Maon se perdeu duas vezes antes de chegar à Reserva. Na primeira, ele saíra em uma cratera com três metros de diâmetro que ficava a quilômetros à oeste da entrada; na segunda tentativa, Maon chegara até uma parte desconhecida das ruínas. Apenas horas depois, quando já escurecera e as luzes da Reserva surgiram no céu, foi que Maon chegou à entrada.

As equipes de buscas estavam sendo montadas quando ele apareceu. O chefe dos patrulheiros, Levi Hortys, o recebeu apenas horas depois. Os olhos escuros do chefe estavam carregados de irritação e as sobrancelhas grossas pareciam enormes lagartas zangadas.

–--Quem foi que deu a porra da permissão para você e a orfãzinha irem procurar por lobisomens? ---ele gritou. O rosto adquiriu um tom de vermelho vivo.

–--O senhor tem toda razão, e...

–--É claro que eu tenho razão, idiota! ---ele bateu na mesa.

–--A culpa é toda minha, mas...

–--Eu sei disso. Agora me deixe e prepara-se para fazer turnos extras pelo resto da sua vida.

–--Correto, senhor, mas a...

–--Eu não quero saber! ---ele gritou.

–--Mas, Samantha, ela está...

–--Que se dane, aquela lá! Não vamos procurar por uma Impura qualquer. Ela nem era uma patrulheira. Que o conselho dos servidores do cafezinho organize uma patrulha. Ela não servia nem como lobisomem nem como patrulheira.

–--Ela foi a melhor nos testes! ---Maon gritou.

–--Cale a boca! Quer ficar retido pelo resto dessa merda de vida? ---o chefe se levantou irritado. ---Esqueça! Samantha é o nome da impura, não é? Mesmo se eu fizesse alguma coisa...o que eu iria procurar? Os ossos da menina? Saia antes que me faça ter um ataque cardíaco.

Maon sentiu o ódio borbulhar em sua garganta e aquecer seu coração. Ele desejou que Levi morresse naquele momento, mas suas preces não foram atendidas. Ele deixou a sala do chefe e se preparou para as patrulhas nas muralhas. Apenas os piores patrulheiros ficavam com a muralha; era frio, solitário e completamente desnecessário. Os Filhos da Noite não tem armas tecnológicas desde a última grande guerra. É impossível que uma tropa deles surja dessas ruínas de merda com uma bomba, Maon pensou amargo.

–--Saia da frente, soldadinho! ---um dos chefes da segurança empurrou Maon para o lado.

Atrás de si, seguiam cinco homens; três deles usavam as roupas dos Diplomatas, os responsáveis pela comunicação entre as reservas. Nenhum deles pertencia a diplomacia daquela Reserva, Maon notou. Havia também um homem com o uniforme dos médicos, mas no símbolo das costas ele exibia o símbolo da Reserva de Nova York. Seguindo ao lado do médico, estava um garoto com no máximo 19 anos; cabelos escuros e expressão sombria. Ele usava a roupa dos cidadãos, mas o revolver em sua cintura e a faca presa ao ombro deixava claro que aquilo era mentira.

Maon encarou-os por mais alguns minutos até o garoto o olhar de volta. Os olhos azuis claros e brilhantes pareciam ao mesmo tempo calmos e selvagens. Ele ergueu um leve sorriso para Maon; um sorriso arrogante e de escárnio, antes de se virar e seguir os outros até a sala de Levi.

Uma folha de papel escapou da pasta que o médico segurava e Maon a pegou antes que alguém percebesse. Guardou-a no bolso do colete a prova de balas e se apressou a ocupar seu posto nas muralhas. Do alto, ele podia ver as ruínas ao seu redor, as cidades conservadas ao norte, as florestas reivindicando seu lugar. E em algum lugar Samantha devia estar sofrendo. Atacada pelas feras. Tudo por sua culpa.

Com cuidado, Maon desdobrou a folha de papel e encarou os gráficos estranhos e complexos que não significavam nada para ele. No topo da página em letras grandes e sublinhadas estava: Gene do Lobo Albino – Experiência 001/2.Abaixo dos gráficos e de um conjunto de números estava escrito: Processo de expressão genética suprimido. Necessária ativação por exposição ao agente patogênico ( malum lupus). Possível reação negativa, requisitando combinação com a Experiênia 001/1. PS: Reprodução de resultados obtidos com Experiência 789 (reestruturação genética fetal) tornou-se insatisfatória pela falha na produção de anticorpos.

–--E então, bonitinho, que tal me devolver aquela folha que você roubou? ---o garoto de antes sorria para Maon. --- Levi não vai gostar de saber que tem um ladrãozinho na patrulha.