Lábios de dor escrita por Lipe Muliterno


Capítulo 2
A enfermaria




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/526394/chapter/2

Filipe e Thalles podiam ver em um dos cantos da sala os médicos caídos.

O primeiro médico, um senhor na casa dos 60 anos de idade, está encostado em um dos armários, de um rasgo em seu ombro pendem veias, artérias e tecido muscular, também é possível ver sua clavícula. Seu pescoço também está aberto e muito sangue sai de sua carótida manchando sua barba branca e pintando seu jaleco de vermelho, a posição da cabeça ajuda isso, jogada e contorcida sobre o ombro esquerdo deixa a ferida bem exposta. Ele também tem uma das pernas em um ângulo surreal, provavelmente fraturada pela mesa que está em cima da mesma.

Já o segundo médico tem seu antebraço pendurado e preso apenas por uma fina tira de pele, ele parece ser jovem, Filipe arrisca uns 25 anos pelo corpo, mas, não dá pra saber ao certo graças ao seu rosto talhado e rasgado e o globo ocular estourado, se dependesse do rosto ele com toda certeza do mundo não seria reconhecido, sua mandíbula parece ter escorregado para o lado direito quando o corpo caiu no chão e onde seria sua orelha existe apenas um vazio e a entrada do ouvido que sangra.

Filipe vira o corpo com a ponta do pé e se arrepende por isso, o jaleco está aberto expondo a camisa, antes branca, rasgada e o abdômen aberto dando visão do interior de seu corpo, é possível ver o estomago rompido e tudo o que o homem comeu espalhado por ali, os intestinos também foram comprometidos e isso empesteia o ar com o cheiro desagradável. Filipe se contorce de nojo ao ver que alguns órgãos ainda se contraem e relaxam devido a espasmos.

–Lipe. – Chama Thalles de forma lenta, provavelmente afetado pela cena.

–Diga. – Responde Filipe com o mesmo tom.

Thalles não responde nada, mas, aponta para a janela e Filipe vira encontrando, dessa forma, mais um corpo.

O corpo está cheio de sangue e está em uma posição como se fosse pular pela janela.

Tanto Filipe quanto Thalles reconhecem o corpo e certo desespero preenche o peito de ambos.

Filipe cria coragem, caminha até o corpo e o tira da janela, deita o corpo no chão e começa a analisar. Apesar da aparente calmaria que ele transmite, um desespero toma conta dele por dentro. Ele se lembra de tudo que já passaram juntos, uma lagrima rola por seu rosto e cai sobre o corpo.

Aquele corpo por si só já o teria o chocado o suficiente, combinado com todo o resto da cena ele se desligou e o corpo está agindo como que por um piloto automático.

A boca e os dentes antes sorridentes e limpos agora estão cobertos por sangue, pele e carne humana. Do olho do cadáver se projeta um bisturi que entrou fundo o suficiente em sua cavidade ocular pra atingir o cérebro e causar transtornos que ocasionaram uma decorrente hemorragia e morte cerebral.

Filipe nunca imaginou encontrar o corpo de Victor aquele estado.

–Lipe, fica calmo. – Pede Thalles.

–Onde está a Isa?

Thalles fica em silêncio pensando.

–Ela entrou aqui com Victor e os médicos, mas, cadê o corpo dela?

–Não faço ideia, Lipe.

Neste momento o senhor de 60 anos começa a se mover no chão e puxar a perna que está sob a mesa.

–Me ajuda, Lipe, ele está vivo. – Pede Thalles desesperado.

Filipe observa Thalles levantar a mesa, mas, em vez de o senhor tentar se levantar, ele simplesmente se joga sobre Thalles.

Os dois caem e Thalles está por baixo. O senhor lança mordidas em direção ao rosto de Thalles que desvia das investidas com dificuldade, ele está enjoado devido ao cheiro de sangue e a visão dos olhos leitosos.

Filipe corre para ajudar mas algo segura seu tornozelo fazendo-o cair e bater a lateral da cabeça contra o chão, ele fica desnorteado, saca seu revolver Taurus 85 de calibre 38 e efetua cinco disparos na direção do agressor, nenhum bem sucedido. Enquanto isso, Thalles consegue lançar o corpo do velho para o lado e se levantar, o velho no chão tenta o agarrar mas ele chuta seu rosto torcendo assim ainda mais sua cabeça. Filipe livra seu pé e se arrasta para perto do amigo. Os corpos se levantam e começam a ir à direção dos dois que apenas fecham os olhos e esperam por sua morte devido ao cansaço e assombro.

Os médicos já se aproximaram muito e um se lança sobre Filipe que trava os dentes esperando o ataque.

Então um estrondo seguido de outro igual preenche a sala e faz os ouvidos dos amigos apitarem. Filipe sente o corpo caindo por cima dele, mas, quando abre os olhos encontra o médico que se lançou sobre ele com um grande buraco pouco acima da sobrancelha esquerda, ele tira o corpo de cima dele e mais a frente vê o outro médico com uma ferida semelhante no meio da testa, acima da ponte nasal.

–Mister e Lipe, vocês estão bem?

A voz familiar desperta de vez Filipe que se levanta e virando para a porta encontra Isadora empunhando um revolver Rossi de calibre 38.

–Acho que sim. – Responde Filipe tirando pedaços de massa encefálica de sua roupa.

–O diretor está convocando todos para o auditório. – Alerta Isadora se virando e saindo pelo corredor.

Filipe e Thalles a seguem em silêncio, respiração pesada e ofegante, suor escorrendo por todo o rosto se misturando com o sangue e os batimentos estão acelerados.

Eles entram no auditório, todos os presentes se viram e os encaram.

Somente agora os três amigos notam o estado de suas roupas.

Filipe está sem seu chapéu e com a farda completamente suja de sangue, pedaço de ossos, pele humana e massa encefálica. Thalles está mais limpo, apenas suas costas foram molhadas no sangue, porém, foram encharcadas e pingam enquanto ele anda. Isadora é a melhor entre os três, poucas gotas mancham seu jaleco e seu rosto, ela ainda carrega o revolver e sua calça está rasgada na perna direita.

Sussurros e murmúrios invadem o grande salão, mas, são logo interrompidos por uma voz vinda das caixas de som.

–Boa tarde a todos, convoquei-os aqui devido aos recentes acontecimentos dentro desta unidade estudantil.

A atenção de todos é levada para a frente do auditório.

Itamar, diretor do colégio de cadetes, 78 anos, 2.11 metros, afrodescendente, usa tapa olho e possui uma cicatriz que atravessa seu rosto desde a extremidade esquerda da boca até a ponta da orelha. Itamar perdeu o olho quando criança graças aos estilhaços de uma bomba detonada perto de onde estudava.

–Passarei agora para vocês o vídeo de uma das câmeras de segurança de nossa enfermaria, as cenas são fortes e vocês tem permissão para se retirar do recinto a qualquer momento.

As luzes se apagam e o projetor é ligado se direcionando para o telão. O arquivo de vídeo é aberto e dão inicio a ele.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Lábios de dor" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.