Sob os Olhos do Napoleão escrita por Ana Barbieri


Capítulo 3
Capítulo 3




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Capítulo 3

Não foram necessários mais do que dois dias para que toda Londres soubesse da novidade. O fato de que Sherlock Holmes iria ser pai parecia ser mais surpreendente do que a morte de Cadogan West e a prisão do Coronel Oberstein, culpado pela morte do primeiro e pelo roubo de planos importantíssimos para o governo Britânico. Foi uma lástima, no entanto, não ter conseguido acompanhar Holmes, Mycroft e Watson em campo, já que uma fervorosa gripe me deixou de cama durante o transcorrer das investigações... meu cunhado assegurou que sentiu minha falta quando finalmente pegaram o coronel, pois o meu sorriso vitorioso e troca de olhares espertos com Holmes já se tornara marca registrada daquela parceria. Só não entendo como ele tomou conhecimento desses detalhes...

Em todo caso, no que concerne a Mycroft Holmes, é sempre surpreendente o quanto de informações consegue obter sobre sua família e ainda assim manter-se a par de tudo o que acontece nos bastidores da coroa britânica. Bastou o raiar da manhã seguinte a nossa descoberta, um envelope com o símbolo do Clube Diogenes já era entregue pela senhora Hudson às nossas mãos. Meu cunhado me congratulava pelo meu maior feito até então, observação que me deixou um pouco intrigada, afinal, não foi Mycroft quem uma vez dissera que meu maior feito fora, na verdade, levar Holmes ao altar? Quando levantei a questão ao meu marido ele simplesmente riu e me pediu para continuar a leitura da carta.

─ Eu pensei que ele seria o primeiro a vir nos visitar quando soubesse. – comentei tornando a encarar a caligrafia de meu cunhado. – Parece que só contaremos com a presença dele quando a criança nascer... “Mais um Holmes para honrar a história do mundo”... Ele é igualzinho a você. – murmurei jogando o envelope contra a mesa.

─ Meu irmão não é muito conhecido pela sua energia ou força de vontade para ir a qualquer lugar. Por isso mesmo quando aparece para uma visita já penso nas possibilidades de problemas que traz consigo. E são sempre maravilhosos. – disse Sherlock sem dar importância ao meu último comentário. Eu não contive uma risada frente à sua linha de raciocínio.

─ Ah sim, eu me esqueço de que a visão de um homem morto nos trilhos de um trem, na sua opinião, só não é mais maravilhosa do que um quadro de Vernet. – retruquei provocando-o.

─ As mentes criminosas de Londres parecem ter perdido um pouco da criatividade, ultimamente. Então sim, minha querida senhora Holmes, permita-me ficar contente quando algo realmente digno do meu poder de dedução aparece. Aliás, a senhora também estaria se tivesse nos acompanhado. É uma amante da caçada tanto quanto eu e Watson. – rebateu ele, agora me provocando.

─ Ousa, então, insinuar que estou envenenando o seu sucesso simplesmente porque não estava lá para olhar nos olhos do meliante? – indaguei arqueando as sobrancelhas, chocada.

─ Serão mesmo insinuações, minha cara? – respondeu Holmes, me fitando como se esperasse a minha confissão de que estava certo. O que, é claro, não aconteceu. – Enfim, eles estão ficando sem ideias... se eu fosse um...

─ Agradeço todas as noites à finada Violet Holmes por ter lhe dado um grande senso de moral, meu querido, o que torna essa hipótese completamente descabida e improvável. – interrompi-o com um alegre sorriso, fazendo com que ele revirasse os olhos... detestava ser interrompido, especialmente pelo meu choque de realidade.

Apesar de ter sido o pai da revelação, John não conseguiu esconder o quanto ainda estava surpreso por ela ao vir parabenizar Holmes. Mary me enchia de perguntas e de recomendações, pois como antiga governanta não conseguia deixar de possuir um vasto conhecimento sobre crianças. Deixamos os dois conversando e tomamos a direção do meu antigo quarto.

─ E qual foi a reação de Sherlock? – inquiriu ela assim que nos sentamos.

─ Para sua grande decepção, não foi nada gritante. Ele já sabia de tudo, Mary. Graças aos poderes de observação da senhora Hudson. – disse decepcionada. – Aposto que John iria erguê-la no ar e gritar de alegria.

─ Mas Holmes também ficou contente, não ficou? – continuou minha amiga, ansiosa.

─ Ah sim. – assegurei com escárnio. – Disse que se for menina, vai transformá-la numa bonequinha britânica. Caso seja um menino, vai roubá-lo de mim e eu nunca poderei vê-lo. Mas, está convencido de que será uma menina, então eu não acho que deva me preocupar com a segunda opção acontecendo.

─ Como se fosse possível separar uma mãe de seus filhos. – desdenhou Mary, risonha. – Ainda mais quando a mãe em questão é Anne Holmes! A primeira palavra dessa criança será homicídio. – brincou me fazendo rir. – Mas, e o que pretendem fazer? Digo, como vão acomodar o bebê? Afinal, o apartamento de vocês não é muito grande...

─ Oh, Mary! Ficamos tão sozinhos aqui em cima que às vezes me esqueço de que os outros quartos são para alugar... Eu sei que a senhora Hudson tem problemas com isso, já que a qualquer momento um inimigo do Holmes pode passar por aquelas portas. – falei, finalmente me lembrando do simples fato de que aquela casa não era nossa... por mais que soasse assim.

─ Pois então, acha que existe a possibilidade de vocês se mudarem...?

─ De jeito nenhum! – exclamei, surtando. – Eu não sei o que faria sem a senhora Hudson e parte da fama de Holmes vem de seu endereço aqui em Baker Street. Não, Mary. Uma mudança está fora de questão... seria como pedir a Holmes que mudasse quem é!

─ Mas, ele vai ter que mudar quem é, Anne. – cortou Mary, calmamente. – Agora que...

─ Ele não vê assim e tão pouco eu, Mary. – rebati, também calma. – Essa criança vai crescer ouvindo falar de seus pais, Sherlock e Anne Holmes de Baker Street. Não, Mary. Uma mudança está fora de questão. – conclui de cabeça baixa.

Ao saírem, John e Mary fizeram comentários quanto à repercussão da notícia na Scotland Yard. Disseram que Lestrade resmungara sobre como o mundo não suportaria a uma outra leva do sangue Holmes. Sherlock apenas meneou a cabeça e disse que as próximas gerações de inspetores da polícia deveria ser suprida com o máximo de ajuda possível, observação provocativa a qual eu não contive uma gargalhada. Todavia, aquela conversa sobre a mudança continuou a me chatear pelo resto da tarde e com consequências notáveis. Fiquei absolutamente ociosa, incapaz de falar ou comentar o que fosse com meu marido.

─ Vai querer que eu suba com o chá agora, querida? – indagou a senhora Hudson, chamando a minha atenção.

─ O que...? Ah... sim, sim, senhora Hudson, por favor. – respondi sacudindo um pouco a cabeça.

─ Anne, eu estava pensando. Que acha de tirarmos alguns dias de férias no campo? Em Surrey. – soltou Holmes, de repente, fazendo com que eu saísse completamente dos meus devaneios.

─ Sherlock, você odeia o campo! O ar, por mais benéfico que possa ser para a maioria das pessoas, sempre pareceu levar o seu humor ao pior estado possível! – lembrei-o, completamente surpresa com a ideia.

─ De fato, mas o nosso caro doutor acredita que uma mudança de ares pode fazer bem a você, no início da gestação. – explicou Sherlock, ainda não me convencendo.

─ Mas, e os seus casos? – rebati.

─ Eu não recebi nenhuma proposta interessante nos últimos dias. Nada melhor do que aproveitar o tempo da calmaria para um descanso, afinal, a sua saúde é o mais importante nesse momento. – insistiu Holmes, com as mãos sob o queixo, dando de ombros.

─ Nenhuma proposta trazida pessoalmente, mas você tem recebido diversas cartas. – comentei.

─ E nenhuma delas com um assunto bom o suficiente para preocupa-la, senhora Holmes. – ele estava decidido a me convencer, isso era visível, lutar seria inútil. – Ora, vamos Anne. Quando foi a última vez que viajamos sem ser a trabalho?

─ Onde ficaremos em Surrey? – perguntei, após um longo suspiro, ainda tentando fazê-lo mudar de ideia.

─ Opções não faltarão. – respondeu ele vivamente.

─ Oh, certo, está bem, você venceu! – retruquei me dando por vencida, batendo a xícara contra o pires, assustando a nossa senhoria quando ela adentrou o quarto.

─ Oh, meu Deus, senhor Holmes, ela não pode se alterar! – ralhou a senhora Hudson sabendo que o motivo da minha irritação só poderia ser o pomposo detetive.

─ A senhora Holmes tem nervos de aço, senhora Hudson. – rebateu ele fazendo pouco caso. – E senhora Hudson, já a aviso de antemão que estamos de partida para Surrey. – acrescentou.

─ De partida?! – exclamou ela. – Tão de repente! E por quanto tempo?

─ Duas semanas. – foi a resposta dele.

─ Duas semanas?! – exclamamos a minha senhoria e eu. Holmes, no entanto, estava se mostrando bastante tranquilo com as nossas reações... até demais na minha opinião. Por mais que os motivos fossem nobres, não conseguia entender o que o teria levado a tomar essa decisão... somente a palavra de Watson não teria tamanho efeito. Em todo caso, nada poderia ser dito ou feito para que ele mudasse de ideia. – Minha querida, vai ser uma oportunidade para vocês terem aquela lua de mel, pelo menos.

Ah, claro... Holmes. O campo. O mau humor. Os insetos...

─ Com certeza, senhora Hudson. – disse antes de tornar a subir as escadas. – Será uma experiência inesquecível...


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Notas finais do capítulo

Aqui estamos mais uma vez com mais um capítulo! Espero que vocês gostem... reviews serão sempre bem-vindas! Holmes é mesmo meio mal humorado quando está no campo, mas acho que Anne vai conseguir acalmá-lo. Veremos! Até o próximo, bjoooos!