A Herança de Espinhos escrita por Hime Illana


Capítulo 3
Capítulo 3




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Quando acordei no dia seguinte eu não me lembrava de ter sonhado nada. Será que eu fui ao vale, mas me esqueci ou será que é porque Josephine não quer falar comigo no momento? Fiquei deitada na cama pensando por um tempo, mas sem chegar a conclusão nenhuma me levantei e fui começar minha rotina. Dessa vez resolvi caprichar um pouco, na Ordem todos são bonitos e bem arrumados e já que eu vou trabalhar lá agora, tenho que me arrumar também. Como não pude fazer nada com minhas roupas ou com meu volumoso e teimoso cabelo, resolvi que ia investir numa maquiagem melhor. Passei rímel, um pouco de blush e coloquei um batom rosa meio avermelhado nos lábios. Estava tudo ótimo enquanto tomava meu café, até que minha mãe acordou.

— Ué, vai sair de novo? Vai pra onde dessa vez? – perguntou ela, e pelo tom da sua voz ela estava desconfiada.

E novamente eu estava em apuros, não tinha como inventar outra desculpa agora, mas também não podia contar a verdade. Respirei fundo, mantive a calma e resolvi que iria contar a ela o mínimo possível, assim não estaria nem mentindo, nem contando tudo sobre a Ordem e seu mundo.

— Eu... vou fazer uma entrevista de emprego.

— Ora, mas eu nem sabia que você estava procurando um trabalho! Onde é? Vai trabalhar em que?

— Eu... não sei ainda, surgiu uma vaga numa empresa no centro, vou lá me candidatar.

— Hmmmm, boa sorte então.

— Obrigada mãe!

Fui em direção ao ponto de ônibus mais aliviada por ela ter acreditado, afinal, eu realmente estava indo atrás de um emprego - mesmo não sendo um emprego convencional - isso não era mentira. Eu realmente não gosto de mentir pros meus pais, principalmente pra minha mãe, primeiro porque mentir não é legal e segundo porque mais cedo ou mais tarde ela acaba descobrindo a verdade e eu sempre acabo me dando mal no final, então o jeito é contar logo a verdade, mas nesse caso eu não posso fazer isso, então eu não tinha outra escolha.

Peguei o ônibus e fui para o centro, a minha sorte é que eu tinha pegado o ônibus para vir pra casa ontem, se eu tivesse recebido carona do Edric pra voltar eu com certeza não ia saber o caminho até a Ordem, já que não conheço muito bem o centro da cidade. Quando cheguei era pouco mais de 8h da manhã, assim que cheguei na recepção encontrei com o Benny me esperando, ele alegremente veio me cumprimentar:

— Elena! Bom dia! Eu estava te esperando! Estou tão feliz que você vai ficar com a gente! – disse Benny tão feliz que estava praticamente gritando.

— Ah, olá, bom dia, eu te fiz esperar muito? – perguntei meio constrangida, nem minha irmã de 5 anos faz tanta festa ao me ver.

— Não, cheguei aqui quase agora, mas vamos, falta pouco pra você ser oficialmente um membro da Ordem. – Benny foi me guiando até o elevador e apertou o botão do 10º andar, o elevador começou a subir.

Quando chegamos ele me levou a um corredor um pouco diferente, ao invés de laboratórios, nesse tinham várias portas que pareciam ser várias salas ou escritórios, tinha pouca gente no corredor o que deixava o ambiente mais tranquilo. Assim que saímos do elevador demos de cara com o senhor super confiante, Edric, ele estava saindo de uma das salinhas com alguns papéis na mão.

— Ora ora, olha quem eu encontro logo cedo, oi Elena! – disse ele com o tom irritante de sempre, eu nunca sei dizer se é excesso de confiança ou se ele tem alguma segunda intenção secreta em mente.

— Oi, nos encontramos de novo... - disse eu, sem saber como reagir.

— Ah, sim, e vamos nos ver com mais frequência de agora em diante, certo?

— É... claro...

— B-bom dia... – disse Benny meio acanhado, eu tinha até me esquecido que ele também estava ali.

— Bom dia Benny. – respondeu Edric com um sorriso meio suspeito. Benny se encolheu um pouco.

— Então... e agora? O que eu tenho que fazer? – perguntei tentando quebrar o clima esquisito.

— A-ah sim, claro, você tem que fazer alguns exames no Setor da Rosa Azul e fazer um teste de iniciação no Setor da Rosa Laranja, e depois tem que levar sua ficha com todos os resultados para o capitão assinar. – respondeu Benny meio nervoso.

— Hmm, é bastante coisa!

— S-sim, mas não se preocupe eu vou te acompanhar em tudo hoje! – disse Benny sorrindo alegremente, ele é tão fofinho!

— Eu encontro vocês depois. – disse Edric indo em outra direção enquanto Benny e eu íamos pro elevador.

Quando entramos no elevador e Benny apertou o botão do 16º andar, ele respirou fundo como se estivesse aliviado por ter se afastado do Edric, estou com uma leve suspeita de que Edric maltrata o pobrezinho de alguma forma. Curiosa, perguntei:

— Então Benny, o que você acha do Edric? – perguntei casualmente.

Ele deu um leve pulo, surpreso com a pergunta.

— Ah, hm, ele é... legal!

— Legal? Só isso?

— Bom, ele é bem competente, profissional e ele passa muita confiança pra gente.

— Confiança ele tem de sobra, pelo que percebi.

Benny riu.

Antes que eu pudesse continuar perguntando o elevador chegou no seu destino. Eu já tinha visto essa área ontem, mas ainda me impressiono como é diferente do resto do prédio, parece que eu magicamente tinha sido transportada para um hospital, com jovens médicos andando de um lado para o outro sendo auxiliados ou simplesmente acompanhados de enfermeiras, algumas me davam a impressão de estarem mais paquerando do que trabalhando. Benny me guiou até uma salinha, dentro dela estava um médico, que se quisesse poderia ser um super modelo, ele era lindo, alto, forte, tinha o cabelo ruivo bem cortado, sardas no rosto e olhos verdes. Ele usava um jaleco branco com o brasão da ordem com os detalhes em azul bordado no bolso por cima do uniforme.

— David, essa é a Elena, eu te falei sobre ela ontem. Elena, esse é o David, o médico que vai te examinar. – Benny nos apresentou inocentemente, ele não deve ter percebido que eu paralisei por uns segundos por causa do monumento à minha frente.

— Muito prazer Elena! – disse David com uma voz grave e simpática que quase me fez derreter.

— O-oi!

— Sente Elena! – Benny foi me empurrando para uma cadeira vaga na mesa em que David estava sentado. Eu me sentei ainda atordoada.

— Elena, eu vou fazer alguns exames em você, ok? Não se preocupe que não vai doer nada. – disse David.

Ele fez exame de sangue, de reflexo, de visão e um teste psicológico, também me pesou e mediu minha altura, depois que saíram os resultados ele colocou tudo numa pastinha e entregou ao Benny.

— Tudo certo Elena, bom dia e bem vinda a Ordem. – disse David com um sorriso bondoso no rosto.

— Obrigada...

— Vamos Elena, ainda tem muita coisa pra fazer! – Benny foi me empurrando até a porta. Depois fomos até o 15º andar, no Setor da Rosa Laranja fazer um teste de aptidão. Curiosa, perguntei:

— Benny, o que exatamente é esse teste de aptidão? – perguntei

— Ah... Você vai ver quando chegar lá. – respondeu ele, e tinha algo de estranho na sua voz, mas não consegui identificar o que era.

Chegando lá encontrei Henry discutindo com outro garoto que pelo uniforme era da Rosa Laranja, ele era mais alto e parecia ser mais velho que Henry, tinha cabelo castanho curto e arrepiado com mechas vermelhas e com um brinco de argola na orelha esquerda, parece que eles estavam a ponto de brigar, mas assim que chegamos perto, eles pararam e Henry entrou na sala com a plaquinha “Somente pessoal autorizado” pregada na porta.

— Marcus, tudo bem? – perguntou Benny ao garoto.

— Sim, tudo bem, você dele ser a Elena, certo? Vamos entrar sua sessão já vai começar.

Benny e eu entramos na mesma salinha que Henry tinha entrado poucos segundo atrás, Marcus entrou logo em seguida.

Essa sala era espaçosa e um pouco escura, tinha uma grande mesa em formato de lua crescente no centro com algumas pessoas que eu não conhecia sentadas nela, eu percebi que elas tinham os detalhes do uniforme de cores diferentes, representado o setor em que trabalhavam, Henry estava sentado numa cadeira mais distante do resto dos outros e ele parecia estar com raiva de alguma coisa.

Bem no meio na sala tinha uma cadeira reclinável, como essas que os dentistas usam e estava ligada a alguns aparelhos, um eu reconheci como um medidor de batimentos cardíacos.

— Elena, você deve deitar naquela cadeira e relaxar, eu vou colocar esses eletrodos em você pra monitorar sua saúde, ok? – disse Marcus num tom tranquilo.

— Se você quiser eu posso ficar do seu lado. – disse Benny nervoso, mas eu não entendia o porquê dele estar assim.

— Obrigada, mas acho que não precisa.

Benny acenou com a cabeça e foi se sentar ao lado de Henry, eles não se falaram.

Depois de colocar os eletrodos, Marcus foi se sentar com o resto do pessoal do seu setor, logo após todos fizeram silencio, entrou uma mulher misteriosa por outra porta, ela me lembrava uma dessas bruxas de contos de fadas, era bem velha e enrugada, com os cabelos brancos e meio maltratados, tinha os dedos comprido e as unhas pontiagudas, mas o que me mais chamou a atenção era que ela usava o uniforme da Ordem, um longo vestido preto, com os detalhes em violeta, seja ela quem fosse, era alguém muito importante aqui. A senhora veio na minha direção se arrastando e colocou as mãos na minha cabeça, comecei a me sentir sonolenta e antes que percebesse tudo apagou.

Comecei a ver flashes na minha frente, uma hora eu via crianças ao meu redor numa sala de aula, outra hora eu ria com amigos numa festa de aniversário e outra eu via meus pais, percebi que o que via na minha frente como um filme eram as minhas memórias, estavam vasculhando a minha mente. Eu não queria aquilo, não queria me olhassem minha mente, que vissem todas as minhas lembranças e meus pensamentos mais íntimos, tentei lutar, tentei fazer aquilo parar, mas não conseguia, estava fora do meu controle, de repente ouvi uma voz familiar, tão baixa que mais parecia um sussurro:

“Elena, você tem que lutar!”

— Josephine, é você? Me ajude, eu não consigo parar!

Minha cabeça começou a doer, parecia que estavam enfiando agulhas no meu cérebro.

“Você esta correndo perigo, lute Elena!”

— Está doendo, faça isso parar!

“Lute Elena!”

A dor era muito intensa e as imagens passavam pelos meus olhos em alta velocidade, eu estava enjoada, mas eu precisava fazer aquilo parar. Juntei todas as forças que tinha em mim.

— SAIA DA MINHA CABEÇA!

A última coisa que vi foi o castelo em ruínas passando rápido diante de meus olhos e depois tudo desapareceu, a única coisa que sobrou foi um sussurro ecoando nos meus ouvidos: “Não deixe eles saberem”.

Quando acordei eu ainda estava na sala deitada na cadeira, senti um cheiro de fumaça e ouvi um barulho de estática. Senti uma mão suave me ajudando a sentar, tudo girava ao meu redor, mas eu consegui reconhecer a expressão assustada de Benny.

— O-o que aconteceu? – perguntei ainda tonta.

Benny não respondeu.

— Vamos sair logo daqui – disse uma voz masculina perto de mim, era Henry. Ele me colocou de pé e usou os ombros pra me dar apoio e me ajudar a andar em direção a porta. Antes que pudéssemos sair ouvi uma voz fraca me chamar:

— Você... minha jovem...

Eu me virei e vi a senhora caída no chão há alguns metros de onde eu estava sentada antes sendo amparada por algumas pessoas, incluindo Marcus, que estava com o rosto branco como uma folha de papel. Percebi que a sala estava toda revirada como se um furação tivesse passado por ali e várias pessoas estavam assustadas olhando pra mim.

— Minha jovem, seu poder é maior do que qualquer um consegue imaginar, eu não sei o que é, mas eu vi uma grande sombra em você. Sua jornada será longa e dolorosa e você terá que fazer escolhas muito difíceis, eu não sei se você encontrará o que procura, mas prosperar ou perecer está em suas mãos... Boa sorte.

Antes que eu pudesse dizer alguma coisa Henry e Benny me arrastaram pra fora e só pararam depois que entraram no elevador. Henry me colocou no chão, eu me sentei e respirei fundo várias vezes tentando voltar ao normal.

— Mas o que foi que aconteceu ali? – perguntei aos dois.

— Eu não sei exatamente. – respondeu Henry.

— Como assim?

— T-tudo estava indo bem até que você começou a se contorcer e os aparelhos começaram a apitar loucamente, aí você gritou e tudo explodiu! – respondeu Benny nervoso.

— O que?

— Eu sabia que algo assim iria acontecer, eu sabia! – disse Henry irritado.

Depois de uns segundos consegui me levantar.

— Para onde estamos indo? – perguntei novamente aos dois.

— Estamos indo ver o capitão, talvez ele consiga resolver isso. – disse Benny.

Chegamos ao 10º andar outra vez, entramos numa sala no final do corredor principal, ela era confortável, com móveis de madeira escura, prateleiras cheias de pastas e arquivos e uma grande mesa de escritório com uma pilha de papéis em cima, não tinha ninguém sentada atrás dela. Cansada e fraca, me deitei num pequeno sofá no canto da parede perto da porta, pouco tempo depois ela se abriu.

— Eu ouvi o que aconteceu, foi pior do que previmos. – disse uma voz masculina familiar.

— Sim, você conseguiu? – perguntou Henry

— Bem a tempo, onde estão os papéis?

— A-aqui! – respondeu Benny

— Ótimo, tudo certo, ela já assinou?

Benny veio até mim trazendo o que acho que era um contrato.

— Elena você tem que assinar os papéis. – disse ele.

— Eu vou ter que passar por aquilo de novo? – perguntei, fraca.

— Não eram pra você ter passado em primeiro lugar, se aqueles imbecis da Rosa Laranja tivessem me ouvido... – bradou Henry, mas foi impedido por alguém.

Com certo esforço me sentei e escrevi meu nome.

— Agora só falta o capitão assinar. – disse Benny.

— Quando é que esse capitão vai chega... – antes que eu pudesse terminar de falar vi que a pessoa assinando os papéis era Edric. – O que você está fazendo, eu pensei que o capitão que ia assinar isso?

— E é isso que estou fazendo. – respondeu ele calmamente

— O-o que?

— Você não sabe? Eu sou o capitão do Setor da Rosa Vermelha - disse Edric acabando de assinar o contrato - E a partir de agora eu sou o seu chefe, bem vinda a Ordem Rose&Crown, Elena.


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