Meus dias sombrios escrita por Clarice


Capítulo 11
Capítulo Dez


Notas iniciais do capítulo

Ainda estão se segurando? Não? Pois voltem a segurar!
Obs:. Amo este capítulo mais do que minha própria vida...
(Aviso quando puderem se soltar, os próximos capítulos todos serão bem intensos, então...)
Boa Leitura!



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Capítulo dez

–Alô, Matheus? - Eu não iria sair de novo sem falar nada com ele. Matheus estava de plantão, só voltaria pra casa sábado a tarde.

–Luísa?

–Eu vou sair. -Não queria pedir, ele provavelmente não deixaria. Ou melhor me "recomendaria" que ficasse em casa, me tratando como a uma paciente idosa.

–Você o quê? -Ele ficou atônito e irritado ao mesmo tempo.

–Vou sair, vou no Circo com a Vanessa. -Respirei fundo, não queria que aquela conversa tivesse o rumo errado. -Eu preciso de um pouco de ar. Não sei quando volto pra casa.

–Claro que não! Luísa, você acabou de passar por uma situação traumática! -Ele falava como se o fato de eu querer sair fosse o maior absurdo do mundo e não era.

–Eu estou bem! -Reclamei.

–Você não tem como saber isso. Você não sabe. -Ele parecia muito nervoso, e ao mesmo tempo tentando controlar o próprio nervosismo, aquilo estava me assustando. - Amor...

–Não adianta, você não vai me convencer. -Bati o pé. - Já estou me arrumando, e além do mais...

–Você simplesmente não pode! -Ele berrou, do outro lado da linha. Criou-se um silêncio confuso, e então ele recomeçou, amansando a voz :

– Não de novo, você é frágil, será que não entende? -Ele parecia muito angustiado, eu não conseguia interpretar aquilo. -Você não vai aguentar!

–O quê? -Gritei, estava ficando nervosa. - Como assim de novo? , Matheus, do que você está falando? -Ele respirou pesadamente do outro lado da linha.

–Amor, fique em casa. Me prometa que vai ficar em casa só hoje. -Sua voz era um murmúrio.

–Eu não estou entendendo mais nada! -Eu queria pressioná-lo, mas um medo incabível me fez terminar aquela conversa desajeitadamente. - Nada, Matheus. Eu vou sair, quando você chegar em casa a gente conversa. Tchau. -Desliguei na cara dele. Fiquei um tempo pensando nas palavras que ele me disse "não de novo" De novo o quê? Aquela fora a primeira vez em que eu fui assaltada. De novo o quê? O interfone tocou, fui atender e era Vanessa. Eu não tinha me maquiado ainda, e meu vestido faltava fechar o zíper. Mas eu a mandei subir.

Corri para calçar os sapatos, fechei o vestido e abri a porta do apartamento. Ela entrou e ficou esperando no sofá, sentadinha como uma criança comportada. Estava com um vestido muito bonito, que contrastava com a cor de seus olhos. E os cabelos soltos. Parecia uma moça adorável. Eu terminei de me arrumar e descemos. Ela foi dirigindo. Tinha um carro bem bonito, apesar de barato. E dirigia bem. Talvez até um pouco melhor do que eu.

–Aconteceu algo?

–Quê? -Eu estava desprevenida quando ela perguntou. Olhando a rua.

–Você. Quando abriu a porta pra mim estava com uma cara atônita. Aconteceu algo?

–Não, nada. Eu... É só que... Meu marido. Ele agiu estranho agora, quando liguei pra ele para avisar que estava saindo. -Respirei fundo, não queria ficar nervosa. -Ele parecia um louco. Mas não quero ficar pensando nisso.

–Certo. -Ela disse, enquanto colocava uma mecha de cabelo atrás da orelha para melhorar na visibilidade. -Você está bem bonita. -Comentou sem me olhar.

–Você também. -Respondi prontamente, como se precisasse dizer aquilo e só estivesse esperando uma oportunidade.

Ficamos bastante tempo num silêncio meio desajeitado. Até que Vanessa começou a falar:

–Na verdade não é exatamente um circo. Está mais para parque de diversões, ou sei lá. Talvez seja as duas coisas.

–Parece bem divertido. -Eu fui esquecendo aquela conversa estranha e tentei me animar.

–E a gente já está chegando.

Era tudo tão grande e colorido. Aqueles barracões enormes, e roda gigante, barraquinhas de comida e tiro ao alvo e tudo estava tão iluminado. Carrossel e aqueles brinquedos enormes de altura, eu me sentia como uma criança, uma excitação tão grande que não me cabia. Cheiro de algodão doce e pipoca, famílias passeando. Crianças e adolescentes correndo pra lá e pra cá. Palhaços enchendo bexigas...

–Como isso estava na cidade e eu não vi? -Perguntei, atônita.

–Pois é. -Ela disse, rindo, e me puxou pelo braço. -Vamos!

Lá ventava bastante porque era em campo aberto. Fomos na canoa, no kamikazi, na montanha russa. Era tanta adrenalina que eu ficava rindo e ao mesmo tempo não parava de gritar. E em alguns Vanessa morria de medo e segurava na minha mão como uma criança. Tinha pula-pula e crianças correndo pra lá e pra cá com os rostos pintados. Aquele lugar tinha uma energia tão especial. No carrinho de bate-bate eu não fazia nada além de persegui-la e prensá-la enquanto ela tentava sair dali. Era tão engraçado que mesmo depois que saímos eu continuei rindo da cara de mal humorada que Vanessa fazia. Comemos cachorro-quente e dividimos o refrigerante. Tudo estava sendo tão mágico. Fomos na roda gigante, e era tão lindo ver o mundo de lá de cima. Dava para ver mais ao longe a cidade, e logo abaixo de nós o circo/parque todo. A gente ia entrar na lona da apresentação dos palhaços, mas Vanessa me disse que não gostava pessoalmente de palhaços. Deixamos pra lá.

Perto das barraquinhas de comida, tinha aquelas em que temos de acertar o pato pra ganhar uma pelúcia. Eu tentei sem sucesso, Vanessa conseguiu um ursinho pequeno e meio sujo. Ela me deu de presente, eu fiquei feliz como se fosse algo tão valioso. Como se de alguma forma aquele ursinho estivesse eternizando o momento, e a sensação que eu sentia. Foi um dos melhores presentes que já ganhei na vida. Tomamos um sorvete quando passamos frente a uma barraquinha de cartomante. Vanessa parou e ficou olhando:

–Você acredita nessas coisas? -Perguntei.

–Eu acredito em tudo até o momento em que não acredito mais. -Ela me respondeu, e riu. -Você tem medo? -Me perguntou, me encarando. Minha hesitação em responder fê-la rir de mim.

–Eu não tenho medo! -Afirmei com a certeza inabalável.

–Então vamos ver nosso futuro! -Ela me puxou pela mão e entramos na barraquinha.

A mulher devia ter uns cinquenta anos. Tinha os cabelos cheios e cacheados, a pele morena. Um lenço vermelho na cabeça, e brincos coloridos, aquela roupa de cigana. Velas acesas que pareciam não fazer fumaça. O lugar tinha um cheiro forte de não sei o quê; Havia uns tecidos pendurados nas paredes e na mesa onde ela tirava as cartas. Vanessa pagou por nós duas. Estava excitadíssima. A mulher tinha um olhar misterioso sobre nós, tentando nos desvendar apenas nos olhando. A mão dela era cheia de anéis, ela tirou as cartas de Vanessa primeiro. Disse que não dava para ver muito sobre o futuro dela, disse que parecia tudo incerto. Eu não entendia direito. O que a carta dizia, o que significava e a maneira de ela interpretar o que via. Além de dizer que o futuro de Vanessa era incerto, disse que ela já havia se machucado muito no amor. E que, no entanto, via uma paixão avassaladora num futuro próximo. Eu fiquei tão animada com aquela previsão, que quis que a mulher fosse ver logo qual era o meu futuro. Ela embaralhou o baralho e o colocou sobre a mesa. Seguiu-se o ritual. Ela tirou umas cartas.

–Vou olhar o passado primeiro. -Ela disse, como havia feito com Vanessa. E então ela tirou uma carta e me olhou profundamente. Eu nunca tinha recebido um olhar tão profundo, e ao mesmo tempo eu não entendi nada. Ela fez então cara de assustada. Como se tivesse visto algo terrível e inimaginável. Não terminou de tirar minhas cartas, me enxotou de lá. De repente pareceu óbvio a mim que meu passado era terrível. Mas que passado era esse, que eu não conhecia? Logo a frase de Matheus bateu em mim como um tapa na cara. "De novo não"... Eu não conseguia me lembrar de nada. O que havia me acontecido?

–Não acredite em tudo o que ouve por aí. -Vanessa me disse, me segurando pelos ombros Me olhava nos olhos. -Não acredite.

–Acha que ela viu o quê sobre o meu passado?

–Não sei. Talvez não tenha visto nada, talvez seja louca. -Ela respirou fundo. -Não fique grilada com isso.

–Será que ela viu o assalto? -Cogitei, ignorando o conselho que recebi. -Assaltos são comuns, ela não teria uma reação tão explosiva...

–Olha, pare de pensar nisso, certo?

–Vou tentar. -Prometi. Mas era quase impossível. Comecei a me sentir estranha, um nervosismo crescia dentro de mim. Senti medo, como se tivesse algo muito ruim eminente em minha vida. -Me abrace. -Pedi a Vanessa. -Me abrace muito forte. -Ela obedeceu prontamente. Meu coração estava muito acelerado. Terrivelmente acelerado.

–Quer que eu te leve pra casa? Precisamos descansar, estamos andando a horas. -Ela tentava amenizar as coisas.

–Vamos, acho que já vimos o que tínhamos pra ver. Só quero uma maçã do amor.

Fomos andar pelo parque em busca de uma maçã do amor. Achamos, Vanessa não queria mas no fim comeu a minha mais do que eu, porque enjoei rápido. Fomos para o carro. Estava muito frio, tão frio que quando eu sentei no banco e fechei a porta do carro, senti um alívio enorme, como se tivesse entrado numa casa com aquecedor. Ela não ligou o carro de pronto. Me olhou um instante, parecia hesitar no que iria dizer.

–Talvez parte do discurso da cartomante tenha sido verdadeiro. -Ela me disse. Eu estava confusa, não peguei direito.

–Que parte?

–Sobre eu estar apaixonada. -Estávamos tão próximas, que ela não precisou fazer esforço algum para aproximar a boca da minha. Eu estava sem reação, meu coração acelerou e eu fechei os olhos. Senti seus lábios tocarem os meus, e abri a boca. Sua língua estava com gosto de maçã do amor. De repente foi como se eu tivesse ficado viciada naqueles beijos com gosto de maçã do amor, e não parávamos de nos beijar. Eu não pensava em consequências, não pensava que era casada. Não pensava em traição. Ou em estar beijando uma outra mulher, mas era exatamente aquilo que eu estava fazendo. Vanessa tinha sobre mim, desde o dia em que nos conhecemos, uma certa força hipnótica. Talvez por isso eu sempre me esforçasse tanto por estar perto dela. Era quase inevitável, como um imã se sentir atraído por outro. Mas chegou um momento em que paramos. Eu quase não tinha fôlego. A boca dela estava rosa, e respirava ofegante.

–Me desculpe. -Ela disse, e deu partida no carro.

Até chegarmos ao meu apartamento, não conversamos mais sobre o ocorrido. Paramos no estacionamento do meu prédio. Ela me olhou de novo, havia algo de temeroso em seu olhar.

–Talvez não devamos mais nos ver. Não quero te deixar confusa nem nada. Nem destruir seu casamento. Eu juro que não... -Eu fiz com que se calasse segurando seu rosto.

–Ninguém aqui é inocente. Eu também queria. Eu quero agora. -Eu nunca me veria dizendo isso, mas voltamos a nos agarrar como se fôssemos dois adolescentes cheios de hormônios. Eu não sabia o que tinha dado em mim, era como se nada daquilo fosse real. Era como um sonho que habitava o profundo do meu inconsciente. Subimos para o meu apartamento. Eu fui beber um copo d'água.

–Você quer alguma coisa? -Eu perguntei da cozinha.

–Eu quero muitas coisas, eu não sei. -Ela respondeu, rindo. Ambas estávamos em um estado de ebriedade que não era possível chegar com bebida alcóolica. Era outro tipo de ebriedade.

Ficamos sentadas no sofá da sala.

–Matheus vai chegar amanhã lá pelas duas da tarde. -Eu disse. Ela continuou tensa, sentada recolhida como se estivesse sentada frente à diretora da escola, ou algo assim e fosse uma aluna muito levada.

–Você quer saber onde eu moro?

–Vou tomar um banho, pegar uma troca de roupa...

–Não precisa. -Ela me interrompeu com urgência. -Não precisa de nada. Vamos. - Me pegou pela mão, descemos. Corremos até o carro, de tanta ansiedade. Ela deu partida e fomos.


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Notas finais do capítulo

Au Revoir!



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