Alizée et Chermont escrita por Velvet


Capítulo 10
Dix


Notas iniciais do capítulo

E eu sumi outra vez, mas quero dizer em minha defesa que o capítulo tava pronto fazia eras, só que eu tava achando uma bosta e não tava com vontade de ler, pra vocês verem, aí acabou que eu mudei umas coisinhas e acho que fica até legalzinho em algum ponto.
Pro caso de já não ter dito: queria agradecer muito a Seraf1mR por ter recomendado a história! Minha primeira recomendação, gente, que emoção! Mas não deixem essa recomendação se sentindo solitária, vão lá e mandem outras pra fazer companhia!



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Eu não me levantei conscientemente, era mais que simples educação, em um segundo eu estava de pé, Amelie com a boca aberta, pronta para repreender pela brusquidão, como se eu fosse um garoto de dez anos.

Alizée, que antes tinha os traços tensos e os olhos assustados, colocou um sorriso corajoso no rosto.

– Desculpem-me, não queria fazê-los esperar – ela se aproximou da mesa e eu aproveitei que já estava de pé para afastar a cadeira ao lado da minha para que ela se sentasse.

– O que aconteceu? Por que você estava com aquela cara? – Sussurrei no ouvido de Alizée enquanto ela se sentava, mas ela só sussurrou um “depois” em resposta.

Nós nos sentamos e eu sentia os olhos de Amelie pousados em mim, o silêncio desconfortável em casa molécula no ar. A mão de Alizée escorregou para o meu colo e apertou a minha, minhas sobrancelhas juntaram de preocupação, mas eu só fechei sua mão dentro da minha e não disse nada.

– Bem, nós só estamos esperando Pierre, ele não deve demorar – Amelie se desculpou pelo marido e passou a nos analisar do outro lado da mesa, até a chegada do marido.

– Um investidor, eu tive que atender, me desculpem pelo atraso – ele disse entrando no salão e sentando à cabeceira da mesa.

Pierre Chevalier era o tipo de pessoa que mesmo se desculpando conseguia parecer mais arrogante do que se tivesse ficado de boca fechada, era o tipo de postura prepotente que havia visto nele durante toda a vida.

Amelie acenou para a copeira e logo em seguida a entrada foi servida. Chegou e passou, assim como a salada que foi e veio antes do prato principal. Eu acolheria o silêncio agradavelmente, mas Amelie se ocupou de conduzir uma conversa educada (com algumas farpas, mas surpreendentemente moderada) com Alizée. E Alizée parecia tão suspeita quanto antes, sua atuação até ali havia me tirado um peso do coração que eu não sabia que existia, mas agora ela parecia cada vez mais distraída, com expressão vaga e voz distante.

Nos últimos pouquíssimos dias, tudo com o que eu havia me preocupado era com que Alizée aceitasse minha proposta, a perspectiva de que ela não fosse boa mentirosa o suficiente, só me passou pela cabeça quando eu a vi contornando perguntas com maestria e respondendo polidamente o básico, levando o assunto para Amelie, evitando dizer qualquer coisa comprometedora sobre a elite da Provença a qual, supostamente, pertencia.

Novamente, meu avô e eu só nos sentamos calados, participando da conversa somente quando uma pergunta direta tinha que ser respondida, eu rezando para que aquilo acabasse, e não duvido que ele estivesse fazendo o mesmo.

Quando o prato principal foi trazido, Alizée já havia minguado o suficiente para que o barulho da conversa das duas soasse desanimado, ela colocava a mãe na testa vez ou outra, não sei se dor de cabeça real ou simulando uma como desculpa para sua mudança gradual de humor.

– As coisas estão indo bem no banco? – Perguntei diretamente para Pierre, tirando a pergunta do nada, preenchendo o silêncio desconfortável e livrando Alizée de outro round. Pierre ergueu uma sobrancelha e limpou a boca com o guardanapo de linho.

– Não achei que se interessasse pelos assuntos do banco – a crítica aberta fez com que eu me arrependesse de ter aberto a boca.

– Eu li no jornal recentemente sobre algumas propostas políticas que vem pavimentando o caminho do Chevalier & Co – o tom lascivo de Alizée cortou o ar antes que eu pudesse pensar em uma resposta -, eu me pergunto se são assim tão importantes – olhei para ela tentando esconder minha surpresa, até duas horas atrás ela não sabia nem quem era meu avô, e agora fazia comentários como se lesse a coluna de economia todo dia.

– Sua namorada parece entender mais de negócios que você, Chermont – meu avô não perdeu a chance de lapidar minha dignidade, mas o tom era bem mais sério do que o ar de repreensão normal dele, era verdadeiramente irritado. Relanceei olhos entre Alizée e Pierre, minha testa franzida. Enquanto Alizée mastigava um pedaço da sua comida, tentando parecer alheia a tensão, Pierre segurava o cabo da faca com força, os tendões se sobressaindo, embora suas feições tivessem se acomodado em uma máscara séria.

[...]

Olhei pelo relógio outra vez e observei o ponteiro se arrastar até marcar dez horas em ponto. Peguei a xícara de café que tinha em mãos e coloquei em cima da mesa de centro, movimentos lentos para não denunciar o quão desesperado eu estava para ir para casa.

– Vamos? – Perguntei para Alizée, e ela concordou com a cabeça, sorrindo em seguida para Amelie, que alegou que ainda era cedo. – Nós já estamos abusando da hospitalidade.

– Foi muita gentileza terem nos recebido, muito obrigada – Alizée disse, muito educada.

Pierre não perdeu nenhum tempo com falsas adulações e apertou a mão que eu lhe estendi, Alizée e eu já de pé. Amelie se levantou para nos conduzir ela mesma até a porta, foi irredutível ao nos proibir de ligarmos para a companhia táxi, emprestando o próprio motorista para nos levar até em casa.

Do lado de fora, dispensei o motorista de ter que abrir a porta do carro para nós e senti o desconforto dele, a figura de Amelie podia ser vista atrás das janelas, pairando sobre nós com sua silhueta de luz vinda de dentro da casa.

Alizée colocou sua elegante figura para dentro do carro e eu olhei ao redor incomodado, sem me dar ao luxo de respirar, aliviado, não até ter saído do alcance dos ouvidos de Amelie e Pierre.

As janelas fumês eclipsavam a luz do lado de fora, o trânsito lento nos prendia no meio da avenida larga, o interior escuro do carro parecia carregado. Eu não me atrevia a dizer nada, porque eu tinha certeza que a primeira coisa que Amelie iria fazer seria interrogar o motorista.

Minha mão escorregou até a de Alizée e apertei com força, ela tirou os olhos da janela e me encarou, profundamente compenetrada em alguma coisa, tanto que seus olhos demoraram a focar em mim.

Todo o estresse que nublava minha mente e tencionava meus músculos, se esvaiu em dois segundos.

Eu me aproximei dela sem perceber, e ela se aproximou de mim também. Se era certo, se era errado, se eu devia, se eu não devia, se eu podia, se eu não podia, isso eu não notei. Eu só sabia que era o que eu queria e ela também.

O tecido do vestido preto que ela usava estava frio, mas a pele dela era quente, e os lábios também, queimavam de encontro aos meus.

Alizée sabia exatamente o que fazer, eu também. Eu devia e eu podia, eu tinha essas duas certezas enquanto a mão dela descia dentro do colarinho da minha camisa.

– Nós vamos descer aqui, obrigada – Alizée falou para o motorista, ao se afastar de mim e abrir a porta do carro. Nós estávamos parados em um sinal e ela só me puxou para fora do carro, sem esperar por reação do motorista.

O sinal estava prestes a abrir e nós fomos até a calçada direita, os saltos de Alizée batendo no asfalto conforme ela corria, minha mão segura na dela. Ela continuou andando quando chegou do outro lado, sem mostrar dúvidas de onde estava ou para onde estava indo, eu só seguia ao seu lado, meus dedos entrelaçados nos dela.

Me situei depois de uma quadra, a placa presa no muro mostrava que nós não devíamos estar a mais de duas ruas do rio. Eu não perguntei a Alizée para onde estávamos indo, só segui no mesmo ritmo. Ela parecia saber exatamente onde queria ir, em um cruzamento ela parecia não saber para que lado, mas seguiu para a direita outra vez, descendo para o rio, ela não me olhou ao seu lado e nem disse nenhuma palavra.

– Ah! Aqui! – Ela sorriu languidamente, parando do nada e olhando para mim como o gato sinistro de Alice do País das Maravilhas. Eu senti que nós estávamos fazendo algo que não deveríamos fazer. Olhei em volta e nós estávamos em uma rua com alguns prédios antigos, meio deteriorados, e vários, pelo menos dois complexos vazios, abandonados. Nós estávamos parados em frente a um.

– Aqui aonde, exatamente? – A pergunta saiu meio nervosa, enquanto eu olhava pros lados, esperando algum assaltante dobrar a esquina e limpar os dois.

– Vem, eu mostro – ela me puxou pela mão para a porta do prédio tampada com algumas folhas de MDF, empurrando uma o suficiente para nós que pudéssemos passar. Olhei para ela incrédulo, mas entrei sem falar nada.

Por dentro, o lugar era coberto de poeira, mas consideravelmente O.K., tinham algumas pichações nas paredes, mas pelo menos eram uns desenhos legais. Não haviam muitos móveis a vista, só uma cadeira sem assento jogada em um canto. A entrada era basicamente um grande salão com piso preto e branco, um padrão de xadrez. No fundo da sala havia uma escadaria em espiral bem larga. Milagrosamente, nenhum usuário de drogas parecia ter visto nesse lugar algum potencial.

– Eu sou doador de órgãos – deixei claro para Alizée, enquanto ela arrumava a porta improvisada outra vez. – Só para o caso de você precisar dessa informação nas próximas quarenta e oito horas.

– Relaxa, eu vinha aqui o tempo todo há um tempo – ela revirou os olhos. – É lá em cima o que eu quero que você veja – ela me puxou pela mão para a escadaria no fundo do cômodo, nossos passos ressoando altos.

Havia um corredor escuro do lado direito que eu não havia notado antes, mas Alizée ignorou aquele caminho. Estava consideravelmente claro, nas paredes de altura colossal haviam janelas em semicírculos de uns dois metros perto do teto, deixando a luz da lua entrar.

A escadaria de pedra tinha lascas e rachaduras nas pedras, além de uma camada generosa de poeira, mas era tão sólida quando deveria ter sido cinquenta anos atrás, ou quando foi feita.

Alizée passou direto por outros dois andares, as correntes de ar e os ratos dentro das paredes fazendo barulhos estranhos. Eu não tinha ideia do que ela vinha fazer aqui “o tempo todo”, e não tinha certeza se queria saber. As escadas terminavam no terceiro andar, e, ao contrário dos outros andares, esse não desembocava em vários corredores, mas em uma sala pequena, com duas portas fechadas em três das quatro paredes, uma de cada lado. Na última parede haviam portas duplas, escancaradas para a noite.

Eu não tinha notado que Alizée havia parado de andar, só quando ela largou minha mão, se abraçando.

– Você está com frio? – Tirei o paletó e segurei enquanto ela colocava os braços por entre as mangas.

– Um pouco, obrigada.

Nós dois ficamos encarando o céu por detrás da porta, eu sabia que se desse mais dois passos conseguiria ver toda Paris de cima, a Cidade Luz em todo o seu esplendor, mas eu estava esperando por alguma coisa, pela palavra de Alizée.

– Quando eu era uma caloura, eu tinha um amigo veterano e ele me mostrou esse lugar. Ele tinha um quarto escuro aqui para as fotos da analógica dele – ela explicou, sua palavras adquirindo um ritmo cadenciado, agradável de ouvir –, hoje em dia, acho que ninguém vem mais aqui. Meu amigo se mudou depois de se formar.

– Obrigado por me trazer aqui.

Ela virou seu rosto para mim e sorriu um milhão de diamantes:

– Você ainda não viu o melhor.

Alizée chutou os saltos dos pés e me tomou a mão, me puxando para a porta aberta. O vento penteando meus cabelos e meus olhos abraçando o firmamento. A cidade apareceu embaixo dos meus pés quando nós atravessamos a porta correndo, o que foi uma coisa estupidamente perigosa, já que não havia mais que quatro metros quadrados de varanda, e a barreira de proteção em ferro fundido, trabalhada no estilo rococó, só ladeava o lodo esquerdo.

O rio era uma faixa negra cortando a cidade brilhante, haviam alguns pontinhos luminosos indo rio abaixo e rio acima, barcos. Alizée sentou no chão com cuidado e jogou as pernas para fora, os pés dançando no abismo.

Em volta de nós, haviam prédios mais baixos e diretamente abaixo havia um beco, mas não me prestei a estudar muito o quê havia embaixo dos meus pés, enquanto me sentava ao lado de Alizée.

– Que horas são? – Alizée perguntou enquanto apoiava os braços atrás de si.

– Quase meia-noite – conferi no meu celular, faltava precisamente um minuto.

– Olha para lá – ela apontou para a direita, bem ao longe e eu só entendi quando momentos depois a Torre Eiffel começou a brilhar.

Alizée sorria com os olhos e com a boca, notadamente orgulhosa de si mesma pela surpresa. Passei minha mão pelo rosto dela e era exatamente como veludo, a penugem do rosto arrepiada pelo vento gelado. Mas seus lábios estavam quentes e meus pés flertando com o nada incutiram aquilo no meu cérebro, eu sentia cada terminação nervosa do meu corpo, eu sentia o mundo inteiro. Mas eu sentia principalmente a cidade brilhando ao redor, vestida em luz só para nós dois; e sentia Alizée.


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Notas finais do capítulo

Beijinho no ombro [pro recalque passar longe] pra quem conseguiu chegar até aqui, parabéns, vocês são meus heróis.



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