Guerra Mutante: A Relíquia Roubada escrita por Luis Gustavo


Capítulo 19
19 - Eu viro um suicida




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Quando saímos daquela sala, corremos para ver a situação que estava lá fora. A porta que antes estava selada havia sido aberta no momento em que Mith morreu. O grupo de distração estava descansando. Eles se levantaram quando apareceram. Todos os motoqueiros da base estavam mortos, aparentemente. Alguns haviam fugido, com certeza. Era de madrugada naquele momento.

Falei para eles sobre o que havia acontecido lá dentro, e sobre a localização de Torrance.

– E o que faremos com a base? – Perguntou Jake, e eu olhei para alguns das motos intactas que estavam cheias de combustível.

– Tenho uma idéia. – Falei, observando as motos que tinham lá dentro.

Após espalharmos todo o combustível possível na base, Esmond lançou uma pequena bomba de fogo de artifício, e em minutos toda a base já estava em chamas, restando alguma motos intactas no lado de fora. Saímos de perto dela, avançando em direção da floresta.

Olhei então para Hariel e Emma, que estavam junto do grupo.

– O que pretendem fazer agora? – Perguntei, aproximando-me delas.

– Bom... – Falou Hariel, que tentava não olhar para mim. – É que...

– Nós queríamos saber se podemos participar do grupo. – Falou Emma, e eu sorri.

– Claro que podem. – Respondi, e elas sorriram. – Mas por quê essa mudança repentina de opinião?

– Você não vai sobreviver muito tempo sem a gente, não é? – Falou Hariel, e eu ri, constrangido.

– Tem razão. – Resolvi dizer, embora eu estivesse mentindo um pouco.

Eu avisei para os outros ficarem quietos, e lhes contei sobre as duas novas membras no grupo. Todos aplaudiram, felizes por aquela notícia. Elas seriam de grande ajuda. Nós prosseguimos a viagem a partir dali. Snow havia pegado um esquilo e o devorou rapidamente. Todos falavam sobre a batalha: os ferimentos que tiveram, as melhores mortes em seus pontos de vistas... Mas eu não tinha cabeça para aquilo. Queria me focar somente em meu objetivo. Estava tão perto de Torrance, mas não sabia se conseguiria enfrentá-lo. Nas duas vezes que eu o enfrentei, eu praticamente fui humilhado.

Havia riscos daquilo tudo ser só uma distração. Talvez Torrance não estivesse de fato lá na Montanha da Escada. Mas, pelo pouco que havia visto nas memórias de Mith, Torrance parecia confiar muito nele em algumas cenas aleatórias. Ele não mentiria para o homem em quem confiou a base, mentiria?

Precisava tirar aquilo de minha mente. Eu estava com muitos pensamentos ao mesmo tempo, e aquilo poderia me deixar mais desatento caso houvesse alguma batalha. Tudo que eu precisava ter em mente eram duas coisas: alcançar a Montanha da Escada...

...E mandar meu grupo de volta para o Abrigo.

Estava disposto a enfrentar Torrance sozinho. Não queria que eles se arriscassem mais ainda. Iria enfrentar Torrance sozinho e ao menos tentar recuperar a Espada, mesmo que não conseguisse matá-lo, e então fugiria depois. Se eu morresse, não teria problemas. Aquela era mesmo uma missão suicida, e eu havia prejudicado muito as pessoas à minha volta. Mas não iria prejudicá-las naquele momento.

Encontraríamos um Abrigo, e quando achássemos um, eu prosseguiria caminho sozinho. Era preciso aquilo acontecer. Não podia deixar que os outros morressem. Estava decidido a fazer aquilo.

Nós andamos durante praticamente o dia inteiro, sem fazer pausas. Alguns reclamaram, mas eu falei que quando mais rápido fossemos, teríamos pequenas chances de Torrance sair da Montanha. Depois desse argumento, eles entenderam que eu estava certo. Mas fizemos as pausas essenciais para nos alimentarmos, a cada três horas. Ficávamos naquelas pausas durante cerca de 30 minutos, nos alimentando e descansando ao mesmo tempo, para então finalmente voltarmos à intensa caminhada.

– Você está bem, Franklyn? – Falou Demetria, aproximando-se de mim, em certo momento da tarde.

– Ah, estou... – Menti, tentando despreocupá-la. – Só é o cansaço da batalha que me deixou assim. Não precisa se preocupar.

– Não acha que seria melhor pararmos, então? – Ela falou, e eu pensei no quê responder.

– Não... – Respondi, um pouco triste por ter que mentir para ela e para os outros. – É como eu falei antes, temos que ir rápido caso queiramos encontrar Torrance.

– Tudo bem... – Murmurou, e nós não falamos mais nada. Ela afastou-se de mim e foi ao lado de Hariel e Emma, conversar sobre qualquer coisa.

Dei uma rápida olhada para o grupo logo atrás de mim. Todos pareciam estar felizes, até mesmo Jake. Felizes porque encontraríamos Torrance. Meu peito doeu ao ver os sorrisos em seus rostos. Eu deveria ser uma pessoa cruel o bastante para mandá-los embora em breve...

Você é um monstro, dizia uma voz dentro de minha mente. No entanto, não era Nasura. Era eu mesmo. Um monstro, um monstro.

A voz saiu de minha cabeça quando um calafrio percorreu meu corpo ao ver, muito ao longe, a silhueta da cadeia de montanhas. A maior delas era a que eu mais podia ver, mas ainda estávamos longe demais. Hariel e Emma deveriam ser as únicas a saber que ela era a Montanha da Escada. Talvez o melhor lugar para meu grupo se abrigar em algum lugar afastado das montanhas. Se ficássemos na mesma gruta de antes, eles poderiam saber o caminho que percorremos.

Foram-se duas horas de caminhada, até encontrar uma gruta em um rochedo localizado em uma clareira da floresta. Avisei aos demais que ficaríamos ali naquela noite, para prosseguirmos no dia seguinte. Todos entenderam. Os turnos de vigia seria eu, depois Jake e depois James, em um tempo de três horas cada um.

Quando certifiquei-me de que todos dormiram, fui até as minhas coisas e eu me preparei para partir. Deixaria que eles dormissem ali. Com certeza ficariam irritados por saber que eu fui sozinho, mas era um risco a correr se eu queria protegê-los. Eu saí da gruta acompanhado de Snow, que não fez nenhum barulho sequer, e demos uma última olhada no meu grupo. Andei 30 passos até uma pessoa agarrar-me pelo ombro. Eu grunhi baixo quando vi que Jake me segurava.

– Tem certeza que quer ir sozinho? – Sussurrou Jake, e eu me perguntei como ele sabia sobre aquilo. – Tenho Personificação Psíquica agora, lembra-se? Consegui ler seus pensamentos em um momento.

Eu fiquei sem palavras por alguns instantes. Tomei coragem e por fim falei.

– Não quero que vocês se arrisquem mais por mim.

– Não estamos nos arriscando por você. – Ele falou, desafiando-me. – Estamos nos arriscando pelas pessoas do Abrigo. Por aquelas que você pretende salvar. Claro que você é uma pessoa importante para nosso grupo agora, mas isso não quer dizer que você é o centro de tudo, Franklyn. Posso ter me tornado um companheiro de todos, uma pessoa diferente do que era antes, mas ainda sei de muitas coisas. E se você pensa que nós temos nos arriscado somente por você, está enganado. Agora, me diga, por que quer ir sozinho?

– Jake... – Comecei, mas não encontrei palavras. Queria dizer algo, mas não conseguia. – Eu... Bom... – Respirei fundo, e então finalmente falei. – Essa vingança é minha. Torrance pode ter deixado várias pessoas do Abrigo em Coma, e eu quero salvá-las também. Você sabe que minha mãe é uma dessas pessoas. Mas, mesmo assim, quem deve matá-lo sou eu. Irei me vingar do que ele fez com meu irmão e meu pai.

– Eu falei que te ajudaria a se vingar, assim como você me ajudou... – Ele murmurou, olhando para a gruta. – Então irei com você para te ajudar.

– Não. – Eu falei, e tive um pensamento. – Quer me ajudar? Fique aqui. Aja como um líder enquanto eu estiver fora. Quando todos acordarem, diga à eles qualquer coisa sobre mim. Minta ou conte a verdade, você é quem sabe. Essa é a única forma de me ajudar.

– Tem certeza? Podemos ir todos juntos.

– Como falei, é minha vingança. – Eu respirei fundo. – Obrigado por ter me ajudado, Jake.

– Obrigado digo eu... – Ele estendeu sua mão, e eu a apertei. – Nos vemos no Abrigo, então?

– Sim. – Menti para ele, afastando-me. – Se eu não voltar, seja um bom líder. – Ele fez uma expressão de como tivesse recebido um tiro. – Cuide do grupo.

Ele ficou quieto, ainda tentando entender o que eu havia acabado de falar. Jake estava confuso, mas me encarou e falou:

– Eu cuidarei.

Então, prossegui meu caminho pela floresta escura, pouco iluminada pela luz, enquanto deixava Jake para trás. E mais uma vez, estava sozinho, acompanhado somente de meu lobo e de minha intensa sede de vingança.

Eu caminhava sem pressa. Parei em um lago para me encarar, e Snow começou a beber a água dele. Comparado à quando saí do Abrigo, eu estava muito mudado. Havia vários arranhões leves já cicatrizados em meu rosto. Puxei a gola de minha camiseta vermelha de frio, olhando para o meu ferimento em meu ombro direito causado por Torrance. Abri minha blusa de inverno branca, olhando para a abertura em minha camiseta na barriga, onde estava o ferimento causado por Mith.

Eu havia passado por tantas coisas, e quase em todas as situações dependi do meu grupo. Agora estava ali, sozinho, indo enfrentar o mesmo homem que havia deixado a mim e a minha mãe sozinhos. Eu estava pronto para morrer.

– Irei te encontrar, Willian... – Falei, um pouco melancólico. – Eu acho...

Voltei a andar, tenso. Snow caminhava ao meu lado em passos silenciosos. O céu ainda estava escuro. Provavelmente estaria na montanha quando fosse de manhã, que agora era impossível de se enxergar na escuridão da noite. Imaginava o que Torrance estaria fazendo lá.

Foram-se horas de caminhada naquela enorme floresta, e em certo momento o dia começou a ficar claro pela luz do sol. Reconheci então o lugar em que eu estava. Eu estava próximo à gruta em que havíamos ficado. Eu passei por ela sem dar muita atenção, seguindo caminho até à maior montanha, que ficava muito à frente.

Passei então pelo túmulo de Yordle, em que eu fiz questão de parar. Fiquei observando a placa que Jake havia escrito com um papel do caderno de Thomas, alguns gravetos e uma caneta.

Em memória de Yordle, o Herói Iluminado, era o que ele havia escrito. Eu deixei algumas lágrimas escaparem, e eu as sequei rapidamente.

– Me perdoe... – Murmurei, triste, ao túmulo de Yordle. – Era para eu ter te salvado... Você não devia estar morto agora.

Eu esperava alguma resposta, mas se tivesse mesmo algum tipo de resposta com certeza eu não iria gostar.

– Sua morte abalou a todos nós. – Continuei. Snow parecia triste, também, pois ele logo abaixou a cabeça quando eu comecei a falar. – Jake foi o que mais chorou. Ele ficou desolado. Negou seu pedido de se tornar líder, e me colocou no cargo. Ele matou Mith, como você sabia que ele faria. Você o mudou, Yordle. Sua morte o deixou mais... presente. Agora, você pode descansar em paz. E pode ter certeza que eu completarei a missão que me foi concedida.

Virei-me, então, e olhei então para a montanha mais alta, a Montanha da Escada. A única forma de eu subir nela daquele lado era escalando a encosta. Snow teria que ficar lá embaixo. Dei uma ordem para que ele não saísse dali. Que achasse algum esconderijo próximo, para não ter risco de ser encontrado por ninguém: aliado ou inimigo.

– É hora de ir. – Falei, afastando-me do túmulo.

Dei uma rápida olhada para a encosta da montanha. Deveria ter uns 50 metros de altura, ou mais. Podia ver o espaço no meio da montanha, onde a escada acabava. Torrance estava lá, eu sabia disso.

Lembrei-me então de uma coisa que não tinha usado até então.

Fiz meu corpo ficar coberto de minha energia mental, e eu alceei vôo. Subi 10, 20, 30 metros. Cheguei na metade da encosta quando comecei a perder a força, mas eu me recusei a cair. Senti uma força imensa percorrer todas as minhas veias, e eu ganhei mais velocidade, e subi mais ainda.

Então, cheguei ao meu destino.

– Torrance. – Falei com ódio, quando pousei na abertura. Ele me olhou e sorriu. Haviam dezenas de soldados caídos ali, com armaduras diferentes. Haviam também pessoas que pareciam ser Mutantes. Todos estavam mortos. Ele vestia as mesmas roupas de antes, e estava com um charuto em sua boca.

– Muita ousadia a sua vir me procurar, Frankl... – Ele falou, e eu impedi que completasse a frase agarrando-o depois de uma corrida. Nós rolamos no chão, e Torrance me deu um chute quando paramos de rolar, que me fez cair em cima de um julggernaut. – Continua com maus modos, hein? – Falou, se erguendo. O charuto continuava em sua boca.

Eu me ergui, cuspindo sangue no chão. Observei, tenso, a carnificina que ele havia causado. Atrás de mim estava a escada. Ele girou a Espada no ar, e eu fiz meu arco aparecer, no mesmo instante puxei a corda e disparei contra Torrance, e repeti o processo. Mas ele se defendeu cortando as flechas facilmente, usando a Espada. O arco seria inútil naquele momento. Ele não avançava, e eu também não avançaria.

– O que quer, garoto? – Ele falou, girando a espada novamente. – Deseja a Espada, não é? – Eu não respondi. – Interessante... Pergunto-me como descobriu minha localização. Mith te disse, não foi?

– Eu invadi suas memórias. – Falei, com ódio. – E depois um amigo meu o matou. E meu grupo destruiu sua base.

– Ah, que pena. Eu gostava bastante dela. Então, veio aqui para se desculpar?

– Vim aqui para recuperar a Espada Dourada, e usá-la para te matar. – Falei, e meus punhos cerraram. Isso, falou Nasura. Desafie-o, tente irritá-lo, faça qualquer coisa que possa fazer com que ele te ataque, e eu te ajudo.

– Os sonhos das crianças são realmente os melhores... – Ele tirou o charuto de sua boca, observando-o. E me encarou com um sorriso maléfico. – Mas pena que são só sonhos.

Então, ele fez o charuto começar a arder completamente em chamas e o lançou em minha direção, e eu nem tive tempo de me defender de tão rápido que foi seu ataque. O projétil em chamas atingiu meu ombro direito, e eu cambaleei para trás com o impacto. Como uma coisa tão leve podia ter tanta força assim?

Torrance apareceu em um feixe de luz na minha frente, me agarrando. Ele me ergueu no ar.

– Junte-se ao seu irmão. – Ele falou, e eu lutava para tentar escapar de seu golpe.

E, por instinto, lhe desferi um chute no rosto. Me esqueci que tinha os pés mimetizados, e também me esqueci que Nasura iria me ajudar. Depois de minha outra não tão amigável personalidade conseguiu fazer com que o motoqueiro me soltasse, eu dei alguns passos para trás, tentando ir para mais perto da escada.

Torrance correu na minha direção, e eu permaneci parado. Dei uma rápida olhada para trás, observando a grande descida, e quando Torrance se aproximou eu o deixei que me acertasse um soco, mas logo depois eu o agarrei e lancei-me na escada, levando-o junto. Nós dois começamos a cair agarrados um ao outro, batendo na pedra, até atingir o gramado.

Eu bati a cabeça, e senti minhas forças irem embora. Então, desmaiei por alguns segundos.


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