Cartas para Hope escrita por Skye Miller


Capítulo 17
Seventeen.


Notas iniciais do capítulo

Olá!
Demorei de novo, né? Sinto muito, mas as vezes bate uma preguiça, e a falta de comentário também ajuda. Sei que não sou a melhor leitora do mundo, que sou fantasma de muitas fics, mas criei um projeto de "Faça um autor feliz" e agora todo capitulo que leio deixo pelo menos um review falando de algo que gostei ou odiei, funciona, acho que vocês deveriam fazer o mesmo. A fic tem 53 acompanhantes e apenas quatro comenta, isso é chato, pessoal.
Mas está tudo bem, eu estou feliz.
Bom, parcialmente feliz, sou muito bipolar, então ignorem.
Gostaria de avisar que a partir de agora a história vai se desenrolar mais, e em aproximadamente em três ou quatro capitulos iremos descobrir quem é o Sr. Confuso.

Hello G!



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– Como você vai conseguir não fazer barulho usando esses saltos? – Henry sussurra me ajudando a se equilibrar, ele parece se divertir com essa situação toda de sair escondido. Na verdade, ele parece estar acostumado com esse tipo de situação, pois anda de forma calma e lenta, como se já tivesse feito isso milhões de vezes. Suspeito que ele já tenha dado algumas fugas noturnas na nossa casa. – Sinto muito dizer, mas se você está usando esses troços para parecer mais alta ou intimidante, não está funcionando. Você tá parecendo uma fuinha andando desse jeito.

– Cala a boca! – Resmungo puxando sua mão. Nós conseguimos passar pela quarto dos nossos pais, então calmamente andamos pela cozinha/sala (copa). O problema é que, ao tentar abrir a porta do chalé, ela está trancada. – Droga!

Henry revira os olhos e abre a janela. Ele passa primeiro, de maneira tão rápida e prática que acho ser fácil, mas não é. Eu demoro para conseguir passar as duas pernas pela janela, pois são curtas demais e Henry falta morrer de sorrir do outro lado. O cretino nem ao menos ergue a mão para me ajudar quando eu piso em falso e caio no chão.

– Você vai acordar nossos pais!

Meus pais estão ocupados demais para se importar com meu riso. – Henry retruca e eu bufo, tentando entender o duplo sentindo na sua frase. – E é você quem está fazendo barulho demais.

Cruzo os braços e olho as horas. São nove e doze, Suzana e Anna estão atrasadas. Eu começo a assoviar e Henry se senta em um dos degraus, conversando com alguém no telefone. Eu olho por cima do seu ombro e bufo quando percebo que ele está falando com Lília. Meu orgulho é grande demais para perguntar como ela está ou se ela já me perdoou. É até estranho dizer isso, porque sou eu quem tenho de perdoar ela por ter me batido e dito aquelas coisas.

Um carro vermelho para na esquina e Anna coloca a cabeça para fora da janela, com os braços erguidos nos chamando. Eu tento andar rápido, mas os saltos dificultam meu processo. Henry já está dentro do carro trocando sorrisos com Suzana e eu me acomodo ao seu lado.

– Você está gata. – Anna elogia quando a irmã dá partida. Suzana parece ser mais jovem, enquanto na verdade é dois anos mais velha que todos nós. – Oi Henry.

Henry sorri de lado e desvia o olhar para me encarar, automaticamente seu sorriso murcha e ele ergue uma sobrancelha.

– O que é isso no seu rosto?

– Isso o que?

– Não sei. É rosado e tá brilhando.

Anna começa a rir descontroladamente e eu aperto os lábios, reprimindo uma risada.

– Maquiagem.

Henry solta um “aaah” e encosta a cabeça no vidro. Eu fico encarando-o, perguntando-me se ele está fingindo que está melhor ou se ele melhorou de verdade. Nós não toamos no assunto da tentativa – Acho que nunca irei conseguir pronunciar a palavra – e ele parece feliz com isso, como se não quisesse entrar em detalhes. Eu só queria saber os motivos, apenas isso. O pior de tudo, é que ele não queria ser salvo. Ele queria realmente morrer, por isso escondeu as facas e as cópias das chaves, para não haver meios de salvá-lo.

O Nandos não é bem uma boate, é algo parecido com um bar. Porém mais organizado e repleto de adolescentes. Nós só conseguimos entrar porque Suzana diz estar responsável por nós. Ano passado fiz uma carteira de identidade falsa com minhas amigas, porque Jassie terminava constantemente com o namorado e a única coisa que a alegrava era ir para alguma boate. Mas quase nunca eu conseguia entrar, os seguranças olhavam para mim e para a minha altura e de cara viam que era falsificada, eu me sentia péssima quando não conseguia entrar, por isso sempre ia de saltos e maquiagem pesada, para saber me camuflar. No dia seguinte, nós amanhecíamos com dor de cabeça e Jassie voltava com o namorado. Era um ciclo vicioso.

– Vocês querem beber alguma coisa? – Suzana perguntando trazendo quatro copos vermelhos. – Tudo por minha conta.

– Eu sou de menor. – Digo, vendo-a sorrir.

– A Anna também, mas nem por isso ela deixa de dar uns goles.

Anna assente pegando um dos copos e trazendo para perto, eu observo estática quando meu irmão pega um dos copos e dá um longo gole. Seu copo já está na metade.

– É que eu não bebo.

– Você fuma, mas não bebe? – Henry pergunta de um jeito engraçado e estala a língua, parecendo impressionado. – Você é esquisita.

As meninas começam a sorrir e eu apenas me remexo inquieta. Suzana pega na mão de Henry e o arrasta até a pista de dança. Eu fico na companhia de Anna, conversando sobre as competições que teremos de enfrentar na próxima semana. Ela parece animada, fala de um jeito engraçado quando começa a narrar sua sensação correndo. Ela tem um ponto de vista bonito, mas sem querer me gabar, o meu ponto de vista é melhor. Ela ver o atletismo como um esporte que a faz passar o tempo, enquanto eu me sinto livre quando corro. Mais do que quando danço. Se fosse para escolher entre o balé e o atletismo eu iria preferir correr, mil vezes correr, mas isso não significa que eu não me sentiria vazia sem a dança.

Eu bebo alguns goles de refrigerante. Meu celular começa a tocar e eu não atendo, pois é Tyler e ele provavelmente iria ter um ataque quando percebesse que eu não estava em casa e sim em um lugar repleto de gente bêbada. Ele começa a enviar mensagens, eu leio algumas e apago o resto.

– Ele parece ser meio ciumento. – Anna comenta olhando meu celular. Ela está cheirando a álcool, mas não parece bêbada. – Eu não sei se conseguiria viver em um relacionamento assim.

– Eu conversei com a minha amiga sobre isso. Ela sugeriu que nós déssemos um tempo.

– Você não vai ficar magoada com isso?

– Na verdade não. Eu acho que vou ficar aliviada. – Confesso e começo a procurar Henry com os olhos, mas ele sumiu. Suzana está na pista com outro cara e só depois de correr os olhos mais uma vez pelo Nandos é que eu encontro Henry conversando com uma loira perto do bar. – Acho que meu irmão vai sair daqui lucrando hoje.

Anna sorri assentindo e vai até o banheiro. Eu cruzo os braços, sem saber exatamente o que fazer. Não posso dançar, pois não consigo me equilibrar usando esses saltos. Não gosto de beber. Não posso fumar por conta das seletivas e nem paquerar com alguém por ser uma namorada fiel a Tyler. Minha única alternativa é ficar sentada, bebendo refrigerante e pensando sobre diversas coisas.

Enquanto estou aqui, sozinha, percebo o quanto sinto falta do Sr. Confuso. Eu espero que quando eu e Tyler estivermos dando um tempo eu possa voltar a falar com ele, eu espero que ele esteja bem. De alguma maneira quero que ele me supere, mas por outro lado quero que ele ainda continue me amando.

– Olá! – Um cara alto, vestido de preto e cheio de tatuagens surge ao meu lado. Eu arregalo os olhos ao ver o seu rosto repleto de pincergs, são tantos que eu não consigo nem ao menos contar. Ele é tão musculoso que eu fico me sentindo uma criancinha ao seu lado. Sorrio amarelo. – Posso ver a sua mão?

– O quê?

– Esse é o Elliot. – Anna explica sorrindo em direção ao tal cara e dando uma piscadela. – Ele é meio metido a cigano.

Eu ergo a mão meio hesitante e ele a pega, traçando o polegar pelas linhas. Eu observo suas expressões, as sobrancelhas estão juntas e ele parece meio aflito.

– Você é uma garota muito indecisa. – Ele olha para mim por um segundo antes de voltar a olhar para minha mão. – Tem que parar de ser tão insegura. Parar com tantos “talvez” ou “será que...”, isso não irá te levar a lugar nenhum. – Eu engulo em seco e suspiro. Henry e Anna estão atrás do cara ouvindo tudo atentamente. – Em breve você terá que tomar uma decisão e deverá esquecer toda essa insegurança. Espero que faça a escolha certa.

Eu guincho baixinho quando ele solta minha mão e sinto um frio por todo o corpo. Ele “lê” a mão de Anna e fala apenas coisas boas em relação ao seu jornal, quando vai ler a mão de Henry seus olhos se arregalam.

– Pobre garoto, passou a vida inteira sendo rejeitado pela garota que ama. – Henry tenta puxar a mão, mas o aperto de Elliot é firme. Eu me aproximo mais, tentando ouvir melhor. O Henry já amou alguém? Estou surpresa, será de quem eles estão falando? Eu acho que possa ser de Sophia, não ficaria chocada se fosse por ela quem ele sempre nutriu algum tipo de amor platônico. – Mas tenha fé, meu jovem. Quando você menos esperar ela estará em seus braços.

Pela expressão de Henry ele não está nada feliz com isso, ele parece na verdade raivoso. Bebe longos goles de cerveja e outro liquido desconhecido. Elliot já se foi, Suzana e o cara com quem estava dançando estão se agarrando e Anna parece entretida no celular.

– Acho que nós deveríamos ir. – Digo para Henry quando percebo que ele está bebendo demais. Ele nega, tomando mais um gole. – Por favor.

Henry me encara por alguns segundos antes de assentir. Eu me espreguiço e cutuco Anna, ela levanta a cabeça parecendo estar perdida com os dedos sobre a tela do celular.

– Nós já vamos. Não precisa chamar a Suzana, vamos de táxi. – Eu lhe dou um abraço forte, se ela me considera uma amiga a partir de hoje irei lhe considerar uma também. Despeço-me de Suzana e me junto a Henry na saída. – Vamos lá.

Nós ficamos parados na esquina esperando um táxi passar. Tiro meu salto e Henry abre uma latinha de Ice, ele não parece bêbado, mas a maneira desajeitada que ele anda o entrega. Quando um táxi finalmente para eu entro e arrasto Henry comigo, ele balbucia algo e encosta a cabeça no meu ombro.

– Eu estou enjoado. – Ele diz quando o carro começa a andar.

Faço uma careta e me afasto quando ele inclina a cabeça para fora da janela e um odor horrível se instala dentro do táxi. Henry limpa o canto da boca com as palmas das mãos e fecha os olhos. Eu acho que ele dormiu, pois aperto sua bochecha com a ponta dos dedos e ele não reclama.

Seu rosto está sereno e ele respira lentamente. Eu tento não olhar para suas cicatrizes no pulso, cobertas pela jaqueta de couro. Mas é inevitável, quando menos percebo meus dedos estão fazendo um trajeto peculiar sobre cada corte e eu sinto meus olhos encherem de lágrimas. Eu me sinto desolada, nunca se passou pela minha cabeça que Henry tentaria machucar a si próprio com o intuito de acabar com a própria vida. É difícil de aceitar o fato de que dividimos o teto a treze anos e eu não sei muita coisa sobre ele, nem mesmo sua cor favorita.

Henry sempre foi inquieto, daquele tipo que não gosta de puxar assunto ou ficar parado. A ovelha negra da família. Talvez essa tenha sido toda a questão, os Adams são engomadinhos. John é um responsável advogado, Cassie uma excelente dentista, a mãe de Sophia uma psicóloga renomada e o pai de Mike (nosso outro primo) um excelente engenheiro. Somos de uma família de porte rico, todos bem sucedidos, todos perfeitinhos. Mas eu e Henry não nos encaixamos entre eles. Eu por conta da aparência (baixa, bronzeada e de olhos escuros) e Henry por ser problemático. Ele é imperfeito demais para uma família tão perfeita.

Quando chegamos no chalé demoro para conseguir acordá-lo, mas quando isso finalmente ocorre eu pago o táxi e nós fazemos o trajeto de volta pela janela. Dessa vez eu consigo me equilibrar, mas Henry bate a cabeça na quina da janela e seu braço voa em direção ao abajur, que caí e faz um som alarmante.

– Puta merda Henry! – Eu exclamo dando um tapa em sua nuca. Ele faz uma careta e olha para o próprio braço, está sangrando por causa do vidro do abajur. – Estamos ferrados.

Pego no seu ombro e nós corremos em direção ao corredor. A luz do quarto dos nossos pais está acesa e há sombras de pés se movendo. Conseguimos entrar no seu quarto no momento em que meu pai abre a porta e anda em direção a sala. Seus passos são firmes e pesados.

– Cassie, o abajur quebrou. – Ele diz alto e pelo barulho parece estar recolhendo os cacos do chão. Meu pai volta para seu quarto e a única coisa que ouvimos em seguida é ele fechando a porta e o som das molas quando seu corpo deita-se na cama.

Eu suspiro e Henry senta-se em sua cama, me aproximo e analiso o corte em seu braço.

– Não tá muito fundo. – Ele diz e me olha, não consigo enxergar a cor por conta da escuridão no quarto, a única coisa que ilumina é a luz da lua que entra pela janela. Eu nego, pois o corte está profundo e jorra sangue por todos os lados. – Nem está doendo.

– É o efeito da bebida.

– Não estou bêbado.

– Certo, quantos dedos tenho aqui? – Ergo três dedos e ele aperta os olhos com força. Seu hálito é uma mistura de cerveja e wiski, me sinto tonta por um momento. Ele balbucia “cinco” e eu nego. – Não mesmo.

Vou em direção a sua mala e pego seu pijama, aquele super másculo do Batman, que é uma simples blusa de flanela preta com o emblema na frente e cheio de desenhos de morcegos estranhos estampados. É tão infantil que eu sorrio só de olhá-la. Depois pego o kit de primeiro socorros e me sento ao seu lado.

– Preciso que tire a jaqueta e a camisa. – Digo e ele nega se afastando.

– Não quero sua ajuda.

– Ah, cala a boca. – Resmungo puxando sua jaqueta e tendo cuidado para não machucar seu braço. Ele apenas me encara, observando meus movimentos atentamente com uma expressão sombria. Eu tiro em seguida sua camisa e faço uma careta quando vejo as pequenas pintinhas negras fazendo contraste pelo seu corpo, são muitas, espalhadas pelo seu peitoral e pelas costas. Depois o ajudo a colocar a blusa do pijama e começo o processo de limpeza no seu braço. – Não tá sentindo nenhum incomodo?

– Não. Apenas arde. – Ele murmura fechando os olhos e os abrindo em seguida, pela sua cara parece que vai dormir a qualquer segundo.

– Se fosse eu no seu lugar estaria chorando. – Digo rindo e ponho um pouco de álcool sobre o ferimento. Henry solta um palavrão e eu rio. – Não chora, maninho.

– Eu não choro mais. – Ele diz friamente se remexendo e atrapalhando meu trabalho em tirar qualquer chance de uma futura infecção sobre o corte. – É até engraçado falar mais. Não me lembro ao certo se já chorei algum dia. Talvez sim, em momentos tristes de angustia. Não sei. Talvez quando eu era capaz de chorar. Hoje só existe uma casca fazia dentro de mim.

Eu engulo em seco e respiro fundo. Minha mão está tremendo quando coloco uma gaze em seu ferimento e volto a me sentar ao seu lado. Eu tenho de perguntar a ele, tenho mesmo, e quando menos espero a pergunta escapa pela minha boca:

– Por que você fez aquilo? – Minha voz saí um sussurro e Henry fica tenso. Ele se levanta e caminha de um jeito desastrado até o banheiro, eu poderia ter rido, mas estou angustiada demais para isso. – Por favor, me responda. Por quê, Henry?

Quando ele volta está com uma calça de moletom cinza caída nos quadris, sua expressão é vaga, se deita na cama e fecha os olhos.

– Foi só um motivo ou foram vários? Foi por causa de alguém? De algo que lhe disseram? Você ia sem deixar nenhum bilhete, nenhuma pista? Você iria simplesmente morrer, sem dizer as justificativas? Sem dizer os porquês?

Eu estou chorando e me sentindo inútil por isso. Ele continua lá, inquieto com um braço ao redor dos olhos e respirando profundamente.

– Lembra o que o diretor disse quando a Aria se matou? Sobre que em um suicídio todos serem culpados? Sobre haver mais homicidas do que se possa imaginar? Todos tem uma parcela de culpa. Todos falaram ou fizeram algo, todos que estavam ao meu redor. Eu só não suportava mais, Hope. Eu não suporto mais. – Ele diz tão friamente que minha garganta fecha e as lagrimas rolam pelas minhas bochechas. – Fiquei dias pensando sobre isso, divagando se deveria fazer ou não. Eu me agarrava a poucas esperanças, me agarrei à esperança de ter Sophia para me reconfortar, mas ela então disse que iria embora para Nova Iorque. E aí tudo foi desmoronando. Os meus motivos para permanecer aqui escaparam pelos meus dedos. No começo eu fiquei assustado, afinal, quem não se assustaria quando percebesse o rumo que seus pensamentos estavam tomando? Pesquisei sobre suicídio, sobre depressão, sobre toda essa merda. Estava decidido. Havia planejado tudo: Tirar boas notas, ser um bom garoto, satisfazer o John por causa do basquete, não irritar você e tudo mais, então veio a parte em que eu tinha de finalizar. Fiquei pensando em overdose por remédios, mas uma lavagem estomacal poderia me salvar e eu não queria ser salvo. Pular de uma ponte ou prédio não era uma alternativa, não queria ter meu corpo danificado por conta da queda. Atirar em mim mesmo era fora de questão, afinal, onde eu conseguiria uma arma? Então se enforcar foi o mais próximo que cheguei. Iria ser doloroso, sufocante, mas no fim não haveria como ninguém me salvar. Peguei as facas para não cortarem a corda, peguei as chaves para não abrirem a porta do quarto. E, voá-la, lá estava eu, com a corda ao redor do pescoço.

Eu não sei o que pensar. Minha cabeça está doendo e não consigo parar de chorar. Ele está tão calmo, tão frio, tão tranquilo, como se não tivesse acabado de confessar uma coisa tão horrível.

– Sabe como eu me senti ao acordar no hospital e ver você em cima de mim dizendo aquelas coisas? Fracassado. Quando você soltou “Bem vindo de volta” eu queria ter voltado atrás e feito de outra maneira. De uma maneira mais rápida e sem escapatória. Entenda, eu não queria ser salvo. Eu não quero estar aqui. Não vejo mais motivos para estar aqui. Não é drama, Hope, eu só quero... ir.

– Mas você não parou para pensar direito, não é? – Eu limpo o rosto e subo na cama, deitando-me ao seu lado e puxando seu braço para conseguir encará-lo nos olhos, mas ele desvia o olhar para o teto. – Não parou para pensar como Sophia, nossos pais, Tyler, Lília, seus amigos ficariam? Como eu ficaria, Henry? Quer um motivo para ficar? Bom, agora eu vou lhe dar: Sua família, aqueles que amam e que estarão sempre com você. Nós somos um belo motivo. Pare de se menosprezar, pare de se odiar.

– Não sei se irei conseguir fazer isso.

– Mas você vai. Porque eu estou aqui, nossos pais e nossos amigos também estão. Com você.

Henry assente vagarosamente e eu coloco minha mão sobre a sua.

– Eu estou tão feliz que você esteja vivo, Henry. – Confesso sentindo minha garganta se fechar ainda mais. Não há mais lagrimas, há apenas uma dor profunda em meu peito. – Aqui, comigo. Não sei bem o que aconteceu, mas você está mais acessível. Antes eu nunca iria conseguir ficar ao seu lado três segundos sem brigar. E olha só onde estamos.

Ele dá um meio sorriso, ainda encarando o teto. Seus dedos deslizam sobre os meus e ele os aperta.

– Acho que nós devemos fazer um novo tratado de paz. – Diz baixinho.

– Eu adoraria.

– A primeira regra é você parar de dizer nossos pais. Eu não me sinto confortável, apesar de terem se passado mais de uma década eu ainda não me acostumei com o fato de dividi-los com alguém. Então, quando estivermos apenas nós dois, vamos chama-los de Cassie e John.

– Tudo bem. A segunda regra é que você tem que parar de me oprimir.

– Eu oprimo você? – Ele automaticamente olha para mim e eu assinto. – Oh, me desculpa. Eu nunca imaginei que... Que fizesse coisas a ponto de você ficar tão... Desculpa.

– Você é muito ruim às vezes, Henry. Você me xinga, me bate, não me deixa assistir TV quando está na sala, fica jogando na minha cara o fato de eu ser adotada, não me aceita, faz bullying por causa da minha altura e meu corpo de criança, não me apoia no quesito de dançar balé e ainda por cima roubou minha melhor amiga. Eu deveria te odiar.

– Caralho. – Ele resmunga irritado e passa as mãos pelos cabelos. – Eu faço isso para te irritar, não pra machucar. Desculpa.

Eu assinto e ele parece pensar em mais alguma coisa.

– Nós vamos continuar com o lance de “Não perturbe”, pois ele estava funcionando. E, apesar de você ser uma chata, devemos tentar parar de brigar tanto.

– Ah, então a chata da história sou eu?

– Claro que é.

Henry está com aquele sorriso. Aquele sorriso esnobe de garoto verão. Aquele sorriso de “Eu sou melhor que você”, aquele sorriso cheio de covinhas que o deixa com aparência de fofo, sendo que de fofo não tem nada. Aquele sorriso que eu aprendi a odiar, mas acho uma gracinha.

– Certo, e o que faremos para selar esse trato?

– Não sei, um aperto de mãos, talvez?

Eu nego. Um aperto de mãos é muito fingido e eu nunca irei confiar em alguém que aperta minha mão para selar um acordo.

– Não. Que tal um segredo?

– Tudo bem.

– Você primeiro.

Henry fecha os olhos, parecendo procurar algo no seu subconsciente. Depois olha para mim e diz como se não fosse nada demais:

– Eu já beijei a Lily.

Puta merda.

Que história é essa?

Mano, como assim?

Volta a fita um minutinho por favor que eu ainda não compreendi.

O QUÊ? – Grito e Henry coloca uma mão sobre minha boca, alarmado pelo meu vexame. É aí que noto que ele realmente não está bêbado. – Quando isso aconteceu?

– Ah, faz muito tempo. Quando ela dormiu lá em casa e entrou no meu quarto. Mas eu não gosto dela, ela é apenas minha amiga. E, além do mais, ela gosta de um tal Cameron que mora na Europa.

Por que me sinto incomodada por isso? Eu deveria estar no mínimo contente por Lília conseguir ter beijado Henry depois de anos nutrindo uma paixão platônica por ele. Mas não gosto de imaginá-los juntos. Talvez seja aqueles ciúmes bobos de irmãos, porque apesar das brigas eu sinto ciúmes de Henry até mesmo com Sophia. Eu queria ter com ele a mesma intimidade que ele tem ela. Eu queria ser sua melhor amiga, daquelas que estarão sempre lá. É assim que os irmãos normalmente são.

– Ela nunca me contou sobre isso.

– Eu pedi para não contar.

– Por quê?

– Qual é o seu segredo? – Ele pergunta mudando drasticamente de assunto. – Você ainda não me contou.

– Ah, o meu é algo bem obvio.

– Não para mim.

Eu engulo em seco com a seriedade em sua voz. Faz muito tempo que não trocamos segredos um com o outro, da ultima vez ele disse ter dado o primeiro beijo em Sophia e eu disse estar gostando do Tyler. Agora, de alguma maneira, nossos segredos estão interligados.

– Eu não gosto do Tyler. Não como antes. Eu não estou mais apaixonada por ele, nem sei porque aceitei namorar com ele. Isso é tão estranho, sabe, passei longos anos sonhado com ele e agora tudo o que mais quero é ficar longe.

Henry ergue uma sobrancelha, mas nada diz. Ele me analisa por alguns segundos, para ver se estou blefando, então se remexe e fecha os olhos. Eu sussurro um “boa noite” e fecho os olhos. Estou tão cansada que não tenho estruturas para ir até meu quarto, por isso decido dormir aqui mesmo. Aproximo-me mais de Henry e passo um braço pelo seu tórax, o abraçando com força. Ele é tão maior e mais forte que eu, apesar de termos a mesma idade ele sempre pareceu mais velho.

Sua respiração está regular e ele pega minhas mãos, arrastando-as mais para cima, para a região dos seus pulmões e eu aninho meu rosto nas suas costas.

– Eu te amo. – Sussurro.

Não espero uma resposta, porque sei que talvez ele ainda possa estar me odiando, mas estou tão feliz em vê-lo bem e respirando que não ligo quando ele não diz nada. Ele está bem, e sabe que estou aqui por ele. Que nossos pais estão aqui por ele. Que ele tem motivos para continuar vivo, para continuar lutando. Lutando não sei exatamente pelo quê. Mas ele continuará, eu sei que vai.

...

Minha mãe parece ter visto o passarinho verde esta manhã. Quando foi no quarto de Henry e me encontrou dormindo ao seu lado ela nada disse, apenas ficou vermelha como um pimentão e rindo de maneira boba. Eu não entendo o motivo do seu entusiasmo, mas ela parece ótima. A todo momento diz algo enraçado, comenta sobre o tempo estar ótimo e fala o quanto a Califórnia é linda. Henry fez uma piada sobre a noite entre eles ter sido produtiva, mas pela expressão do papai não é isso. Ela está feliz por causa de algo que só ela entende.

– Mas então, quando você iria me contar que estava namorando o Tyler? – Eu me engasgo quando ela pergunta isso. Mamãe me olha preocupada e vem ao meu socorro. Estamos em um bazar aproveitando a liquidação, minha mãe sempre preferiu lugares assim, por poder aproveitar as roupas customizando-as e porque o dinheiro é sempre doado para alguma caridade. Ela só vai ao shopping quando precisa comprar roupas para algum jantar chique. – Pelo amor de Deus, Hope, está tudo bem?

– Como a senhora descobriu?

– Ah, por favor. Eu conheço você e vi vocês se beijando no aeroporto. Mas, filha, apesar do Tyler ser muito lindo, eu não o aprovo.

– Ninguém aprova. – Sussurro envergonhada pegando um cachecol roxo e jogando dentro da cestinha. – Ai, mãe isso é tão complicado.

Sinto cheiro rejeição no ar.

– Mais ou menos.

– Talvez vocês devessem dar um tempo, aí você colocaria seus pensamentos em ordem e...

Meu telefone começa a tocar, interrompendo sua fala. Eu suspiro quando percebo que é Tyler e atendo a contra gosto.

– Oi.

Oi baby. – Fecho os olhos com força e trinco os dentes. Pior apelido que esse não há. – Estou com saudades.

– Tyler, faz apenas quarenta e oito horas que saí daí. Você sabe que amanhã à noite estarei de volta.

Eu sei, baby, mas sinto sua falta. Onde você está?

– Fazendo compras.

Com quem?

– Com minha mãe.

– Menos mal. Por que não atendeu o telefone ontem a noite?

Estou tão irritada que nem ao menos cogito na ideia de inventar uma desculpa.

– Porque estava ocupada.

– Com o quê?

– Conversando.

– Com quem?

– Anna Palmer.

– Onde?

– Em um bar.

– Que história é essa?

– Eu não estava sozinha. Henry estava lá.

– Se você acha que isso me deixou mais tranquilo está muito enganada.

– Tyler...

– O que eu disse sobre bebidas? E festas? Você me desobedeceu, deveria ter tido ao menos o bom senso de me avisar.

– Caralho, você é meu pai por acaso? – Grito, sem conseguir controlar meu nervosismo. Estou tão irritada. – Eu estou sufocada. Você me afastou dos meus amigos, controla minhas mensagens e fica me tratando feito um objeto, como se eu tivesse de fazer exatamente tudo o que você quer. Mas, sinto muito dizer, eu não sou do tipo que fica submissa a alguém, eu gosto de liberdade, gosto de minhas próprias opiniões. Gosto de ter minhas próprias escolhas e não ter alguém as controlando. E você controla tudo, Tyler, exatamente tudo. Na primeira semana você foi um amorzinho, um sonho, o meu sonho, exatamente como eu imaginava. Aí você ficou possessivo, me forçando a fazer coisas que não queria. Estou cansada. Estou irritada com você. Pare de me ligar e me esquece por algum tempo, um longo tempo, tipo pra sempre.

Eu fecho a boca automaticamente. As palavras saltaram da minha boca de maneira tão rápida que nem tive tempo de medi-las. Porra, acabei de jogar na cara do meu namorado que nosso relacionamento é uma merda.

Você está terminando comigo?

– Parcialmente sim.

Você só pode estar brincando.

– Não estou não.

– Ninguém termina comigo, Hope Adams.

– Fico feliz em ser a primeira.

– Mas eu te amo, porra!

– Obsessão não é amor.

– Isso não vai ficar assim.

A linha fica muda e eu sinto um arrepio na espinha. Minha mãe está do outro lado da loja conversando com uma atendente. Minha respiração está pesada e eu me sinto aflita quando meu celular volta a tocar. Atendo sem olhar o nome e suspiro.

– Que é?

– Olá, Querida Hope.

Arregalo os olhos e meu humor muda drasticamente de irritado para ansioso. Sua voz continua estranha por causa do aplicativo, mas mesmo assim dispara cargas elétricas por todo o meu corpo. Sem perceber, estou sorrindo feito uma idiota.

– Sentiu saudades?

– Muitas. Você sumiu.

– Minha meta era sumir para sempre.

– Você não ousaria. Sei que estava te evitando e tudo mais, porém ainda assim queria continuar do jeito que estávamos. Sabe o quanto fiquei aflita por você sumir por mais de duas semanas? Quase um mês sem ligações, presentes, bilhetes e desenhos. Sabia que havia parado com as cartas, mas ainda esperava algo. Eu estava começando a pensar o pior. Nunca mais faça isso, por favor.

– Eu sinto muito, isso não irá mais acontecer.

– Eu espero realmente que não. Senti sua falta, tipo muito. Minha vida está muito merda. Meu irmão tentou se matar, minha melhor amiga me odeia, as seletivas estão próximas e eu acabei de terminar com meu namorado, cinco minutos atrás.

– Você e Tyler terminaram?

– Bom, sim, mais ou menos. É, terminamos, eu pedi um tempo e explodi com ele

– Você acaba de fazer uma grande merda.

– Ué, por que?

– Ninguém dá um chute na bunda de Tyler Paskin e saí ileso. Ele é do tipo que termina com alguém e não o contrario. Ele não vai lidar muito bem com isso no primeiro momento. Se acostume em tê-lo te ligando, na porta da sua casa ou te perseguindo. Mas com o tempo vai voltar ao normal, ou assim eu espero.

– Você parece conhecê-lo bem.

– Tenho meus contatos.

– Uh, tudo bem Sr. Misterioso. – Digo com uma voz engraçada e ele ri. Apesar do aplicativo seu riso soa livre, e é tão lindo que me faz ter a sensação de já tê-lo ouvido antes. – Gostaria de agradecer pelos presentes. Adorei os discos e as flores. Adorei tudo, na verdade. Encontrei uma maneira de lhe retribuir tais presentes, mas gostaria de entrega-los pessoalmente.

Eu cruzo os dedos esperando uma resposta positiva, mas tudo o que recebo é o silêncio. Sr. Confuso solta um suspiro e por fim diz:

– Isso não será possível.

– Ah.

– Tente entender, nós não podemos nos conhecer.

– Ah.

– Está tudo bem, não é?

– É. – Minto, apertando o telefone com força na palma da minha mão. A mentira soa oca, arranhando minha garganta. – Preciso desligar agora.

– Tudo bem. Foi muito agradável ouvir sua voz.

– Vamos voltar a nos comunicar por cartas?

– Se você quiser, Querida Hope, estarei ao seu dispor.

– Okay. Tchau.

Desligo o celular com as sobrancelhas arqueadas. Eu não irei mais trocar cartas com ele pelo simples fato de estar decidida a descobrir quem ele é. E irei conseguir, custe o que custar.


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Notas finais do capítulo

Comecei a perceber de uns tempos para cá que raramente eu gosto de um capitulo. Vocês podem achar foda e tudo mais, porém é raro quando eu gosto de algo que eu escrevo. Isso é tão estranho, mas tão natural para mim, o engraçado é que mesmo não gostando eu posto, porque de certa maneira escrever me faz se sentir melhor.
Minhas aulas retornam amanhã, então não sei como vai ser a partir de agora, por causa dos treinos e cursinhos, se a inspiração vier até mesmo notas do celular vão servir para me reconfortar.

Eu espero que tenham gostado, espero que o fim do namoro e a ligação do Sr. Confuso não tenha sido algo meio forçado, porque de certa maneira parece, mas é que eu tenho de avançar mais a fic. E caso alguém queria entrar no grupo do wpp, o Mean Girls (Em que a maioria acompanha minhas fics do meu outro perfil, o Queen) é só mandar o número.

Beijinhos de luz e me façam feliz com os recadinhos!

~Skye



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