Ao nascer de uma nova Esperança escrita por Rafú


Capítulo 35
Capítulo 35


Notas iniciais do capítulo

OIZINHO!!! Mais uma vez atrasada, pensei que ia conseguir postar ontem, mas tive um bloqueio criativo. Me perdoem. Quero agradecer a linda Estér Everllark, pela linda recomendação. Obrigada querida, você é que é fantástica. Você recomendou de todo o coração e eu agradeço de todo o coração. Linda! Espero que gostem do capítulo. Bijus.



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Nunca teria me passado na cabeça que Gale pudesse ser pai. Não importa o número de vezes que eu morresse e nascesse de novo, esta ideia, definitivamente, nunca surgiria. O garoto nem se parece com ele, com exceção dos cabelos. Como pode? O menino não parece ser tão pequeno. Deve ter a idade de Alice.

– É, eu sei. Mas é meu filho. – falou Gale como se estivesse lendo meus pensamentos.

– Quantos anos ele tem? – perguntei.

– Seis. – respondeu ele calmamente.

– O que? Ele é um ano mais velho que Alice. – pensei alto.

– Desculpa, mas eu teria te contato antes, se eu soubesse da existência do meu filho.

– Você não o conhecia? – perguntei surpresa.

– Não, até o mês passado. – diz ele.

Peeta surge na porta da cozinha.

– Katniss, quem é que está... Ah, Gale. E aí, cara? Como vai? – Peeta se aproxima e os dois se cumprimentam.

É bom ver que Gale e Peeta se tornaram amigos e não guardam mágoas um do outro.

– Vou bem. Este aqui é o Louis, o meu filho.

– Jura? Legal. Não sabia que você tinha um filho. – diz Peeta surpreso.

– É, eu também não. – fala Gale rindo.

– Não? Nossa. Eu queria poder conversar com você, mas tenho que cozinhar lá dentro. Então, se você não se importa...

– Ah, não. De forma alguma. Pode ir. – fala Gale.

– Peeta, o Ray está com quem? – pergunto antes que ele entre na cozinha.

Ele parou para pensar.

– PATRICK, O RAY ESTÁ COM QUEM? – gritou ele para Patrick que estava na cozinha.

– NO ESCRITÓRIO COM A ALICE. – respondeu Patrick.

– No escritório com a Alice. – repete Peeta para mim.

– É, eu ouvi. – respondo. Peeta vai para a cozinha. Eu volto minha atenção para Gale e o garoto que continua a se esconder atrás dele. – Então, vamos sentar porque eu quero saber desta história.

Gale, Louis e eu sentamos em uma das mesas da padaria. Alice surge carregando Ray. Ela o coloca em meu colo.

– Mãe, posso brincar lá fora com os outros? – pergunta ela.

– Alice, lembra do Gale? Meu amigo? – pergunto a ela apontando para Gale.

Ela olha para Gale, o avaliando.

– Não. – responde ela.

– Bem, neste caso, meu nome é Gale. Sou amigo da sua mãe. – apresenta-se Gale.

– Olá Gale. – diz Alice, mas logo nota o garoto sentado ao lado de Gale. – Quem é ele?

– Este é Louis, filho de Gale. – respondo.

– Oi, Louis, meu nome é Alice. Quer brincar comigo lá fora? – pergunta Alice para ele, mas o menino não responde, apenas olha para a mesa. – Ei! Louis. Estou falando com você. Quer brincar comigo lá fora? – Alice bufa impaciente. – Ele não fala, mamãe?

– Oh, ele fala sim. Só está encabulado. – responde Gale por mim. Ele dá um leve cutucão em Louis. – Ei. Por que não vai brincar com os outros lá fora, hein?

– Está tudo bem, vamos. – incentiva Alice oferecendo a mão para o menino.

Louis olha para a mão estendida de Alice, e muito devagar leva a sua ao encontro da dela. Alice o puxa para a rua. Ele olha para o pai que acena com a cabeça o estimulando para ir.

– Ele é sempre assim? – pergunto a Gale.

– Não. Ele nunca havia saído do Distrito 2 antes. – explica Gale. – Ele está estranhando. – ele muda a direção de seu olhar, de mim para Ray que estava em meu colo. – Então este é o Ray?

– Ah, sim. Este é o meu menino. – falo sorrindo.

– Mas olha só, a cara de Peeta. Este herdou seus olhos. – ele se aproxima mais de Ray. – E aí? Meu nome é Gale.

Ray apenas ri.

– Você não vai me contar o que aconteceu? – pergunto já curiosa.

– Ah sim. Então, você lembra a primeira vez que vim aqui? Para levar minha família embora?

– Ah sim. Lembro.

– Lembra que eu falei que tinha me relacionado com uma garota por um tempo?

– Sim.

– Bem, na verdade, ela foi quem me deu um chute. Porque estava grávida.

– Oh!

– Pois é. Ela foi embora. Eu lembro que no dia que ela se foi ela gritou comigo, dizendo que eu era um babaca irresponsável. Mas em momento algum havia me informado que estava grávida. Acho que agora eu entendo o que ela quis dizer com “babaca irresponsável”.

– Puxa vida Gale. Que coisa horrível.

– É.

– Mas então... Como você descobriu a existência do seu filho?

– Ah, ela morreu.

– Oh, Deus. Gale, eu sinto muito.

– Ah, mas eu não sinto.

– Hã?

– A desgraçada passou seis anos escondendo meu filho de mim, tinha mais que morrer mesmo.

– Bem, vendo por este ponto de vista...

– Os avós não quiseram se responsabilizar por ele, então ele está comigo.

– Mas o que você está fazendo aqui no 12?

– Ah, fui expulso do Exército.

– Nossa! Por que?

– Bem, Katniss. Você mais do que ninguém sabe que carregamos cicatrizes emocionais da Revolução. Eu também tenho pesadelos à noite. Eu também vejo corpos mutilados no meio do sono. Mas o problema foi quando passou dos pesadelos para a vida real. Eu ouvia um tiro e me desesperava, saía correndo, achando que precisava salvar alguém. Achando que bombas cairiam do céu a qualquer instante. Me mandaram para uma clínica psiquiátrica. Me tratei dois meses lá, mas ainda estava meio mal. Foi então que descobri Louis. E jurei a mim mesmo que aguentaria a barra por ele.

– Então você vai se mudar pra cá?

– Vou sim.

– E sua mãe e seus irmãos?

– Eles não quiseram vir.

– E você vai sustentar um filho com que dinheiro?

– Eu ganho indenização da Capital. Você também ganha, não é?

– Ganho sim. – respondi.

Todos que tiveram uma importância maior ou são vencedores dos Jogos Vorazes, ganham uma indenização da Capital todo mês. É bastante dinheiro. A renda que Peeta ganha na padaria, ele divide entre os funcionários. Como não são muitos, os funcionários ganham muito bem. Mais do que o necessário.

– Bem, eu queria um favor.

– Pode falar.

– Quero um emprego. Quer dizer, não quero que meu filho ache que sou um vagabundo que fica em casa sem fazer merda nenhuma.

– Você quer um emprego? E como eu posso ajudar nisso?

– Eu quero saber se Peeta não tem algo útil pra eu fazer aqui na padaria?

– Você... Quer... Trabalhar... Na padaria? – pergunto sem acreditar.

– É, quero.

Paro para pensar. O que poderia acontecer de tão ruim se Gale trabalhasse aqui? Lembrei do dia que Peeta e Gale brigaram na cozinha. Não. Isto não aconteceria de novo. Peeta e Gale são amigos agora. Eles não vão se matar. Ou será que vão? Não, não vão não. Gale é pai agora. Ele não vai querer ensinar coisas erradas para Louis. Ele vai querer ser um exemplo para ele. Ele já quer isso, quer trabalhar mesmo já ganhando a indenização da Capital.

– PEETA! PODE VIR AQUI UM MINUTO? – grito da mesa mesmo, sei que há clientes ainda dentro da padaria, mas estou pouco me importando com eles.

– Fala, amor. – diz ele, batendo as mãos uma na outra para tirar a farinha.

– Gale quer um emprego na padaria?

Peeta olhou para Gale, mas não consegui decifrar nada.

– E o exército? – perguntou ele.

– Fui expulso. – Peeta continuou quieto. – Olha, nem precisa me pagar. Eu faço qualquer coisa. Sei lá, eu varro o chão. Qualquer coisa.

– Ele pode ficar no lugar da Lucy. – diz Peeta para mim.

– No lugar dela? Por que? Você vai demiti-la? – pergunto.

– Não. Ela me pediu demissão ontem. Ela quer estudar na Capital.

– Você não me contou.

– Com o seu temperamento ontem, seria impossível. – disse ele.

– Então... Estou contratado? – pergunta Gale.

– Sim, ficará no balcão. Atenderá pedidos. Os clientes. Servirá eles. Anotará encomendas. De vez em quando limpará as vidraças. – responde Peeta.

– Oh, muito obrigado. – diz Gale.

– E será pago. – enfatiza Peeta.

– Não, não quero o...

– Não perguntei se queria ou não. Katniss vai te mostrar como se faz, você começa amanhã. – Peeta termina e não espera reposta alguma, apenas volta para a cozinha.

Gale me olha boquiaberto. Acho que não esperava que Peeta falasse com tanta arrogância.

– Ele é sempre assim? – pergunta ele.

– Ele é o patrão. Tem que ter pulso forte. Melhor não contradizer ele.

– Não irei. Então... vai me ensinar a trabalhar aqui?

– Sim. – me levantei e me virei para os poucos clientes que haviam ali. – PESSOAL, ESTE É O GALE. ELE COMEÇA A TRABALHAR AQUI AMANHÃ. – todos disseram um “bem vindo, Gale”. – TENHO QUE ENSINAR ALGUMAS COISAS A ELE. QUEM QUER FICAR COM RAY PRA MIM POR ENQUANTO? – as mulheres todas levantaram as mãos, pois é, Ray é uma criança desejada. – Ela levantou primeiro. – falei caminhando até uma loira e deixando Ray com ela.

Mostrei a Gale como mexer na caixa registradora, onde anotar os pedidos, aonde pendura-los. Como anotar os pedidos de encomenda. Entre outras coisas. Ele aprendeu rápido.

– Obrigado, Catnip. – diz ele me abraçando quando Peeta já estava fechando a padaria.

– De nada. Então... vai morar aonde?

– Fiquei com a primeira casa da Vila. A Presidente Paylor me doou ela.

– Oh, vai morar perto de casa então.

– Parece que sim. Pelo menos Louis terá com quem brincar.

Caminhamos todos juntos para casa, já que agora Gale mora na Vila dos Vitoriosos também. Nos despedimos rapidamente e fomos para a nossa casa. Minha casa é uma das últimas da Vila.

Assim que chegamos, Peeta atira a bolsa de Ray no sofá.

– Estou exausto. Vou tomar um banho e desço para preparar o jantar. – diz ele.

– Tudo bem, deixa que eu faço o jantar. Pode descansar. – digo, colocando Ray no cercadinho.

– Ok, obrigado.

Ele sobe e eu preparo o jantar. Ele fica bastante tempo no banho. Sinal de que ele realmente está cansado. Ray acabou dormindo, eu coloquei ele no berço e voltei para a cozinha. Onde Alice estava quase caindo também.

– Está cansada? – pergunto.

– Muito. – responde ela com a cabeça deitada na mesa.

Ela não conseguiria esperar até o jantar. Mas o que está acontecendo aqui? Está todo mundo caindo pelos cantos. Preparei apenas um sanduiche e um achocolatado para Alice e deixei ela ir dormir. Peeta voltou depois que Alice se foi.

– Cadê as crianças? – pergunta Peeta.

– Dormindo. Está todo mundo cansado hoje. Até você. – digo mexendo o molho da panela.

Ele se aproxima. Me abraça por trás e beija meus cabelos. Em seguida, tira a colher da minha mão, pega um pouco do molho, assopra e prova.

– Hmm. – diz ele me devolvendo a colher, mas ainda me abraçando. – Isto está muito bom. Viu só? Está pegando o jeito.

– Eu duvido. – digo rindo.

– Está sim. Só falta um pouquinho mais de sal. – diz ele pegando o saleiro.

Comemos a comida tranquilos, um raro momento em que jantamos sozinhos, já que as crianças quase sempre estão junto.

– Nenhum problema Gale trabalhar na padaria? – arrisco perguntar sem tirar os olhos do meu prato.

– Claro que não. Por que haveria? – diz ele.

– Não sei.

– Katniss, eu não guardo rancor algum dele. E espero, sinceramente, que ele não guarde de mim.

– Se ele guardasse rancor de você, nunca procuraria emprego na padaria.

– Isso é verdade. Mas que droga, Katniss!!!

– O que foi??

– Você está, definitivamente, proibida de cozinhar melhor do que eu!!! Isto aqui está muito bom. Eu não aceito isso. Ninguém, nem mesmo você, pode cozinhar melhor do que eu.

Eu apenas rio, sei que não está tão bom quanto ele diz, mas decido entrar na brincadeira.

– Talvez um dia, eu te passe a fórmula secreta. – digo sussurrando como se ninguém pudesse ouvir.

– Eu exijo a fórmula secreta imediatamente.

Eu me levanto, levando meu prato para a pia.

– Talvez a fórmula secreta seja amor.

Ele se levanta e coloca o seu prato na pia e me abraça por trás.

– Isto eu tenho de sobra. – sussurra ele.

Ele me vira de frente e me beija. Mas interrompe o beijo e me abraça enquanto boceja. Eu rio e o empurro para trás.

– Vai dormir. – digo a ele.

– Não. Você fez o jantar, então eu lavo a louça.

– Não, você trabalhou o dia inteiro. Então vá dormir, porque você está tão cansado que seus olhos chegam a estar vermelhos.

– Não posso negar. Estou mesmo. Boa noite. – diz ele me beijando.

– Boa noite. – digo de volta e ele se vai, me deixando sozinha na cozinha.

Limpo a louça enquanto murmuro uma canção. Depois de toda a louça estar limpa, começo a limpar a mesa. Mas largo o pano ao ouvir os gritos de Peeta.

– EU NÃO SEI DE NADA, EU JURO!!! POR FAVOR!!! PARA!!! – grita ele desesperadamente.

Largo o pano na mesa e corro escada acima em direção ao quarto. Quando ligo a luz, vejo Peeta se contorcendo na cama enquanto implora que parem de fazer algo. Começo a sacudir ele. Ele leva um susto quando abre os olhos e me vê. Dá um pulo pra trás e cai no chão. Bate a cabeça na cômoda e se levanta rapidamente enquanto noto um fio de sangue escorrer de sua cabeça.

– Peeta? – eu digo ajoelhada na cama. – Peeta?... Peeta, está tudo bem.

Ele está confuso, está assustado, está fora da realidade. Me levanto mas não caminho até ele com medo de assusta-lo. Ele me olha, imóvel. Ele corre até mim. Eu me assusto, achando que ele estivesse tendo um flashback. Mas ele apenas me abraça e começa a chorar.

– Diz pra ele, Katniss. Diz pra ele que eu não sei de nada. Eu juro que não sei. Katniss... Katniss... Diz pra ele, por favor. Eu não sei de nada.

Peeta me prensou contra a parede me abraçando. Alguns flashes passam em minha mente, a primeira entrevista de Peeta que vi no Distrito 13. Pude ouvir sua voz claramente em minha mente: “Mas ela não sabia o que estava fazendo, nenhum de nós sabíamos que tinha um plano acontecendo dentro da arena.” Ele não sabe de nada. O torturaram para descobrir o que ele sabia, mas ele realmente não sabia de nada. Ele disse que não sabia de nada, mas obviamente não acreditaram nele. O abracei mais forte.

– Shhh, está tudo bem. Foi só um pesadelo. Está tudo bem. Ninguém vai machucar você. – o consolei.

Ele para de me abraçar e olha em meus olhos.

– E você? Vai me machucar, Katniss?

– Por que eu machucaria a pessoa que eu estava tentando salvar? – pergunto de volta. Ele me olha desconfiado. Maldito pesadelo. Ele está em dúvida. Pego a mão dele e o levo até o quarto de Alice. Por sorte a porta estava fechada e ela não acordou com a gritaria de Peeta. – Olha. Ela não é linda?

– É muito linda. – responde ele, olhando para a menina.

– Você sabe quem é ela, não sabe, Peeta? – ele me olha procurando a resposta certa para dar, eu sorrio. – É sua filha. Alice. Meus cabelos, seus olhos. A sua Pequena Sunshine. – ele me olha admirado, vejo um sorriso se formar em seus lábios. Mas vejo em seus olhos o ponto de interrogação ainda. O arrasto pelo corredor até chegar ao quarto de Ray, que estava de pé no berço. Como Peeta disse: ouvidos de caçador. O garoto sorri quando nos vê. – E ele, Peeta? Ele é lindo também, não é?

– É.

Pego Ray do berço e paro com ele na frente de Peeta.

– Quem é ele, Ray? – pergunto.

Ray ri e aponta para Peeta.

– Papa! – responde ele sem pestanejar.

Peeta ri e deixa uma lágrima rolar pelo rosto enquanto tira o garoto de meus braços.

– Seus cabelos, meus olhos. – comento.

Peeta senta na cadeira de balanço e olha fixamente para a parede movendo os olhos, como se um filme estivesse passando em sua frente.

– Katniss? – pergunta ele.

– Sim?

– Você lembra se eu desliguei a luz do escritório da padaria? – pergunta ele.

Eu rio.

– Desligou, eu lembrei você de desligar.

– Ah, é verdade. Que dia eu falei que Gale começaria a trabalhar?

– Amanhã.

– Que idiotice. Amanhã é sábado. Eu não abro a padaria no final de semana.

Eu rio mais e pego Ray do seu colo.

– É só telefonar pra ele. – respondo. – Eu peguei o número. Vamos descer para que eu possa limpar este machucado que você fez na cabeça.

Fomos para a cozinha, onde estava a caixa de curativos. Peeta sentou em uma cadeira e ficou com Ray em seu colo. Limpei o machucado. Peeta pegou o número de Gale e foi telefonar para avisar que amanhã a padaria não abre. Enquanto isso, eu amamentei Ray.

– Pensei que quisesse parar de alimentar ele no peito. – comentou Peeta.

– Não dá. Se eu não amamento ele, meu peito dói. – respondo.

– Isso é uma droga. Coitada daquelas mães que perdem as crianças.

– Sim, coitadas.

Ray acabou dormindo de novo. Depois de coloca-lo no berço, Peeta eu fomos para o quarto. Deitamos e me abracei em Peeta, como de costume.

– Não quero dormir. – sussurra Peeta para mim.

– Por que não?

– Estou com medo dos pesadelos.

– Não precisa ter medo. Eu estou aqui. – digo antes de pegar no sono.

Acordo no outro dia, e ao invés de encontrar Peeta ao meu lado encontro um bilhete dele deixado em seu travesseiro:

“Fui na estação de trem buscar algumas encomendas que fiz para a padaria.
Te amo.
Com amor,
Peeta Mellark”


Me espreguicei. Levantei e fui tomar um banho. Quando saí, passei no quarto de Ray, ele, como de costume, já estava acordado. Que horas será que este garoto acorda? Sempre que levanto e vou ao quarto dele, ele já está de pé dentro do berço.

– É claro que você já acordou. – digo o pegando de dentro do berço.

– Mama. – diz ele.

– Fruta. – retruco no mesmo tom.

Passo no quarto de Alice, mas ela não acordou ainda.

– AICE!!! – grita Ray.

– Shhh, fica quieto. Você vai acordar ela. – digo saindo do quarto antes que ele a acorde. Fui para a cozinha, piquei uma maçã em uma vasilha de plástico e dei para Ray comer. Ele começou a colocar tudo de uma vez na boca. – Ei! Uma de cada vez. Se não você vai se engasgar. – ele começou a comer direito.

Olhei para a rua, vendo o sol brilhando e notando que a neve desapareceu. Derreteu rápido. Estava quente até. Tempo maluco. Um dia está frio e no outro está quente. Mas hoje é um ótimo dia para ir a floresta.

– Mãe. – chama Alice.

Eu me viro e vejo ela esfregar os olhos.

– Bom dia, meu amor. – digo a ela, já pegando as coisas para preparar seu café da manhã.

– Cadê o papai?

– Ele foi na estação de trem buscar algumas coisas para a padaria. – respondo.

– Ahhh. – diz ela, sentando-se a mesa. – E quando ele volta?

– Não sei. Mas estava pensando em ir para a campina hoje. Você quer ir?

Logo vejo os olhos de Alice se iluminarem.

– Quero. – responde ele prontamente.

– Então tome seu café-da-manhã. - falo colocando a caneca e o pão em sua frente.

– Mas e o papai?

– Eu vou deixar um bilhete pra ele, depois ele nos encontra lá. Ou a gente encontra ele. – digo rindo, pois sei que Peeta se perde se ficar sozinho na floresta.

Nós tomamos o café. Alice sobe para se arrumar. Eu arrumo a cozinha e depois subo, para arrumar Ray, os cabelos de Alice, trocar a minha roupa. Levo uma pequena mochila que possui coisas mais para Ray do que para Alice. Escrevo o bilhete para Peeta e deixo em cima da mesa da cozinha.

Saímos de casa e caminhamos devagar, sentindo o sol no rosto. Olho para as casas que há ao redor, e me lembro de quando tudo não passava de cinzas e cadáveres. O Distrito 12 mudou muito daqueles tempos para cá. Eu mudei muito daqueles tempos para cá. Lembro de quando voltei ao 12 depois da Revolução terminar. Eu era só carne, osso e pele. Porque a minha alma tinha sido perdida, eu não via alegria em nada. E por mais que as pessoas me dissessem o quanto estavam agradecidas por eu ter transformado Panem em um lugar onde podemos viver e não sobreviver, eu me sentia vazia. Mas ao mesmo tempo me sentia pesada. Lembrava de todas as mortes. De todos que morreram diante dos meus olhos. Oh, como eu queria que eles estivessem aqui hoje. Como eu queria que eles vissem como Panem cresceu desde a morte deles. Cinna, Finnick, Rue, Boogs, Prim... PRIM! Como eu queria que ela conhecesse meus filhos. A minha pequena médica não teve tempo de viver a sua carreira. Mas, quem sabe se eles não estão vendo tudo agora mesmo? Talvez estejam vendo tudo lá de cima.

Adentro a floresta seguida por Alice, sei que ela está logo atrás de mim, mas sempre olho para trás para confirmar. Tomo cuidado com pedras e outros atritos que estejam no caminho, pois Ray está em meus braços e não vai ser nada legal tropeçar e cair com ele no meu colo. Enfim, chegamos na campina. Um lugar que nunca muda. Continua verde. Menos quando neva, aí fica branco. Mas a neve derreteu, então no momento está verde.

Alice sai correndo assim que avista o tapete verde, para ser sincera, eu senti vontade de correr junto, mas... Onde ficaria Ray? Então, estendo uma toalha no chão e me sento com Ray, tirando alguns brinquedos de dentro da mochila e os espalhando na toalha para ele brincar. Ele se se diverte rapidamente. Alice chega até nós, ofegante:

– Trouxe água, mamãe? – pergunta ela.

– Trouxe sim. – respondo, tirando a garrafa de água e estendo para ela.

Ela senta, bebe a água e me devolve a garrafa. Alice continua na toalha, brincando com Ray.

Fiquei mais tempo do que queria na campina, pois esperava que Peeta viesse nos encontrar, mas como ele não apareceu, guardei as coisas na mochila e voltamos a caminhada para casa.

Chegamos em casa, eu joguei a mochila no sofá.

– Peeta!!! Chegamos! – gritei de onde estava. Mas não obtive nenhuma resposta. Coloquei Ray no cercadinho e saí pela casa a procura de Peeta, mas não o encontrei. – Alice!

Alice veio correndo.

– Que?

– Fica aqui com seu irmão que eu já volto, ok?

– Ok.

Saí e fui a casa ao lado. Bati na porta.

– Olá, docinho. – fala Haymitch assim que me vê.

– Viu o Peeta? – perguntei sem rodeios.

– Sim, ele estava atrás de você e das crianças. Disse que foi buscar algumas coisas na estação de trem e que quando voltou a casa estava vazia. Ele disse que você não deixou bilhete algum, então...

– O que?! Eu deixei um bilhete em cima da mesa da cozinha!!!

– Então seu bilhete evaporou, porque o garoto não o viu.

– Tá. Obrigada. – falei já dando as costas.

– De nada, docinho. Se prepara que ele deve estar bem irritado.

Tive que dar razão a Haymitch. Nem consigo imaginar o que Peeta deve estar achando que eu fui fazer com as crianças. Voltei para casa, e fui a cozinha ver o bilhete que deixei. Ele realmente havia sumido de cima da mesa. Procurei pelo chão e o encontrei perto da lata de lixo.

– Mas como ele veio parar aqui? – perguntei a mim mesma e no mesmo instante vi a janela da cozinha aberta. – Ótimo, deixei a janela aberta. – um vento deve ter entrado pela janela e levado o bilhete. Coloquei o bilhete no bolso da minha calça. – Alice!

– Que, mãe? – diz ela adentrando a cozinha.

– Vamos procurar o papai. – digo a ela, indo para a sala e pegando Ray. – Vamos.

Atravesso a Vila dos Vitoriosos e avisto a casa de Gale. Decido passar ali antes de seguir. Bato na porta. Gale atende e suspira.

– Katniss, oi. – diz ele.

– Você viu o Peeta? – pergunto.

– Sim, entra aí que ele está tendo um treco. – fala ele me puxando pra dentro.

– O que? Ele está aqui?

Ele não responde, apenas me empurra até a cozinha. Peeta está lá, andando de um lado para o outro. Até me notar dentro da cozinha, ele para e corre até mim me abraçando com cuidado, pois Ray estava no meu colo.

– O que você tinha na cabeça? – ele grita, me largando e dando três passos para trás.

“Vai começar”, penso comigo mesma.

– Olha, eu fui dar uma volta com as crianças. É errado passear com meus filhos agora? – pergunto, tentando manter a calma.

– E não dava pra deixar um bilhete? Eu achei que... Que... Ah, sei lá. Tivesse fugido com eles ou outra coisa qualquer.

– O que? Você acha mesmo que eu iria embora de uma hora para outra sem te avisar? Você bebeu por acaso? E eu deixei a droga de um bilhete em cima da mesa, mas o vento o levou. – falei tirando o bilhete que estava amassado dentro do meu bolso e o atirando na mesa.

Ele o pegou olhando para mim, desamassou e leu.

– Você foi na campina com os dois? – perguntou ele.

– Fui? Por que?

– Levou os dois, sozinha para lá?

– Ah, Deus!!! – eu bufei. Me virei para Alice e entreguei Ray para ela. Me virei para Gale. – O Louis está?

– Ele está lá em cima. – responde Gale.

– Alice, fica lá em cima com o Louis.

– Eu não sei onde é o quarto dele. – diz Alice.

– Tudo bem, eu mostro. – diz Gale empurrando Alice para fora da cozinha.

Me virei novamente para Peeta.

– É, levei. – respondi finalmente a pergunta dele. – Por que? Algum problema?

– Claro que há um problema. E se vocês se perdessem?

– O que?! Está falando sério? Você sabe que eu conheço aquele lugar muito bem.

– Tá, mas Alice não conhece. E se ela se perdesse?

– Ela não ia se perder. Eu estava de olho nela e Ray estava no meu colo.

– E se aparecesse algum lobo? Se você se machucasse? Se acontecesse qualquer coisa? Ia fazer o que?

– Pela amor de Deus, Peeta. Como você é pessimista. Não aconteceu nada. Olha pra mim. Estou inteira, Ray está inteiro e Alice também.

– Não faça mais isso. Não vá sozinha com eles para a floresta.

– Está querendo insinuar que eu não sou responsável o bastante para cuidar sozinha dos meus filhos?

– Não é isso. É só que você é uma e eles são dois.

– Ah, qual é? Ray tem apenas onze meses, ele nem sequer caminha. Eu não acredito que depois deste tempo todo, você não confia em mim. – falei virando as costas e indo pra rua.

– AONDE VOCÊ VAI? – pergunta ele da varanda de Gale.

– PRA CASA, VOCÊ LEVA AS CRIANÇAS DEPOIS, JÁ QUE EU NÃO SOU UMA MÃE BOA O SUFICIENTE PARA CUIDAR DOS MEUS FILHOS!

– NÃO FOI ISSO QUE EU DISSE!

– NÃO COM ESTAS PALAVRAS, MAS DEIXOU BEM CLARO.

Effie e Haymitch saíram de suas casas, parecem ter escutado a algazarra. Haymitch correu até mim.

– Mas o que é isso? – pergunta ele.

– Sou uma mãe irresponsável, é isso. – respondi passando por ele.

Effie parou perto do chafariz, ela meu puxou quando fui passar por ela.

– Katniss, calma querida! – diz ela com paciência.

– O que é isso? Me solta. – falo puxando meu braço.

– Katniss, meu bem, ele só estava preocupado. Você sabe muito bem como ele é. Ele não fazia a mínima ideia de onde vocês estavam.

Olhei para trás e vi Haymitch conversar com Peeta na sacada de Gale.

– Isto é uma doença. Ninguém é tão preocupado a este ponto. – falo, voltando a olhar para Effie.

– Ele é assim. Os Jogos o modificaram, Katniss. Os Jogos, A Revolução, o telessequestro... E isso modificou você também. Isso modificou Panem inteira. Como vamos saber o que se passa na cabeça dele, quando brigas como estas acontecem? Será que ele não vê as memórias implantadas nele?

Fechei os olhos. Ouvir alguém falando dos Jogos Vorazes, da Revolução e do telessequestro ao mesmo tempo, me faz ver imagens em minha cabeça. Tento me concentrar em Effie e ignorar as imagens de explosões a minha frente.

– Ele acha que eu não sou... – parei de falar pois comecei a ouvir uma voz.

“Você me matou, Katniss.”

Olhei ao redor procurando o dono daquela voz.

– Katniss? – ouço a voz de Effie, mas parece tão distante que levo um choque quando noto que ela está bem na minha frente.

“Você me matou, Katniss”, ouço uma voz diferente repetir a frase.

– Finnick? – tento adivinhar de quem é a voz.

– O que? Katniss, está me ouvindo? KATNISS!!! – chama Effie.

“Você me matou, Katniss.”, outras vozes se juntam com a de Finnick, e noto que reconheço todas elas.

Olho para os lados, procurando os donos das vozes, mas não há ninguém falando aquilo. Começo a dar alguns passos para trás, tentando, devagar, fugir das vozes que parecem cada vez mais próximas.

“Você me matou, Katniss”, ouço a doce voz de Prim no meio das outras.

– Prim? – tento chama-la para mim, apesar da acusação que ela me faz.

– Katniss? KATNISS, OLHE PARA MIM!!! – chama Effie em desespero.

Mas não dou atenção, pois me prendo a voz de Prim. Ela repete a frase: “Você me matou, Katniss. Por quê? Porque fez isso? Eu te amava tanto.”

– Prim? Prim, me desculpa. Prim? Prim! PRIM!!! – saio correndo, eu preciso acha-la, eu tenho que encontra-la. Não posso perde-la novamente. – PRIM, ONDE VOCÊ ESTÁ?

– KATNISS!!! – ouço a voz de Peeta vindo ao meu encontro. Sei que ele está correndo até mim. Mas a única pessoa que consigo pensar agora é Prim.

– PRIM!!! – começo a chorar.

– Estou aqui. – ouço sua voz atrás de mim.

Me viro e levo a mão a boca ao ver seu estado. O corpo coberto de sangue. Vejo pedaços de carne lhe faltando.

– Prim... – sussurro, mas não consigo completar a frase. “Me perdoe, Prim. Me perdoe.”

Sinto um puxão e logo noto que é Peeta me arrastando para longe dela.

– Katniss...

Tento me livrar de seus braços.

– NÃO! ME SOLTA! PRIM! – vejo ela dar as costas e se esconder na escuridão.

Peeta segura meu rosto com as duas mãos.

– Katniss! Para! Me escuta! É uma alucinação. Não é real. Não é a Prim. Você sabe que não é ela. É coisa da sua cabeça. Vamos, Katniss! Não é real. – ele coloca a minha mão em seu peito, e sinto seu batimento cardíaco acelerado. – Está sentindo isso? Isso é real. Eu sou real, Katniss. Eu estou aqui.

– Peeta... – não termino de falar, pois sinto meu corpo ficar inerte e tudo se apaga na escuridão.

Acordo na minha cama, levanto de sobressalto. Foi um pesadelo? Foi real? Eu não faço mais a mínima ideia. Me levanto e corro escada abaixo.

– Katniss? – ouço a voz de Peeta quando atravesso a cozinha.

Volto e noto ele de pé, e Ray sentado na cadeirinha.

– Peeta... – corro até ele e o abraço. Ele aperta os braços ao meu redor e me sinto bem mais segura do que quando acordei. – Peeta, eu não sei o que aconteceu. Era um pesadelo? Era real? Eu estava alucinando?

– Calma, você teve uma alucinação e desmaiou. Está tudo bem. Eu liguei para o médico que substituiu o Doutor Aurelius. Ele disse que isto pode vir a acontecer às vezes, vai mandar um remédio pra você.

– Eu não posso, estou amamentando.

– Eu sei, eu disse a ele. Fica tranquila, ele vai mandar um remédio que não afeta isto. – ele parou um instante e respirou fundo. – Desculpa, não tinha necessidade de gritar com você.

– Tudo bem, a culpa é minha. Dava para ter esperado você ter voltado e iriamos todos juntos para a campina.

– Você tem o direito de sair sozinhas com eles.

– Eu não queria sair sozinha. Eu pensei que você fosse ler o bilhete e encontrar a gente lá. Mas a burra aqui, esqueceu a janela da cozinha aberta.

– Não diga isso. Acontece. Não é culpa sua. Eu sou um idiota também.

– Não, você não é.

– Sou sim.

– Não é.

– Estou dizendo que sou.

– E estou dizendo que você não é.

– Chega! Não quero começar outra briga. Estou esperando o beijo que você me dá toda a vez que pedimos desculpas, depois de uma briga. – Me aproximei dele e o puxei pelos cabelos, o beijando. Ele retribuiu, me puxando pela cintura para perto dele. Somos interrompidos por Ray.

– PAPÁ. – grita ele.

Peeta me solta rindo.

– Eu sei, estou fazendo o papá. Se acalme.

Fomos para a campina mais uma vez. Desta vez sem brigas, e espero que continue assim.


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Notas finais do capítulo

Como eu disse a algumas de vocês, a mãe de Louis é o menos importante, tanto que o nome da mami dele nem aparece. O que vocês acham do Gale trabalhando na padaria? Hehehe. Peeta e seus chiliques de super protetor, mas todos sabem que ele só é uma pessoa super preocupada. Quero comentários. Beijocas da Tia Rafú pra vocês!!! ;)