O que eu fui depois de você escrita por Raissa Muniz


Capítulo 8
Capítulo 7 - O encontro




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Lorenzo chegara ao trabalho ainda com marcas de sono. Passara a noite procurando novas crônicas em seus arquivos, sendo por fim vencido a produzir pelo menos duas novas. Sentou-se em sua mesa, ligando o computador como de praxe. Olhou o mostrador do relógio: ainda faltavam quarenta minutos para que seu chefe chegasse.

Abrindo um novo arquivo do word, começou a rascunhar.

“15 de novembro de 2014

Lena,

Você tem tido sonhos estranhos e confusos desde a descoberta da gravidez. Teima em salientar que já os tinha antes de descobrir que estava grávida, mas minha memória me limita a recordar de algumas poucas coisas. Já ouvira, é verdade, seus relatos sobre sonhos horripilantes e aparentemente sem nexo, mas nunca me preocupara tanto como agora. Talvez a presença do bebê tenha algo com tudo isso. Sinto-me na obrigação de cuidar dos dois não só agora, mas para o resto da minha vida.

Um rabisco preocupado do sempre seu,

Lorenzo Sacramento”

Lorenzo salvou o arquivo em um pen drive que carregava também a primeira carta que escrevera. Seus olhos percorriam toda a extensão da mesa de trabalho amarrotada quando o telefone tocou. Olhou o mostrador, sem identificar o número.

— Oi?

— Aqui é Carmem. Estou ligando para relembrá-lo da emissão de novas crônicas.

— Ah, oi, Carmem. Estava pensando nisso agora mesmo. — mentiu. — Entrego-as hoje na hora do almoço. Passe-me o endereço do escritório de Rubens.

Carmem passou, dizendo algumas instruções para chegar até lá. Por fim, agradeceu a atenção de Lorenzo, demonstrando a mesma segurança que falara com Helena no dia anterior, mas não com a mesma cordialidade.

Lorenzo desligou, retomando o trabalho. Se estivesse na pele deste velho escritor falido, teria procurado uma alternativa melhor de se lançar no mercado. Os erros que iniciantes cometem na aurora de suas idades chega a ser assustador para quem tanto calejou a postura, como eu.

Às doze e meia Lorenzo chegou ao local indicado por Carmem em seu telefonema, conferindo o endereço com o anotado na tela do celular. Apertou a campainha uma, duas, três vezes.

Por fim, uma secretária abriu a porta, exibindo um sorriso ensaiado.

— Boa tarde. — disse, gesticulando rumo a alguns sofás que se encontravam ali na recepção.

— Boa tarde. — respondeu Lorenzo, seguindo seus gestos e indo se sentar em um dos sofás.

— Pois não? — perguntou ela, já sentando em sua mesa e pegando a agenda para verificar se Lorenzo tinha horário marcado.

— Estou aqui trazendo algumas crônicas para Rubens Paiva.

— Ah, o seu Rubens está em horário de almoço, infelizmente. Aqui é o escritório de advocacia dele, como bem deve ter percebido pela placa. — respondeu, rindo educamente. — Mas dona Carmem está aqui. Vou chamá-la.

Lorenzo assentiu, despreocupado. Em alguns minutos após o término do chamado da secretária, o telefone tocou novamente, anunciando que Lorenzo poderia ir até a sala de Carmem.

Caminhou em passos largos, tentando aproveitar ao máximo o curto tempo que tinha para o almoço. Ao chegar na porta, bateu três vezes, esperando resposta. Carmem abriu sorridente, vestida em um blazer salmão. Seus olhos amendoados estavam vivos em um sorriso aberto. Seus cabelos castanhos e levemente ondulados caíam em seus ombros. Tudo em Carmem parecia ter sido milimetricamente pensado.

— Olá. Seja bem vindo. — anunciou, dando espaço para que Lorenzo passasse.

A sala era espaçosa, fazendo Lorenzo reconhecer que não fora encaminhado para a sala de Carmem, mas para uma sala de reuniões.

— Boa tarde. — respondeu ele ainda sem se sentir confortável naquele espaço. — Tenho pouco tempo a dispor pois estou dando uma fugidinha do horário de trabalho. — anunciou, sem jeito.

— Deixe-me ver aqui as crônicas.

Lorenzo estendeu a mão com um pacote um pouco menor que o anterior. Entregou as crônicas para Carmem e olhou ao redor, sem jeito.

— Eu realmente só passei aqui para entregar o pacote. — anunciou, desculpando-se nas entrelinhas.

— Oh, tudo bem. — ela riu, apertando o pacote contra o corpo. — Então presumo que aceite pelo menos um suco ou um café antes de rir?

Lorenzo riu nervosamente. Assentiu com a cabeça, embora as horas corressem de encontro aos seus planos para o horário do almoço.

Carmem encaminhou-se para um pequeno frigobar no canto esquerdo da sala. Uma grande persiana deixava alguns raios solares passarem pelos vidros que mais pareciam uma parede do que uma janela.

Trouxe um suco para Lorenzo e apontou uma cadeira da longa mesa. Ele se sentou, desconfortavelmente.

— Ontem liguei para o seu número e falei com uma voz desconhecida. — disse Carmem.

— Era Helena. Minha esposa.

— Ah, você é casado? — perguntou ela, arqueando as sobrancelhas com uma disfarçada expressão de surpresa.

— Sim, sim. — respondeu Lorenzo, animando-se. — E ela está grávida. Vou ser pai.

Maravilhou-se por dar essa notícia também a uma desconhecida como Carmem, mas não se sentiu exposto ou ridículo diante daquela ocasião. Carmem divertiu-se com o jeito do rapaz.

— Meus parabéns pelo bebê. — disse, exibindo um sorriso. — Já sabe se é menino ou menina?

— Ainda não sabemos. Caminha para os dois meses.

— Ah! Informe-me quando souber. Farei questão de comprar um presentinho. — respondeu, derretendo-se em sorrisos.

Lorenzo assentiu, terminando de tomar seu suco. Demorou ainda alguns minutos falando amenidades como o calor costumeiro da cidade e seus projetos enquanto escritor. Carmem explicou como Rubens trabalhava buscando novos talentos e mantendo o escritório de advocacia como forma de se sustentar. Salientou também que era também advogada, oferecendo-se para qualquer imprevisto que ele precisasse de um profissional da área.

Ele agradeceu, tomado de carisma pela mulher. Achou seu modo de falar envolvente, muito mais do que da primeira vez que a vira, no café. Nem parecia Carmem ser apenas uma mulher. Parecia um camaleão, assumindo suas várias cores de acordo com a ocasião.


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