I'm Aquarius escrita por Tom


Capítulo 8
Cigarros


Notas iniciais do capítulo

É, eu realmente devo estar com motorzinho nos dedos. xD
Tem uma música mais para o final do capítulo e eu realmente recomendo ler com ela como fundo.



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Sento-me em minha cama e ponho as mãos na frente do rosto molhado pelas lágrimas. Minha respiração ainda é difícil, então prefiro inspirar e expirar pela boca. Neste momento a única coisa em que penso é em como eu gostaria de estar na minha casa, em minha cama, como se nada tivesse acontecido ou mudado. Eu continuaria a ser apenas eu, Corinne Squarre.

E até mesmo quando pensei que não poderia ficar pior, fui derrubada ao chão como um pino de boliche. Só de pensar na vida que eu levava antes meus olhos tornam a se encher novamente com aquele líquido salgado. Mordo o lábio inferior, tentando conter os soluços, e deixo-me cair sobre o colchão macio.

As imagens do passado invadem minha mente sem minha permissão, mostrando-me a garota imbecil, gorda e nojenta da sétima série. Aperto com força a coberta que havia em baixo de mim, como se a dor que eu sentia naquele momento fosse se apagar apenas com aquele gesto.

As risadas dos outros estudantes começam a retumbar em meus ouvidos e eu grito para que eles parem, todos eles. Tento lhes falar que aquela era outra pessoa, uma pessoa totalmente diferentemente de mim, mas os olhos não enganam. Os olhos azuis, com aquele brilho intenso, já estavam ali. E eles me traíram. Eles estavam me traindo!

Como se não bastasse os próprios risos, ouço os gritos das pessoas no dia do acidente. Imagino todos os seus rostos enfurecidos gritando comigo, me xingando, me desejando a morte. As minhas mãos vão parar ao lado das têmporas e começo a bater naquele local, implorando que aquilo pare. Implorando que tudo aquilo pare. Que eu possa apertar um botão que fará tudo sumir.

Não sei quanto tempo se passou, mas sento-me novamente na cama enquanto as lágrimas molham toda a minha roupa e o que estava ao meu redor. Quando olho para frente, me flagro no enorme espelho que havia ali. Fito o reflexo e por um momento me pergunto quem era aquela pessoa com o rosto sujo da maquiagem borrada, marcado pelas lágrimas excessivas, de cabelos revoltos e bagunçados.

Pisco algumas vezes, ou talvez algumas dezenas, mas nada parece mudar. Ergo o braço direito e a pessoa do espelho também ergue, e aquilo é como se fosse uma coisa nova para mim. Perco-me naquela situação, maravilhada com o fato de que o reflexo também se move conforme eu me movo. Levanto-me, e a pessoa também se levanta. Mas quando sorrio, o que vejo no reflexo é um monstro.

Claro que seria um monstro.

– Você não é um monstro, Corin. – ela disse enquanto se abaixava para perto de mim e passava a mão em seus cabelos, tentando abrir um sorriso amigável. Eu a fitei com os meus enormes olhos azuis, sem entender nada.

– O-o-o-o que você f-f-faz aqui? – gaguejei a pergunta enquanto afastava a mão da garota de perto de mim. O que ela estava fazendo? Tentando me ajudar? Eu era uma aberração, um motivo de piada e ninguém iria querer me tirar desse status.

– Você não é um monstro, Corin. – repetiu e pegou em minha mão direta, fitando-me com intensidade. – E vou lhe ajudar a ver isso. – por mais que o choro me fosse presente depois de tantas zoações, provocações e xingamentos, quando fixei o meu olhar no seu, eu acreditei que suas palavras fossem verdade.

– Você não é um monstro, Corin. – murmuro em voz baixa e passo o dedo indicador levemente pelos meus lábios rosados, ainda fitando fixamente o reflexo do espelho. Sem pestanejar, ele faz o mesmo que eu.

E eu não era um monstro.

Matar o garoto e o seu pai não me tornava um monstro porque fora uma fatalidade, e a culpa também era das pessoas que viviam ao meu redor, que me levaram a tal atitude. Assim como ser uma perdedora no passado também não me tornava um monstro, mas me tornava uma vencedora. Porque eu consegui passar por cima de tudo aquilo e me tornar o que eu sou hoje.

Olho para o reflexo e sorrio novamente, mas dessa vez ele também sorri para mim. E eu sei que os dias não serão fáceis, porque as pessoas simplesmente não esquecem ou perdoam uma coisa vergonhosa, mas eu ainda era Corinne Squarre e só isso bastava no momento.

* * *

A manhã de Lisbeth era uma rotina: acordava atrasada e vestia qualquer coisa que via pela frente. Praticamente se esquecia dos livros ou dos outros materiais, mas nunca de seu celular e dos fones de ouvido. Depois que batia a porta de seu quarto e a trancava, corria até o refeitório e pegava uma fila enorme para servir-se dos alimentos ali oferecidos. Depois escolhia sempre a mesma mesa perto da janela, sentando-se sozinha.

Era como se as pessoas soubessem exatamente o tipo de pessoa Lisbeth era e assim a evitavam ao máximo. Um exagero, com certeza, porque poderiam iniciar uma longa discussão sobre a quantidade insuficiente de peito de peru que serviam naquele sanduíche.

Mas naquele dia em especial as coisas começaram estranhas. Lisbeth não se atrasou, não esqueceu de pôr as meias, pegou todos os livros e ainda uma caneta azul extra. Desceu despreocupadamente as escadas e andou lentamente pelos corredores, entreouvindo conversas sobre a homenagem feita à Corinne Squarre e em como ela era uma gorda-iludida-e-idiota, para não dizer palavras mais feias. E Lis chegou na conclusão de que Megan realmente havia aprontado.

A fila da cantina não estava cheia, então Lisbeth serviu-se rapidamente e ainda pegou um enorme sanduíche com muito peito de peru dentro, fazendo-a sentir-se mais feliz. O suco de laranja quase transbordava de seu copo, o que também era ótimo, porque o líquido quase nunca dava para o lanche inteiro. Sentou-se em sua mesa, escolheu uma música aleatória na playlist de seu celular e pôs-se a comer.

Mas foi como se o destino a estivesse preparando para o que estava por vir. Enquanto se preparava para dar uma nova mordida no pão, fitou as pessoas na sua frente e essas pareciam completamente fixadas em alguma coisa não muito longe dali. Lisbeth tirou o seu fone e estranhou o silêncio em que se encontrava o refeitório visto que agora ele estava cheio.

Mas então ela viu Corinne Squarre entrando pelas portas duplas e não pôde acreditar. Ou aquela garota era muito burra ou gostava de sofrer, porque ir à aula depois do que lhe acontecera era uma espécie de masoquismo incompreensível. Logo os sussurros começaram seguidos de algumas risadas de desdém e apontamentos. Ela era o centro das atenções, com certeza.

Corinne cruzou o refeitório com os olhos e, por alguns segundos, ela e Lisbeth fizeram contato visual. Fora pouco tempo, verdade, mas tempo suficiente para que a garota de cabelos negros se precipitasse em direção à mesa. A loira olhou para a bandeja com a comida pela metade e brigou consigo mesma por ter encarado a Lady Vadia. Mas agora era perda de tempo, porque ela já estava ali.

– Posso me sentar? – Corinne perguntou em uma voz baixa e meio rouca. Lisbeth lembrou-se do tempo que ficara sem dormir por causa dos gritos e soluços que vinha do quarto da frente, franzindo as sobrancelhas. A loira acenou com a cabeça em confirmação e Corin se sentou. Quando Lis ergueu o olhar, a garota exibia um sorriso tímido. Aquela visão era estranha, porque por um momento Lisbeth acreditou que Corinne fosse uma menina inocente.

– Quanto de maquiagem você teve que passar para esconder as marcas de choro? – Perguntou e deu uma mordida extravagante em seu sanduíche, tentando não pensar em como aqueles olhos azuis eram perfeitamente compatíveis para os cabelos negros e o rosto delicado da garota.

* * *

CLINT EASTWOOD - GORILLAZ

Jimmy acendeu o cigarro e encostou-se no capô de seu Dodge Challenger 1970. Ajeitou o chapéu preto em sua cabeça e, logo depois de tragar e sentir a costumeira fumaça lhe invadir os pulmões, expeliu-a pela boca formando pequenas espirais. Pela visão periférica viu Matthew se aproximando com um sorriso vitorioso nos lábios.

– Deixe-me adivinhar, tem relação com Corinne Squarre? – perguntou a ele e, antes mesmo de estar próximo o suficiente, Matt fechou a cara. Jimmy virou-se para o amigo e abaixou os óculos Ray-Ban até a ponta do nariz, observando-o de maneira indiferente com seus olhos verdes. – Você sabe que não me importo.

– Você poderia pelo menos ficar feliz por mim, idiota, porque sou um gênio. – Matthew resmungou e também escorou-se no capô do carro de forma brusca. Jim crispou os lábios, mas nada disse. Só Deus sabia o quanto ele amava aquele Dodge. – Mas sim, é sobre ela. Acredita que a cadela ainda está no refeitório e vai assistir as aulas? Não sei como ela tem coragem.

– É. Ela parece ter mais coragem do que muitos de vocês. – Jimmy dá de ombros e volta a fitar alguma coisa invisível que estava na sua frente, levando o cigarro à boca para uma nova tragada. Matthew vira-se para ele, olhando-o de cara feia.

– Você fala como se não fosse um de nós. – comenta com irritação. Jimmy deixa que toda a fumaça que era presa em sua boca saia de uma vez, formando uma parede branca. Ele abre um sorriso de escanteio e joga o cigarro longe, mesmo sem termina-lo.

– Às vezes eu não gostaria de ser. – responde à Matt e fica totalmente em pé, tirando de dentro do bolso de sua jaqueta preta as chaves do carro. Aperta um dos botões que haviam ali e o automóvel se tranca. Depois disso, Jimmy tira um novo cigarro do maço e o põe entre os lábios, sem acendê-lo.

O lado de fora do colégio era cheio de pessoas que gostavam do ar livre. Garotos que andavam de skate enquanto o tempo lhes permitia, outros que batiam palmas para o sol, os fumantes e rebeldes e as garotas que rodeavam Jimmy e o seu famoso carro, tentando chamar a sua atenção. Quando duas meninas olharam e apontaram para o seu cigarro, ele fez uma careta.

– Não, suas vadiazinhas, isso não é uma metáfora. – pontuou a frase levando a mão ao bolso e trazendo de lá seu isqueiro prateado. Matthew riu e partiu em direção ao colégio, Jimmy seguindo-o. Depois de já ter o cigarro aceso, assoprou a fumaça no rosto das garotas porque os seus caminhos se cruzavam e elas logo começaram a tossir, fazendo com que o garoto abrisse um sorriso torto.

– E hoje ainda temos aula de filosofia com um professor novo e provavelmente tapado. O dia poderia ser melhor que isso. – Matthew resmungou enquanto tomava das mãos de um garoto gordo a sua maçã. Mordeu-a uma vez e deu de ombros, como se aprovasse a fruta.


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Notas finais do capítulo

Bem, espero que a quebra de pontos de vista não tenha prejudicado a leitura de vocês, mas tudo faz parte do show. Gostaram? Reviews? Não se acanhem, gafanhotos.