Done For You escrita por Aida


Capítulo 5
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Demorou mas está aqui galerinha, espero que gostem!
xoxo



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Desvio de um soco e procuro um ponto onde possa atacar, dou três passos para trás e tento manter as pernas funcionando e se movimentando para não entrar em pânico. Ela mantém a guarda alta e todas suas investidas são extremamente precisas, sempre na altura do peito e concentrada em acertar meu rosto.

Calculo o ângulo correto para que eu possa acertar um soco em uma fresta de sua defesa, ajeito as mãos do jeito certo e olho em volta, não tenho escapatória nenhuma.

–Sabe que isso acaba aqui, não é? - Ouço a voz dela entredentes, quase como um rosnado.

Poderia tentar me ajoelhar e pedir para ela não me machucar, mas seria pior para o meu rosto e para o meu orgulho.

–Eu não tenho mais medo - Digo e dou minha primeira tentativa de chute, se a mão precipitada da oponente não tivesse me agarrado e torcido, segurei sua nuca com as mãos fechadas e tentei colocar meu peso contra o seu, jogá-la no chão talvez a desorientasse o suficiente para que eu pudesse fugir.

Tudo o que eu precisei foi que ela me imobilizasse e me colocasse diante de seus olhos verdes e raivosos. Me desfiz de seu aperto tendo em mente que meus braços ficariam marcados com sua força, uma rasteira que nunca poderia prever me pegou desprevenida e ao cair de costas pude sentir o ar abandonar meus pulmões, meu lábio inferior ser machucado pelo jeito que meus dentes se fecharam e a dor inundando meu corpo como uma avalanche.

Acabou.

–Mia, já chega! - Grita o professor batendo a mão no tatame nada macio do centro, estou tão ofegante e mesmo assim o ar parece não ser o suficiente.

A mão forte de Marco está estendida pra mim, mas não acho que meu braço de gelatina vai obedecer ao meu cérebro e se erguer em sua direção.

–Você foi bem Jones - O professor diz como da primeira vez que pisei aqui a quase dois meses atrás e mesmo eu tendo chutado os lugares baixos dele sem querer em uma demonstração. - Onde está o Kole? Ele nunca perde as aulas.

Ele também me prometeu que nunca perderia aulas e me deixar sozinha para ter de fazer dupla com a monstruosamente forte Mia, pensei.

–Ele deve ter tido algum imprevisto - Respondi com a voz mais fina do que queria, meus orgãos ainda estavam voltando devagar e dolorosamente pros lugares que pertenciam. - Vou falar com ele quando o vir.

Me levantei devagar e coloquei a mão diretamente no lábio dolorido, chega de aulas de defesa pessoal por hoje. Kole estava realmente sumido, já haviam se passado dois dias inteiros onde eu só podia ver o rosto do loiro quando dividíamos a quadra com o time de basquete e ele não fazia mais questão de me esperar no portão da escola ou de me procurar na hora do intervalo, talvez estivesse ocupado demais para a velha amiga.

Tomei uma chuveirada rápida e coloquei as roupas eu fora mais cedo para a escola, a quinta-feira estava fria e nublada do lado de fora mostrando que o inverno seria bem frio. Meu cabelo ainda estava estranhamente sedoso e com uma leveza incrível, as roupas de inverno que procurei foram simples, mas nada na casa de Six era simples o bastante para que as outras pessoas acreditassem nisso. A leggin preta grossa e as botas marrons eram exatamente o que eu queria para me aquecer, uma blusa branca sobre posta com um casaco de lã vermelho e um lenço enrolado no pescoço. Me sentia como se estivesse sendo abraçada por um delicioso urso pardo muito quentinho.

Me despedi de alguns conhecidos do Centro Social e fui até o ponto de ônibus mais próximo ouvindo música no IPod que Andy me emprestara, ele dissera que eu precisava partilhar do que ele ouvia para que se pelo menos fossemos fingir estar sintonia, fingiríamos direito.

Algumas bandas eram realmente muito boas, minha favorita até agora era KISS.

As ruas de Cincinnati estavam úmidas e com claros indícios que o outono estava impregnado aqui, as árvores quase sem folhas e algumas delas que sobraram ainda eram avermelhadas e meio alaranjadas, a respiração que se condensava na sua frente quando espirava, o céu estava na maioria das vezes nublado e com um cinza claro bem morto.

No ponto de ônibus tinha um adolescente bonito e de semblante sério encostado no poste. O moletom azul escuro um pouco escondido pela jaqueta jeans ainda mostrava sinais de que já fora usado muitas vezes, a touca que vez ou outra ficava comigo escondia seu loiro indomável, mesmo que algumas mechas escapassem pela mesma.

Não consegui esconder o sorriso que logo apareceu, tirei os fones de ouvido.

–Oi - Disse caminhando para mais perto, porém, ele não movera um músculo - Kole?

–Você não mora mais no Petesburgo - Ele disse tão sério que por alguns momentos eu achei que havia confundido aquele loiro, com o meu verdadeiro amigo loiro, aquele que nunca falaria assim comigo.

–Eu estou morando com meu pai em um lugar... - Vasculhei minha mente para achar uma palavra que se encaixaria nessa mentira, falar com indiferença e segurança seria o ideal - diferente.

Quando meus olhos puderam vislumbrar um pouco dos castanhos cor de café de Kole, era como se eu visse mágoa por um momento.

–Não apareceu hoje na aula - Tentei desviar o rumo tenso da conversa - Marco perguntou de você e...

–Eu não quero saber! - Disparou e me segurou pelos ombros, tive vontade dizer que estava dolorida demais para esse tipo de aperto mas as palavras jorravam da boca do mais alto - Eu fico um fim de semana sem te ver e você arranja roupas novas, um namorado e um emprego pro seu pai? Sr. Rodriguez disse que seu pai estava morando sozinho e eu achei que sua mãe...

Abracei Kole o mais forte que pude, ignorando a dor e querendo desesperadamente sufocar quaisquer palavras que envolvessem aquele assunto em particular.

Ele havia notado, é claro que havia notado.

–Posso explicar - Apertei mais o abraço enterrando meu rosto no moletom macio e cheiroso, sentindo os músculos proeminentes e saltados, muito bem definidos. - Me deixa explicar, por favor.

As mãos de Kole deslizaram até meu pescoço, fazendo círculos sem parar perto de minhas orelhas e senti meu couro cabeludo se arrepiar.

–Tem quinze minutos até o próximo ônibus passar - E com um sorriso tímido e quase imperceptível pude ver a feição do loiro suavizar.

***

Foram quinze minutos de enrolação, inventei uma história onde eu pudesse encobrir todos os fatos e todos os rastros. Aparentemente eu agora estava morando com uma senhora amiga do meu pai e ele na empresa Six (onde havia arranjado um emprego com a ajuda dessa senhora), a mesma empresa do meu novo e riquíssimo namorado que havia conhecido em uma cafeteria, pois ele havia deixado a carteira cair e eu (como a boa garota não-mentirosa que sou) fui devolver prontamente, quando meu amigo perguntou o porque de eu não ter contado, disse que meu pai fizera de tudo um segredo e uma grande surpresa, mesmo eu não tendo gostado nenhum pouco de Maddie (sim, eu tive de envolver Maddie na história) pois ela era uma católica rigorosa e não permitia nenhum tipo de figura masculina além de Jesus Cristo em sua casa e por isso ainda não o havia convidado para uma visita.

A cama de gato que eu inventara era confusa e tinha deixava vários espaços em branco, mas com um pouco de persistência Kole pareceu entender e compreender. Ele não fez perguntas ou demonstrou que desconfiança, mas ouvir Maps do Maroon 5 não me fazia sentir menos culpada, depois de repassar mais de cinco vezes meus anos de amizade com o Kole em minha cabeça, eu havia chegado em uma conclusão: eu nunca havia mentido para o loiro.

Estava entrando na propriedade de Biersack quando vi um vulto vir correndo rápido e me circular sem parar, S parecia estar exultante por me ver.

–Como vai, parceiro? - Bagunço seu pelo de um lado para o outro e ele me dá lambidas boazinhas - Também senti saudades.

Com a companhia do galgo fui até a entrada e abri a porta grande e branca com a chave que CC me entregara ontem no caminho para escola. A casa parecia maior e mais assombrosa não tendo ninguém, nenhum barulho, nenhum empregado, nenhum CC ou Maddie, nada.

–Maravilha - Revirei os olhos, uma casa tão grande para absolutamente ninguém.

Maddie havia deixado meu prato posto à mesa, hoje o cardápio era sopa de legumes com pão australiano caseiro e suco de manga. A sopa ainda estava quente e o suco gelado, era incrível como a senhora sabia exatamente quando eu iria chegar, meu prato nunca estava frio ou a bebida quente, talvez fossem super poderes da terceira idade, chame como quiser.

O cachorro com olhinhos de filhote me encarava atentamente em cada passo e movimento que executava, após o almoço e de ter lavado e guardado toda a louça que havia utilizado, fui para a biblioteca fazer a lição de casa e estudar. S deitou ao lado e junto a mim, passamos a tarde estudando (talvez ele não tanto quanto eu).

Retas, ângulos e tabelas já me deixavam de saco cheio quando as primeiras gotas de chuva bateram nas janelas grandes da biblioteca, eu já sabia de tudo aquilo e da mesma forma como os dias anteriores onde eu estudava todos os livros e materiais que ainda tinha e ou fora passado nos três últimos anos.

Peguei o celular que ainda não havia aprendido a mexer direito para verificar pela terceira vez que eram seis horas e trinta e cinco minutos, mesmo o céu lá fora já estar escuro e não ter nenhum sinal de um ser vivo na casa. A impaciência junto da solidão faziam um mesclado de sentimentos irritante e inquietantes, a biblioteca de Andy engolia três das quatro paredes da sala, junto de um sofá vermelho escuro e o tapete felpudo branco no chão no qual S se deliciava, rolando para cá e para lá.

Passei os dedos por vários exemplares nas prateleiras altas e que ia até quase o teto da sala, eram coleções e mais coleções de livros antigos e que eu nunca nem sequer ouvira falar, a maioria falava de música e arte. Voltei a me sentar na escrivaninha e abri as gavetas das laterais, em ambas vários papéis dobrados se amontoavam quase transbordando.

Peguei um deles, o mais amarelado e amassado.

I'm just trying to breathe (Eu estou apenas tentando respirar)

Just trying to figure it out (Apenas tentando desvendar)

Because i built these walls (Porque eu construí esses muros)

To watch them crumbling down (Para vê-los desmoronando)

I said (Eu disse)

Then I lost it all (Então eu perdi tudo)

And who can save me now? (E quem pode me salvar agora?)

Um arrepio percorreu e eriçou meus cabelos, junto deste pequeno verso algumas notas musicais acompanhavam logo abaixo, talvez se eu tivesse frequentado mais aulas de música e menos de culinária, agora eu soubesse como seria a melodia do que se parecia ser um pedaço de uma canção.

Era tão íntimo e tão profundo, e eu estava invadindo completamente a privacidade dele! Algo tão lindo, parecia tão triste como esses versos, tão pessoal... Será que ele havia escrito isso? Nunca conseguiria pensar no mais alto escrevendo tais palavras, tão sentimentais e que mostram tamanha fraqueza, dor talvez.

Meu pai uma vez me dissera que existe uma história por trás de cada pessoa, tem um motivo para elas serem do jeito que são. Elas não seriam assim só porque querem, algo no passado as fez ficar desse jeito e algumas vezes é impossível consertá-las. O papel antigo podia ser uma pista da razão do comportamento do moreno, ou essa solidão estivesse mexendo com a minha cabeça e me deixando maluca.

Não, esse não era o Andy que eu conhecia, ele só era assim e pronto.

Ouvi a porta da frente ser batida e logo fiz questão de devolver o papel para o lugar que pertencia, e tive que segurar a vontade de querer desdobrar todos os outros que estavam ali fazendo companhia para aquele em especial. O cachorro que fora fiel a tarde toda agora havia disparado para o corredor e tudo que podia se ouvir eram suas patas arranhando o piso branco.

Juntei meus cadernos, livros e celular em um montinho e fui andando em passos apressados, torcia para ser Maddie.

Mas não era Maddie, era o moreno tatuado e ranzinza, que parecia ainda mais ranzinza por estar molhado dos pés à cabeça.

Não o cumprimentei e apenas segui meu caminho para as escadas, Andy escolhera me ignorar por completo desde a festa dois dias atrás. Saía bem cedo e só voltava quando eu já estava na décima sexta etapa do sono, então não via porque falar com ele.

–Bom te ver também - Ouvi a voz rouca e resmungada do moreno sobressair pelo barulho da chuva.

Assim que cheguei no meu quarto, guardei toda a roupa que havia usado no cesto para que eu descobrisse quando e onde poderia lavá-la. Guardei meus materiais e tentei não pensar na música, em como ela seria, talvez agitada, talvez triste assim como as palavras nelas escritas.

Mordi o lábio inferior bem onde havia machucado mais cedo. Me repreendi, agora sim, deve estar horrível e em resposta logo senti o gosto metálico e nauseante do sangue. Aproveitei para tomar uma ducha, e o banheiro parecia levemente mais frio que o normal, bochechei água e quando vi no espelho um corte no lábio estava exposto e pulsante.

Ótimo, apenas ótimo.

Lavei os cabelos com capricho, tentei ser rápida mas quando se tem um cabelo grande é difícil ser rápida no banho. Podia ouvir a chuva torrencial que caía do lado de fora, ao longe um trovão cresceu e fez muito barulho, não pensar em o quanto odiava tempestades me parecia uma ótima ideia.

Um raio cai perto, posso escutar o estridente som como se o mundo se quebrasse em milhões de pedacinhos, as luzes do banheiro se apagaram e a água morna do chuveiro, fica um gelo. Sufoquei um grito e puxei a toalha que deveria estar pendurada na minha frente, encosto a mão no tecido e levo um susto com as fibras macias, fecho a torneira em desespero e penso no próximo passo.

Sem lanterna, sem velas, sem isqueiro, escuridão total.

Lembro que não estou sozinha em casa, mas estar com Andy é quase a mesma coisa que estar sozinha em casa.

Preciso sair bem devagar e não tropeçar nas coisas, coloco a mão na parede e vou me guiando até sentir a porta do closet. Me enfio lá dentro e vou tateando as roupas até achar algo que se pareça ou possa se fazer passar por um conjunto de moletom, coloco-o o mais rápido possível junto com roupas de baixo.

–Bela? - Ouço a voz de Biersack no corredor - Está tudo bem? Cadê você?

–Estou aqui dentro do closet - Chamo ainda incerta, esperava ter colocado as roupas do lado certo.

A luz branca me cega assim que ele atravessa a porta do guarda roupa.

–Pode tirar isso do meu rosto? - Ele abaixa a luz e arqueia uma sobrancelha - Obrigada. O que aconteceu? Por que a luz acabou?

–Um raio atingiu um dos postes da rua, o gerador não aguentou e ficamos sem luz - Ele faz sinal para que eu saia de dentro do closet. - Vamos lá pra baixo, acho que tem algumas velas na cozinha.

Sigo Andy até lá embaixo, enxugo meu cabelo e passo os dedos para que não fique embaraçado (mesmo sem muito sucesso). Assim que chegamos na cozinha, abro a geladeira e pego fatiados, mostarda e tomates na gaveta dos legumes, arranjo um prato e pego o pão na prateleira enquanto Andy procura por velas e coloca minha toalha sobre umas das cadeiras altas.

Faço um sanduíche improvisado e me sento no balcão para comer.

–Não consigo achar as malditas velas! - Exclama e bate um dos armários no momento em que um trovão corta o barulho da chuva, alto o suficiente para me fazer pular e segurar o braço de Andrew como faria com meu pai se ele estivesse aqui, olho para as janelas que não param de cair água, a escuridão total do lado de fora é sinistra e parece ser o cenário perfeito para um filme de terror, talvez o cara com a serra elétrica estivesse nos esperando.

–Tem medo de uma chuvinha? - Escuto sua voz debochada e lembro que estou apertando seu braço, encolhida como uma criança - Não se preocupe, tempestades não duram pra sempre.

Andy estava vestindo calças como as minhas e uma blusa de manga branca com preta. Estava descalço e com o cabelo desgrenhado, tinha um vinco na sobrancelha (talvez de sempre estar tenso) o que fazia ele parecer mais malvado com pouca luz. O moreno pega a outra metade do sanduíche descaradamente e come como se fosse feito pra ele, revirei os olhos e puxei o prato por malcriação.

A casa está fria como nunca antes, sem o aquecedor central, era como se estivéssemos do lado de fora sem agasalhos. Esfreguei os braços compulsivamente, enquanto terminava de comer.

–Porque Maddie não está aqui? Ou CC? - Pergunto enquanto lavo as mãos e o prato na água congelante da mangueira removível, Andy parece já ter terminado de comer e olhava para a lanterna grande e amarela com curiosidade.

–Ela teve de ficar na cidade, tinha coisas pra resolver e CC foi pra casa - Ele se levantou e apontou a lanterna para mim, ele riu baixo e de uma maneira engraçada - Agora eu sei onde Maddie colocou minhas roupas de inverno.

Olhei para as roupas na luz e corei violentamente, eu estava usando um moletom preto com um símbolo de Batman em preto e amarelo, calças grandes demais e que arrastavam pelo chão quando eu andava, não eram roupas minhas.

–E-eu achei as roupas no closet, não sabia que eram suas - Tentei justificar, a risada ainda eram crescente e peguei a lanterna de sua mão - Vou fazer questão de devolver, não se preocupe.

Voltei para a sala principal e meus pés estavam a ponto de grudar no chão, estava muito frio e eu começara a bater queixo. Biersack apareceu na sala com um sorriso de lado, aquele sorriso que significava que ele estava se divertindo as custas de outra pessoa.

–Dá pra parar de sorrir como um idiota e descobrir um jeito de nos aquecermos? - Apontei a lanterna para a escada, talvez muitos cobertores adiantassem - Estou congelando.

A figura mais alta colocou as mãos ao redor de meus ombros e me fez olhar para aquele olhos enevoados pela escuridão, como poderiam parecer tão acesos mesmo estando naquela obscuridade.

–Não se preocupe, em último caso, você se aquece no inferno - Ele passou o dedo indicador pela minha bochecha e se eu pudesse teria mordido e arrancado o dedo desse babaca fora.

Ele começou a subir e no alto da escada um figura escura parecia nos encarar, não lembrava de ter uma estátua lá em cima. Contenha-se, sem pânico, não tem nada lá, não pode ter nada lá.

–Andy? - Fui para o pé da escada mesmo estando com a lanterna, não queria apontar para sei lá o que estava lá parado nos esperando e se deliciando com meu medo.

Quando a coisa se mexeu e pareceu se arrastar pela escada, o grito que tive de conter mais cedo veio à tona e nem pensei no que fiz ou o que eu deveria ter feito, a lanterna escorregou da minha mãe se espatifando no chão. Subi até onde Andy estava e abracei sua cintura, apertando os olhos e esperando a morte eminente.

–Desculpe, desculpe - Minha voz parecia de uma criança de cinco anos que acabou de ver um filme de terror, ou vivido um - Por favor não me deixe aqui sozinha!

–Qual é o seu problema? - As mãos de Andrew circularam meus cabelos e os seguraram forte na base da nuca, abaixara um pouco para poder olhar nos meus olhos. Suas sobrancelhas franzidas e boca retesada, parecia tão na defensiva quanto em nossa primeira briga.

Apontei para a escada e se pudesse teria me fundido à ele, me escondendo em sua blusa e percebendo que ele emanava um calor bom, nem um pouco assustador.

–Aquele é o Six, sua maluca! - Ele colocou a mão sobre o coração e depois me fez virar para o cachorro apavorado que nos encarava, e fez um ganido de quem não entendia coisa alguma.

Eu também não S, eu também não.

Agora me sentia uma idiota, na verdade uma completa idiota muito corada.

–Parabéns, conseguiu quebrar nossa única fonte de luz - Me empurrou para que subisse as escadas, resmungando o quão infantil eu era.

Assim que chegamos lá em cima no corredor, não se podia ver um palmo à frente. Mesmo sabendo que Andy estava logo atrás de mim e tínhamos um cachorro que poderia latir a qualquer momento se algo estivesse errado, eu ainda me sentia insegura. Talvez fossem os raios e os trovões, a chuva que estava engolindo Cincinnati ou a casa vazia, escolha um ou todos como eu.

O de olhos azuis colocou as mãos sobre meus ombros e foi me guiando para um dos quartos, qual eu não sabia. Não queria me separar de Andy (quem diria que eu sequer chegaria a pensar em uma coisa dessa, não é?) mas assim que ele soltou meus ombros quis que ele voltasse e me segurasse de novo, sentir o calor transpassar as barreiras de sua blusa e me envolver como o moletom do Batman não fazia.

O fogo irradiou no canto do quarto, engoliu a madeira que agora podia ser vista e logo iluminou o quarto azul escuro. Andy estava no canto do quarto segurando um isqueiro ao lado da lareira, deitado no tapete em frente a mesa estava S que eu descobrira que seu nome era Six, pois Andy tinha uma imaginação tão fértil quanto amor no coração. O cachorro parecia se deliciar com o calor que o fogo produzia, com um pelo tão curto eu não duvidaria que ele estivesse com tanto frio quanto eu.

–Pode sentar na cama se quiser - Ele apontou enquanto pegava o isqueiro e acendia um cigarro de sua cartela.

Decidi sentar no tapete perto do galgo, fiz carinho assim que ele me olhou com seus olhos azuis claros, gritantes e tão bonitos quanto os do dono.

Andy sentou ao nosso lado e soprava a fumaça em direção à lareira que queimava morna e parecia esquentar gradualmente. O cheiro de cigarro não era tão ruim, menta e nicotina talvez, cheiravam a riqueza pois aqueles cigarros não eram como os vagabundos que os revoltados da escola fumavam nos arredores.

–Porra, o que houve com sua boca? - Andy soltou e quando virei para o lado seu rosto estava perto e tenso mais uma vez, o cigarro preso levemente entre os lábios e as mãos no meu rosto segurando-o com uma delicadeza surpreendente (coisa que eu achei que Biersack nunca teria).

Ele passou por Six que estava de olhos fechados e se sentou em frente, encolhi o rosto e tentei não corar pois sua perna estava diretamente em contato com a minha, sua mão direita estava no meu pescoço segurando o cigarro e a esquerda em meu queixo, analisando.

–Eu me machuquei, só isso - Tentei me afastar mas suas mãos desceram para minha cintura e me puxaram para perto voltando a olhar, parecíamos quase da mesma altura agora.

–Pode parar de se mexer? - Colocou o polegar onde não estava estava machucado e ali ele esbarrou o que quase pareceu um carinho, seu polegar afagando meu lábio.

Meu coração estava na boca e pulsando forte o bastante para que minha cabeça latejasse.

–Não foi nada - Toquei sua mão e a abaixei - Se estiver preocupado sobre o que as outras pessoas vão dizer, é só falar que você não costuma ser muito carinhoso comigo.

O que é a mais pura verdade.

Andy sorri minimamente e estica as pernas, quando ele olha pra janela posso ver claramente suas tatuagens e o piercing brilhando em sua boca. Os cílios fazendo sombra nas bochechas bem definidas e pálidas, sinto a aliança pesar dois quilos em meu dedo.

–Está ouvindo as músicas que te passei? - Tomou mais um trago de seu cigarro e expirou fundo, encostou no mármore da lareira e parecia descontraído, diferente - O que acha delas?

–Sim - Dei de ombros - São boas, diferentes.

Olhei em volta como Biersack fez minutos atrás e tudo o que me prendeu atenção (além da chuva contra a janela) era aquele lindo piano negro.

–Você toca? - Pergunto e os olhos azuis iluminados pelo fogo, pareciam laranjas como o céu no ápice de seu crepúsculo e não se desviaram nenhum segundo dos meus.

Mesmo eu querendo evitar contato visual, Andy parecia adorar encarar meus olhos ou algo que eu não enxergasse.

Foi sua vez de dar de ombros.

–Você que conversar? - Prendi o cabelo emaranhado em um coque - Devíamos nos conhecer melhor, para fazer essa coisa de namorar mais realista.

–O quer saber? - Ele tragou mais uma vez, a voz calma e talvez até um pouco entediada.

Sorri internamente, uma conversa normal com Andy Six?! Quem diria, eu devia estar fazendo algum progresso finalmente.

–Você teve uma resposta positiva no evento? - Disse e coloquei a mão sobre o queixo, puxando o moletom mais pra baixo - Sabe, com a história do namoro e tudo mais.

–A foto que tiramos e o discurso foi só o que precisei para criar o começo perfeito - Andrew segurou o cigarro entre o indicador e o polegar - Lembra o senhor que falamos, Levi?

Recordo-me do senhor robusto que disse que Andy era um homem de sorte por me ter.

–Sim - Dou de ombros - O que tem ele?

–Escritor da coluna social de revistas e do Jornal Principal de Cincinnati - Ele fala e sorri de lado, parece satisfeito consigo mesmo - Escreveu quase um parágrafo inteiro só sobre como estávamos vestidos, fez um brincadeira com nossos sobrenomes e somos intitulados Jiersack agora. A empresa toda não para de falar nisso, chega a ser irritante.

Assenti e tentei sorrir também, mas então lembro-me do sorriso do meu pai ao me ver e do abraço apertado que trocamos naquela noite, lembro o quão longe ele está e como me senti sozinha hoje.

Eu não me sentiria sozinha se ele estivesse aqui.

–O que mais quer saber? - Pergunta e joga o que sobrou do cigarro no fogo que crepita audivelmente mais alto, mais intenso.

–Absolutamente tudo - O cutuco com minha perna para que volte a olhar para mim, para que volte a conversar comigo - Sua história, quero conhecer meu namorado de mentira como uma boa namorada de mentira.

Ele fechou os olhos e suspirou, mesmo eu querendo que o mesmo sorrisse com meu pequeno trocadilho.

–Eu nasci em... - E com isso comecei a descobrir o verdadeiro Andy, às oito e dezessete de uma noite chuvosa e pavorosamente bonita de outubro.


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Notas finais do capítulo

Até daqui a uma semana, o capítulo foi meio devagar... Mas espero que vocês tenham aproveitado! xoxo



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