Nightmares Come True escrita por Polo


Capítulo 21
A Guerra


Notas iniciais do capítulo

Essa está sendo provavelmente a fic com a constância mais estranha de atualizações da sua vida, mas aqui estamos, cada vez mais perto do final. Acho que esse isolamento social vai me ajudar a terminar a história, fiquem atento que nas próximas décadas talvez cheguemos ao final haha. Bem, sem mais delongas...
Aqui estamos nós. Em 2020 e com o resto das nossas vidas inteiras pela frente. Convido você a embarcar pela última vez nesse mundo que, de uma forma ou de outra, fez parte da nossa história.
Abraços, Paulo.



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HADES

 

Soldado, você irá participar do primeiro pelotão de ataque. Junto de você, estarão nossas unidades sem vida e nossos cães de guerra. Boa sorte. Um amanhã livre depende de você.

A voz de Malévola, a misteriosa Lua que se comunicava por todos que lutavam pelo Castelo Negro, ressoou no meu ouvido. Seus comandos não era assim tão encorajadores quando você se lembra que dividiu vários pedaços de pizza com ela na noite anterior.

— Primeiro pelotão de ataque. - Soltei um riso seco e olhei para Clayton que segurava um facão de batalha ao meu lado. - Sabe o que isso significa, não é? Que estamos sendo enviados para a morte.

O caçador de Nova Londres nada respondeu. Estava focado no campo de batalha. Toda a nossa força estava reunida em frente ao castelo. A multidão de soldados a que eu fazia parte, os cachorros que olhavam sérios para o horizonte, e uma quantidade impressionante de pessoas mortas que estava perfeitamente imóvel e posicionada de uma maneira segura de nós. Pensei no cadáver selvagem do meu irmão que eu costumava alimentar anos atrás. Era quase inconcebível ver aquelas feras desprovidas de qualquer animosidade, completamente domesticadas.

— Uma cortesia do Professor Arquimedes Porter. - Clayton comentou como se adivinhasse meu pensamento. - Era um homem genial quando estava vivo.

— É. - Fingi interesse. - Tenho certeza que sim.

Era um dia quente e a podridão dos corpos se fazia sentir. Escutei alguns outros soldados reclamar do mau-cheiro e os olhei como as criaturas patéticas que eram. Esses não iam durar muito tempo.

Forçando a visão para o horizonte, era possível ver o exército de Disney Land. Com aquela distância se assemelhavam muito com formigas. Esse pensamento me levou para meus anos de criança, quando meu maior divertimento era queimar formigueiros com folhas e isqueiros. Não demoraria até que aquelas formigas também fossem queimadas.

Olhei para Dr. Facilier que carregava um arsenal de navalhas por baixo do seu paletó roxo. 

— Me lembre de novo porque não estamos usando armas de fogo.

— Não há armas o suficiente para todo mundo. - Cameron respondeu como se aquilo fosse uma resposta satisfatória. - Além disso, estamos travando uma guerra simbólica. O Lobo Mal quer que a nova era não venha com armas de fogo e todos os horrores que elas trazem.

Disfarcei o riso acariciando o meu lança-chamas.

— Claro.

 

 

ANNA

 

— Povo de Disney Land. - Um homem de meia-idade que se apresentou como Comandante Rourker bradou para a multidão com seu megafone. - Estamos diante da maior ameaça que a nossa nação já testemunhou. Estamos falando da própria morte em si. Da destruição de tudo que conhecemos e amamos. Vamos deixar que isso aconteça?

A multidão gritou que não. Olhei para o porrete com arame farpado que eu segurava. Havia sido o prêmio do concurso de bebida da noite passada. Além dele, ganhei uma ressaca irritante que insistia em não me abandonar.

— Muito bem. - Comandante Rourker continuou seu discurso. - Hoje vocês lutam por seus amigos e por suas famílias. Hoje vocês lutam pelo futuro!

Apertei a minha arma com força. Olhei à minha volta e só vi rostos desconhecidos. Família e amigos? Não tinha a muito tempo. Hoje eu lutaria por mim mesma. Custasse o preço que fosse. A imagem da minha irmã, Elsa, passou rapidamente pela minha cabeça. Balancei minha cabeça confusa porque já fazia anos que eu não tinha notícia dela. Estava morta com certeza.

Pelo menos uma vez na eternidade eu não senti falta da sua presença. Não demoraria até nos encontrarmos.

— Soldados! - O Comandante Rourker tirou um facão de guerra do seu cinturão e apontou em direção ao longíquio Castelo Negro. - Ao ataque!

 

 

LILO

 

Não muito distante de onde eu e Nani nos despedimos na madrugada passada, o nosso grupo de elite se reunia para discutir estratégia. Além de mim e Stitch, estavam presentes Taran, ainda vestindo sua armadura, Cobra Bubbles, Arthur, que olhava admirado para o comandante chefe do exército, Ralph, Vannelope, Jack Frost, o rapaz de cabelos brancos que eu havia conhecido, e Breu, um outro ex-guardião que parecia muito próximo de Jack.

Em cima do morro, observei os dois lados da guerra correndo em direção ao campo de batalha. Mesmo com tanta distância, era fácil observar a diferença entre os lados. Enquanto o nosso era organizado e quase uniforme, as frentes de batalha do inimigos pareciam distorcidas e separadas. O que era de se esperar, uma vez que eles trabalhavam com outros tipos de guerreiros no seu lado.

— O plano é simples. - Taran disse para nosso grupo que se reunia em um círculo. - Enquanto os dois lados se enfrentam no meio do campo de batalha, nós avançaremos em tocaia para invadir o castelo.

— Parece fácil. - Vanellope comentou com seu jeito despreocupado.

— Apenas parece. - Nosso comandante a cortou de imediato. - O Lobo Mal sabe que vamos tentar invadir a sua fortaleza. Foi o que fizemos anos atrás para destronar o Rei de Chifres.

— Certo. - Eu falei tentando acompanhar o rumo da conversa. - Então o que vamos fazer? Tentar entrar por alguma entrada secreta?

— Não adianta. - Taran respondeu de imediato. - Ele já deve ter lacrado todas as entradas alternativas, ele não facilitaria para nós. Imagino que a única entrada possível seja pela porta da frente.

— Mas, mas… - Vanellope pareceu assustada de súbito. - Lá deve ser altamente vigiado. 

— Sim. - Ralph concordou com pesar. - Eu dúvido muito que eles enviaram os seus melhores agentes para o campo de batalha. A elite deve estar guardando as portas.

Engoli em seco pensando em Shan Yu, o homem que havia assassinado Mulan, a pessoa mais forte que eu havia conhecido.

— Sim. Eu nunca disse que seria uma missão fácil.

— Os guardiões estão lá. - Jack Frost comentou com um sotaque forte de um estrangeiro, era a primeira vez que eu o via abrindo a boca. - A Lua acabou de se comunicar comigo.

— Sim. - Taran o olhou de forma imponente. - Espero que você saiba o que isso significa.

Jack Frost se limitou em encará-lo com gélidos olhos azuis. Foi Breu que falou em seguida.

— Nós sabemos, senhor. - O homem pálido e de vestes negras comentou. - Nós estamos prontos para fazer o necessário para salvar a Disney Land, pode ficar tranquilo.

— Bom. - O comandante respondeu de maneira seca. - Mais alguma pergunta?

Arthur, que estava observando o campo de batalha durante toda a conversa levantou a mão.

— Vá em frente.

— Senhor. - Ele comentou com uma timidez que não combinava com ele. - eu estava observando que o nosso exército está em muito maior número que na noite de ontem. O que houve?

Taran olhou para Cobra Bubbles apreensivo. Percebi que aquilo era algo que eles esperavam que ninguém notasse.

— Isso foi muito bem observado, Arthur. - Taran respondeu não demonstrando qualquer sinal de abalo na voz. - Estávamos trabalhando anteriormente com um número reduzido de soldados para a grande batalha, pois acreditávamos estar em clara vantagem numérica.

— Mas estimativas recentes dos nossos cientistas revelaram que teríamos mais chance de vencer hoje se utilizássemos toda a força disponível. - Cobra Bubbles continuou. - Cada homem e mulher apto para lutar.

— Espera. - Arthur olhou para o chão parecendo confuso. - Isso quer dizer que…

—  Todos estão aqui. - Taran revelou. - Inclusive os que não tiveram um treinamento avançado. Precisamos de todos.

— Hazel! - Ele levantou a voz. - Vocês trouxeram a Hazel para uma guerra?!

— Arthur, veja bem. É uma situação complexa. - Cobra Bubbles falou e eu percebi que ele tentava ser o mais humano possível. - Precisamos de todos os reforços possíveis para hoje.

— Ela não teve o treinamento necessário. Vai morrer lá fora. - Ele parecia perplexo. Ele pareceu apertar a sua espada, Excalibur, com mais força do que nunca. - Eu não posso deixar que isso aconteça. Ela é a pessoa que eu mais amo em todo o mundo.

Taran deu um passo para frente.

— Você está pensando em nos deixar para ir atrás dela? - Ele disse quase decepcionado. - Está pondo em risco todo o destino da nossa nação por causa dos seus interesses pessoais? Você, por algum momento, já pensou no quanto isso é egoísta? Está mesmo disposto a fazer isso?

Arthur deu um passo para frente olhando para o homem que um dia fora seu ídolo.

— Estou.

— Então vá. Mas deixe a Excalibur aqui. - Taran anunciou. - Você não é digno o suficiente para levantá-la.

Olhei preocupada para Arthur, um dos poucos amigo sinceros que eu fiz nesse mundo corrompido.

— Mas, senhor. - Tentei intervir. - Você não pode mandá-lo para o meio da batalha desarmado. É suicídio.

Taran me lançou um olhar castanho acusatório, como se me mandasse ficar calada apenas com a expressão.

— Essa é minha ordem.

— Muito bem. - Arthur disse sem medo. Ele deu as costas para o nosso grupo e foi até uma rocha de tamanho médio que estava esquecida por lá. Ele levantou a Excalibur e a fincou com força na rocha. - Que só uma pessoa digna consiga levantar essa espada.

Observei um dos meus últimos amigos se lançar de cima do morro e correr desarmado até o campo de batalha. A Excalibur estava fincada na pedra e eu tinha certeza que nunca sairia de lá. Ninguém era tão digno de levantá-la quanto Arthur.

 

 

HÉRCULES

 

Milhares de homens e mulheres corriam junto a mim em direção ao nosso inimigo em comum. Eu nunca assumiria isso em voz alta, mas me sentia eletrizado com aquilo. Estávamos correndo em direção ao futuro. Todo o resto da história dependeria de quão bem lutaríamos. Pensei em Phil em todo o seu treinamento. Com certeza valeria a pena.

Olhei de relance para Mégara que corria ao meu lado. Ela sempre teve uma cara fechada, mas hoje parecia estar mais focada que o habitual. Eu conhecia aquele olhar e sabia o porquê dele. 

Ela pensava em matar Hades.

Por mais que eu também desejasse ver o mundo livre de um verme como ele, não poderia deixar que aquele pensamento me consumisse. Os dois exércitos eram muito numerosos. A chance de encontrarmos uma pessoa específica era muito difícil. Não era esperto pensar em matar uma só pessoa quando o inferno grita ao seu redor. Uma ponta de preocupação por Meg surgiu, mas tratei de afastar rapidamente esse pensamento.

Ela era uma das mais fortes pessoas que eu já havia conhecido. Assim como não era inteligente perder um foco pelo ódio, também não era perder pelo cuidado. Ela saberia se virar.

Depois de mais um tempo de corrida, me deparei com meu primeiro inimigo. Um homem corpulento de barbas brancas. Me desviei do ataque de seu machado e rapidamente enfiei um dos meus facões em seu tórax.

Ao meu redor, os dois exércitos começavam a se chocar em diferentes pontos. Era oficial. A guerra pelo destino da humanidade começava agora.

 

 

PETER

 

Com exceção dos cães, os Meninos Perdidos era o grupo de guerreiros mais selvagem encontrado naquele campo de batalha. Nós não lutávamos como os outros. Enquanto o exército treinou todos para um combate organizado, nós nos virávamos com o que havíamos aprendido. Com o estilo da Terra do Nunca de guerrear.

Eu desviava por dentre de cada abertura do exército inimigo. Enfiava a minha adaga pelas costas de alguns soldados, de modo que ninguém percebesse que era eu fazendo isso, e depois fingia estar lutando do lado deles. Apenas para atacá-los novamente quando sua guarda estivesse baixa. Todo aquele processo era repetitivo e rápido, de modo que eles não percebiam o que estava acontecendo até que fosse tarde demais.

Era como se eu fosse a sombra de mim mesmo.

Eu sabia que alguns outros do meu grupo copiavam a minha tática. Tod, embora um tanto afobado, era quase tão bom quanto eu na astúcia de se infiltrar. Wendy, que havia melhorado muito nos últimos anos com a espada, era inteligente e sabia quando se infiltrar ou não.

Coelho Branco era veloz e corria de um lado por outro distribuindo golpes e confundindo os adversários. Vez ou outra eu o conseguia avistar enfiando suas lâminas nos inimigos.

Alice e o Chapeleiro Louco, no entanto, não eram tão sutis na hora de matar.

— Podem vir, seus vermes inúteis. - Eu ouvi a minha namorada gritar por entre gargalhadas. - Estão se sentindo com sorte? Pois venham com tudo que eu estou esperando. Nós somos todos loucos por aqui!

Me esgueirei por dentro de mais um grupo. Já estava pronto para enfiar minha adaga em uma mulher forte de cabelos cheios quando senti uma mão forte me segurar pelo ombro.

— Ei você. - O dono da mão disse com voz nervosa. Eu havia sido descoberto.

Tentei me virar a tempo, mas o homem negro e forte já havia levantado o seu facão para a minha direção. Em um milésimo de segundo, tentei me libertar de seus braços, mas a sua força era superior a minha, de modo que continuei preso. Me preparei para o golpe.

Foi quando mãos pequenas que seguravam um pano surgiram envolta do homem. O pano foi em direção ao nariz do meu agressor. Ele pareceu confuso por um instante, mas por fim caiu duro no chão.

Foi nesse momento que eu percebi que as mãos pequenas pertenciam a Sininho que me deu um sorriso vitorioso.

— Pó de fada. - Ela disse balançando o pano encardido como se fosse o maior tesouro já visto na humanidade. - Uma invenção de Tinker Bell LTDA. Me agradeça depois, Pan.

No meio da multidão, uma faca se aproximou das costas da minha salvadora.

— Sininho! - Eu gritei. - Cuidado!

De repente, um garoto de cabelos castanhos claros vestido com um capuz de guaxinim surgiu do nada e atacou seja lá quem segurava aquela faca. Cody nos deu um sorriso parecido com o que Sininho havia acabado de dar.

— Meninos Perdidos. - Ele falou orgulhoso para nós. - Unidos.

No mesmo momento que ele disse, uma lâmina de espada perfurou o seu crânio, destroçando todo o seu rosto em uma fração de segundos. Eu e Sininho demos um grito de horror. Fui até seu atacante e lhe cortei a garganta enfurecido.

Eu não deixaria que mais nenhum Menino Perdido morresse naquele dia.

 

 

ARIEL

 

Para onde quer que você olhasse haveria morte. Poderia ser soldados que perdiam a sua vida, ou literalmente mortos que vinham em sua direção. Lutávamos juntos eu, Jim, Butch e Amélia. A aparência fétida dos meus adversários que um dia me causavam horror, agora pouco me afetavam. Eu era bem mais forte do que a garota de anos atrás.

Eu carregava um tridente de batalha e o usava com facilidade para espetar a cabeça dos mortos que se acumulavam ao nosso redor. Não era difícil matar alguém que já não tinha vida, mas a quantidade deles que era o problema. Amélia usava luvas adaptadas que se assemelhavam a garras de tigre e as usava para perfurar a cabeça dos mortos. O Vagabundo carregava um simples taco de baseball, mas era bastante eficiente em seu manuseio. Jim, por sua vez, usava uma espada curvada típica de um pirata. Todas as nossas armas estavam ensopadas de sangue negro.

Formávamos um círculo, de modo que cada um pudesse cuidar da guarda dos outros. O exército havia nos informado que essa era a melhor tática para lidar com os cadáveres.

Meu tridente girava por entre as cabeças pobres dos mortos. Eu estava suando muito. Não sabia por quanto tempo eu deveria aguentar aquela situação, mas eu sabia que não poderia me deixar esmorecer.

Um morto pequeno veio em minha direção e esmaguei a sua cabeça com o peso da minha arma. Outro veio pela minha direita e enfiei uma das partes pontiagudas do tridente entre seus olhos. Uma defunta que parecia estranhamente recente veio em minha direção com rapidez, mas conseguí neutralizá-la com um chute para depois destroçar a sua cabeça. Eu percebi que estava ganhando ritmo e pegando o jeito da coisa. 

Fui avançando até mais e mais mortos e destruindo cada um deles. De repente, matar aquelas coisas se tornara automático. Por mais empolgada que eu estivesse, eu tomava cuidado para respeitar o perímetro do meu grupo, e não colocar a sua segurança em jogo.

Me deparei com um grupo de dez mortos e comecei a matá-los um a um. Quando retirei meu tridente da cabeça do último, percebi que Jim me observava de perto.

— O que você está fazendo aqui? - Eu disse para ele. - Vai quebrar a roda.

— Eu pensei que você estava em perigo.

Fui até ele e lhe dei um beijo rápido, apenas para lhe empurrar de volta para a sua posição.

— Jim Hawkins, vamos deixar uma coisa muito clara. - Eu falei girando com o meu tridente e acertando dois mortos no processo. - Eu não preciso que você se sacrifique por mim. Eu preciso que você viva por mim.

Jim me lançou um sorriso orgulhoso e correu de volta para o seu lugar na roda.

 

 

CRUELLA

 

Eu sempre odiei cachorros. Por mais impopular que fosse essa opinião, eu pouco me importava. Cães eram seres asquerosos que se empolgavam com qualquer coisa. Naquele momento, essa coisa era matar.

Ao nosso redor, eu podia ouvir gritos e latidos por todos os lados. Os cachorros eram os inimigos mais selvagens do lado da Lua. E aqueles que escolhiam lutar contra eles, eram os mais selvagens do lado da Disney Land.

Eu e Trevor lutávamos lado a lado. Eu carregava uma espada leve e ele uma estranha parafernalha em suas mãos que se assemelhavam a manoplas.

— Trevor. - Eu falei enfiando minha espada na barriga de um doberman. - Que diabos é isso?

— Luvas de confusão. Eu mesmo as projetei. - Ele disse apontando sua bugiganga para todos os lados. - Trabalha em uma frequência que confunde os cachorros. Por que acha que você está se saindo tão bem em matar essas coisas?

Eu demorei para responder. Pensando por um lado, os cães estavam muito menos selvagens que no nosso último encontro.

— Escuta esses gritos, DeVille. - Trevor disse enquanto socava um cão no focinho. O cachorro gemeu de dor. - Não esse ganido. Os gritos dos nossos soldados. Estão por toda a parte. Os cães estão acabando com a gente.

Pensei por um momento em Roger e Gaspar. Conhecendo a personalidade deles era claro que eles estavam atacando os cachorros naquele momento. E eles não contavam com a ajuda de Trevor para facilitar.

— Pinóquio. - Eu disse atacando um poodle assassino. - Às vezes eu prefiro quando você conta mentiras.

 

 

PACHA

 

Eu estava lá quando a cabeça de Horloge foi esmagada por um porrete sem qualquer aviso. Eu vi seu cabelo castanho ser tingido com o vermelho do seu sangue. Vi seus olhos pularem da sua face como as engrenagens de um relógio quebrado.

Eu também fui testemunha da morte de Lumière. Um homem de cabelos azuis o incendiou com um lança-chamas. Eu vi o rosto do homem mais espirituoso que eu conhecia ser derretido como cera. Eu imaginei que enquanto ele dava seus suspiros finais, ele suspirou todos os xingamentos possíveis em francês.

De pé ao meu lado estavam Esmeralda e Dumbo. Junto comigo, formávamos os últimos sobreviventes do Pátio dos Milagres. Toda a nossa história. Todo o nosso sofrimento. Todas as lembranças das pessoa que lá viveram. Tudo isso dependia de nós três.

Esmeralda era habilidosa com a espada e cortava a garganta dos inimigos como se não fossem nada. Dumbo era grande e carregava um pesado martelo de guerra. Já eu, carregava um facão improvisado e uma dose considerável de sorte.

Um homem magro e moreno veio em minha direção e lhe acertei com um soco no rosto. Me virei e consegui desviar de uma lâmina por um triz, apenas para ser atingido na perna. Encontrei a autora do ataque e enfiei o meu facão na sua barriga. Alguém chutou as minhas costas e eu quase me desequilibrei, mas consegui manter a minha base e revidar o ataque. Eu estava no meio do inferno.

Tentei avistar Esmeralda na multidão. Não havia sinal dela em lugar nenhum. Invés disso vi que Dumbo enfrentava cinco combatentes ao mesmo tempo. Assustados com o tamanho do meu amigo deviam ter se juntado apenas para atacar. Vi Dumbo esmagar a cabeça de um inimigo, e depois de mais outro, mas o terceiro, que era rápido, conseguiu enfiar uma a faca na sua barriga. Dumbo ainda conseguiu acertar a cabeça do terceiro, mas o restante dos atacantes continuaram a série de ataques no tronco do gigante.

Eu nunca ouvira a voz de Dumbo antes, mas naquele momento tive a impressão que ele chamava por sua mãe.

Gritei de dor. Alguém havia enfiado uma faca no meu ombro esquerdo. Justamente o braço que eu usava para segurar o meu facão. De repente, eu estava indefeso. Percebendo isso, uma garota de cabelos loiros e tranças veio até mim e enfiou uma navalha no meu peito.

A dor era insuportável e tive que ficar de joelhos. Fiz um último esforço para avistar Esmeralda no meio da multidão. E foi então que eu a vi. Uma lança estava atravessada em seu corpo que se encontrava completamente inerte. Ela também estava morta.

Senti mais facadas na minhas costas, mas essas já não doíam tanto. Minha visão estava começando a ficar escura e meus sentidos mais raros. Eu sabia o que viria a seguir.

Em uma instante, pensei em toda a minha vida. Na minha infância pobre. Na minha família. Chicha, Chaca, Tipo e Yupi. Todos mortos pouco depois do fim do mundo começar. Quem iria chorar a suas mortes agora? Pensei em Kuscotopia e em seu problemático ditador. E em como eu consegui transformá-lo em um amigo. Pensei no Pátio dos Milagres e em todos os que lá encontraram refúgio. Pensei em Esmeralda, Dumbo, Horloge, Lumière, Clopin. Pensei em mim. Pensei o mais forte que eu consegui porque eu sabia que seria o último da história a pensar em nós. Mesmo em dor, vislumbrei seus rostos por uma última vez.

Fechei meus olhos, pronto para ser esquecido na história.

 

 

CAMERON

Um fato curioso sobre a guerra. Um bom soldado, quando está nela, não é mais uma pessoa. Ele é parte de um pelotão. A sua individualidade dá lugar a uma ideologia. Por isso você continua a matar e a morrer sem nenhum problema. A sua ideologia continua vivendo.

Bem, eu não sou um bom soldado.

O engraçado é que eu pensei que eu era. Eu havia feito muita coisa pela minha ideologia. Havia me infiltrado no Pátio dos Milagres e acabado com todos eles. Eu ainda lembrava dos seus nomes. Clopin, Kuzco, Esmeralda, Dumbo, Pacha… Tantos outros. 

Mas a guerra estava em curso e eu percebi que gostava muito de viver. Soldados de Disney Land e do Castelo Negro morriam por todos os lados e eu sabia que não tardaria até que fosse a minha vez. Quer dizer, seria a minha vez se eu escolhesse ficar para lutar.

O que não era o caso.

Eu era conhecido por Homem das Sombras por algum motivo. Eu havia feito o reconhecimento do terreno muito meticulosamente antes da batalha. Sabia todos os atalhos e esconderijos. Eu não teria participação alguma no confronto. Eu viveria.

Era claro que o exército não perdoaria os meus atos se me encontrassem. Eu teria que viver à margem da sociedade. Mas isso era algo que eu já estava acostumado. Além disso, quem sabe? Talvez em alguns anos eles possam mudar a sua mentalidade sobre mim.

Eu era muito bom em fazer amigos do outro lado.

 

 

WENDY

 

Corri em direção a um homem alto e de tapa olhos, pulei em seu tronco, me agarrei em seu corpo utilizando as minhas pernas e cortei a sua garganta com a minha espada. Aterrizei no chão com cuidado e sorri vitoriosa assumindo a postura.

Olhei para o Chapeleiro Louco que corria alucinadamente perto de onde eu estava.

— Reginald. - Eu disse esperançosa. - Por favor, me diz que você viu isso.

Ele me encarou com seus olhos negros e elétricos.

— Vi o quê, Caxinguelê?

Soltei um suspiro decepcionada e voltei a batalha. Era claro para mim que os Meninos Perdidos eram muito bons no que faziam. Eu estava decididamente orgulhosa de todos eles. Em especial, de mim mesma. Enquanto eu enfiei a minha espada na cabeça de uma mulher ameaçadora, ponderei o quanto eu tinha mudado e o quanto eu continuava a mesma.

 Eu sempre tive que ser madura. Meus irmãos mais novos precisavam de mim. Eles não estavam mais entre nós, mas eu acabei ganhando uma nova família com novos irmãos. E eu sabia que eles precisavam de alguém para dar um puxão de orelha merecido aqui e alí. Mas ao mesmo tempo, eu tinha certeza que eu não era a mesma. A Wendy de Nova Londres não era tão boa com espadas quanto a da Terra do Nunca.

Nós avançávamos com rapidez por dentro do exército inimigo. Todos aqueles que estavam no nosso caminho eram apenas distrações. O nosso prêmio final estaria na cabeça do Capitão Gancho. Eu nunca esqueceria daquela noite. A noite em que ele cortou a mão do nosso líder e assassinou Nemo. O mais novo entre nós. O dono da melhor risada. A imagem de Miguel apareceu em minha mente. Foi como perder o meu irmão mais novo duas vezes.

Tropecei com tudo em algo que estava no chão. Assustada, tentei me levantar. Uma velha de cabelos roxos e olhos verdes veio em minha direção com um machado. Em um movimento rápido, saquei a minha espada e enfiei a lâmina em sua barriga. Me levantei cambaleante.

Olhei para o que eu havia tropeçado. Meu coração gelou ao ver um capuz de coelho sujo de sangue. Aquele era o Coelho Branco e dessa vez pensei em João.

E em como a minha família estava diminuindo.

 

 

ARTHUR

 

Chegar na batalha foi fácil, conseguir uma arma improvisada também, mas eu sabia que encontrar uma pessoa específica naquele mar de morte que era o verdadeiro desafio. Ainda assim eu deveria tentar. Era a vida de Hazel que eu estava em jogo.

Desviei de um corte de uma espada, e enfiei a minha faca na barriga do meu agressor. Com um pulo me joguei para cima de uma mulher esbelta do grupo adversário. Enquanto a utilizava de escudo, tentei procurar por algum sinal da minha namorada. Ela não estava em canto algum.

Larguei o corpo agonizante do meu escudo humano e corri para o leste. Ela tinha que estar em algum lugar. Durante o meu trajeto, eu me concentrei muito mais em desviar de ameaças que tirar vidas.

Um porrete de arames farpados voou para a minha direção e quase acertou a minha cabeça. Olhei assustado para a origem do ataque. Era uma jovem de olhos azuis quentes e cabelos laranjas. Eu a reconhecia da noite de ontem. Era Anna de Arendelle que havia se tornado quase uma celebridade no acampamento por ter sido a vencedora do concurso de bebida.

— Ei. - Eu disse irritado para ela. - Cuidado com quem você acerta com isso. Você pode acabar acertando um dos nossos.

Sem parar para ver o seu rosto, me joguei na multidão em busca de Hazel.

 

 

HADES

 

Eu havia vivido uma vida boa até então, mas nada havia preparado para o melhor momento da minha vida.

Caos. Em sua maneira mais pura, caos. Não importava em que direção você olhasse, encontraria um cena de horror acontecendo. Pessoas que se diziam boas enfiavam lâminas no coração de desconhecidos. Cães arrancavam rostos. Mortos comiam vivos. E, claro, corpos eram queimados.

Eu nunca fui bom no mundo real. Sempre fui o filho indesejado, o delinquente, a decepção. Sempre vivi na sombra do meu irmão. Talvez por isso minha pele fosse tão cinzenta. Talvez por isso que eu necessitasse das minhas chamas. Eu precisava iluminar o mundo.

Por isso, naquele momento, eu fui completamente feliz. Meu lança-chamas queimava desarbitrariamente os combatentes. Para ser completamente honesto, eu não estava nem vendo se minhas vítimas lutavam ao meu lado. Aquilo não importava. A única coisa que importava era que eu fizesse o maior número de vítimas. Queimasse o maior número de pessoas. Para que assim eu queimasse todo o mundo.

Para que assim eu iluminasse a minha vida.

 

 

MÉGARA

Meu coração parou quando vi aquelas chamas azuis limparem o campo de batalha. Minha mente se transportou para anos atrás, para a pior época da minha vida. De repente tudo veio à tona. O zoológico, Adônis, os abusos que meu corpo e mente sofreram. Uma alma por outra. De alguma forma, eu tinha certeza de quem era o autor daqueles ataques de fogo.

Virei-me na direção de Hércules que empurrava uma mulher para longe.

— H, é ele. Olha lá. - Por um momento, Hércules deixou-se distrair para olhar para onde eu apontava. Ele concordou relutante. - Vamos.

Pude ver que ele estava aturdido. Pelo que eu conhecia do meu companheiro de viagem, aquele cenário em nada combinava com ele. Hércules havia sido criado para ser um herói, mas aquilo não era um ato de heroísmo. Era um cenário cruel de guerra e nada o havia preparado paras os horrores que isso trazia.

Mesmo assim, ele me acompanhou. Eu sabia que ele também tinha contas a acertar com aquele monstro. Mas foi então que ouvimos um grito alto de socorro. Parecia impossível ouvir algo no meio de todo aquele caos, de modo que a autora do grito não deveria estar longe. Nós dois sabíamos disso.

Hércules pareceu vacilar. Olhei para ele enquanto desviava de um ataque inimigo. Pude ver que ele estava dividido. Algo em seu interior queria acabar com a vida do homem que matara seu pai biológico, aquele que havia roubado a sua existência por completo. Mas, havia outra parte em Hércules, uma parte ainda mais forte, que aspirava por outra coisa.

E foi então que eu entendi o que diferenciava eu e ele. Hércules era um herói completo, seu maior instinto era salvar vidas. Eu estava mais interessada em me vingar. Eu sabia também que não era a minha culpa, que nunca seria. Que algo em mim estava morto a muito tempo e que talvez eu nunca superasse. Isso doía demais e eu sabia que não poderia levar mais alguém comigo.

— Vai na frente. - Eu disse no tom mais reconfortante que consegui. - Eu te encontro depois.

Hércules olhou para a minha direção. Seus olhos claros de herói me encaravam com algo

que eu não havia decifrado por inteiro o que significa.

— Apenas… - Ele disse finalmente desviando o olhar. - Tome cuidado. A gente se vê depois.

Dizendo isso, meu melhor amigo correu em direção ao grito que havíamos escutado. Soltei um sorriso triste. Dei as costas para ele e olhei determinada para as chamas azuis que cresciam no cenário de guerra. Uma alma por outra.

Corri em direção ao meu pesadelo. Eu desviava de lâminas e porretes como ninguém. Em pouco tempo eu encontrei o autor das chamas. Hades. Ele queimava um grupo de combatentes que eu nunca havia visto antes. Não me admiraria se fosse alguém do seu próprio lado. Seus olhos amarelos se viraram em minha direção.

— Mégara. - Ele disse com sua voz asquerosa que me fizeram perder tantos sonos. - E eu pensando que esse dia não poderia melhorar.

Em resposta, ergui o meu facão.

— Ok, ok. Já entendi que você está um pouco chateada. Nosso último encontro foi um pouco desagradável. Quer falar sobre isso querida?

Já havia suportado as baboseiras daquele monstro por muito tempo. Corri em sua direção com o facão em punhos. Hades me olhou como se estivesse decepcionado com algo.

— Você não deveria ter feito isso.

As chamas incendiaram meu corpo tão rápido que tudo pareceu um sonho. A dor era extrema. Depois de ter tirado tudo de mim, ele conseguiria se safar.

Ele veio até perto de mim para falar algo. Eu já não conseguia entender o que ele falava, mas devia ser algo sarcástico. Algo engraçado. algo esperto. Algo cruel. Algo, acima de tudo vazio. Esse era Hades. E era por isso, que ele morreria comigo.

Com o meu corpo em chamas, reuni todas as minhas energias pela última vez. Senti toda a força do Adônis, da Cinderela, de todas as vítimas daquele monstro. Ele não sairia ileso. Não dessa vez.

Senti minha arma penetrando o peito de Hades. Permaneci em pé pegando fogo até ver seu corpo cinzento caindo com tudo no chão.

Finalmente, eu pude descansar.


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