O Colar do Parvo escrita por Marko Koell


Capítulo 21
A reunião de Átimos




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Todos nós estávamos extremamente cansados. Exaustos. Talvez nem tanto os outros, mais eu sentia um cansaço fora do normal. Dormi durante muito tempo, fora que eu acordava, olhava para Matheus e voltava a dormir novamente. Ele me abraçava forte e por algumas vezes, quando eu abria os olhos, eu ouvia ele dizer que me amava e que não deixaria nada acontecer comigo.

A verdade era outra. Seria eu que deveria protegê-lo e não ao contrário. Mais eu não podia dizer aquilo para ele, eu sentia que ele gostava de proteger, de ser quem mandava. Algo normal a ele, vindo da sua índole, e que eu particularmente, adorava. Fiquei ali mais algum tempo deitado quando alguém bateu na porta e Alim disse para todos ficarem em silêncio.

– Alim, homem, abra essa porta. – disse um rapaz.

– Não, não. Hoje eu não vou abrir.

– Porque homem?

– Tenho afazeres aqui e estou com uma prima...

– Uma prima? Apresente a mim, prometo fazê-la feliz... – o homem riu.

– Vá embora, abriremos apenas amanhã!

– Alim, abra essa porta.

– Não.

– Deixe de ser chato homem...

– São as ordens, rapaz... são as ordens. Se quer que eu a desobedeça, fale com alguém dos Soberanus, está bem? Se alguém permitir...

– Eu não vou falar com nenhum deles... abra essa porta.

– Gente chata! – disse ele a nós sussurrando. Todos pareciam estar atentos.

– Abra Alim...

– Eu já disse que não rapaz. Vamos vaze daqui agora.

O homem resmungou e saiu.

– Esses bêbados. – disse Alim.

Algum tempo depois, Alim trouxe a nós costelas, pão e arroz. Jantamos rapidamente já que não podíamos ficar com as luzes acesas por muito tempo, para não chamar fregueses. Mesmo assim um ou outro batia a porta da taberna, e Alim sempre dizia a mesma coisa.

– Pois bem, daqui a pouco será meia-noite e os soldados de Átimos viram me buscar. Vou buscar o máximo de informação possível. – disse Alim.

– Eu acho arriscado! – disse Kauvirno.

– Sempre é, no entanto já faço isso há tempos, não com esse ilustre senhor, chamado Átimos, mas confiem em mim.

Alim e Kauvirno, junto de meus pais e Tereza conversavam de um lado da taberna, próximo ao balcão. Eu e Matheus ainda estávamos grudados no canto da sala, quando Nathan e Adrian se aproximaram.

– E então como vocês estão? – perguntou Nathan.

– Nem tenho palavras! – disse Matheus aturdido.

– Como deixamos aquilo acontecer? – perguntou Adrian.

– Eu pergunto o mesmo a vocês... não sabiam que era arriscado trazer alguém de fora? – eu perguntei.

– Sim, sabíamos. Mais sabe como é. A garota era linda, provavelmente um encanto de amor a primeira vista.

– Sim Adrian, mais apenas você fora atingido por ele. Eu não me senti tão alucinado por ela. – disse Nathan – Muito menos Matheus. Nós nos distraímos, mais não ficamos encantados.

– E como faz para não ser atingido por esse encanto? – eu perguntei.

– É preciso não estar amando outro alguém. – disse Adrian – Fora isso, você não é atingido.

Matheus não disse nenhuma palavra, me abraçou mais forte e me beijou próximo a orelha. Eu olhei a Nathan e por mais que eu tentasse segurar, eu não consegui.

– E você está amando quem Nathan?

Ele me fitou e muito sem graça disse que ninguém. Levantou e foi até os mais velhos.

– Nathan vive se apaixonando, ainda sofrerá por conta disso.

– Bem meninos é chegada a hora. Alim vai à reunião e nós ficaremos aqui escondidos, no escuro e todos em silêncio até ele voltar. – disse Kauvirno.

– Está bem! – eu disse. Logo depois os outros disseram o mesmo.

– Sei que passou um dia bem agitado Matheus. Eu queria lhe pedir desculpas pela forma grosseira como o tratei hoje, mais cedo.

– Tudo bem Kauvirno. Eu sou um estrangeiro, um ignorante nisso tudo, eu deveria ter me calado e aceitado o que você havia dito. O que era certo a se fazer.

– Não, você não é tão estrangeiro assim e muito menos ignorante. Todos nós somos. Mais deixemos de delongas e vamos.

– Se escondam no porão, aquela portinhola ali atrás do balcão.

– Alim, mais ali é apertado... – eu disse.

– Não será mais, vamos todos entrem lá, eles já devem estar chegando!

Então entramos e sentamos. Aquele lugar, que no dia anterior era apertado, agora parecia espaçoso, mas ainda muito escuro. Fiquei do lado da porta, olhando para a frestinha, enquanto Alim ia e vinha com certa preocupação. Até que bateram na porta e ele foi abrir. A pessoa por detrás dela: Melissa.

– Ainda me deve uma costela abafada, humano inútil! – ela entrou e avaliou o lugar, com ela três homens grandes, um deles loiro os outros morenos.

– Melissa, sabe que minha taberna abre todos os dias, mais você sempre chega aos piores horários. Quem sabe se viesse no meio do dia, encontraria umas costelas do jeito que aprecia.

– É... eu tenho de fato trabalhado muito, e meu irmão me enche por demais a paciência. Étimos realmente é muito insensível me fazendo trabalhar dia e noite para conseguir o colar.

– E não deveria, uma mulher tão esplendorosa como você, deveria morar num castelo.

Ela pareceu enobrecida com tal elogio.

– Confesso que devo concordar com você. Eu deveria ser a rainha do mundo, aonde todos implorassem por suas vidas...

– Melissa, quem sabe o dia que parar de pensar em matar, tua vida não melhora? – disse Alim.

– Alim, eu mato quantos eu quiser e da forma que eu quiser e você não se meta com isso. Tem sorte de ser o único humano que nós bruxos mantemos vivos. – disse ela caminhando.

– Entendo. Mas e quanto ao colar? Alguns desertores aqui comentam sobre ele...

– Está ficando difícil de conseguir. Vamos ali e aqui e sempre nos escapa a oportunidade.

– Então já esta se aproximando do colar?

– Mas é lógico. Hoje foi um dia a parte. Aliás, se souber alguma coisa de algum dos vigilantes, nos avise. Hoje a casa daqueles Taurinos foi incendiada. O encanto se quebrou e ainda por cima, pelo próprio descente deles. Ironia não? – ela riu.

– Realmente! Mas aconteceu algo de novo, fora isso?

– Oh, sim! Leda enlouqueceu, lutou contra nós. Vampira maluca. E ainda matou a virgem, como isso me enoja.

– A virgem?

– Sim, uma amiga daquele namoradinho do guardião do colar. Ela era loucamente apaixonada por ele, e ainda por cima virgem. Quer pureza maior? Foi fácil enfeitiçá-la.

– Vocês bruxos...

– O que quer dizer? Esta nos julgando? – disse ela o encarando.

– Não, não. Jamais faria isso. Sabe e muito bem que eu me coloco no meu lugar.

– Isso é bom! – disse ela.

– Então quando vamos? – disse Alim.

– Nossa, ficamos de conversa e esqueci da hora. – ela indicou Alim aos três homens – Sabem as regras, vamos partir.

Um dos homens vendou Alim e então eles saíram. Melissa foi a última, antes de fechar a porta ela reavaliou o local. Quando fechou a porta todas as velas se apagaram.

– Podemos sair agora? – perguntou Matheus.

– Ainda é cedo, devemos esperar mais. – disse Kauvirno.

Algum tempo depois, Kauvirno deixou todos sair. Acendemos uma única velha e ficamos todos no meio do salão.

– Ela não bate bem da cabeça... tipo, ela é meio doidinha! – disse Matheus rindo.

– Sim Matheus, ela tem alguns problemas com o ego, se for a isso que esteja se referindo. Melissa é altamente vaidosa, no entanto a nós, ela parece uma simples mundana. Para ela, a mais perfeita de todas. Se desvalorizar o ego dela, ela cai no chão feito uma criança que acabou de receber um não. E então endoidece, e sai por aí matando quem não tem nada haver com suas emoções e atitudes. – falou meu pai.

– O que me preocupa agora é essa tal reunião, sobre o que será tratado nela. – disse Kauvirno confuso – Precisamos saber o máximo de informação possível, talvez essa tal Fenda Nebulosa, seja o local onde os pais de Matheus estejam.

– Como se chamava o local onde Átimos fora enterrado? – eu perguntei.

– Não tinha nome, ele foi enterrado dentro de uma montanha, junto com seus discípulos, vampiros!

– Será que a tal fenda não é lá? Na minha visão eu estava numa caverna...

– Pode ser Kayo. Mas é arriscado ir até lá.

– Mas talvez a única solução de saber alguma coisa. O colar me levou até a caverna por algum motivo, quem sabe o motivo não seja esse.

– Faz sentindo, no entanto devemos esperar Alim chegar com mais informações.

Aquela espera era angustiante. Acendíamos apenas uma vela de cada vez, e já estávamos na terceira. A ordem ali era não falar, não fazer movimentos bruscos, de modo que ninguém do lado de fora percebe-se que havia alguém ali.

Algumas vezes ouvíamos passos do lado de fora, mais logo iam embora. Provavelmente algum animal ou até mesmo fregueses da taberna, constatando que a mesma estava realmente fechada. Então apenas podíamos ficar quietos. Próximos para tentar se aquecer. Era arriscado ir a outro lugar usando magia, pois uma grande concentração de bruxos se fazia, provavelmente, próximo. Era arriscado demais, dizia Kauvirno.

Eu e Matheus ficamos num canto, mais afastados, ainda abraçados. Ele dormia enquanto eu estava ali, sentindo o seu doce cheiro, e pensando em tudo o que tinha acontecido. E pensando também na família de Aline. Eu tentava não me culpar, mas saber que pessoas estavam morrendo por eu ser o guardião de um colar que há muito havia sido, supostamente, esquecido, estava se tornando um peso muito grande. Por algumas vezes me veio a mente a pergunta, porque eu fui nascer?

Ouvimos uns passos e algumas risadas eufóricas. Kauvirno apagou a vela e pediu que todos se escondessem no porão da taberna. Assim fizemos. Era Alim que chegava, acompanhado de Melissa e dos três homens.

– Entendeu então Alim? Qualquer novidade nos conte, ou iremos te caçar e fazer uma poção com o seu coração! – disse Melissa, rindo.

– Não se preocupe Melissa. Contarei.

Os exilados então saíram e Alim entrou na Taberna.

– Fiquem aonde estão até eu dizer que podem sair. – disse ele.

Ele pegou fósforo e foi acendendo os lampiões por todo o bar. Depois foi até uma janela e observou.

– Podem sair. – disse ele.

– E então Alim, o que nos conta? – perguntou Kauvirno.

– Bem, tirando o fato que eu não sei onde fica a Fenda Nebulosa, posso ser claro em dizer que os pais de Matheus estão vivos, e ainda lá. Eu pude vê-los num certo momento que eu servia bebida.

– Ainda bem! – disse Matheus, alegrando-se.

– Sim, mais temos que ser rápidos quanto a isso. Eles estão irritados. Átimos não apareceu, quem proferiu a reunião foi Étimos, seu filho! Coisa como, procurar pelo guardião do colar e matá-lo, e levar o colar até Átimos.

“Pelo que eu percebi, é que Átimos ainda está fraco, apenas o colar poderá dar a ele a força que ele precisa para se regenerar. Étimos ofereceu, pelo que eu entendi, a Taça dos Eruditos e a Espada do Soldado Derrotado, para quem trouxer o colar até ele, e assim ter o poder eterno.”

“Outra coisa que eu pude perceber é Melissa e seu irmão, Antonius. Vivem brigando e lá estavam afastados um do outro. Sabemos o quanto Antonius destrata de sua irmã, pela sua condição mental. Não sei se isso poderá ajudar algum dia, mais tenho certeza de ter ouvido Antonius comentando com outro bruxo que sua irmã estaria com os dias contados.”

“Mas enfim, além do colar, fora oferecido dinheiro para todos os exilados que trazer mais pessoal. Uma quantia exageradamente grande. Depois eu fui levado até uma saleta, onde eu fiquei por algum tempo. Melissa apareceu e me trouxe para a taberna.”

– Então, realmente estão armando uma guerra. – comentou Tereza.

– Sim, mas isso já era previsto. – disse Kauvirno.

– Mas Kau, o que iremos fazer? – perguntou minha mãe – Não temos aliados, e você sabe que são poucos que devemos confiar.

– Sim eu sei, é arriscado aliar-se a qualquer um...

Eu fiquei sentado na cadeira, e por algum momento me desliguei. Eu vi a expressão de Matheus mudar de feliz para triste novamente. Kauvirno, disse que não era o momento de resgatar os pais dele, que não podíamos, simplesmente entregar o colar aos Soberanus, que isso seria arriscado. Matheus acabou discutindo com Kauvirno. Quebrou uma cadeira com um chute e foi até o porão. Eu fui até ele.

– Calma Matheus...

– Kayo, ele não quer pegar meus pais... são meus pais...

– Eu sei...

– Você não sabe nada. Você esta com seus pais aqui do seu lado, eles são bruxos como você. Podem se defender, e meus pais não.

– Eu não sei o que dizer pra te acalmar.

– Ah, não diga nada. Alias aqui, ninguém diz nada. Só sabem falar do colar , da taça e dessa espada. Não estão nem aí pra mim, ou pra qualquer outro. Ah, esquece! Eu sou um não-mágico.

– Matheus isso não tem nada haver...

– Como não tem? Se fosse seus pais na mesma situação eles logo iriam resolver. Mas esse maldito velho... sempre pensando no bem dos bruxos...

– Matheus você está nervoso. Não existe motivo para ficar tão bravo agora...

– Como não?

– Nós temos que esfriar a cabeça e tomar uma atitude, mais esbravejando não iremos conseguir.

– Estou cansado Kayo. – disse, agora chorando – É mais do que eu agüento carregar.

– Está querendo desistir agora?

– Não estou me referindo a isso!

Nathan e Adrian apareceram, cada um segurando um lampião. O porão ficou mais iluminado. Adrian fechou a porta.

– Estão discutindo lá em cima, obviamente. – disse Nathan.

– Porque? – eu perguntei.

– Seus pais querem ir até a caverna que você disse... Kauvirno, como mais velho e na liderança do grupo, não quer deixar.

– Ele sempre diz que é arriscado... – disse Matheus, ainda chorando.

– Arriscado sempre é. Mas é bom correr riscos. – disse Adrian.

– O que você está querendo dizer com isso? – eu perguntei.

– Se eles não querem ir, não vejo problema. Nós vamos. – disse Nathan – No entanto não sabemos aonde Átimos foi enterrado, você teria que nos levar.

– Vocês estão brincando comigo? – disse Matheus.

– Não! – disse os dois juntos.

– Está bem!

– Mas veja Matheus, você terá que fazer exatamente o que nós mandarmos. Você não tem nada que possa te proteger, então cuidado sempre. Está bem?

– Ok! – disse ele.

– Vamos Kayo, use o colar e nos leve até a caverna.

Eu pedi que todos segurassem as mãos um dos outros, eu pus o colar e segurei a mão de Matheus e de Nathan que segurou a de Adrian. Fechei os olhos e imaginei a caverna. Quando os abri, eu vi meus pais entrando no porão correndo, desesperados. A imagem deles foi ficando menos clara, conforme distorcia e outra ficava mais clara, um ponto escuro com pequenos focos de luz. Fomos indo em direção a ela até que batemos em alguma coisa e todos caímos no chão.

Tudo estava mais claro agora. Estávamos em algo rochoso, e alto. Com poucas árvores, e muitas delas, mortas.

– Não era aqui que devíamos estar! – eu disse.

– Você imaginou a caverna por dentro, mais ela está bloqueada. Por isso estamos aqui. – disse Adrian.

Olhamos melhor, e estávamos no alto de uma imensa montanha de rocha escura. Mais no alto via-se, no cume, uma nuvem escura que a cobria.

– Estamos muito alto! É uma queda e tanto. – disse Nathan olhando para baixo, na ponta de uma pedra.

– Temos que subir, - eu disse – a Fenda fica ali em cima.

– Estão vendo? Se não nos arriscamos, ficamos para trás. Calma Matheus, vamos buscar seus pais e trazê-los em segurança. – disse Adrian.

Matheus agradeceu, com dificuldade. Todos estávamos com falta de ar, que naquela altura era quase mínima. Nathan pediu para que continuássemos sem falar e fossemos devagar para não nos cansar muito.

– Antes de amanhecer estaremos no topo. – disse ele.

Então, seguimos.


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