O Guia NERD para Quase-adultos escrita por GTavares


Capítulo 2
Qual sua casa?




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Era quase hora de levantar, o Sol já estava nascendo e uma luz matutina invadia o quarto do garoto. Na parede esquerda de sua cama, pôsteres de filmes espalhados tornavam-se coloridos com a entrada da luminosidade. Era visível seu gosto pelos clássicos. Um enorme Darth Vader de corpo inteiro preenchia o centro da parede, cercado por personagens de Harry Potter, O Hobbit, Star Trek, Akira, O Guia do Mochileiro das Galáxias.

Além de toda nerdice cinematográfica, notava-se alguns cartazes de The Big Bang Theory, com todos caracterizados em super-heróis. Via-se um Sheldon Cooper de Flash ao lado de um Batman, um Lanterna Verde e, estranhamente engraçado, um Aquaman indiano. Havia também um cartaz com um enorme lobo estampado com as escritas “winter is coming”.

Sob a janela uma escrivaninha anil era preenchida com revistas em quadrinhos variadas, todavia o que mais se destacava era uma coleção com nove volumes de Sandman.

Em seu criado-mudo um despertador em formato de sabre de luz marcava quase 6h00 da manhã. Ao lado, um abajur com uma vaca sendo abduzida por um grande disco voador iluminava um mangá. Na capa um homem alto com longos cabelos cinza, com veste roxa e um olhar claro sereno. Era o nono volume de Fruits Basket da autora Natsuki Takaya. Dexter já tinha decidido que não iria continuar a ler essas histórias de “mulherzinhas”, mas gostou tanto do conteúdo que não conseguira parar. Dizia a si mesmo que este seria seu “guilty pleasure”.

Uma forte voz rouca e séria começou a ecoar em seu quarto, enquanto o sabre era preenchido por uma luz vermelha que piscava a toda hora. “Luke, I’m your father” repetia-se constantemente até Dexter tirar sua mão de baixo de seu edredom, estampado pelo game Galaxian, e bater firme sobre a espada Jedi. “Hora de levantar”, pensou ele.

No caminho para o colégio, com sua bicicleta “DeLorean”, Dexter começou a acelerar, passando por obstáculos, desviando de pessoas. Fantasiava que estava em uma fuga quase impossível, em meio à Guerra causada por zumbis e alienígenas. Constantemente olhava para trás, como se uma arma interplanetária fosse o atingir a qualquer momento, paralisando-o. Colocava seus olhos no chão, imaginando mortos-vivos saindo do solo e agarrando o pneu de DeLorean. Suas viagens ao colégio sempre eram mais divertidas, apesar de chegar sempre suado.

Vestido com sua camiseta vermelha, estampada com um enorme “Bazinga”, bermuda até o joelho, seus fiéis All Star pretos e sua mochila que viera com o notebook, Dexter sentia a falta de ar que uma vida sedentária, de um adolescente baixo e gordo, trazia. Apesar de suas roupas, mesmo possuindo com um alto grau de miopia, ele decidira abandonar seus óculos, grandes e quadrados que eram utilizados apenas para leituras noturnas, e utilizar lentes de contato para parecer menos, como ele dizia, NERD.

Na sala de aula, a professora de História explicava o motivo pelo qual os Nazistas perseguiam os Comunistas. Um assunto extremamente desinteressante para Dexter, que já lera todas as Biografias de Hitler disponíveis, inclusive uma em Alemão; assistira aos filmes e sempre buscava informações em sites na internet. Achava ridículo o fato de algumas pessoas considerarem que “O homem do bigodinho”, como sempre brincava, era de esquerda.

Quando a explicação sobre a formação do Partido Comunista se iniciara, a aula foi interrompida por uma garota:

─ Com licença professora, esta é a sala do segundo ano? – perguntou a menina sardenta com as mãos trêmulas de nervoso.

─ Sim – respondeu com uma voz ríspida devido à interrupção – Você é Sophie, certo? – disse medindo-a, enquanto a garota concordava – Bom, estamos no meio de uma discussão sobre o comunismo na Segunda Guerra, pode-se sentar – apontando-lhe uma carteira.

Sophie sentou-se na frente de Dex, que de imediato sentiu o perfume amadeiradamente doce da menina, e fez com que ele coçasse seu nariz durante algum tempo até se acostumar. Ela tinha quase sua altura, o que não é difícil de ser alcançada; seus cabelos eram no ombro, escuros com as pontas pintadas em camadas de rosa e roxo. Em seus olhos um lápis forte dava lugar à sombra. A Pele alva cheia de sardas destacava-se da camiseta preta de uma banda de rock desconhecida.

No intervalo, uniu-se a seus dois únicos amigos desde sempre. Rupert, um ruivo alto e extremamente magro, Dex já pensou milhares de vezes em chegar e conversar sobre os problemas causados pela anorexia, porém tinha medo de ser apenas um motivo genético e acabar sendo entendido erroneamente pelo amigo. E Peter, que estava no último ano do colégio e, apesar de sua extrema inteligência, era tão bonito quanto qualquer outro menino ali. Possuía a pele morena e os olhos verdes profundos e grandes. Poderia facilmente ser um modelo conhecido mundialmente, não fosse o fato de passar nos vestibulares de Medicina nas melhores Universidades do país, em primeiro lugar desde o primeiro ano do ensino médio.

─ Eu já disse, a águia é o emblema da Corvinal porque ela voa onde jamais nenhum outro pode subir – disse Rupert sem paciência.

─ Isso é muito subjetivo – interrompeu Peter com um ar pensativo – Em meio tantos animais mágicos, você realmente acredita nessa? Afinal, o animal que voa mais alto em todo mundo é um Abutre encontrado no Sudão, que pode chegar a mais de 11 mil metros de altura.

─ Tá, mas será que esse abutre já existia no período de Harry Potter? – questionou Dex – Além disso, a águia é uma metáfora. Na mitologia Grega representa a imagem de Zeus, ou seja, ela é símbolo de coragem, nobreza, soberania, imponência e inteligência.

─ É, faz sentido pensando dessa maneira – respondeu Peter com desdém – Mas, se nós tivéssemos recebido nossas cartas e ido para Hogwarts, em que casa vocês acham que estaríamos?

─ Corvinal, sem dúvidas – responderam os outros em uníssono.

─ Talvez você fosse para Grifinória ou Sonserina – falou Dex com um riso de lado, referindo-se a Peter

─ Com certeza seria Corvinal, não faria sentido ir para outra casa – respondeu Peter quase interrompendo Dex – Vocês que poderiam ser destinados à outra. Dex, você pode ter toda essa sua inteligência, mas sempre teve esse espírito corajoso reprimido em si, poderia ser uma Hermione masculina – debochou olhando para o menino – E você Ruper, vem de família nobre e tem esse seu lado ruim...

─ Lado ruim? Não viaja Peter – respondeu de imediato.

─ Quem foi que misturou laxante com a água do bebedouro da sala dos professores só porque tirou 8,5 em matemática? – disse Dex com uma risada – Usando uma seringa e luvas para não ser pego.

─ Fala baixo cara, ninguém sabe disso – disse Ruper olhando para os lados vendo se alguém estava de olho.

─ Ok! Entramos na Corvinal e estamos em frente à Sala Comunal e eu sou a aldrava de Bronze – falou Peter gesticulando – Pergunta para você – apontando para Dexter – Qual criatura os sereianos utilizam como arma e o que os bruxos fazem com ele?

─ Mesmo? – perguntou Dexter – Se trata da Lobalug, ou Seringa. Os sereianos a utilizam como arma porque ela contrai a bolsa esguichando veneno como forma de ataque quando é ameaçada. E os bruxos utilizam desse veneno para fazer poções.

─ A porta foi aberta para você – disse Peter sorrindo – Agora Ruper, Quem veio dos brejais e quem afirma isso?

─ Acho que – Ruper ficou pensativo – não faço a mínima ideia.

─ Ahá! Você não seria de Corvinal, isso é uma certeza agora – Peter ria como uma criança.

─ “Há mil anos ou pouco mais, eu era recém-feito. Viviam quatro bruxos de fama, cujos nomes todos ainda conhecem: O valente Gryffindor das charecas, A bonita Ravenclaw das ravinas, O meigo Hufflepuff das planícies, o astuto Slytherin dos BREJAIS. Compartiram um desejo, um sonho, uma esperança, um plano ousado de, juntos, educar jovens bruxos. Assim começou a Escola de Hogwarts” – cantou Sophie com uma voz açucarada – Então, Salazar Slytherin veio dos brejais e quem afirma isso é o Chapéu Seletor na canção do 4º ano.

Todos olharam para garota que estava ali, observando-os enquanto discutiam sobre as Casas de Hogwarts. Um embrulho no estômago de Dexter surgiu no mesmo momento que seu rosto pigmentara-se de vermelho escarlate. A vergonha entrara em erupção e ele pensou que até as espinhas de seu rosto fossem explodir.

─ E não, não sou de Corvinal, sem chances – disse Sophie fazendo um X com os dedos – Sou Sonserina, nasci Sonserina e morrerei Sonserina. Casarei com Draco e teremos vários Draquinhos. E eu sei que ele é casado com a vaca da Astoria Greengrass, mas ele a deixará e ficará comigo. Já está tudo decidido – correu com as palavras sem tempo dos meninos associarem o que havia dito.

Apesar da vergonha alheia, Dex notou que a menina segurava o volume 21 do mangá que estava lendo na noite anterior. Pensou que ela não tinha necessidade de se envergonhar com aquilo, afinal, era uma garota. Eles poderiam trocar informações sobre a história. Divertir com as partes engraçadas. O cheiro de madeira doce voltava a incomodar seu nariz.

─A A ATCHIM – e uma gosma nojenta grudou em sua mão, vindo de suas vias respiratórias.

Nota final 1: Nunca espirrar na frente de uma garota.


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Notas finais do capítulo

* "Winter is coming" - O inverno está chegando, em tradução livre. É o lema da antiga e orgulhosa casa nortenha Stark, da saga de Livros "As Crônicas de Gelo e Fogo" de R. R. Martin, e o nome do primeiro episódio da série Game of Thrones.

* Guilty pleasure é uma expressão referente às coisas que nós amamos, mas temos vergonha de dizer para outras pessoas.

* Luke, I’m your father - "Luke, eu sou seu pai" é a frase célebre dita por Darth Vader em Star Wars.

* DeLorean é o nome do carro no Filme "De Volta para o Futuro".