter sua família separada? Ela sabia que conseguiria continuar a viver com o abuso, mas não sozinha, não sabendo que sua família não teria um lugar. O desespero a tomou para si, ela se perguntou, como ela não havia se lembrado de tais avisos, e por que Nightmare estaria a ajudando?

E então, no fim do seu pesadelo ela viu Luna descendo dos céus para salvá-la, ela dizia que esse pesadelo era uma abominação e que não havia mensagem nenhuma, e lhe faria o favor de apagá-lo. Era isso? Applejack sentia sua sanidade rastejar para fora de seu cérebro e escorrer pelos seus ouvidos, isso não podia estar acontecendo, ela nunca havia sentido tanta ira em sua vida, agora até mesmo a Princesa Luna era vista com outros olhos.

“Nem todos os Pesadelos são ruins, Applejack, e nem todos tem uma lição bonitinha para lhe ensinar, alguns deles são avisos, avisos aos quais você deve prestar muita atenção, talvez Luna estivesse sobrecarregada de trabalho, não acha?” – Ela perguntou, mas Applejack ficou em silêncio pelo o que pareciam longos minutos, só para então responder com outra pergunta.

“Granny... se foi...?” – E a égua da noite respondeu acenando sua cabeça de forma afirmativa. – “E por que você tentou me avisar? Se você quer me ajudar, por que você simplesmente não aparece e chuta a bunda desses caras?” – Ela questionou, tentando entender a situação, se o que Nightmare Moon havia lhe mostrado realmente era verdade, ela teria que achar um jeito de impedir esse futuro corrompido.

“Por que eu não posso, docinho, não ainda, eu acabei de voltar para o mundo material, meu corpo ainda é muito frágil, se eu tivesse aparecido, um coice seria tudo o que você precisaria pra acabar comigo. Agora me escute, com muita atenção que eu irei responder as suas perguntas.” – A criatura de ébano se mantinha calma e serena, e Applejack invejava essa paz de espírito, ela não sabia mais o que era verdade ou não, mas ela estava sem escolhas, ela teria que ouvir.

“Primeiro de tudo, o porquê eu resolvi aparecer pra você, Applejack. Você carrega o mesmo Elemento da Harmonia que Luna e eu carregamos eras atrás. Honestidade, suas amigas não iriam me dar ouvidos, mas você é diferente, quando eu lhe digo que quero seu bem, não tem algo no fundo do seu coração que lhe sussurra que eu estou falando a verdade?” – O pônei acenou com a cabeça, isso era verdade, pelo menos queria acreditar que sim, ela precisava se agarrar à algo, e Nightmare por enquanto não havia se mostrado como uma ameaça, e nem havia mencionado nenhuma noite eterna.

“Segundo, eu não quero mergulhar Equestria em nenhuma noite eterna, minha queria, suas amigas estarão a salvo, não se preocupe. Eu quero criar um novo reino ao sul, um lugar onde todas as criaturas da noite, ou aqueles que amam as sombras poderão viver em paz, longe da luz castigadora de Celestia. Apenas pense comigo, minha querida, se o poder dos Elementos da Harmonia podia separar Luna e eu como você, Twilight e as outras fizeram, por que ela teve que banir Luna para a Lua por mil anos? Você já se perguntou quais foram as outras barbaridades que ela já fez?” – Ela deu uma pausa, fitando Applejack que abaixou a cabeça e fitou o vazio negro abaixo delas. – “Eu estou falando um monte e não estou lhe deixando pensar, não é mesmo? Hmm...”

Nightmare deu alguns passos à frente, agora o pônei que uma vez havia sido sua inimiga não parecia mais tão apavorada, em um ato que surpreendeu Applejack, ela abaixou o seu focinho e fossou sua testa carinhosamente. Suas bochechas não demoraram a corar, ela nunca iria imaginar que a criatura mais sombria que já havia visto era capaz de demonstrar algum tipo de afeto. Ela só parou com suas carícias quando a pequenina resolveu perguntar, balbuciando as palavras.

“Como... você pode me ajudar?” – E ela finalmente ergueu sua cabeça.

“Respire fundo, e me aceite. E não se preocupe, pesadelos não são maus, eles são apenas sombrios...”

Então Nightmare fechou seus olhos abaixou sua cabeça, mantendo seus olhos no mesmo nível dos de Applejack, e inclinou-se para frente, juntando seus lábios, assoprando algo sombrio para dentro do pequeno pônei, que arregalou seus olhos, ela estava assustada, e nem podia acreditar que seu primeiro beijo havia sido com uma criatura que uma vez tentara destruir, mas as trevas que desceram pelo seu corpo logo lhe confortaram, e ela deixou seus olhos descansarem. Não se engane leitor, era um beijo com carinho, sem paixão, mas ainda assim um beijo, um belo jeito de firmar um trato, melhor do que um aperto de mão, não acha?

E finalmente Applejack viu luz ao abrir seus olhos, e pela primeira vez nas últimas horas sua cabeça estava leve, pelo menos ela achava que sim. Ao abaixar sua visão, ela conseguiu observar dois pôneis falando sobre o que eles planejavam fazer com ela assim que o “Mestre Cloudy” voltasse. Ela achou isso tão patético que não pode conter uma gargalhada, porém também havia ficado grata por manter o seu corpo intocado. Ela tentou se levantar, porém havia sido amarrada sentada contra o tronco de uma das árvores, tudo bem, ela não iria precisar se mexer muito, sua ira havia sido acalmada, porém algo nesse lugar ainda estava sedento por vingança. Haveria sangue, mas ela não derramaria uma gota.

“Ora ora, vejo que acordou...” – Disse Cloudy, se aproximando de AJ e os outros dois pôneis. – “Tá achando engraçado é? Vamos ver se você vai conseguir rir de boca cheia...” – E então ele e seus amigos riram e cutucaram uns aos outros com os cotovelos.

“Antes, eu posso pedir só uma coisinha, parceiro? O que vocês fizeram com esse rancho? Por que as árvores morreram e a terra secou?” – Applejack perguntou, tentando parecer o mais inocente e inofensiva possível, como se houvesse aceitado um destino cruel.

“Ah, você vai me perguntar isso mesmo? Tudo bem, você não vai conseguir fazer perguntas depois que a gente terminar contigo mesmo.” – Cloudy se aproximou e passou seu casco contra a crina da égua, segurando-a de modo firme. “Nós a matamos com uma maldição poderosa, para usa-la você precisa de muito ódio, entende? E no mínimo um unicórnio para canalizar a magia até o cristal. Então a magia flui de modo fácil e poderoso, ela consome seu corpo lentamente, por isso quanto mais pôneis, melhor, mas o que importa é o ódio mesmo. Essas terras estão mortas, secas e amaldiçoadas, para sempre. Agora fica quietinha, e não morde...”

O unicórnio moveu seu casco para baixo, segurando o queixo de Applejack, seu coração acelerou só de pensar no que iria acontecer logo em seguida. Porém ele notou algo de errado, a base da crina da garota estava se tomando um tom mais alaranjado, sua face era fria ao toque, e seu pelo ficava cada vez mais escuro.

Cloudy saltou para trás, ele acabara de sentir o calafrio mais assustador de toda sua vida, e ver a égua se transformar na sua frente não estava ajudando, os seus companheiros também estavam assustados, mas nenhum deles possuía a mínima ideia do que realmente estava acontecendo.

Applejack inclinou seu pescoço para um lado, depois para o outro, emitindo dois “crack” bem sonoros, e se levantou, as amarras não eram mais um problema, já que elas se desfizeram como em um passe de mágica. Então ela alongou o resto de seu corpo, ele havia crescido, não muito, mas era bem notável, havia ficado maior que os seus agressores sem sombra de dúvidas, seu pelo agora era negro como um céu sem estrelas, negro como um pesadelo. Seus olhos deixaram de ser aquele tom de verde que amava tanto, agora eram azul turquesa, e reluziam levemente, porém isso ela só iria descobrir no escuro.

“Acharam que mataram essa terra? Ah, a única coisa que vocês mataram foi uma velinha inocente.” Uma lágrima escorreu de um de seus olhos, e ela rapidamente a secou sozinha ao escorrer pelo seu pelo.

“Mas o que diabos é isso...?” Cloudy perguntou ao vazio, olhando ao redor, seus companheiros o olhavam assustados, como se esperando algum tipo de comando. “Peguem o cristal!” Ele bradou, no mesmo instante, os olhos de AJ se arregalaram e ela sorriu largamente.

“Vocês vão pagar pelo o que fizeram, seus putinhos.” Seus cascos dianteiros trovejaram contra a terra à sua frente. “O lugar que vocês violaram está vivo, e ele quer ter uma palavrinha com vocês...”

Quando os pôneis se viraram para correr até o seu precioso cristal, se depararam com uma visão perturbadora, um galho afiado havia atravessado o pescoço de um de seus companheiros que havia decidido ficar fora da brincadeira perturbadora que haviam planejado, e algo ainda mais desesperador, o cristal estava sendo engolido pela terra.

“A terra irá consumi-los, se alimentará de seus corpos e beberá e seu sangue, suas almas malditas vagarão aqui para sempre, para assim refletir por seus atos.” – Ela sentenciou, e subitamente o solo embaixo de seus cascos engoliu suas pernas, e lentamente começou a puxar o resto de seus corpos.

Os garotos gritavam e se debatiam, imploravam por perdão, mas a égua não se mexeu, assistindo aos cavalos que tentaram abusar de seu corpo serem engolidos pela terra com desprezo. E em pouco tempo, tudo estaria em silêncio, a natureza finalmente estava em paz, ela refletiu por um momento, era esse o seu novo poder de sua conexão com a terra? Ela não havia controlado a terra, apenas a deu vida própria por um momento.

Agora as dúvidas estavam voltando, o que fizera, foi algo bom ou ruim? Se a natureza havia escolhido se vingar contra os responsáveis pela morte de sua avó, estaria ela errada em ter possibilitado que isso acontecesse? E então o seu sentido do que era certo e errado já não era mais o mesmo.

“Venha logo minha queria Applejack, suas amigas chegarão em breve, mas ainda não é hora de encontrá-las.” – Um sussurro ecoou em sua cabeça.

“Sim, minha senhora.” – Ela fechou seus olhos e se curvou em uma saudação, como se Nightmare Moon estivesse à sua frente, e então se virou e correu em direção ao sul. Ela estava ansiosa para conhecer Nightmare pessoalmente novamente, tantas perguntas que precisavam de respostas mais claras povoavam sua mente. Poderia ela retornar à sua antiga aparência? O que aconteceria agora com ela? Ela havia mencionado um novo lugar, como ele seria? Sua família estaria a salvo? Quando ela os veria novamente? Eles provavelmente chegarão ao rancho ao anoitecer, e encontrarão Granny sem vida, seu chapéu e a terra arrasada, será que eles ficarão preocupados? Que pergunta idiota, ela pensou, e com isso gargalhou sozinha, no meio de todo esse caos, seu coração era confortado com a promessa de uma nova aventura, algo lhe dizia que tudo iria terminar bem.

Era isso o que ela esperava.

Em algum canto escuro do mundo dos sonhos, Discord assistia à tudo de camarote com um grande sorriso no rosto, batendo palmas com suas patas bizarras.

“Nightmare, devo confessar de que estou impressionado... muito impressionado...”


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