Candidatos a Deuses escrita por Eycharistisi
As pessoas em redor da mesa viraram-se todas para ver Burn aproximar-se, quase a soltar fumo pelas narinas, de tão irado que estava.
– Tu! – berrou ele, com os olhos negros a arde de raiva fixos em Softhe. Avançou para ela com passadas largas e, antes de alguém poder evitar, agarrou-a por um braço e arrancou-a da cadeira.
– Ai! – exclamou Softhe, tentando soltar-se do aperto doloroso do Deus Supremo do Fogo.
– Como te atreves a fazer-me frente?! – perguntou Burn, abanando a rapariga de um lado para o outro e despeando por completo os seus cabelos – Não passas de uma humana minúscula e inútil!
– Hey, hey, hey! – exclamou Lilás, aparecendo a correr e tentando segurar Burn – Calma aí, meu…
– Não te atrevas a tocar-me! – gritou Burn, soltando Softhe com uma mão para poder empurrar o amigo para longe – Este assunto é entre mim e ela!
– Bem, eu também comi daquilo que o Shark estava a guardar – revelou L, levantando-se – Portanto, o assunto também me diz respeito.
Burn olhou para ela, avaliando-a de alto a baixo.
– Não te metas – rosnou ele, antes de voltar a virar a sua atenção para Softhe.
– Oh, já percebi! – exclamou Tech – Ele quer ter um assunto só com a Softhe. If you know what I mean…
Começaram todos a rir-se, o que deixou Burn ainda mais irritado.
– Tu – começou Softhe, espetando o dedo indicador na frente do nariz de Burn, com os olhos castanhos cerrados de forma ameaçadora – vais larga-me. Agora.
Burn ficou a olhar para ela, como se se recusasse a acreditar que uma humana tinha acabado de lhe dar uma ordem.
– Larga-me – repetiu Softhe, aproximando ainda mais o dedo espetado do nariz do rapaz.
Burn mexeu-se desconfortavelmente e depois, lentamente, começou a afrouxar o aperto nos braços da rapariga, deixando as mãos deslizar ao longo deles e cair ao lado do corpo.
Os rapazes trocaram olhares arregalados, mas não se atreveram a comentar nada. Quanto a Burn, continuou a olhar para Softhe, parecendo meio desorientado. Depois deu um passo hesitante atrás, mas que pareceu ter o condão de o acordar.
– Vamos embora! – ordenou aos amigos, virando as costas à rapariga e afastando-se com passadas largas.
Os seus amigos seguiram-no rapidamente, com Shark incluído, depois de espetar um beijo de despedida na bochecha de L.
– Pensei que fosses desfazer a miúda – disse Snow, admirado, quando já tinham saído da sala comum e avançavam apressadamente pelo corredor – Porque paraste?
Burn moveu o maxilar daquele jeito que dizia “não me irrites agora, ou eu faço de ti churrasco”. Mas, para surpresa dos rapazes, respondeu:
– Nunca ninguém se atreveu a fazer-me frente – murmurou ele – E aquela humanazinha irritante, insolente, completamente inútil…
– Ela despertou-te a atenção? – perguntou Shark, tentando esconder um sorrisinho malandro.
– É claro que não! – estalou Burn – Estou só irritado e… e chocado por uma humana se atrever a fazer-me frente quando outros deuses não se atrevem a fazê-lo.
Os amigos de Burn trocaram olhares divertidos nas suas costas. Sabiam muito bem o que Burn estava a sentir mas não tinha coragem para admitir: ele estava impressionado com a humana.
* * *
– Estás bem, Softhe? – perguntou Dórrémi, aproximando-se da Sobrinha.
– Sim – confirmou a rapariga, ainda a lançar um olhar irritado para a porta por onde Burn desaparecera com os amigos.
– Vais ficar com nódoas negras – avisou Gina, baixinho, enquanto passava por ela e saia da sala.
– O-onde é que ela vai? – perguntou Softhe, admirada por a rapariga ter falado para ela.
– Para o jardim – respondeu Saya.
Olharam todos para Saya, admirados, e ela encolheu os ombros de forma defensiva:
– Que foi?
– Parece que conseguiste fazer amizade com a rapariga esquisita – comentou Bella.
– Ela não é esquisita – negou Saya – É só incompreendida.
– Mas porque é que ela vai para o jardim? – perguntou L – Aliás, temos sequer jardim, aqui perdidos no meio do mar?
– Claro que temos – confirmou Saya – Deves saber que a escola está dividia em várias “ilhas”, ligadas entre si por pontes. Bem, uma dessas ilhas tem um pequeno jardim. É muito bonito e calmo, justamente porque quase ninguém lá vai. Porque iriam, quando têm toda a diversão aqui? – perguntou, apontando com o polegar por cima do ombro, para os rapazes que estavam a festejar um golo nos matraquilhos.
– E não se vai atrasar para as aulas? – perguntou L, verificando o relógio.
– Se se atrasar, é problema dela – disse Saya – Não se metam na vida dela, pode ser?
Alguns encolheram os ombros e depois seguiram para a zona das salas de aula. Dórrémi e Bella levaram Softhe para a zona desportiva, Tech e Dest desapareceram misteriosamente e Saya levou L para a sala em que teria Introdução ao Conceito de Poderes.
– Olá, Circe, Hisui – cumprimentou L, ao ver as duas raparigas junto da sala.
– Olá – disseram elas, com pouco entusiasmo.
– Viste aquela tua amiga arrepiante? – perguntou Circe.
– Quem? – perguntou L.
– A do cabelo preto – explicou Hisui.
– A Gina? – perguntou Saya, erguendo uma sobrancelha.
– Essa mesmo – confirmou Circe – Viram-na?
– Não – negou Saya, antes de L ter tempo de responder – Porquê?
– Sonhei com ela – disse Circe, encolhendo os ombros levemente.
L e Saya trocaram olhares cheios de significados.
* * *
– És louco? – perguntou Dest a Tech, baixinho, para caso de alguém estar a ouvir.
– Eu só disse…
– Sim, disseste! E tu sabes que não podes dizer nada desse género! Nós não podemos andar a brincar com o destino das outras pessoas. Entendes? Isto não é um jogo!
– Diz o roto ao nu, mal vestido vais tu – disse Tech, lançando um olhar cheio de significados ao irmão – Relaxa, Dest. Foi só um pormenorzinho sem importância.
– Sem importância? – repetiu Dest, descrente – Sem importância?! Tens noção que podes ter destruído a vida a quatro pessoas?! Quatro, Tech! Agora deveria obrigar-te a desfazer o que fizeste!
Tech encolheu-se.
– Não estraguei a vida de ninguém – negou Tech – Eles foram feitos um para o outro. Vejo-o no ritmo do coração deles.
Dest esfregou o rosto com as mãos, terminando a deslizá-las pelos cabelos negros.
– Okay, desta passa – disse Dest – Se o que dizes é verdade, tu não alteraste nada, apenas apressaste…
– Talvez fizesse parte do destino eu apressar as coisas – sugeriu Tech.
Dest lançou-lhe um olhar acutilante.
– Não há destino, Tech. Só nós.
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