Ao nascer de uma nova Esperança escrita por Rafú


Capítulo 36
Capítulo 36


Notas iniciais do capítulo

OIZINHO!!! Um aviso: vou começar a postar nos Domingos, ok? Bem, não tenho muito o que dizer sobre o capítulo. Então leiam antes que eu dê sopilers. Bijus.



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Mais alguns anos se passaram. Aliás, passaram não. Voaram. Ray já está nos seus quatro anos de idade. E eu nos meus vinte e nove. Só então notei que já estava entrando na casa dos trinta.

Alice ainda não aprendeu sobre os Jogos Vorazes na escola, o que me deixa tranquila e aflita ao mesmo tempo. A cada dia que passa, é uma distância a menos para ela saber sobre meu passado e o de Peeta. Mas Peeta sempre tenta me tranquilizar, dizendo que ela vai entender.

Gale está trabalhando muito bem na padaria. Se adaptou assim que começou. Peeta e ele se tornaram bons amigos, para meu alivio.

Nos últimos dias, Alice demonstrou interesse pelo arco e pelas flechas. Graças a um desenho chamado “Robin Hood”. Ela pediu pra mim ensinar ela, e eu não vi problema algum. Estou agora mesmo desenhando um alvo na árvore onde Peeta e eu fizemos o balanço. Termino de desenhar o alvo, procurei imitar os modelos que haviam no centro de treinamento da Capital. Peeta está sentado na grama ao lado de Ray, que está distraído com seus carrinhos e soldadinhos de plástico. Peeta tem um caderno de desenho e um lápis nas mãos. O caderno foi um presente que lhe dei no último aniversário. Ele é bem bonito, com uma capa trabalhada em detalhes de pedrinhas e laços formando tranças. Achei útil, afinal, é bem mais simples carregar um caderno e um lápis nas mãos, ao invés de quadros, tintas e pincéis. Mesmo assim, ele não abandonou por completo seus quadros e tintas. Eu gosto de vê-lo pintar seus quadros. A forma que ele olha para o quadro, procurando a cor exata que deve usar. Ele olha como se fosse possível entrar na paisagem que está desenhando. Peeta acabou doando muitos dos quadros, pois eles se acumularam no ateliê. Tanto que tivemos que começar a guarda-los no porão. E tenho que dizer que o porão estava quase completamente tomado pelos quadros. Um museu da Capital aceitou de muito bom grado as telas de Peeta. Uma parte acabou indo para o Distrito 13, que também construiu um museu referente aos Jogos e a Revolução.

Volto para onde Alice está, parada a alguns metros da árvore-alvo. Ela segura o arco na mão, e uma aljava de flechas está em suas costas.

– Muito bem. – falei, tentando saber por onde começaria. – Acho que primeiro devo te ensinar a segurar isto.

– Tudo bem. – diz ela.

– Você segura o arco com a mão esquerda, e a flecha com a direita.

– A mão esquerda só serve pra segurar o arco?

– Sim, o resto você faz só com a direita. – peguei um outro arco e uma flecha que estavam no chão. Usei as armas que meu pai fez. – Você faz assim.

Fico na posição de ataque, segurando o arco e a flecha e tentando segurar a vontade de soltar a corda e deixar a flecha cravar o alvo. Mas sei que Alice é quem precisa acertar o alvo, não eu. Ela imita o que eu faço enquanto Ray para de brincar com seus brinquedos e fica a nos observar.

– Assim? – pergunta Alice.

– Isso mesmo. Agora, como estamos usando a mão esquerda para segurar o arco, vire o ombro esquerdo na direção do alvo. Desse jeito. – ela repete o que eu faço. – Bem, agora, você apoia a mão que está segurando a corda na sua bochecha. – ela segue a instrução novamente. – Agora, mire com um dos olhos e solte a flecha.

Ela solta a flecha, mas, por um motivo que nem eu compreendi, ela acabou cravando no chão a cinco passos de nós.

– Droga. – diz Alice abaixando os ombros.

– Tudo bem. – digo rindo. – Pelos menos ela cravou no chão. – caminho até a flecha a retirando da terra. Estendo a flecha para Alice. – Tome. Tente de novo.

Alice olha para a flecha sem muito ânimo.

– Vamos, Alice. Alguma hora você consegue. – estimula Peeta.

– Ninguém acerta de primeira. Vamos, pegue a flecha e tente de novo. – falo.

Ela pega a flecha e atira novamente e novamente erra. E isso se repete nas outras inúmeras tentativas. Numa delas, ela quase chegou a acertar a árvore. Ele atira o arco no chão, frustrada.

– Eu nunca vou conseguir acertar. – diz ela se sentando ao lado de Peeta.

– Vai sim, eu também não conseguia no começo. – digo. – Olha, vou te mostrar como se faz. – falo pegando o arco, a flecha, mirando um pouco acima do alvo e acertando a árvore. – Viu só, eu também errei o alvo.

– Mas ao menos acertou a árvore. – retruca Alice.

Suspirei, larguei o arco e caminhei até a árvore para pegar a flecha de volta. Eu estava tirando ela, quando ouvi o grito de Peeta.

– RAY, NÃO!!! KATNISS!!!! - Me viro e abaixo a tempo o suficiente de a flecha cravar no alvo sem acertar minha cabeça primeiro. Me ergo. A flecha não cravou no meio do alvo por pouco. Olho para trás e vejo Ray com o arco na mão. Não. Ele não pode ter conseguido. Se Alice não conseguiu, como Ray conseguiria? Vejo Peeta correr até mim. – Meu Deus, Katniss! Você está bem?

– Eu... Eu estou sim. – digo, ainda sem acreditar se foi realmente Ray que lançou a flecha – Foi Ray quem atirou a flecha?

– Foi.

– Mas como? – digo puxando a flecha. – Alice não conseguiu. Como ele conseguiu?

– Eu não faço a mínima ideia. Mas ele vai ficar longe daquelas armas a partir de hoje.

– Ah, mas não vai mesmo. – falo correndo até ele.

– KATNISS, NEM PENSE NISSO!. – gritou Peeta caminhando até nós.

Ignorei ele e parei na frente de Ray.

– Faça de novo. – digo lhe alcançando uma flecha.

Ele a pega, eu paro atrás dele e vejo ele fazer todo os movimentos corretamente.

– Ray, solta isso. – diz Peeta na metade do caminho, mas longe da árvore, com medo de ser atingido.

Ray abaixa o arco ainda com a flecha posicionada e olha para Peeta.

– Não, Ray. Continua. Não ouve ele. – sussurro. – Acerte o alvo.

Ray novamente se posiciona para acertar o alvo, ele estica a corda ao máximo.

– Ray, não solta a corda. – fala Peeta.

– Solta, Ray. Solta a corda. – falo.

– Me dê isso. – diz Peeta esticando a mão para pegar o arco das mãos de Ray.

– SOLTE AGORA. – grito antes que a mão de Peeta chegue perto da arma.

A flecha voa e acerta a árvore novamente, mas um pouco mais abaixo do que antes.

– Acertei, mamãe? – pergunta Ray.

– Acertou sim, você acertou. – comemoro.

Peeta ajunta o caderno e o lápis do chão e caminha até mim, ele parece realmente bravo comigo. Para na minha frente e aponta para mim com a mão que segura o caderno.

– Se ele machucar alguém, saiba que a culpa será sua. – diz ele e se vira em direção a porta. – Vamos, Alice.

Alice se levanta do chão e acompanha Peeta. Não dou muita importância para o que ele fala. Estou muito feliz com Ray ter conseguido usar o arco e a flecha. Depois resolvo meu problema com Peeta.

– Papai está bravo comigo? Por eu ter jogado a flecha? – pergunta Ray.

– Não, querido. Não. Não é com você que ele está bravo. Não se preocupe. Quer tentar acertar o alvo de novo?

– Quero. – diz ele já pegando outra flecha.

Fico mais um bom tempo vendo Ray lançar flechas. Ele conseguiu acertar o centro do alvo uma hora.

Quando entramos, sinto o cheiro do almoço. Caminho até a cozinha e vejo Peeta e Alice sentados a mesa já comendo. Peeta não olha pra mim. Ótimo, adoro brincar de ser invisível. Pego um prato pra mim e pro Ray e nos sirvo. Coloco o prato na frente de Ray.

– Coma. – digo a ele, me sentando ao seu lado.

– Pai? – fala Ray.

– Fala, filho. – diz Peeta.

– Está zangado comigo?

– Não. – ele olha pra mim – Com você não Ray.

Eu olho pra Peeta e volto a olhar pro meu prato rapidamente. Droga, já estou sentindo a tempestade vindo. Só não caiu ainda porque as crianças estão na cozinha.

Mas qual é o problema de Ray usar arco e flecha? É um esporte. É saudável.

O clima ficou tão pesado que nem as crianças falaram durante o almoço. Alice esvaziou seu prato.

– Mãe, posso brincar com o Louis e o Joe hoje? – pergunta ela.

– Já fez sua lição de casa? – pergunto.

– Não.

– Quando terminar sua lição pode ir, se o seu pai deixar. – inclui Peeta pra ver se amenizava as coisas pro meu lado depois.

– Pai? – chamou Alice olhando pra Peeta.

– Depois da lição. – confirmou Peeta.

– Posso ir também? – pergunta Ray terminando de comer.

Eu já ia dizer um “não” e inventar alguma desculpa. Se Ray ficasse aqui, Peeta não gritaria tanto. Mas Peeta se adiantou.

– Pode, vai junto com Alice.

Alice e Ray saíram da mesa e correram escada acima. O clima ficou mais pesado ainda. Me levantei quando terminei de comer e levei meu prato a pia para lavá-lo. Aproveitei e comecei a lavar a pilha de louça que se formou por ficarmos sem lavar por dois dias. Peeta terminou seu prato, mas não moveu um músculo pra se levantar da cadeira. Continuei a lavar a louça. Alice e Ray correram escada abaixo novamente.

– Terminei. Podemos ir agora? – diz Alice.

– Vão. – responde Peeta.

É agora. Parei de lavar a louça, sequei as mãos e me virei, me apoiando na pia. Preparei meus ouvidos pra receber os gritos furiosos de Peeta. Mas não houve nada além de silêncio.

Eu fiquei surda? Ou será que Peeta realmente não está gritando? Ele continua parado, sentado e olhando fixamente para o prato vazio a sua frente. Por que ele não está gritando comigo? Era para ele estar gritando comigo. Grita comigo, Peeta!!!

Mas o silêncio permanece.

– Peeta? – o chamo, mas ele não se mexe por algum tempo, até que se levanta, pegando o prato da mesa e levando até pia. Me afastei da pia. E se ele decidir quebrar o prato na minha cabeça? Não acho que ele faria isso, mas nunca se sabe. Ele continuou a lavar a louça que eu parei de lavar.

Ah, sim. Agora que eu lembrei. Eu sou invisível. Me escorei no balcão. Vou ter que fazer ele me enxergar.

– Peeta, não faz isso. – comecei a fazer uma voz dengosa. – Peetinha, por favor. Não fique zangado comigo. – ele continuou a me ignorar, que coisa irritante. Odeio ser ignorada. Mas não desisti da tática da voz dengosa. – Meu pãozinho. Não fica assim. – que droga foi essa? Pãozinho? Mas quem sabe não dê certo? Tentei outro apelidos ridículos que vieram na minha cabeça. – Pudim, doce, amor, querido, mel. PADEIRO GOSTOSO!!! – vi ele tentar segurar um sorriso, só tentar... – Você está rindo, eu estou vendo este sorriso se esforçando pra sair. Vamos, meu padeirinho gostosinho e cheirosinho. Olha o que eu estou fazendo. Estou sendo fofa. Isso não conta não? Sem falar na humilhação que estou passando, tendo que dizer estes apelidos sem noção. Você nunca mais me verá ser fofa desta forma. Vamos, amorzinho da minha vida. Fala comigo. – ele começou a rir baixinho, tentando não soltar a risada. – Peetinha, você está rindo. Você acha que eu não estou vendo este sorrisinho aí? Hein, Peetinha?

– Mas que droga. Peetinha não, né? – exclama ele, soltando a risada. – Você é impossível, sabia?

– Eu sei. Alice também é. E Ray é o dobro.

Ele seca as mãos no pano de prato.

– Não pense que não estou mais zangado só porque estou rindo. – diz ele indo pra sala.

Fui de atrás.

– Mas qual é o problema de Ray usar arco e flecha? – pergunto. – Você não se opôs quando Alice me pediu para ensiná-la.

– É, mas Alice tem nove anos e Ray apenas quatro. Quatro anos, Katniss!!! Como você vai deixar ele usar uma arma desta aos quatro anos?

– Eu usava.

– Aos quatro anos?

– Aos seis.

– Pois é, quando ele fizer seis anos poderá usar então.

– Mas ele pode não querer mais aos seis anos. – retruco.

– Você não pensou na possibilidade de ele acertar alguém? Katniss, ele quase acertou a sua cabeça hoje!!!

– Mas eu me esquivei!!!

– E se você não tivesse se esquivado? Poderia estar morta agora.

– Peeta!!!

– E se ele quase acertar outras pessoas? E SE ELE MATAR ALGUÉM?

– Peeta, não diz isso. Está transformando Ray em um assassino.

– Você usou armas iguais aquelas para matar pessoas.

– Foi necessário, você acha que senti algum prazer em matar aquela gente?

– Você pareceu sentir prazer quando matou Rue.

– O que?! Como assim?! Eu não matei a Rue.

Mas o que está acontecendo? Como assim eu matei a Rue. Ah! Droga. É uma das memórias implantadas por Snow.

– Ela gritou seu nome desesperadamente. Ela estava presa em uma rede, uma armadilha. Você a encontrou. Eu pensei que você ia correr até ela e a livrá-la. Mas você parou, sorriu, tirou uma flecha a posicionando no arco, e a soltou, cravando no coração dela.

– Meu Deus, Peeta!!! Eu não fiz isso. – eu começo a chorar. – Peeta, Snow colocou isto na sua cabeça. Não é real, eu não matei a Rue. Eu nunca conseguiria machuca-la. Nem mesmo se sobrasse só ela e eu naquela arena. VOCÊ SABE DISSO, PEETA.

– Será que você não a machucaria mesmo? – pergunta ele em dúvida.

Eu saí correndo de casa e corri até a casa de Haymitch. Não bati na porta, apenas invadi a casa aos prantos.

– HAYMITCH!!! – o chamo.

– Alice e Ray estão na casa de Gale, eles... O que você tem? – diz Haymitch.

– Vem comigo. – falo o puxando pelo pulso e o arrastando até a sala da minha casa, Peeta ainda estava lá. – Diz pra ele, Haymitch. Diz pra ele que eu nunca machucaria a Rue. Diz pra ele que não fui eu que matei a Rue.

– Ele está tendo um flashback? – pergunta Haymitch.

– Eu não sei, eu só sei que ele está me acusando pela morte de Rue.

– Sobe lá pra cima, deixa que eu falo com ele. – fala Haymitch me empurrando até as escadas. Eu não me oponho. Subo, indo até o meu quarto, deitando na cama e continuei a chorar.

Desta vez, não estava chorando por Peeta ter me acusado de matar a Rue. Mas porque flashes da morte dela começaram a passar pelos meus olhos.

Depois de um tempo, apoiada ao parapeito da janela, Peeta entra no quarto. Eu me encosto na cama e só então noto que algumas lágrimas teimosas continuam a escorregar dos meus olhos. Peeta senta na cama e seca uma das minhas lágrimas.

– Desculpa. – sussurra ele – Eu sei que você não matou a Rue, eu não sei o que deu em mim. Me perdoa.

– Tudo bem. – sussurro de volta.

Ele sorri.

– Não tem problema Ray usar arco e flecha, desde que ele só use em casa e ali no pátio dos fundos. Ok?

– Ok. – digo.

– Vamos descer para terminar aquela louça?

– Vamos. – digo sorrindo.

Nós descemos, Peeta lavou a louça e eu a sequei.

– Então... Eu sou um padeiro gostoso? – pergunta Peeta secando as mãos no pano de prato.

Eu abraço o pescoço dele e beijo seu queixo.

– O mais gostoso que existe.

Ele me abraça e sussurra no meu ouvido:

– E você é a esposa, mãe e caçadora mais gostosa de todos os tempos.

– Ah, eu sou?

– É sim, minha arqueira sexy.

– Melhor diminuir este fogo, hein.

– Isto vai ser impossível enquanto tiver A Garota em Chamas ao meu lado. – sussurra ele, beijando meu pescoço.

Por cima de seu ombro, vejo as crianças voltando pela janela.

– Peeta, para. As crianças estão vindo. – ele me ignora e continua a distribuir seus beijos, não consigo me afastar pois ele me abraça com força. – Pee... – sou interrompida por um beijo de Peeta nos meus lábios. Tento me afastar mas ele é persistente. Tenho que parar antes que certas coisas aconteçam com Peeta. Ouço o barulho da porta. Não vejo outra alternativa e mordo o lábio inferior de Peeta. Ele se afasta num pulo.

–AI! Você me mordeu. – reclama ele, passando o dedo no lábio e tirando o sangue.

– Oi mãe, oi pai. – diz Alice entrando na cozinha aos pulos.

– Oi, meu amor. – digo.

Alice olha para Peeta surpresa, só então noto que mordi muito forte o lábio de Peeta, pois um rastro de sangue está escorrendo.

– A boca do papai está sangrando? – pergunta Alice.

– É... Hã... Papai comeu amoras. – menti, pegando um pano de prato e limpando o sangue. – E ele se sujou.

– Oba! Tem amoras. – comemora Ray. – Onde está? Eu quero, mamãe.

– Não tem mais, seu pai comeu tudo. – digo.

– Ah, papai é guloso. – reclama Ray e sai da cozinha.

– Eu trago mais amanhã. – diz Peeta, mesmo depois de Ray ter saído da cozinha.

– É melhor você tomar um banho, Alice. Tem escola amanhã. – falo.

– Tá. – Alice sai aos pulos da cozinha.

Peeta larga o pano na mesa.

– Ai, isso doí, sabia? – diz ele, passando a língua no lábio.

– Me desculpa, mas as crianças estavam vindo, e você não parava, e eu imaginei que...

– Tudo bem, acho que entendi. Tá perdoada. - Eu rio. – Ei, você não tomou seu remédio.

– Ah, eu não preciso destas porcarias.

– E o que vai fazer se tiver alucinações?

Bufei. A alucinação de Prim há três anos atrás, não foi a última que tive. Tive outras várias, normalmente aparecem quando estou no meio de uma briga. Mas às vezes aparecem do nada. O médico que substituiu o Doutor Aurelius, O doutor Rudy, receitou um remédio diário. Mas eu odeio estes comprimidos, me deixam lerda.

Peeta coloca um copo de água e um dos compridos na mesa.

– Tome. – ordena ele.

Bufei novamente antes de pegar o comprimido e engoli-lo com a ajuda da água.

– Você é chato. – reclamo.

– Sou? Eu não era o padeirinho gostosinho e cheirosinho? – ri ele.

– É o padeirinho gostosinho, cheirosinho e chato.

– Você vai acabar me agradecendo depois.

Não posso discordar pois sei que é verdade. O dia passa tranquilamente. E mais uma manhã vem. Levanto antes que todo mundo. Vou ao banheiro, tomo um banho, escovo os dentes e abro a janela do meu quarto.

– Que isso, mulher? Ficou doida? – fala Peeta quando a luz do sol invade seus olhos, ele coloca o travesseiro na cabeça.

– Vamos, acorde. Alice tem que ir pra escola e a padaria precisa ser aberta. – digo, tirando o travesseiro.

– Mas já?

– Não mandei você passar a madrugada olhando filmes.

– Lembrete: nunca olhar filmes nas madrugadas de domingo a quinta. – diz ele sentando na cama e se espreguiçando.

– Isto mesmo, agora levanta aí que eu vou acordar a Alice.

Caminho pelo corredor até chegar ao quarto de Alice. Abro a janela.

– Ah, mãe. Fecha a janela. – reclama ela cobrindo a cabeça com o lençol.

Vou até a cama e puxo o lençol. Ela se encolhe.

– Vamos, levanta. Tem que ir pra aula.

– Eu vou amanhã. – diz ela.

– E vai hoje também. Vamos.

Ela levanta da cama cheia de preguiça.

Desço e começo a adiantar o café-da-manhã. Ray aparece logo em seguida. Aí está um que não precisa de ninguém para ser acordado.

– Oi, mãe. – fala ele sentando a mesa.

– Oi, querido.

Preparo o café e sirvo a mesa. Peeta e Alice chegam logo em seguida já vestidos para sair.

– Hmmm, bacon. – fala Alice.

– Já fez todo o café? – pergunta Peeta sentando-se à mesa.

– Fiz.

– Está me deixando mal acostumado. – brinca ele.

Comemos o café tranquilamente. Logo, Peeta e Alice já estão indo.

– Alice, não esqueça o lanche. – falo segurando a merendeira.

Alice vem até a cozinha seguida de Peeta. Ela pega o lanche da minha mão e me dá um beijo na bochecha.

– Tchau, mãe.

– Tchau.

Peeta se aproxima, deixando um beijo em meus lábios.

– Tchau. – diz ele.

– Tchau.

– Tchau, filho. – fala Peeta ao se virar para Ray.

– Tchau, pai.

Era muito “tchau” para um único dia. Lavo a louça enquanto Ray assiste televisão.

– Ray, suba e tire este pijama. – digo quando vou em direção as escadas para arrumar as camas.

– Estou indo. – afirma ele, pulando do sofá.

Decido ir a padaria. Preparo o almoço, e levo um pouco para Peeta. Chego a padaria e vejo Gale limpando as vidraças da vitrine pelo lado de fora.

– Limpe bem isso, Gale. Ou Peeta irá demiti-lo. – brinco antes de entrar na padaria.

– Pode deixar, patroa Kat. – devolve ele rindo.

Ray entra correndo e vai direto a cozinha.

– PAI! PAI! – grita ele até chegar perto da cozinha.

Peeta sai da cozinha. Ray corre até ele e pula em Peeta.

– Calma aí, rapaz. – diz Peeta.

– O que foi, Peeta? A idade já está lhe alcançando? – pergunto.

– Que idade o que. Só tenho vinte e nove.

– Quase trinta.

– Você tem a mesma idade que a minha.

– Mas consigo pegar meu filho no colo.

– Eu também... Tá, talvez demore um pouco pra conseguir erguer ele, mas consigo.

Eu rio.

– Trouxe seu almoço. – falo estendo a comida.

– Obrigado. Agora desce filho, papai vai comer. – fala ele largando Ray no chão.

Patrick aparece.

– Opa, e aí Doce de Maracujá. Decidiu aparecer patroa?

– E você não desiste deste apelido. – reviro os olhos.

– Nunca. – diz ele e bagunça os cabelos de Ray. – E aí, moleque?

– Ei, para. – diz Ray tirando a mão de Patrick da sua cabeça e tentando arrumar os cabelos.

– Tire estas mãos sujas do cabelo do meu filho, Pat. – fala Peeta devorando a comida.

– E o meu almoço, onde está? – reclama Pat.

– Vai fazer. Tá achando que eu tenho cara de cozinheira agora? – resmungo.

– Olha só, a antiga Katniss hostil está voltando. – fala Gale entrando na padaria.

– Eu não sou hostil. – retruco.

– Não sei não. Ouvi por aí que você quase acertou uma flecha na cabeça do Idealizador chefe na 74° edição dos Jogos Vorazes.

– Como você sabe disso? – perguntei já olhando para Peeta.

– Não olha pra mim, eu não falei nada. – se protege Peeta.

– Haymitch é um cara muito legal pra conversas. – afirma Gale.

– Eu devia saber, Haymitch e sua boca grande. – afirmo.

A tarde na padaria se passa, eu fico no balcão com Gale. Até Brend me chamar.

– Oi, posso falar com você? – diz ele parecendo meio indeciso.

– Claro. – sigo ele, até chegarmos no escritório. A coisa deve ser séria. Mas me assusto quando ele tranca a porta e guarda a chave no bolso. – Por que você trancou a porta?

– Eu preciso te falar uma coisa, uma coisa que vai custar o meu emprego aqui.

– Brend, abre esta porta agora. – falo assustada.

– Não, eu preciso que você saiba da verdade. – diz ele.

– Como assim? Que verdade? Brend, você está me assustando.

– Eu te amo, Katniss. – diz ele e eu levo um choque.

– Você o que?

– Eu amo você desde o primeiro minuto que olhei pra você. Você não sabe o quanto estava linda naquele traje que estava pegando fogo na 74° edição dos Jogos.

– Brend abre esta porta. – falo girando a maçaneta inutilmente.

– Eu amo você.

– Mas eu não, eu amo o Peeta, estou casado com ele. Tenho filhos com ele.

– Eles podem vir junto.

– Vir junto pra onde? – pergunto assustada enquanto ele dá um passo em minha direção.

– Vamos fugir. Vamos sair deste Distrito. Você, eu e as crianças.

– O que? Como assim? PEETA!!! – chamo ao ver que ele dá mas alguns passos em minha direção.

Ele me puxa e me prensa na parede.

– Shhh, não grite. Apenas venha comigo. Eu posso te fazer tão feliz quanto Peeta. Por que você acha que eu aceitei trabalhar nesta padaria, hein? Meu único objetivo aqui era você. Nunca trabalharia num lugar como este se não fosse por você. – sussurra ele.

Eu me desespero.

– PEETA!!! PEETA!!! PEETA!!! – eu chamo em desespero.

Brend me cala com um beijo. Eu tento me soltar, mas ele é bem mais forte do que eu. Ouço a voz de Peeta e Gale.

– BREND! ABRA A PORTA! – grita Gale.

– BREND, LARGA ELA. LARGA ELA. BREND!!! – grita Peeta.

Ouço o barulho de estrondos na porta. E noto que Peeta está tentando arrombar a porta que era feita vidro. Finalmente ele consegue e joga Brend no chão. Eu abraço Peeta ainda tomada pelo choque do que aconteceu.

– MAS O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO, SEU IDIOTA? – berra Gale furioso.

– Ele machucou você? – pergunta Peeta segurando meu rosto.

Eu aceno com a cabeça, dando uma resposta negativa. Noto que estou tremendo. Peeta me abraça novamente.

– Eu a amo. – explica Brend.

– Você o que? – pergunta Peeta incrédulo.

– Eu disse que amo a Katniss.

– E você acha que com violência vai chegar a algum lugar? – pergunta Gale.

– Desculpa, mas estou esperando a dez anos. Dez anos esperando a Katniss, mas ela não vai deixar de olhar só para Peeta. Eu deixei o meu conforto na Capital pra...

– Você é da Capital? – pergunta Peeta.

– Sim.

– E como nunca notamos?

– Eu mudei meu estilo, eu aprendi a falar da forma distrital, eu me mudei por completo pela Katniss.

– Ela não ama você, Brend. – esclarece Peeta.

– Ela ainda pode me amar. Ela tem apenas vinte e nove anos.

– Se ela amar você, ela poderá ir. Mas não a force a nada como fez hoje, se não você terá que se ver comigo.

Fiquei estarrecida. Peeta me deixaria ir se eu não o amasse mais? Deixaria? Tão fácil assim? Eu não deixaria. Sou uma pessoa egoísta demais pra deixar a pessoa que eu amo ir embora. Nunca imaginei Peeta com outra pessoa além de mim.

– Você sabe que não vou desistir tão fácil. – afirma Brend.

– Já chega! – estoura Peeta, ele me arrasta pra fora da sala, me abraça com um braço e com o outro aponta em direção a rua. – Está demitido. Saia agora da minha padaria!

Brend não diz mais nada. Apenas caminha com passos lentos até Peeta e entrega o avental em suas mãos. Antes de sair Peeta lhe dá o salário deste mês.

– Sinto muito. – diz Brend.

– Eu nunca esperava que você fizesse isto. – sussurra Peeta.

Brend sai da padaria e some no meio das outras pessoas. Gale vem até Peeta.

– Hã... Você... Você quer que eu coloque uma placa na vidraça pra dizer que estamos contratando? – pergunta Gale.

Peeta afirma com a cabeça.

– Coloque. – ele me segura pelos ombros, só agora noto que ele não me soltou e que eu continuo a tremer. – Você está tremendo. Vamos pra cozinha.

Peeta me puxa para a cozinha e me faz beber um copo de água.

– O que houve? – pergunta Diego.

– Demiti Brend. – afirma Peeta.

– Por que? – pergunta Patrick.

– Acho que isso não é da sua conta. – responde Peeta, sendo hostil.

– Desculpa. – murmura Patrick.

– Algum de vocês são... Hã... São da Capital? – pergunta Peeta.

– Sou do Distrito 7. – responde Patrick.

– Distrito 2. – diz Diego.

– Por que saíram dos seus Distritos? – pergunto ainda com a voz trêmula.

– Pra trabalhar aqui, é claro. – responde Patrick, e eu levo um susto. – Vou poder me exibir por aí e dizer: “Eu trabalhei para Peeta e Katniss e eles são muito gente fina”

Me acalmo quando Patrick complementa sua resposta.

– Eu vim pra cá porque odiava meu Distrito, bando de gente mesquinha. – afirma Diego.

– Onde está o Ray, Peeta? – pergunto.

– Patrick, aonde você enfiou o Ray? – indaga Peeta a Patrick.

– Ah, droga! Espera aí. – ele corre até a dispensa e destranca a porta. Ray sai de lá furioso.

– Não tem aranha verde nenhum lá dentro. Você mentiu pra mim. – diz ele parecendo magoado e corre ao meu encontro, abraçando minhas pernas.

Eu o pego no colo.

– Que feio, Pat. – Peeta finge estar xingando Patrick. – Não é pra trancar o Ray na dispensa.

– Desculpa. – diz Pat tentando segurar o riso.

– Ray e eu vamos buscar a Alice na escola. – falo olhando para o relógio de parede.

– Tudo bem. – responde Peeta.

Saio da cozinha e já sou indagada por Gale.

– Já vai, Catnip? – pergunta ele.

– Vou buscar Alice na escola. Se quiser posso trazer o Louis junto.

– Oh, eu agradeceria.

Caminho até a escola. Na metade sinto meus braços ficarem dormentes pelo peso do Ray.

– Tá, a mamãe cansou. Descendo. – falo o soltando no chão.

– Ahhh.

Ele reclama mas não se opõe a caminhar.

Louis, Alice e Joe correm ao meu encontro assim que me vê.

– Cadê o meu pai? – pergunta Louis.

– Na padaria. Você vai comigo hoje. – respondo.

– E o meu pai, onde ele está? – indaga Joe.

– Como assim? – olho para os lados. – Onde está Haymitch?

– ESTOU INDO!!! – berra ele enquanto corre até nós.

– Onde você estava? – pergunto.

– Perdi a hora. Effie é uma danadinha. – sorri ele.

– Ahh, acho que entendi. Cuidando pra não dar irmãozinhos para o Joe. Este moleque aqui não fazia parte dos meus planos. – sussurro a última frase para Ray não escutar.

– Oh, não. De forma alguma. Vamos Joe. – diz ele puxando Joe pelo pulso.

– Tchau tia Kat. – grita ele.

– Tchau. Agora vamos nós. – falo e começo a caminhar.

Em pouco tempo já estamos na padaria novamente. Alice entra correndo e gritando por Peeta como sempre.

Peeta sai da cozinha e ela tenta pular no colo dele.

– Calma aí, papai está cansadão. – diz ele, largando Alice no chão.

– É a idade. – brinco.

– Vai apanhar. – diz ele pra mim.

– Como é que é? – indago cruzando os braços.

– Eu... Eu... disse que vou cozinhar. – gagueja ele.

– É melhor ir cozinhar mesmo.

Ajudo Alice na lição de casa e ela, Louis e Ray vão brincar com outras crianças na rua. Até a hora que Louis entra correndo na padaria.

– Kat! A Alice e outra menina estão se pegando no pau.

– O QUE?! PEETA!!! – chamo mas já saio correndo porta afora.

Peeta aparece como se tivesse brotado do chão. Corro até a rodinha que se formou em torno da Alice e da outra menina. As duas estavam se agarrando pelos cabelos. Eu agarro Alice enquanto Peeta agarra a outra menina e as afastamos.

– Você vai ver só, sua doida. Mexa com meu irmão de novo e eu te mato. – grita Alice se esperneando.

– Eu é que vou te matar, sua maluca. – berra a outra garota que era loira.

Não pude deixar de lembrar da briga que eu e Delly tivemos a alguns anos atrás.

– Calma aí, ninguém aqui vai matar ninguém. – diz Peeta.

– O que aconteceu? – pergunto.

– Ela chamou o Ray de retardado e empurrou ele. – responde Alice.

– Ei, qual o seu problema? O que o meu filho fez pra você? – pergunto já irritada, ninguém mexe com meus filhotes.

– Ele nasceu. – responde a menina má educada.

– E você também infelizmente. – devolvo na mesma moeda.

Como assim? Estou brigando com uma criança.

A mãe da menina aparece, uma mulher com cara de homem, que parece bem mais grosseira que a filha.

– Quem aí está mexendo com a minha filha? – pergunta ela empurrando as crianças da sua frente.

Eu solto Alice atrás de mim.

– Não tem ninguém mexendo com ela, é a sua filha que está mexendo com as outras crianças.

– Olha só. – diz ela. – Se não é a heroína de Panem. Tá achando que sua filha é santa?

– Não sei, mas a sua deve ser o capeta em pessoa. – respondo.

– Ora, sua miserável. Quem você acha que é? Má educada.

– Posso até ser. Mas mais que a sua filha não sou.

– Katniss, para. – diz Peeta soltando a garota.

– Cala a boca, Peeta. Ninguém toca nos meus filhos. E você, - falo apontando para a mulher – é melhor deixar sua filha longe dos meus.

– Ora, acha mesmo que vou seguir alguma ordem sua?

– Não é uma ordem... É um aviso.

– Louis, chama seu pai que a coisa vai ficar séria. – diz Peeta.

Louis sai correndo em direção a padaria.

– Eu vou ter dar uns tapas garota. Se mete comigo pra você ver.

– É melhor você não mexer comigo. Lembra que eu sobrevivi a duas arenas, uma rebelião e a um namorado telessequestrado.

– Como é que é? – pergunta Peeta.

– Ah, me ajuda aí, caramba. – digo a ele.

Gale chega.

– Muito bem, já chega com esta baderna. Vamos para com a briga. Anda. – Gale começa a me empurrar em direção a padaria.

– Se esta garota mexer com minhas crianças de novo eu não vou perdoar. – aviso por cima do ombro do Gale.

– Já chega, Kat. – diz Peeta me pegando e me jogando por cima do ombro como se eu fosse um saco de farinha. – Pega as crianças, Gale.

– O que você está fazendo? Me solta.

Ele só me larga quando entramos na padaria.

– Você não pode agir assim numa situação dessas. Tem que ser matura. Não se iguale ao nível daquela mulher.

– Desculpa. – murmuro ainda irritada.

Ray entra na padaria e corre na minha direção, me mostrando um machucado no cotovelo.

– Olha, mamãe. – diz ele.

Eu o pego no colo.

– Tudo bem, eu vou cuidar disto.

O resto da tarde foi calma, com exceção de Peeta que passou um sermão com os motivos de eu não poder fazer barracos e todo o blá, blá, blá dele. Escutei metade e o resto fingi que prestava atenção.


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Notas finais do capítulo

E aí, gostaram? O que acharam do nosso Ray fofo usando arco e flecha? E do Brend revelando todos os seu segredos? Barraco da Katniss? Me digam amores. Beijocas da Tia Rafú pra vocês. ;)