I'm Aquarius escrita por Tom


Capítulo 2
Primeiro dia e espirros


Notas iniciais do capítulo

Hey! Agora a história começa de verdade. Talvez esse capítulo possa se tornar confuso para alguns, mas com o tempo as coisas se explicam.



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O barulho vindo de meus sapatos de salto é a única coisa que ouço aqui. Meus passos são rápidos e nervosos; eu ando de cabeça baixa. A casa de meu pai é tão bem iluminada que, mesmo sendo quatro da madrugada, eu me sinto como se fosse meio dia.

Acabo de chegar de viagem, depois de dez horas de voo, e a primeira coisa que faço é procurar a cozinha. Meu estômago implora por isso e eu não demoro a encontrá-la. Talvez minhas lembranças não estejam tão ruins assim, afinal, daquele lugar. Tiro de dentro da geladeira um suco de laranja recém aberto e três fatias de peito de peru.

Coisas leves. Ainda devo permanecer em meu regime.

Enquanto como consigo não pensar em nada, ou, pelo menos, pensar em coisas banais. Por exemplo: "onde estudarei?", "como me receberão?", "onde está o canalha de meu pai?". Fatos desinteressantes que fazem com que eu consiga fugir de mim mesma pelo menos por certo tempo.

* * *

Acordo com o alerta de mensagens de meu celular. Por um momento sinto-me desnorteada, como se fosse apenas mais um dia de colégio e Sheyla estivesse me mandando zilhões de mensagens escrito "acorda, sua vadia". Sinto-me reconfortada com a ideia, tanto é que pego o meu celular e antes mesmo de desbloqueá-lo abro um sorriso.

Sou tola.

A primeira mensagem de texto é de Johnny. Nela ele me pergunta se estou bem, mas, mesmo sem uma resposta minha, diz que tudo vai ficar bem. A maior parte das "sms's" possuem conteúdo parecido, então simplesmente não me importo em não lê-las. Na verdade, pulo logo para a conversa que mais me interessa.
Clark Prettzel, meu querido namorado. O homem que fez com que eu adquirisse uma bela galhada sobre minha cabeça. Ele diz que está preocupado e que quer vir até a mim.

Um sentimento me penetra os poros e percebo que é ódio. Sorrio pois essa é uma sensação agradável, mas lembrar de Clark me faz lembrar do que fiz depois que descobri suas traições e então eu começo a me desesperar de novo. O ódio é transformado em terror e as lágrimas simplesmente transbordam de meus olhos sem pedir qualquer permissão.

– O que está acontecendo comigo? - murmuro ainda mergulhada na escuridão por debaixo da coberta. Cenas daquela noite me vem a cabeça, cenas que quero esquecer. Um quebra-molas, gritos, a música alta. Tudo em harmonia perfeita mas mortal. Eu havia acabado com três vidas naquele dia: com a do pai e seu filho, e, principalmente, com a minha.

Mas por que eles simplesmente não esperaram para cruzar a rua? Custava alguma coisa? Esperar um pouco mais?

Soluços começam a escapar de minha boca e percebo que a situação está incontrolável. Eu estava esperando levar uma vida normal aqui, é isso? Com novos amigos, quem sabe um bom namorado, viver bem com meu pai? Como sou idiota. Eu nunca mais poderei aparecer em meio a pessoas novamente. Não quando a vergonha ainda está tão recente em minha face.

Depois de tantas outras horas chorando, eu durmo novamente.

Durante dias é isso que faço. Chorar para, logo após, dormir.

* * *

– St. Hungham School. - leio no papel em minhas mãos. Estou parada em frente a uma construção antiga, não muito o meu estilo, mas que possui o seu charme. Puxo com a mão direita uma mala preta porque escolhi passar os cinco dias da semana dormindo ali, longe da casa perfeita e do meu pai perfeito.

Percebo que essa atitude ali é bem comum. Não sei se pelo simples fato de os adolescentes não poderem ficar em casa ou, então, por possuírem aquele sentimento de rebeldia sem causa.

Suspiro.

Isso não possui a mínima importância em minha vida.

Nossos uniformes são iguais aos de qualquer outra escola em Tightum já que este é o padrão estabelecido pelo governo na área da educação, até mesmo para as escolas particulares.

– Saia para as meninas, calça para os meninos. Nada muito curto ou provocante, desleixado ou inapropriado. Mantenham o senso, alunos, e poderão conviver bem com as regras da escola. - discursou uma mulher botoxizada que eu desconfio que seja a diretora. Tento não rir de sua face deformada e o esforço que faço é intenso.

Desvio minha atenção então, para observar os outros alunos.

Estranhos, escrotos, encantadores, entediantes, escandalosos, espertos. Há mais diversidade aqui do que em qualquer outro lugar. Gosto disso.

Depois de mais alguns minutos de falatório somos liberados para acharmos nossos aposentos. A propriedade é tão grande que, graças a Deus, não precisamos dividir o quarto com ninguém. Antes de sair para o corredor, entretanto, olho-me no espelho.

A maquiagem bem feita tampa as manchas insistentes que as lágrimas deixaram no decorrer dos dias, o cabelo negro está ondulado e devidamente distribuído pelas minhas costas, meus olhos claros continuam penetrantes e misteriosos, minha boca levemente carnuda e tingida com um batom rosa claro demonstra simplicidade, mas, ao mesmo tempo, poder.

Sorrio para meu reflexo.

Meu reflexo me responde com uma careta de dor.

Conto até três, lentamente, tentando espantar de minha mente a enxurrada de memórias que tentam invadi-la.

* * *

Segundo o mapa eu me encontro no lugar correto. Prédio L, último andar, ala norte, corredor 18. Agora só preciso localizar o quarto - de número 789 - no meio daquele mar de portas.

Inicio minha caminhada e o som de conversas inunda meus ouvidos. Tenho certeza que alguns já foram para os quartos de outros e estão se divertindo. Aqueles, os mais idiotas, falam com os seus pais pelo telefone. Mas ainda tem os que possuem a dor da saudade idiota e falam com seus namorados (as) e best friends forever.

Reviro os olhos, enojada.

Mas não é como se eu nunca tivesse feito isso antes.

Quando já estou quase no final do corredor um barulho diferente me chama a atenção. São espirros, muitos deles, vindo de uma porta à direita. Paro e franzo as sobrancelhas, confusa. É possível alguém espirrar tantas vezes seguidas assim? Não penso muito.

Abro a porta.

O quarto é simples. As malas estão jogadas pelo chão e as roupas já estão espalhadas. Não vejo coisas interessantes ali, talvez algumas jaquetas de couro, mas o resto se resume em camisetas de bandas e super-heróis. Incrível. Temos uma criança entre nós.

– Tudo bem? - pergunto com respeito, porém já me arrependendo de ter aberto a porta. A garota, que usa um moletom preto, se vira e tenta focar o olhar em mim, mas seus espirros não permitem. Sinto uma necessidade enorme de ir embora.

Para ontem.

– Sim, - espirro - eu - espirro - tô - espirro - bem.

Sorrio um sorriso frio e já me viro para ir embora. Antes, entretanto, a garota me chama.

Se - espirro - vir - espirro - alguma - espirro - coordenadora - espirro - por aí - espirro - avisaquenessamerdatempoeirapracacete. - e, de forma muito rápida, conseguiu formar a última frase antes de voltar para os espirros. Ela se tranca no quarto e a única coisa que consigo pensar é em como ela possui uma boca suja.

Inspiro e expiro.

Quando olho para a porta da frente vejo que, em cima da mesma, há o número 789 belamente pintado em uma tintura preta. Olho para a cima e faço uma careta.
Meu azar ainda pode aumentar? Sou vizinha de quarto de uma menina que tem uma ridícula alergia à poeira.

* * *

Quando estou sozinha toda a dor volta sem piedade. Percebi que de dia sou Corinne Squarre, filha da bela socialite Maddison Squarre e do bilionário Joan Sullivan, mas a noite sou apenas mais uma assassina, uma mera fugitiva. A protagonista de uma vida cheia de mentiras.


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Notas finais do capítulo

Corinne é só alguém dominada pela futilidade. xD